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O CRIME COMO ATO PERVERSO: UMA ANÁLISE DAS CARTAS DE ASSASSINOS SERIAIS

EL CRIMEN COMO UN ACTO PERVERSO: UN ANÁLISIS DE CARTAS DE ASESINOS EN SERIE

RESUMO.

Este trabalho se insere no campo teórico da psicanálise e tem por objetivo discutir, a partir do conceito de perversão, a relação entre o ato perverso e os assassinatos em série, através das comunicações que certos autores desse tipo de crime realizaram com a mídia e com as forças da lei. Para a realização desse objetivo foi feita uma análise de conteúdo, segundo Bardin (2011), em 35 cartas enviadas por sete assassinos em série diferentes para a grande mídia ou para a polícia. Como resultado, encontra-se o fato de que a estrutura desses documentos é bastante similar e apresentam descrições de seus crimes, seus estados mentais, além de ameaças à população e um deboche direcionado às autoridades e forças policiais. Por fim, nota-se que a estrutura do ato perverso, conforme pensada por Freud e Lacan, está presente nas cartas estudadas, que pertencem a épocas e lugares distintos, e cujos autores não tiveram contato direto entre si.

Palavras-chave:
Assassinos em série; ato perverso; psicanálise

RESUMEN.

Este trabajo es parte del campo teórico del psicoanálisis y tiene como objetivo identificar los comportamientos comunes que están presentes en diferentes actos perversos, más específicamente en las comunicaciones que los asesinos en serie llevan a cabo con los medios de comunicación y las fuerzas de la ley. Para lograr este objetivo, se realizó un análisis de contenido, según Bardin (2011) sobre 35 cartas enviadas por siete asesinos en serie diferentes a los principales medios de comunicación o la policía. Como resultado, existe el hecho de que la estructura de estos documentos es bastante similar y presenta descripciones de sus crímenes, sus estados mentales, además de las amenazas a la población y un libertinaje dirigido a las autoridades y las fuerzas policiales. Finalmente, se observa que la estructura del acto perverso, como lo piensan las teorías de Freud y Lacan, tiende a repetirse en los sujetos estudiados, que pertenecen a diferentes tiempos y lugares y que no tuvieron contacto directo entre sí.

Palabras clave:
Asesinos en serie; acto perverso; psicoanálisis

ABSTRACT

This work is part of the theoretical field of psychoanalysis and aims to discuss, from the concept of perversion, the relationship between the perverse act and serial murders, through the communications that certain authors of this type of crime made with the media and with the forces of the law. To achieve this objective, a content analysis was carried out, according to Bardin (2011), on thirty-five letters sent by seven different serial killers to the mainstream media or the police. As a result, there is the fact that the structure of these documents is quite similar and presents descriptions of their crimes, their mental states, in addition to threats to the population and a debauchery directed at the authorities and police forces. Finally, it is noted that the structure of the perverse act, as thought by the theories of Freud and Lacan, is present in the studied letters, which belong to different times and places, and whose authors had no direct contact with each other.

Keywords:
Serial killers; perverse act; psychoanalysis

Introdução

Este artigo tem como objetivo discutir o conceito de perversão sob o viés psicanalítico através da análise de 35 correspondências de sete notórios assassinos em série. Para isso, essas cartas passaram por uma análise qualitativa de conteúdo, conforme pensada por Bardin (2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. São Paulo, SP: Almedina.), para auxiliar na pesquisa sobre o ato perverso. A análise de conteúdo foi utilizada como ferramenta para a compreensão dos conteúdos dessas correspondências e para elucidar os padrões encontrados nos atos desses sete sujeitos.

Invariavelmente, a perversão é associada à crueldade e à imoralidade. Por isso é tão comum escutarmos que autores de crimes bárbaros são perversos. Esse entendimento é fruto de constantes mal-entendidos que circundam o complexo conceito de perversão (Santos & Campos, 2017Santos, C. F., & Campos, É. B. V. (2017). A psicopatologia psicanalítica das perversões na atualidade: uma revisão sistemática. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 17(2), 653-673. Recuperado de: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812017000200013&lng=pt&nrm=iso
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). Por mais que encontremos autores que trabalhem bem o tema, é inegável o fato de que a neurose e a psicose são objetos de estudos mais frequentes, como podemos constatar ao examinar as publicações e pesquisas no campo da psicanálise. Portanto, torna-se necessário o aprofundamento na pesquisa das perversões para dissipar conclusões precipitadas ou inadequadas, que porventura podem prejudicar a construção clínica e teórica da psicanálise.

Os vieses psiquiátrico, sociológico e jurídico relacionam a perversão a sujeitos subentendidos como maus ou cruéis, cujos atos desviantes e antissociais agem na contramão das leis morais. Tal entendimento, no entanto, refere-se à perversidade. A perversão, segundo preceitos psicanalíticos, diz respeito, de maneira geral, à sexualidade humana (perversão-polimorfa) e à subjetivação advinda da dialética edipiana (estrutura perversa).

Além da perversão-polimorfa e da estrutura perversa, a perversão também aparece na psicanálise pelo ato perverso, do gozo perverso e da suplência perversa. Aqui, a proposta é pensar sobre o ato perverso, o que, de certa forma, não nos exime de abordar, mesmo que suscintamente, as outras formas de perversão.

A teoria da sexualidade foi uma grande subversão psicanalítica, pois demonstrou, através do conceito de pulsão, que não estamos a serviço da manutenção e preservação da espécie. Assim sendo, tudo aquilo que era configurado como desvio, errância ou aberração segundo uma lógica instintiva, fazia parte da sexualidade humana para Freud. A sexualidade, com sua estrutura perverso-polimorfa, não respondia mais a uma condição naturalista do desejo (Mendonça, 2018Mendonça, L. G. S. F. (2018). Há mulheres na perversão? Rio de Janeiro, RJ: Luziê.).

A perversão também é tratada na psicanálise como uma estrutura clínica, assim como a neurose e a psicose, ou seja, como resultado da subjetivação advinda da dialética edipiana. O perverso, diante da castração, a desmente (Verleugnung), evitando a todo custo se colocar como sujeito, pois isso implicaria ser faltoso, dividido, castrado.

