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Cultura de segurança e relações de poder nas organizações

Resumo

O conceito de Cultura de Segurança (CS) é amplamente utilizado na indústria e literatura científica, ganhando significados que vão de abordagens fatalistas até as integradas. Mesmo naquelas mais avançadas, questões de fundo permanecem na superficialidade: como os conflitos e contradições do trabalho são tratados? Qual o limite para desobedecer a uma regra com segurança? Qual a influência das relações de poder e dominação entre os indivíduos no desenvolvimento da cultura? Ignorar essas questões é deixar de lado o principal elemento na compreensão do tema, qual seja, os determinantes das práticas e valores desenvolvidos pelos indivíduos e grupos sociais. Este ensaio busca discorrer sobre as nuances presentes na CS, trazendo para o centro da reflexão as relações de poder presentes nas organizações. A problematização está construída sob uma perspectiva interdisciplinar, mobilizando não somente referências teóricas específicas acerca da atividade humana no trabalho e da gestão da segurança nas organizações atuais, como também referências clássicas no campo da filosofia, sociologia e psicologia. Concluímos mostrando a necessidade de trazer a experiência das situações cotidianas para o seio da organização, retomar a palavra dos sujeitos por meio de espaços livres de punição e ampliar a autonomia dos indivíduos presentes na ponta dos processos.

Palavras-chave:
cultura organizacional; poder; autonomia; gestão de riscos; saúde do trabalhador

Abstract

The Safety Culture (SC) concept is widely used in industry and scientific literature, encompassing meanings ranging from fatalistic approaches to integrated ones. Even in the more advanced approaches, fundamental questions often remain on the surface: How work conflicts and contradictions are addressed? What is the limit for safely disobeying a rule? What is the influence of power and domination relationships on the development of this culture? Ignoring these questions means overlooking the main element for understanding the subject, namely, the determinants of practices and values developed by individuals and social groups. This essay seeks to delve into the nuances present in SC, placing power dynamics in organizations at the center of the reflection. The questioning is built from an interdisciplinary perspective, mobilizing not only specific theoretical references about work human activity and safety management within current organizations but also classical references in the fields of philosophy, sociology, and psychology. We conclude by highlighting the need to bring the experience of everyday situations into the heart of the organization by reclaiming individuals’ voices with punishment-free spaces and expanding the autonomy of individuals involved in the frontlines of processes.

Keywords:
organizational culture; power; autonomy; risk management; occupational health

Introdução

O termo “cultura de segurança” aparece pela primeira vez em 1986, como parte da análise do acidente da usina nuclear de Chernobyl, realizada pela Agência Internacional de Energia Atômica. O relatório de conclusão do acidente mostra que os procedimentos formais desenvolvidos pela usina deveriam ser “complementados pela criação e manutenção de uma ‘cultura de segurança nuclear’”11. International Nuclear Safety Advisory Group. Summary Report on the Post-Accident Review Meeting on the Chernobyl Accident. Safety Series No. 75-INSAG-1. Vienna: INSAG; 1986.(p. 9, tradução nossa). Antes disso, em 1979, a Comissão Reguladora Nuclear dos Estados Unidos da América (EUA) já havia reconhecido a contribuição de fatores organizacionais no acidente da central nuclear de Three Mile Island, afirmando que as principais deficiências na segurança dos reatores à época não eram problemas de hardware, mas “problemas de gestão” (22. Nuclear Regulatory Comission. Three Mile Island: a Report to the Commissioners and to the public. Washington, DC: Nuclear Regulatory Comission Special Inquiry Group; 1980. (p. 89, tradução nossa).

A partir desses eventos, o conceito de Cultura de Segurança (CS) passou a ser amplamente utilizado na indústria e na literatura científica, sendo compreendido como um conjunto de valores e comportamentos relacionados à segurança e compartilhados entre os membros de uma organização33. Guldenmund FW. The nature of safety culture: a review of theory and research. Sa Sci. 2000;34:215-57.. Essa abordagem tem as suas bases nos estudos de Schein44. Schein EH. Organizational Culture and Leadership. 2nd ed. San Francisco: Jossey-Bass; 1992., que define cultura organizacional como “um padrão de pressupostos básicos compartilhados […] a serem ensinados aos novos membros como a maneira correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas” (p. 12, tradução nossa). O campo da gestão da segurança se apropriou desse conceito e passou a defender a CS como sendo o produto da articulação entre normas, valores e práticas especificamente no campo da segurança, desenvolvido em diferentes setores, como na indústria nuclear, na indústria química, na aviação civil ou no setor de segurança do paciente55. Daniellou F, Simard M, Boissières I. Fatores Humanos e Organizacionais da Segurança Industrial: um estado da arte. Toulouse: ICSI; 2010..

