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Obituário

OBITUÁRIO

Professora Ester de Camargo Fonseca Moraes foi uma figura de notável entusiasmo, carisma, inteligência e fortaleza de caráter, conhecida não só por todos os que se dedicam à Toxicologia no Brasil, mas também por expoentes nacionais que militam em outras áreas do conhecimento.

Nos primeiros anos da década de 40, o Jockey Club de São Paulo utilizava um laboratório particular do Professor Doutor Linneu Prestes, então responsável pela cátedra de Química Toxicológica e Bromatológica na Faculdade de Farmácia e Odontologia, realizando análises de saliva, mas de maneira não institucional.

Em 1944, a diretoria do clube decidiu criar um laboratório próprio - Serviço Químico - destinando para este fim, um espaço no prédio da sede social do clube; em 1947, este foi transformado em Serviço Químico e Biológico. Em 1952, o laboratório foi transferido para seu local definitivo Pio Hipódromo Paulistano; um ano depois, passou a denominar-se Serviço de Controle e Pesquisas Antidopagem.

A Profa. Ester acompanhou este desenvolvimento desde o princípio; apenas recém-formada pela Faculdade de Farmácia e Odontologia, começou a prestar ajuda técnica ao Prof. Linneu Prestes que, em 1944, a convidou para ocupar o cargo de química auxiliar no Serviço Químico. Em 1947, foi promovida a assistente de chefia com a criação do Serviço Químico e Biológico. No período de 1958 a 1968, assumiu a direção geral do Serviço de Controle e Pesquisas Antidopagem como químico-farmacêutico chefe.

Em 1951, prestou concurso para Livre-Docente da Cadeira em que era Assistente na Faculdade de Farmácia e, em 1966, quando a Faculdade passou a se chamar Faculdade de Farmácia e Bioquímica; a 9ª Cadeira foi desdobrada da antiga cátedra de Química Toxicológica e Bromatológica, sendo criada a Disciplina Autônoma de Toxicologia, que ficou sob sua responsabilidade. A criação desta Disciplina coincidiu com a mudança da Faculdade para a Cidade Universitária, na cidade de São Paulo.

Foi, portanto, a responsável pela criação da disciplina de Toxicologia como entidade autônoma e separada de outras correlatas, no curso de Farmácia da Universidade de São Paulo, o que foi posteriormente instituído também nas demais Faculdades de Farmácia, federais, estaduais ou privadas, que hoje ministram esta disciplina. Em 1968, a professora Ester optou pelo regime integral na USP, renunciando ao cargo de responsável pelo Serviço do Jockey Club, cujo desenvolvimento e prestígio continuavam em plena ascensão. Ela sentiu a necessidade de se empenhar ao máximo para a instalação real e efetiva da Disciplina recém-criada (desprovida de qualquer infra-estrutura!) cuja importância era, todavia, prioritária para o Brasil, transferindo para a Faculdade de Ciências Farmacêuticas, a larga experiência adquirida em seus 24 anos de trabalho no Jockey Club. A decisão de renunciar a sua posição já consolidada no Jockey Club foi difícil, mas valeu a pena: em fins de 1969, a disciplina de TOXICOLOGIA já se equiparava didaticamente a qualquer uma das antigas disciplinas da Faculdade.

Com a reforma universitária, em 1970, foi iniciada a integração didática do Departamento, começando pela integração física das Disciplinas, que foram reunidas em um único local de trabalho: Bloco 17 do Conjunto das Químicas. Também, com a reforma universitária, foi integrado ao Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas, o antigo laboratório clínico da Faculdade de Farmácia e Bioquímica. Nesta ocasião, a Profa. Ester propôs a criação do Laboratório Toxicológico, paralelo ao Laboratório Clínico, constituindo o Laboratório Clínico e Toxicológico do Departamento. Aprovada a sua criação, foi o mesmo vinculado à Disciplina de Toxicologia, até adquirir autonomia com a maturidade.

Em 1970, a Disciplina de Toxicologia passou por força da reforma universitária a integrar o recém-criado Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas.

A Profa. Ester foi coordenadora do planejamento para a implantação, em 1972, do Curso de Pós-Graduação em Farmácia - Área de Análises Toxicológicas, em nível de Mestrado, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas.

Em 1972, com a reforma curricular da Faculdade, agora de Ciências Farmacêuticas, a Disciplina de Toxicologia passou a ser autônoma e em tempo integral e colocada em concurso, concorreu então à vaga e obteve o título de Professor Titular de TOXICOLOGIA da USP.

Participou do Jubileu Científico do Prof. René Truhaut, celebrado solenemente em Paris, em 19 de outubro de 1984, por ocasião do 150º Aniversário da criação da primeira Cadeira de Toxicologia da Faculdade de Farmácia de Paris. No livro do jubileu, a Dra. Ester contribuiu com o artigo "Toxicidade do material de artistas".

Em 1987, aposentou-se do cargo de Professor de Toxicologia, após 45 anos de atividade plena e ininterrupta. Exerceu, ainda, voluntariamente, depois daquela data, por mais cinco anos, a função de orientadora de mestrandos e doutorandos da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, deixando a USP, definitivamente, apenas depois de 50 anos de trabalho.

Durante sua atividade docente, além das aulas ministradas em quase todas as Faculdades de Farmácia do País e muitas da Argentina, participou de inúmeros Congressos no Brasil e no Exterior.

Seu entusiasmo, honestidade científica, preocupação com o uso da melhor terminologia, entre outras qualidades, fizeram da Professora Ester uma daquelas pessoas cuja arte de transmitir o conhecimento se torna fonte geradora do estímulo que desperta o oficio de ensinar.

Em 1987, em palestra proferida no V Congresso Brasileiro de Toxicologia da Sociedade Brasileira de Toxicologia, em Salvador, na qual discutia o ensino da Toxicologia no Brasil, nos presenteou com quadro que consistia de um mapa do Brasil com estrelas vermelhas e azuis, respectivamente, os mestres e doutores que havia formado até aquela data e que, espalhados desde o Amazonas até o Rio Grande do Sul, eram os responsáveis pelo ensino da Toxicologia no Brasil.

Tudo começou com ela. O que aprendemos foi com ela que o fizemos. Nossas condutas, a ética toxicológica, o fazer Toxicologia.

Que seu exemplo seja sempre a nossa diretriz para continuarmos a perseguir nossos ideais, como ela o fez durante toda a sua vida.

Texto escrito por Alice A. da Matta Chasin, Fausto Antonio de Azevedo, Maria Elisa Pereira Bastos de Siqueira, Nilda Fernícola, Regina Lúcia Moraes Moreau e Silvia Berlanga de Moraes Barros - Professores de Toxicologia.

Este texto foi originalmente publicado na Revista Brasileira de Toxicologia, v.15, n.2, 2002.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Mar 2009
  • Data do Fascículo
    Jun 2003
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