No entanto, não é apenas um sujeito perverso que comete um ato perverso. É ponderando sobre os atos - ‘ato psicanalítico’, acting out e ‘passagem ao ato’ - que elucubraremos sobre o ato perverso. Para isso, faz-se necessário refletir sobre desejo e gozo, afinal, Lacan (2008bLacan, J. (2008b). O seminário, livro 20: Mais, ainda (1972-1973). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar .) nomeou um gozo perverso, ao lado do místico, do feminino e do fálico.

Os Atos

Na lição de 22 de fevereiro de 1967, Lacan (n.d.Lacan, J. (n.d.). O seminário, livro 14: A lógica do fantasma (1966-). Recife, PE: Centro De Estudos Freudianos De Recife. 1967, p. 216) adverte, primeiramente, que o ato é significante. Acrescenta que é um significante que se repete. O ato, ainda, é a instauração do sujeito como tal: “[...] por um ato verdadeiro, o sujeito surge diferente, em razão do corte, sua estrutura é modificada”. Finalmente, aborda o limite imposto ao reconhecimento do ato no sujeito. ‘Seu Repräsentanz na Vorstellung, nesse ato, é a Verleugnung’, ou seja, quando o sujeito não se reconhece em seu verdadeiro alcance inaugural. É de se notar que, num ato, o sujeito pode desmentir sua representação.

Os atos, em psicanálise, admitem algumas dimensões. Desde o próprio ato psicanalítico - título, inclusive, de um dos seminários lacanianos -, à passagem ao ato, acting out e o ato perverso.

O ato psicanalítico institui o começo: é autêntico e fundador. Dissez (2005Dissez, N. (2005). Leitura do tetraedro do seminário “o ato psicanalítico”. Bulletin De L’ali, 114.) aponta-o como o registro de um desejo responsável por modificações no sujeito que constitui um verdadeiro começo. Lacan (2008aLacan, J. (2008a). O seminário, livro 16: De um outro ao outro (1968-1969). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar .) pensa nos efeitos da introdução da psicanálise na subjetividade, ou seja, no ato freudiano com o estabelecimento do inconsciente. A formulação cartesiana ‘penso, logo sou’ indica o ato de estabelecer o inconsciente como ruptura sobre o cogito.

Para introduzir o ato analítico, Tolipan (1991Tolipan, E. (1991). A estrutura da experiência psicanalítica (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.) fala das entrevistas preliminares. Esse tempo imprescindível da análise visa à mudança de posição subjetiva e o estabelecimento da transferência. A mudança de posição subjetiva transforma uma demanda qualquer em uma demanda de análise, ligando o sujeito a um sintoma, a uma angústia ou a uma inibição que lhe acomete. “O primeiro ato analítico constitui-se na própria autorização de iniciar-se uma análise” (Tolipan, 1991Tolipan, E. (1991). A estrutura da experiência psicanalítica (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro., p. 87).

É com o ato analítico que se evita a repetição e cria-se algo novo. Todo ato marca um início, algo que altera o sujeito depois que ocorre, fazendo com que ele não seja mais o mesmo; nesse sentido é que algo se inicia. O ato subverte a relação do sujeito com o saber. Quando os atos são falhos ou sintomáticos, há o surgimento de um significante recalcado desconhecido pelo sujeito. Já no ato analítico, um significante novo se inscreve.

A passagem ao ato e o acting out são saídas para evitar a angústia. Denotam a existência de uma relação do sujeito com o ‘objeto a’. Retomando Lacan (2005Lacan, J. (2005). O seminário, livro 10: A angústia (1962-1963). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar.) no seu seminário sobre a angústia, o que faz barreira à angústia é o sintoma e, quando ele falha, o acting out e a passagem ao ato são como a última tentativa de barrá-la.

Entretanto, esses atos são respostas diferentes frente à angústia. O acting out é “[...] em essência, a mostração, a mostragem, velada, sem dúvida, mas não velada em si” (Lacan, 2005Lacan, J. (2005). O seminário, livro 10: A angústia (1962-1963). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 138), ou seja, é endereçada ao Outro, enquanto a passagem ao ato é a saída de cena, quando o sujeito é totalmente apagado, sem se dirigir ao Outro. “O acting-out é uma repetição em ato. É um corretivo ao analista. É qualquer coisa na conduta do sujeito que essencialmente se mostra para um espectador. O acento está na demonstração em direção ao Outro” (Tolipan, 1991Tolipan, E. (1991). A estrutura da experiência psicanalítica (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro., p. 89-90). Freud (2006aFreud, S. (2006a). Observações sobre o amor transferencial (novas recomendações sobre a técnica da psicanálise III). In S. Freud. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (p. 173-190). Rio De Janeiro, RJ: Imago. (Trabalho original publicado em 1915).) nos explicita bem essa demonstração ao Outro, essa repetição como um corretivo ao analista, no seu texto sobre o amor transferencial, comentando que se o analista corresponde aos avanços da paciente, o tratamento fica comprometido.

Ela teria alcançado sucesso naquilo que todos os pacientes lutam em análise - teria êxito em atuar (acting out), em repetir na vida real o que deveria apenas ter lembrado, reproduzido como material psíquico e mantido dentro da esfera dos eventos psíquicos (Freud, 2006aFreud, S. (2006a). Observações sobre o amor transferencial (novas recomendações sobre a técnica da psicanálise III). In S. Freud. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (p. 173-190). Rio De Janeiro, RJ: Imago. (Trabalho original publicado em 1915)., p. 183).

A passagem ao ato, por sua vez, tem o caráter por vezes trágico e definitivo, como os suicídios, por exemplo. Na passagem ao ato, há uma saída de cena: o sujeito identifica-se ao objeto como função de resto e cai (Sequeira, 2016Sequeira, V. C. (2016). Crime, gozo e ato: uma leitura psicanalítica. Psicanálise & Barroco em Revista, 14(1), 215-235. Recuperado de:https://bityli.com/Mt9Xn
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). “O sujeito aparece totalmente apagado pela barra que o divide” (Tolipan, 1991Tolipan, E. (1991). A estrutura da experiência psicanalítica (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro., p. 91). A saída de cena distingue a passagem ao ato do acting out e, nesse âmbito, o analista nada pode fazer; o sujeito apenas se retira.

