Acessibilidade / Reportar erro

Em busca de maior igualdade de gênero na ciência

EDITORIAL

Em busca de maior igualdade de gênero na ciência

Em 1792, Mary Wollstonecraft escreveu em seu livro A Reivindicação dos Direitos da Mulher: "Minhas observações sobre a educação nacional são obviamente sugestões, mas eu gostaria principalmente de enfatizar a necessidade de educar os sexos em conjunto para o aperfeiçoamento de ambos".1

Em 2014, estamos presenciando uma situação crítica e inaceitável na Nigéria, causada pelo obscurantismo e cegueira do grupo Boko Haram e por um país que parece não estar preparado para lidar com a igualdade de gênero.

Contudo, a situação dos direitos da mulher é ainda pior, porque, mesmo na moderna Comunidade Europeia, de acordo com recente texto de Serena Kutchinsky: "informações coletadas pela Agência Europeia pró Direitos Fundamentais (FRA), que entrevistou 42.000 mulheres, de 28 países-membros, revelaram que uma dentre três mulheres já foi física ou sexualmente abusada".2 Surpreendentemente, "países com os maiores níveis de igualdade de gênero apresentaram os maiores índices de violência de gênero. As supostamente liberais nações nórdicas apresentaram os piores resultados:Dinamarca (52%), Finlândia (47%) e Suécia (46%). O Reino Unido saiu-se um pouco melhor, vindo em quinto lugar".2

O que falar sobre o papel das mulheres na ciência? Que situação temos no Brasil?

Podemos enfocar esse assunto de muitos ângulos, mas, para resumir, vamos considerar algumas informações apresentadas pelo CNPq quando da celebração do Dia Internacional da Mulher, 8 de março. De acordo com essa instituição federal, a participação das mulheres em bolsas de estudo para pesquisa perfaz 36%. Isso é considerado pela academia como um certificado de excelência em pesquisa. Por outro lado, quando se observa o número de bolsas para alunos de graduação em ciências, 56% são destinadas às mulheres. Isso claramente significa que os degraus para ascender na carreira científica são maiores para as mulheres do que para os homens.

Esse aspecto nos remete à fala da Profa. Montserrat Filella (Universidade de Genebra, Genebra, Suíça), durante o XVI Encontro Nacional de Química Analítica (ENQA), em Campos de Jordão, em outubro de 2011. A Profa. Montserrat mencionou estar feliz por participar de um encontro científico com tantos jovens cientistas motivados e com tão alta percentagem de mulheres. Entretanto, ela também chamou atenção para o fato de que, embora houvesse muitas mulheres na audiência, não havia muitas fazendo apresentações orais ou como palestrantes convidadas.

A ascensão na carreira científica não deve sofrer influência de gênero ou de nenhuma outra particularidade como raça ou nacionalidade. A ascensão na carreira científica deve estar relacionada à dedicação e aos esforços em prol da expansão do conhecimento humano.

Felizmente, há luz no fim do túnel. Um belo sinal é a edição de 2014 do Prêmio CAPES-Elsevier, que homenageou dez mulheres brasileiras com contribuições notáveis à ciência. Na química, certamente podemos nos regozijar, pois sete dessas mulheres contribuem para a ciência química e áreas correlatas. Bravo!

De acordo com uma das homenageadas, Profa. Vanderlan Bolzani, "A ciência é predominantemente masculina, apesar de todos os avanços que temos conseguido. Felizmente, esse prêmio estimula as mulheres. Eu cresci num ambiente no qual não havia personagens femininas nos livros. Creio que, ao longo do tempo, com muita luta, atuação brilhante, grande vigor e, acima de tudo, muita paixão, as mulheres estão escrevendo uma nova história, na qual os livros começam a ter personagens femininas."

É importante assinalar que a edição de 2010 do Prêmio CAPES-Elsevier também homenageou dez mulheres.

Temos ainda uma longa estrada à frente. No entanto, vale lembrar que, até agora, dos 165 laureados com o Prêmio Nobel de Química, tivemos apenas quatro mulheres. É notável que uma delas, Marie Curie, também tenha recebido o Nobel de Física e que a outra, Irène Joliot-Curie, fosse sua filha.

Nós parabenizamos todas as mulheres que trabalham pelo progresso das ciências.

Vamos juntos construir uma estrada suave e completamente livre de qualquer preconceito de gênero para a carreira científica. É sempre oportuno evitar o desperdício da força intelectual de toda a humanidade.

Um recente editorial do periódico American Scientist afirma que: "A American Scientist tem uma longa história de publicar autores provenientes de grupos científicos sub-representados. Nós apoiamos a filosofia de que o valor da diversidade está em criar uma comunidade científica que seja mais criativa e inclusiva do que todas as ideias".3

Solange Cadore

Editora Associada JBCS

Joaquim A. Nóbrega

Editor JBCS

Referências

  • 1. Apud Irvine, I.; The way we were - The purpose of education. Prospect, April, 2014, 88.
  • 2. Kutchinsky, S.; Violence against women is Europe's secret shame. Prospect website [http://www.prospectmagazine.co.uk/kutchinsky/violence-against-women-is-europes-secret-shame/#.U6BfSPldV1Y], March, 21st, 2014.
  • 3. Editorial, American Scientist, May-June, 2014, 162.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jul 2014
  • Data do Fascículo
    Jul 2014
Sociedade Brasileira de Química Instituto de Química - UNICAMP, Caixa Postal 6154, 13083-970 Campinas SP - Brazil, Tel./FAX.: +55 19 3521-3151 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: office@jbcs.sbq.org.br