É possível perceber, então, que o conceito de CS evoluiu ao longo da história. Não obstante, mesmo nas abordagens mais avançadas, que consideram a necessidade de integração entre gestão e operação, questões de fundo permanecem na superficialidade ou são esquecidas por completo. Em meio à justa necessidade de articulação de normas e práticas, como as contradições do trabalho são tratadas? Qual o limite para desobedecer a uma regra com segurança? Qual a influência das relações de poder e dominação entre os indivíduos no desenvolvimento da cultura? Ignorar essas questões é deixar de lado, talvez, o principal elemento na compreensão do tema, qual seja, os determinantes das práticas e valores desenvolvidos pelos indivíduos e grupos sociais.

Com isso, este ensaio busca discorrer sobre as nuances presentes no conceito de cultura de segurança, trazendo para o centro da reflexão as relações de poder presentes nas organizações. Começamos com um breve histórico dos tipos de CS desenvolvidos ao longo da história, citando diferentes exemplos que ilustram a teoria (tópico 2). Em seguida, discorremos sobre a relação entre conflitos, as regras e a lógica punitivista sobre erros e violações às regras (tópico 3). A partir disso, tratamos especificamente sobre as formas de poder e dominação no trabalho (tópico 4). Por fim, refletimos sobre as perspectivas de avanço para a construção da segurança, calcadas sobretudo na valorização da experiência e na retomada da palavra para ampliar a autonomia dos indivíduos (tópico 5).

A problematização do tema será construída sob uma perspectiva interdisciplinar, mobilizando não somente referências teóricas específicas acerca da atividade humana no trabalho e da gestão da segurança nas organizações (como F. Daniellou, J. Reason ou S. Dekker), mas também referências clássicas da filosofia, sociologia e psicologia (como E. Durkheim, T. Hobbes, J. Piaget ou S. Lukes), que constituem um pano de fundo para compreender as teorias e práticas desenvolvidas no campo da segurança, suas relações com as dinâmicas de poder e com o trabalho contemporâneo.

Tipos de Cultura de Segurança

As dinâmicas envolvidas na criação, manutenção ou modificação de uma CS dependem fundamentalmente do grau de engajamento das lideranças e dos executantes nas propostas e práticas a favor da segurança55. Daniellou F, Simard M, Boissières I. Fatores Humanos e Organizacionais da Segurança Industrial: um estado da arte. Toulouse: ICSI; 2010.. Em função dessas relações, quatro tipos de cultura de segurança podem surgir: fatalista, de ofício, gerencial e integrada (Figura 1).

Figura 1
Tipos de cultura de segurança.

Na Cultura Fatalista, o envolvimento dos executantes e das lideranças é baixo e os acidentes são vistos como produto do acaso. Assim sendo, os próprios trabalhadores vítimas de acidentes graves costumam associá-los ao azar. Embora esse tipo de cultura tenha predominado no Ocidente até o século XVII, ainda é possível observar diferentes exemplos na atualidade, principalmente na agricultura, na construção civil, em acidentes de trânsito e em algumas indústrias. Trabalhadores rurais no Uruguai, por exemplo, fazem frequentemente associação dos acidentes à fatalidade66. Pucci F, Nión S, Pereyra V. La construcción social del riesgo en la producción rural. Montevideo: Imprenta Prontográfica; 2021.. Nesse mesmo sentido, os 33 mineiros presos durante 2 meses numa mina no Chile se diziam sortudos e frequentemente agradeciam a Deus por estarem vivos77. Franklin J. 33 Men: Inside the Miraculous Survival and Dramatic Rescue of the Chilean Miners. Berkley: G.P. Putnam's Sons; 2011..

A Cultura de Ofício se caracteriza por baixo envolvimento das lideranças e maior envolvimento dos executantes na produção de segurança. Esse tipo de cultura foi predominante no Ocidente nos períodos industrial e pré-industrial e seus métodos se limitavam às práticas informais dos trabalhadores para evitar acidentes. É conhecido, por exemplo, que mineradores do século XVII levavam canários para minas subterrâneas para alertá-los, em caso de morte desses animais, do risco de vazamento de gás inflamável no local. Na pesca artesanal, a segurança também fica exclusivamente a cargo dos pescadores e jangadeiros88. Saldanha MCW, De Oliveira LP, Celestino JEM, Veloso I. Construção de Demandas e Tecnologia Social: aplicação na atividade jangadeira. Revi E&S. 2010;1(2).. A construção civil guarda, igualmente, grande porção de informalidade e baixo engajamento dos gestores sobre a segurança real99. Pucci F, Levin R, Trajtenberg N, Bianchi C. La negociación de los umbrales aceptables de riesgo en la industria de la construcción uruguaya. Montevideo: Universidad de la República; 2004..