Essa breve explanação sobre os atos que constituem a clínica e a teoria psicanalíticas servem de trajeto para nos lançarmos sobre o ato perverso. O autor do ato perverso não é necessariamente um perverso estrutural, e um ato perverso não corresponde à perversão-polimorfa.

No seu seminário sobre a lógica da fantasia, Lacan (n.dLacan, J. (n.d.). O seminário, livro 14: A lógica do fantasma (1966-). Recife, PE: Centro De Estudos Freudianos De Recife. 1967.) coloca o ato perverso no nível da questão sobre o gozo, enquanto que o ato neurótico tem como finalidade sustentar o efeito do desejo. Se relembrarmos que, perante a castração, o neurótico se reconhece como sujeito da falta e busca no Outro uma complementariedade ($ ◊ a), na perversão o sujeito se coloca como ‘objeto a’ e suplementa o Outro com o gozo (a ◊ $), dividindo seu parceiro entre a submissão à voz imperativa e a revolta contra os maus tratos infligidos. Ao perverso, não interessa se seu parceiro consente com a posição de submissão: ele tem que se dividir, se debater, se angustiar, isto é, ser sujeito da falta, que é exatamente o que o perverso desmente em si. Com isso demonstramos que a perversão tem uma relação íntima com o gozo.

Quanto ao sujeito perverso, o desejo se dá como uma subversão e suporte de uma lei. Por mais que o perverso seja aquele que busque gozos sem fim, essa satisfação não é sem lei.

Se há uma coisa que hoje sabemos do perverso, é que aquilo que aparece externamente como uma satisfação irrefreada é uma defesa, bem como o exercício de uma lei, na medida em que esta refreia, suspende, detém o sujeito no caminho do gozo. A vontade de gozo no perverso, como em qualquer outro, é uma vontade que fracassa, que depara com seu próprio limite, seu próprio freio, no exercício mesmo do desejo (Lacan, 2005Lacan, J. (2005). O seminário, livro 10: A angústia (1962-1963). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 166).

O campo do gozo não se prende à tripartição das estruturas clínicas. Lacan, ao elaborar seu quadro das fórmulas quânticas da sexuação, propõe formas de gozos possíveis de serem depreendidas dessas fórmulas, tais como o gozo fálico, o gozo feminino, o gozo místico e também o gozo perverso. Brevemente, relembramos que o gozo fálico é relacionado à palavra. Por intermédio do significante barra-se o gozo total, ilimitado, ao mesmo tempo em que propicia outro.

Tanto o gozo feminino quanto o gozo místico estão em S(A/) e, ao contrário do gozo fálico, estão no corpo, são inefáveis e indizíveis. Quanto ao gozo perverso, Lacan (2008bLacan, J. (2008b). O seminário, livro 20: Mais, ainda (1972-1973). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar ., p. 82) diz de

[...] pessoas que também não estavam tão mal do lado místico, mas que se situavam mais do lado da função fálica, Angelus Silésius, por exemplo - confundir seu olho contemplativo com o olho com que Deus o olha, isto bem deve, por força, fazer parte do gozo perverso.

Se a fantasia opera sobre todas as relações do sujeito com o objeto a (Lacan, n.d.Lacan, J. (n.d.). O seminário, livro 14: A lógica do fantasma (1966-). Recife, PE: Centro De Estudos Freudianos De Recife. 1967), Alberti e Martinho (2013Alberti, S., & Martinho, M. H. (2013). Sexuação, desejo e gozo: Entre neurose e perversão. Psicologia USP, 24(1), 119-142. doi: 10.1590/S0103-65642013000100007
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) afirmam que, no caso de Angelus Silésius, o gozo místico se confunde com o perverso, porque o que se interpõe entre o sujeito e Deus é o objeto a da fantasia, o olhar de Deus.

Como recorda Valas (2001Valas, P. (2001). As dimensões do gozo. Rio De Janeiro, RJ: Zahar Ed.), Lacan desejou que o campo do gozo fosse denominado de campo lacaniano, por considerar essa a sua contribuição mais importante. Para ele, ‘Totem e tabu’ (Freud, 2006bFreud, S. (2006b). Totem e tabu. In S. Freud. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (p. 13-163). Rio De Janeiro, RJ: Imago . (Trabalho original publicado em 1913).) é o mito freudiano do gozo, que veio completar o mito edipiano do desejo e da lei. Esse mito freudiano do gozo é localizado em Lacan no gozo do Outro, o gozo originário, mítico, que está na Coisa. Ele só tem seu sentido retroativamente, pela incidência do significante S1 que barra o seu acesso ao sujeito.

A entrada do significante no real, no gozo infinito, produz, de uma só vez, uma perda e um sujeito. Essa marca significante que ‘inaugura’ o sujeito do inconsciente advém do Outro, e inscreve estruturalmente a castração, a barra no sujeito, assinalando a origem da economia do gozo. Pela via da repetição, o sujeito tenta recuperar uma perda - ‘objeto a’ - para aceder ao gozo ilimitado.

No seminário dedicado aos conceitos fundamentais da psicanálise, Lacan (1973Lacan, J. (1973). Le seminaire, livre 11: Les quatre concepts fondamentaux de la psychanalyse (1964). Paris, FR: Éditions du Seuil.) desenvolverá as operações necessárias para que haja a constituição do sujeito: a alienação e a separação. Enquanto a alienação é assujeitar-se ao Outro, ao campo da linguagem, a separação é a operação que permite o sujeito aceder ao desejo. No movimento de alienação e separação

[...] ocorre uma extração de objeto que nem é colocada no campo do sujeito, nem no campo do Outro, mas justamente em uma interseção que aponta para o objeto como aquilo que falta a ambos, possibilitando por esta falta mesma a instalação de um laço com o Outro (Calazans & Bastos, 2010Calazans, R., & Bastos, A. (2010). Passagem ao ato e acting-out: duas respostas subjetivas. Fractal: Revista De Psicologia, 22(2), 245-156. doi: 10.1590/S1984-02922010000800002
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, p. 249).

Em psicanálise, a possibilidade de um discurso - um laço social - é impulsionada pela falta.

Calazans e Bastos (2010Calazans, R., & Bastos, A. (2010). Passagem ao ato e acting-out: duas respostas subjetivas. Fractal: Revista De Psicologia, 22(2), 245-156. doi: 10.1590/S1984-02922010000800002
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) afirmam que na passagem ao ato não há a distinção entre os lugares do sujeito, do objeto, do Outro e da angústia. Quando Lacan (2005Lacan, J. (2005). O seminário, livro 10: A angústia (1962-1963). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar.) coloca o ‘objeto a’ como função de resto do lado do sujeito na passagem ao ato, sem uma intermediação com o Outro, é precisamente essa falta de distinção que está sendo tratada. No acting out, por sua vez, o sujeito não cai junto ao objeto, e mantém o lugar da demanda e da transferência. Transferência essa denominada de ‘selvagem’ por Lacan (2005Lacan, J. (2005). O seminário, livro 10: A angústia (1962-1963). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar.). O acting out é ancorado no simbólico e não tem caráter resolutivo. Por conseguinte, não há a destituição do lugar do Outro, mas a demanda para que ele se mantenha em seu campo.

Algumas questões podem, contudo, ser colocadas a partir da distinção entre a passagem ao ato e o acting out. A passagem ao ato, por ser um ato em que o discurso com o laço social é deixado de lado, costuma ser ruidosa - como sugere a noção de crimes imotivados. No entanto, conforme indicam alguns autores, ela pode ter como consequências a pacificação do sujeito e, por conseguinte, uma estabilização (Calazans & Bastos, 2010Calazans, R., & Bastos, A. (2010). Passagem ao ato e acting-out: duas respostas subjetivas. Fractal: Revista De Psicologia, 22(2), 245-156. doi: 10.1590/S1984-02922010000800002
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, p. 251).

E quando esses crimes imotivados são seriais e têm como objetivo exibir-se e endereçar-se para o Outro? Se os autores desses crimes buscarem suplementar o Outro com gozo, dividindo sua vítima? Nesse caso, a vítima poderia ser o público, estarrecido, angustiado, com tal ato. Os crimes imotivados, em caráter serial, e com as características apresentadas pela análise de conteúdo das cartas desses assassinos seriais (abordadas mais a frente, na parte ‘resultados’ e ‘discussão’), sugerem um ato de endereçamento ao Outro e um sujeito que sustenta uma demanda e uma transferência para, através dela, dividir o Outro. O ato aqui só tem valor se produz efeito de reconhecimento ao autor, garantindo, por sua vez, sua parcela de gozo. Situa-se, aí, o ato perverso. O ato perverso não significa necessariamente um ato criminoso, mas certamente alguns crimes representam o ápice de um ato perverso.

A partir do que foi exposto, situaríamos o ato perverso mais próximo do acting out, já que ele, por mais que comprometa o laço social e a relação transferencial, endereça, responde ao Outro. O ato perverso tem a ver, claro, com a perversão. No entanto, não é só um perverso que comete tal ato. Um sujeito que, num ato, coloca-se como objeto a e obtém gozo à custa de outros sujeitos, desempenhou uma atuação perversa (Mendonça, 2015Mendonça, L. G. S. F. (2015). Da perversão-polimorfa à estrutura perversa: um estudo sobre a possibilidade de haver mulheres estruturalmente perversas. 152 f. Tese (Doutorado em Pesquisa Clínica em Psicanálise) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.).

Susini (2006Susini, M.-L. (2006). O autor do crime perverso. Rio De Janeiro, RJ: Companhia De Freud.), em O autor do crime perverso, cunha propositalmente a palavra autor pela relação deste tipo de crime com uma peça teatral. Eles fazem parte de um espetáculo e visam, especificamente, à reação do público.

A autora expõe uma diferenciação entre crimes cometidos ao acaso, nos quais o autor tenta esconder seu crime, e crimes perversos, minoria nas estatísticas criminais, que são provocativos, e cujo autor quer transformá-lo em uma obra-prima. Este tipo de assassino é o que provoca grande fascínio do público e da mídia, e seus nomes tornam-se amplamente conhecidos. Devemos atentar que o autor do crime perverso não é, necessariamente, um perverso. Neuróticos e psicóticos podem cometer um ato perverso e também um crime perverso. Por mais que a autora utilize frequentemente o termo ‘criminoso perverso’, julgamos que a especificidade da perversão, nesses casos, atrela-se aos crimes, e não aos autores deles.

Uma das diferenças entre os crimes comuns e os perversos seria justamente a reação provocada no público. Apesar de causar nojo, espanto e temor, os crimes perversos também ganham grande popularidade, encontrando seu público-alvo independente da época em que ocorrem.

Susini (2006Susini, M.-L. (2006). O autor do crime perverso. Rio De Janeiro, RJ: Companhia De Freud.) cita o termo serial killer, o assassino em série. A autora explica que é necessário captar a lógica do ato, aquele que é comum à série, para compreender as ações desse tipo de assassino. Gilles de Rais, Jack, o Estripador e Landru são citados como exemplos de tais criminosos que tiveram seus nomes perpetuados ao longo da história.

Gilles de Rais demarca, segundo a autora, o nascimento histórico do criminoso perverso. Em 1440, Rais afirma ter matado mais de 200 crianças por prazer e conta com detalhes suas práticas sexuais e o gozo que sentia ao degolar meninos. Esse homem conseguiu fazer com que seu testemunho saísse da sala de julgamento e atingisse o público na rua, criando um espetáculo e passando uma mensagem de que “[...] existe um crime causado pela busca do prazer, existe um crime em que se acrescenta gozo” (Susini, 2006Susini, M.-L. (2006). O autor do crime perverso. Rio De Janeiro, RJ: Companhia De Freud., p. 17). Esse crime sexual teria sido deixado em segundo plano pela explicação demoníaca típica da idade média.

Jack, o Estripador, atuou em 1888 estripando diversas prostitutas, mutilando seus corpos e deixando rastros para que fossem encontrados. Mandou diversas cartas para a polícia onde se denominava The Ripper, chegando a enviar o rim de uma das vítimas ao chefe de um comitê de vigilância instaurado por sua causa. Essas cartas foram coladas nas paredes de Londres, causando terror no público e fazendo o espetáculo acontecer.

Susini (2006Susini, M.-L. (2006). O autor do crime perverso. Rio De Janeiro, RJ: Companhia De Freud.) compara o crime perverso com uma estrutura de peça de teatro, dividida em quatro atos. O primeiro é o crime em si, realizado debaixo dos panos, mas sempre com tendência a se revelar. O segundo ato é a descoberta do corpo e do crime, que apesar de escondido, parece ter sido colocado para ser encontrado, tirando o autor de seu anonimato. O terceiro ato é o julgamento do autor, quando esse aparece frente a seu público, geralmente na sala de audiência, que já tem um ar teatral. O quarto e último ato é a execução do autor, onde ele consegue realizar sua última grande cena. As emoções geradas no espectador pela sua atuação são previstas, parte do seu grande espetáculo, a fim de alcançar seu júbilo, seu gozo.

Essa explanação sobre o espetáculo do crime perverso nos traz à memória Dennis Raider, ou BTK (bind them, torture them, kill them (aprisioná-los, torturá-los, matá-los)), como preferia ser chamado. Casado há muitos anos e com filhos, atuou durante 20 anos matando famílias no bairro. Frequentemente levava ‘lembranças’ das casas de suas vítimas e deixava amostras de sêmen, pois o crime o excitava. Como buscava reconhecimento pelos assassinatos, colocava cartas em lugares públicos, ligava para a polícia ou até enviava poemas para um jornal se responsabilizando pelos seus atos. Quando foi preso, os carcereiros o proibiram de ver a propagação de seus crimes na televisão da penitenciária. Isso não o impediu de ter a dimensão de seus feitos, pois sabia que, se o proibiam de ver televisão, era porque nela falavam dele.

Também nos lembramos do filme Seven - os sete crimes capitais (1995) (Kopelson, Carlyle, & Fincher, 2017Kopelson, A., Carlyle, P. (Produtores), & Fincher, D. (Diretor). (2017). Seven - os sete crimes capitais [DVD]. Burbank, CA: New Line Cinema.), cuja trama gira em torno de dois policiais que são encarregados de investigar um serial killer (assassino em série) que segue a ordem dos sete pecados capitais. Provocando horror e fascinação na população com sua forma de matar, John Doe, o assassino, entrega-se aos detetives, relatando já possuir os dois corpos que faltavam para completar a sua ‘obra’, que seriam o da inveja e o da ira, escondidos em lugares que só ele conhecia.

No trajeto aos tais corpos, Doe revela aos detetives que se vê como a Espada de Deus, fazendo com que cada pecado se volte contra o pecador.

Todos nós vemos um pecado capital em cada esquina, em cada lar. Nós toleramos porque é uma coisa comum. Mas, isso acaba no momento em que estou dando o exemplo. Tudo o que estou fazendo vai ser decodificado, estudado e imitado por outros seguidores (Kopelson et al., 2017Kopelson, A., Carlyle, P. (Produtores), & Fincher, D. (Diretor). (2017). Seven - os sete crimes capitais [DVD]. Burbank, CA: New Line Cinema.).

Chegando ao local indicado, um pacote endereçado a um dos detetives é aberto pelo outro. Este contém a cabeça decepada da mulher grávida do policial a quem o pacote havia sido enviado. Doe então confessa que ele personifica a inveja ‘por não enxergar o mundo como vocês’. Cabe ao detetive, marido da mulher morta, assumir a ira e matar Doe e, assim, sacramentar a ‘obra’ serial baseada nos pecados capitais. Por mais que soubesse que o melhor suplício a ser imposto ao assassino era mantê-lo com vida, o policial, como bom neurótico, divide-se intensamente entre deixá-lo vivo ou levar a cabo a sua ira. Ele termina por matar John Doe.

Esse personagem nos é benvindo na ilustração sobre o ato perverso, pois, estruturalmente, talvez o situaríamos na estrutura psicótica, mas podemos denominar seus assassinatos em séries de atos perversos.

A prática perversa em uma estrutura psicótica já foi apontada por Maleval (2007Maleval, J.-C. (2007). Suplencia perversa en un psicótico. Ancla: Revista de la Cátedra Ii de Psicopatologia, 1, 162-179.). Ele relaciona o caso do senhor M., descrito por M’Uzan, a uma suplência perversa na psicose em vez de uma perversão masoquista, como era comumente entendido.

Como aponta Godoy na apresentação do texto de Maleval (2007Maleval, J.-C. (2007). Suplencia perversa en un psicótico. Ancla: Revista de la Cátedra Ii de Psicopatologia, 1, 162-179.), uma prática extrema tal como a do senhor M. (além de homicídios, auto e heteromutilação, canibalismo, necrofilia etc.) se dá em sujeitos com uma psicose desencadeada, onde essas práticas operam como suplência. Nessa categoria, encontram-se muitos casos de famosos assassinos em série. Para Maleval (2007Maleval, J.-C. (2007). Suplencia perversa en un psicótico. Ancla: Revista de la Cátedra Ii de Psicopatologia, 1, 162-179.), quando um psicótico procura análise e não há alucinações nem delírios, frequentemente apresenta uma das seguintes características: tendência a escrever, transtornos psicossomáticos ou uma associação de práticas perversas à estrutura psicótica. Paradoxalmente, uma psicose associada às defesas perversas pode, às vezes, originar condutas mais perigosas para a sociedade do que as psicoses clínicas.

Prosseguindo na temática criminal, Schurman-Kauflin (2000)Schurman-kauflin, D. (2000). The new predator: women who kill - profiles of female serial killers. New York, NY: Algora Publishing., no seu livro The new predator: women who kill - profiles of female serial killers, demonstra as diferenças nos atos criminais de homens e mulheres serial killers. Por mais que elas componham a minoria, essa população vem aumentando (1/3 de todas as mulheres serial killers já registradas começaram seus crimes nos anos 70). Seus atos são mais cuidadosos, mais difíceis de serem reconhecidos, pois geralmente matam por asfixia ou envenenamento, ao contrário dos homens, que matam com golpes, facadas, estrangulamento etc. Ainda, as mulheres não tendem a fugir ou ir para outra cidade após uma morte como no caso dos homens, elas permanecem atuando na mesma comunidade. No mais, essas mulheres criminosas geralmente matam pessoas indefesas (crianças e idosos) ou pessoas que lhe devotam muita confiança. “Mulheres serial killers agem como camaleões que se relacionam com suas vítimas e parecem ser a última pessoa que alguém suspeitaria” (Schurman-Kauflin, 2000Schurman-kauflin, D. (2000). The new predator: women who kill - profiles of female serial killers. New York, NY: Algora Publishing., p. 19, tradução nossa)5 5 “Women serial killers act like chameleons who bond with their victims and seem to be the last person anyone would suspect”. .

Susini (2006Susini, M.-L. (2006). O autor do crime perverso. Rio De Janeiro, RJ: Companhia De Freud.) também aborda o domínio do autor do crime perverso sobre a cena e o público. Os jornalistas teriam a função de intermediar o assassino e o público, difundindo o espetáculo, e os policiais teriam o papel de descobrir a obra-prima. Já o magistério pronuncia o veredito. O público nessa história assume o papel de vítima, identificando-se com ela e sendo dividido.

Quando um crime perverso é cometido, um público já é imaginado, como um filme que não pode ser feito sem antes se pensar em qual tipo de público atingir. O domínio e a suposição do público são essenciais. Com isso, o público acaba se tornando parceiro do autor do crime perverso.

O ato perverso, como percebemos, compromete o laço social, mas não o rompe, e é endereçado ao Outro, numa tentativa de dividi-lo para garantir ao autor do ato, mais gozo. Os exemplos citados corroboram a ideia de que os atos perversos, em última instância, podem se transfigurar em crimes, todavia, aqueles que cometem um crime perverso, não são, necessariamente, perversos. Porém, além de uma sexualidade perverso-polimorfa, identifica-se aí um modo de gozo, singular a cada sujeito, e que emergindo num ato com tais predicados, poderia ser configurado como ato perverso.

Método

Esta pesquisa é documental e qualitativa e trata de cartas enviadas por serial killers para a polícia e para a mídia durante seu período de atuação na atividade criminosa. Por se tratarem de dados públicos vinculados em livros e em websites, a pesquisa dispensou a aprovação em Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) e está em conformidade com a resolução do Conselho Nacional de Saúde, nº 510/2016.

O corpus desta pesquisa consiste em 35 cartas de sete assassinos em série, tendo em vista que as correspondências selecionadas para a análise foram escritas e enviadas no período em que eles estavam realizando seus crimes, tendo sido excluídas todas as cartas escritas depois que eles foram presos. Também foram excluídas as cartas que não faziam menção aos crimes cometidos e também aquelas que tratavam de temas difusos ou eram incompreensíveis.

As correspondências escolhidas para essa análise foram escritas e enviadas por Jack, o Estripador (Whittington-Egan, 2019Whittington-Egan, R. (2019). Jack the ripper: the definitive casebook. Stroud, UK: Amberley Publishing.), o Assassino do Zodíaco (Mooney, 2019Mooney, C. (2019). The zodiac killer. Minneapolis, MN: Abdo Publishing .), David Berkowitz (O Filho de Sam) (Burling, 2019Burling, A. (2019). The son of sam killings. Minneapolis, MN: Abdo Publishing.), Dennis Rader (B.T.K) (Williams, 2017Williams, D. J. (2017). Mephitic projects: a forensic leisure science analysis of the BTK serial murders. The Journal of Forensic Psychiatry & Psychology, 28(1), 24-37. doi: 10.1080/14789949.2016.1247187
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), Albert Fish (Parker, 2016Parker, R. J. (2016). Serial homicide 1: Ted Bundy, Jeffrey Dahmer, Albert Fish, Gary Ridgway, Dennis Nilsen, Edmund Kemper (notorious serial killers). Toronto, CA: RJ Parker Publishing.), o Machadista de Nova Orleans (Davis, 2017Davis, M. C. (2017). The axeman of new orleans: the true story. Chicago, IL: Chicago Review Press.) e Joseph James DeAngelo (o Assassino de Golden State) (Phillips, 2018Phillips, C. (2018). The Golden State Killer investigation and the nascent field of forensic genealogy. Forensic Science International: Genetics, 36, 186-188. doi: 10.1016/j.fsigen.2018.07.010
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).

O tratamento dos dados coletados para este trabalho foi realizado com a análise de conteúdo conforme pensada por Laurence Bardin (2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. São Paulo, SP: Almedina.), que consiste na utilização de um conjunto de métodos qualitativos e quantitativos para a análise de documentos textuais e visuais, com o objetivo de compreender, sistematizar e interpretar o conteúdo desses documentos.

As cartas foram reunidas, traduzidas e transcritas de modo integral e então se realizou uma pré-análise (Bardin, 2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. São Paulo, SP: Almedina.; Mendes & Miskulin, 2017Mendes, R. M., & Miskulin, R. G. S. (2017). A análise de conteúdo como uma metodologia. Cadernos de Pesquisa, 47(165), 1044-1066. doi: /10.1590/198053143988.
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) de todo o material transcrito, que consiste numa leitura geral e dinâmica do conjunto de dados para começar a criar uma interpretação. A análise de conteúdo oferece uma série de possibilidades e nesta pesquisa adotamos a análise temática, onde se divide o corpus em unidades de significação, que são as menores unidades com significado em um documento, que são agrupadas em temas, que posteriormente são categorizados.

A amostra escolhida para este trabalho se apresenta significativa com relação à totalidade desses documentos, tendo em vista que as cartas escritas por assassinos em série não são tão comuns e também não se encontram facilmente disponíveis. A amostra parece também atender aos critérios de representatividade, pertinência, homogeneidade e exaustividade propostas por Laurence Bardin (2011Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. São Paulo, SP: Almedina.).

Esse método de análise não pertence a uma vertente teórica específica e se coloca como ponte entre dados textuais não tratados e dados sistematizados passíveis de uma significação de acordo com conceitos oriundos de qualquer perspectiva teórica das ciências humanas e sociais. Neste trabalho, utilizamos o referencial teórico da psicanálise, conforme apresentado nos tópicos anteriores, para a compreensão dos resultados da análise de conteúdo aqui proposta.

Na análise de conteúdo utilizada neste trabalho, as 35 cartas selecionadas foram divididas em 731 unidades de registro e cada uma dessas unidades foi classificada em 21 temas que foram então agrupados em seis categorias. Os resultados provenientes serão apresentados no tópico seguinte para que na discussão deste trabalho eles sejam relacionados à teoria proposta.

Resultados

A apresentação dos resultados será feita pelas categorias, que conforme apresentado são seis, e estão elencadas na Tabela 1:

Na categoria ‘Descrições de crimes cometidos’ estão contidas todas as unidades que fazem referência a crimes cometidos pelo assassino em série que está escrevendo a carta. Estão incluídos temas de descrições de modus operandi, de vítimas, de posição dos corpos conforme deixados nas cenas dos crimes, de canibalismo, de tortura e também de acontecimentos que sucederam ou precederam o ato criminal em si. É a categoria mais presente nas cartas e, de modo geral, ela apresenta uma revisitação do crime cometido fornecendo detalhes que visam chocar o leitor e também, em algumas situações, podem servir como comprovação da autoria do crime por parte do assassino. Essa revisitação não parece ser simplesmente um contar de uma história, tendo em vista a riqueza de detalhes que remontam ao momento do crime cometido, que quase propõem uma continuidade ou uma reprise vivida desses momentos.

Tabela 1
Análise de conteúdo de cartas de assassinos em série

A segunda categoria, ‘Descrições de si mesmo’, fala sobre características mentais próprias dos assassinos e também os sentimentos que vêm à tona neles quando cometem assassinatos. Nessa categoria estão sentimentos de desejo pelo reconhecimento e fama e de frustração quando esse desejo não é atendido.

A terceira mais frequente categoria das cartas analisadas são mensagens dos assassinos endereçadas especificamente à polícia ou a policiais, sendo que a grande maioria dessas mensagens possui um tom provocativo ou de deboche com relação ao trabalho realizado pela polícia. Também se encontram aqui indicações de erros cometidos pelos policiais e instruções enviadas para polícia no sentido de como devem liberar as cartas para a imprensa ou em caminhos que devem procurar para encontrar cadáveres e provas dos crimes cometidos.

A quarta categoria sobre descrições de crimes que serão cometidos aborda principalmente as ameaças realizadas por esses assassinos no sentido de garantir que irão voltar a cometer crimes. Essas ameaças não são simples e contam com ricos detalhes sobre os crimes que ainda não foram cometidos, demonstrando grande processo imaginativo e de fantasia acerca desses crimes que ainda estariam por vir. É sabido que muitos dos crimes que aqui foram descritos não chegaram de fato a ocorrer, até por conta da engenhosidade quase irreal que algumas das descrições continham.

Essas são as quatro maiores categorias que se apresentaram nas cartas analisadas e, com isso, pode-se dizer que resumem em grande parte o sentido encontrado nessas correspondências de assassinos seriais. De modo geral, essas categorias se apresentam em basicamente todas as cartas analisadas, desde Jack, o Estripador, um assassino na Inglaterra do século XIX e em Dennis Rader, um assassino preso nos Estados Unidos cerca de cem anos após os crimes cometidos por Jack.

As outras duas categorias restantes não são menos relevantes para a nossa análise, mas apresentam frequência bem menor do que as quatro já descritas e não são tão representativas do conteúdo desses documentos. Entretanto, é impossível negar sua pertinência, já que juntamente com as outras quatro formam todo o conteúdo encontrado no processo da análise que aqui se propõe.

A quinta categoria tem o nome de ‘Estilo de escrita’ e fala sobre frases de inícios e de finalização das cartas e também trechos cifrados ou poéticos de difícil atribuição de significado. Não é uma categoria tão relevante para a análise proposta neste trabalho, tendo em vista que muitas frases são meramente protocolares em qualquer correspondência, com exceção daquelas que visam o deboche do seu destinatário ou que objetivam reforçar um nome de referência para o assassino.

A categoria de ‘mensagens direcionadas à mídia e à sociedade’ possui, com quase exclusividade, instruções para a publicação das cartas ou então para a maneira como deveriam retratar os crimes. Além disso, conta com algumas poucas provocações em relação à mídia e também indicação de erros de publicação. Quando se comparam essas provocações àquelas endereçadas às forças da lei, percebe-se que o último caso abunda muito mais nas cartas e que, portanto, são mais significativas na análise.

Existiram ainda mensagens que não se enquadraram nas categorias acima e que não constam na análise, são 18 unidades de significação que falam de crimes frustrados e que não aconteceram.

Um fator externo ao conteúdo escrito das cartas analisadas que deve ser levado em conta neste trabalho é que em muitos casos elas foram enviadas com pacotes anexos que são significantes. Observemos os casos de duas correspondências, uma de Jack, o Estripador e outra do Assassino do Zodíaco, onde no primeiro caso foi enviado um pedaço do rim de uma mulher para a polícia e no segundo caso o assassino enviou uma camisa ensanguentada como prova de que sua carta era verídica e que, de fato, tratava-se daquele que cometeu o crime do qual a correspondência tratava.

Na carta de Jack supra referenciada, encontramos o trecho “Sr. Lusk (delegado de polícia), eu envio para você a metade do rim que tirei de uma mulher e conservei para o senhor, o outro pedaço eu fritei e comi e estava muito bom”. Há aqui o intuito claro de chocar o destinatário da carta. Já no caso do Assassino do Zodíaco é enviada uma camisa ensanguentada, conforme o mesmo escreve: “Eu sou o assassino do motorista de táxi na rua Washington na noite passada, para provar aqui está um pedaço da camisa dele manchada de sangue”. Esse elemento em anexo funciona como um meio de comprovar a autoria do assassinato prévio.

Discussão

Vemos, então, que existem muitos elementos em comum nas cartas enviadas pelos assassinos em série. Não só nos conteúdos textuais que elas apresentam, mas também na maneira como elas são enviadas e em sua simbologia. Entende-se aqui que essas similaridades não falam sobre os sujeitos que escreveram a carta, mas demonstram os aspectos em comum que seus atos possuem e podem apresentar.

Os crimes imotivados podem ter efeito estabilizador no sujeito e configurar a passagem ao ato. No entanto, crimes seriais tendem a se aproximar do acting out, pois geralmente carregam em si um endereçamento ao Outro. Esses crimes se configuram em ato perverso ao reunirem particularidades que são atreladas à perversão, embora as atuações perversas não predigam uma estrutura.

O ato perverso não rompe com o laço social, e sua tônica está na demonstração em direção ao Outro. O crime enquanto ato perverso não tem apenas efeito apaziguador no sujeito, pois para ele o crime em si não basta. É preciso anunciá-lo, divulgá-lo e ser reconhecido por ele. As cartas analisadas são uma demonstração clara que a realização do crime não foi suficiente para seus autores. O assassinato foi um meio para alcançar o Outro, endereçando-lhe literal e simbolicamente cartas. O autor do ato perverso clama pelo Outro, pois só assim consegue se marcar pelo ato.

No ato perverso, o sujeito busca extrair o máximo de gozo possível através, sobretudo, da divisão do Outro. Contudo, o gozo está submetido à lei do significante, sendo, portanto, interditado. Mesmo assim, ele segue sempre adiante, pois a transgressão é também um lugar de gozo. É se deparando inevitavelmente com a falta estrutural que o sujeito recomeça, caracterizando o comportamento serial. O ato perverso busca a todo instante transpor a lei e instaurar uma lei Outra.

Percebe-se, então, que todas as seis categorias decorrentes da análise de conteúdo das cartas apresentam elementos que configuram os atos desses assassinos como atos perversos. Em ‘descrições de crimes cometidos’, os autores buscam causar seu público, dividindo-o entre a repugnação e o fascínio, através de um relato detalhado e grotesco dos seus assassinatos. Nas partes ‘descrição de si mesmo’ e ‘estilo da escrita’, eles expressam seu desejo pela fama e notoriedade, atrelando ao seu ato um reconhecimento. Nesse quesito, essa categoria se entrelaça a ‘mensagens direcionadas à mídia e à sociedade’, de forma a corroborar que os assassinatos em si não bastaram a esses sujeitos. O ato só tem, de fato, valor de ato se produz um efeito de autenticação, elevando-o ao predicamento de um ato perverso.

O endereçamento especificado à polícia ou aos policiais denota a relação do ato com a lei, que sempre é convocada para ser transgredida. A falta inevitável que aparece nessa operação de gozo é o motor da sua repetição, instaurando o caráter de série, como é anunciado na categoria sobre ‘crimes que serão cometidos’.

Portanto, Jack, o Estripador, o Assassino do Zodíaco, David Berkowitz, Dennis Rader, Albert Fish, o Machadista de Nova Orleans e Joseph James DeAngelo, independentemente de suas estruturas clínicas, são autores de atos perversos - nesses casos, atos criminosos - comprometendo o laço social, mas não rompendo com ele, pois estão sempre endereçados ao Outro, visando reconhecimento. Para não se dividirem, dividem o outro, gozando às suas custas.

Considerações finais

A perversão é um tema intricado e pouco estudado se compararmos com as publicações em psicanálise dedicadas aos campos da neurose e da psicose. Um dos fatores para isso ocorrer se deve às dificuldades que cercam a clínica da perversão. Entretanto, Freud, Lacan e seus seguidores dedicaram-se bastante à conceituação da perversão, seja através da perversão-polimorfa, da estrutura perversa, do gozo perverso, da suplência perversa e, em menor escala, do ato perverso.

A perversão se faz presente em todos nós por pertencer à estrutura da sexualidade. Ao introduzir o conceito de pulsão, Freud rebate o saber reducionista e biologizante de sua época, demonstrando que a sexualidade vai além do sexo e da reprodução da espécie, ideia essa calcada no humano como um ser instintivo. Sendo um ser pulsional e não funcional, qualquer objeto pode ser alçado à categoria de objeto de desejo.

Além de ser um traço original e universal do ser humano, a perversão aparece como estrutura através da negação da castração do Outro. Na perversão há um tipo específico de negação (Verleugnung), que se aproxima de ‘renegar’ e ‘desmentir’. É como se o sujeito soubesse da existência daquilo que ele recusa, porém persiste em negar a sua presença.

Perpassando a suplência perversa (quando a perversão se coloca como uma defesa em um caso de psicose) e o gozo perverso (que se relaciona ao gozo místico, mas se situa mais perto da função fálica), adentramos nos atos perversos. Os atos em si marcam um antes e um depois. Enquanto na passagem ao ato há uma saída de cena, uma ruptura com o laço social e a identificação do sujeito ao objeto - como função de resto -, no acting out o sujeito não cai com o objeto e mantém o lugar da demanda, demonstrando-se em direção ao Outro. É uma repetição em ato.

O ato perverso se aproxima do acting out na sua vertente de convocação ao Outro e por não romper com o laço social. No entanto, de uma forma particular, o ato perverso opera através da falta intrínseca ao laço social e tenta sobrepujá-la, que, por sua vez, acaba por acentuar o seu caráter faltoso. Pelo ato perverso, seu autor goza ao suplantar a lei, porém, para isso, ele precisa admiti-la.

O ato perverso também se configura pela validação do próprio ato, ou seja, o ato em si não basta como endereçamento ao Outro: ele só tem valor se produz efeito de reconhecimento no sujeito. Os atos perversos carregam atributos da perversão, mas não qualificam estruturalmente os sujeitos desses atos.

Os autores dos crimes seriais aqui relatados pertencem a épocas e lugares distintos, e não tiveram contato direto entre si, ainda assim as cartas que escreveram carregam estruturas bastante similares. As 35 correspondências analisadas de sete diferentes notórios assassinos seriais demonstram seis conteúdos temáticos, a saber: descrições de crimes cometidos, descrições de si mesmo, mensagens direcionadas à polícia, descrições de crimes que serão cometidos, estilos de escrita e mensagens direcionadas à mídia e à sociedade.

Como já examinado nos tópicos anteriores, essas cartas representam um evidente endereçamento ao Outro. Seus autores tentam de toda forma dominar a cena e causar seu público, seja através de descrições gráficas e detalhadas dos seus crimes ou por relatarem as suas intenções futuras. O ato criminal por si só não é válido, o sujeito precisa ser reconhecido por ele, e por isso descrevem a si mesmos nas cartas. Suas mensagens destinadas à sociedade, à mídia ou à polícia têm sempre a intenção de dividir e angustiar o Outro, reconhecer a lei para transgredi-la, e seu público os acompanha a cada passo com atenção, apreensão e até certo fascínio.

Dessa forma, espera-se que este artigo possa contribuir para o avanço dos estudos sobre o intricado campo das perversões, auxiliando na categorização sobre o ato perverso, além de fomentar interesse maior da psicologia brasileira sobre a temática forense e também avançar os estudos sobre criminalística.

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    “Women serial killers act like chameleons who bond with their victims and seem to be the last person anyone would suspect”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    08 Jul 2020
  • Aceito
    20 Maio 2021
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