A Cultura Gerencial surge quando as lideranças exercem papel preponderante no desenvolvimento das regras de segurança, e o envolvimento dos executantes geralmente se limita em obedecer às ordens. Esse tipo de cultura, muito frequente na atualidade, iniciou-se no fim do século XIX e se espalhou em todo o mundo, marcando o aparecimento de exigências de certificação internacionais. Nesse caso, há uma tendência de desvalorização do conhecimento acumulado pela cultura de ofício, tornando desfavorável o desenvolvimento de formas de confiança entre trabalhadores e gestores1010. Walter J, Poy M, Darmohraj A. L'agir en sécurité. Confiance, intelligence de la règle et coopération. In Terssac G, Boissières I, editors. La sécurité en action. Toulouse: Octarès; 2009. p. 207-23.. Por exemplo, uma indústria de papel uruguaia buscou sem sucesso regular os riscos por meio do aumento de normas e procedimentos de segurança1111. Pucci F, Nión S, Manisse S. La regulación autónoma del riesgo: el caso de una empresa papelera. In Boado M, ed. El Uruguay desde la Sociología XXI. Montevideo: Universidad de la República; 2014.. Sob a mesma lógica, durante a queda da Swissair 111, em 1998, embora a tripulação tenha respondido conforme determina o procedimento de combate a incêndio, o fogo se alastrou, matando as 229 pessoas a bordo. Nesse caso, a obediência ao procedimento acabou sendo o problema e não a solução, e essa tragédia deu início a novas pesquisas sobre o uso de listas de verificação e procedimentos1212. Burian BK, Barshi I, Dismukes RK. NASA Technical Memorandum 213462, The challenges of aviation emergency and abnormal situations. Mountain View: NASA Ames Research Center, Moffett Field; 2005..

A complexidade dos sistemas sociotécnicos levou à compreensão de que é necessário articular conhecimentos de gestão e operação na construção da segurança, o que caracteriza o campo da Cultura Integrada. Alguns exemplos podem ser observados na atualidade. Com o intuito de incorporar os trabalhadores em terra (operadores de sala de controle, atendentes do balcão, carregadores de bagagem, entre outros) à gestão da segurança, o CRM evoluiu de uma prática com participação exclusiva dos pilotos no cockpit, incluindo posteriormente toda a tripulação em voo e, finalmente, os trabalhadores em terra1 1 Essa evolução ocorreu muito em função do acidente da Air Ontario 1363, no qual a aeronave caiu 49 segundos após a decolagem, deixando 21 mortos e 44 sobreviventes. Um dos fatores contribuintes do acidente foi o excesso de gelo nas asas do avião. Uma comissária sobrevivente revelou posteriormente que havia identificado esse risco antes da decolagem, mas ficou receosa de expô-lo ao comandante e dar a impressão de querer passar por cima de sua autoridade. . Assim, o nome passou de Cockpit Resource Management, para Crew Resource Management e, por fim, Corporate Resource Management1313. Colantuono F. Pane Inteligência Aérea: O Sucesso da sua "operação" depende das suas decisões. 1st ed. Lauro de Freitas: Novvus3; 2021.. No mesmo sentido, Rocha et al. (1414. Rocha R, Mollo V, Daniellou F. Contributions and conditions of structured debates on work on safety construction. Saf Sci. 2019; 113:192-9., numa empresa francesa de distribuição de eletricidade, desenvolveram um dispositivo organizacional de articulação entre situações reais e o sistema de gestão.

Apesar do conceito de Cultura de Segurança Integrada avançar em relação aos demais, uma vez que inclui a participação dos executantes na construção gerencial das regras e práticas de segurança, questões de fundo ainda permanecem pouco discutidas: como se dão as relações de poder entre indivíduos ou grupos que favorecem ou dificultam práticas e valores na segurança? Como se constroem as relações de dominação no processo de produção de regras e de definição de punição aos “desobedientes”? A abordagem da Cultura de Segurança Integrada se aproxima pouco dessas questões, uma vez que dá ênfase ao consenso e à convergência, ignorando os determinantes dos conflitos, contradições e ambiguidades. Aprofundaremos essa reflexão nos tópicos a seguir.

Os conflitos, as regras e a lógica punitivista

O lugar do conflito e a perspectiva de diferenciação na cultura organizacional

Organizações podem ser entendidas como instrumentos de decisão e ação coletivas, nos quais os indivíduos podem agir e aprender a partir do conflito entre as regras formais e informais, ou entre as situações imaginadas e as reais1515. Reynaud JD. Pour une sociologie de la régulation sociale. Sociologie et sociétés. 1991;23(2):13-26.. A lógica contemporânea, no entanto, busca o inverso disso. Desde os anos 1990, Westrum1616. Westrum R. Cultures with requisite imagination. In Wise J, editor. Verification and Validation of Complex Systems. Berlim: Springer Verlag; 1992: 401-416. sustenta que o mainstreaming enfatiza demasiadamente o consenso e exclui a ambiguidade no estudo da cultura. O discurso dominante valoriza aqueles que trazem soluções, e não problemas1717. Rocha R. Ressignificar o retorno de experiência para romper com o silêncio organizacional: o lugar do debate sobre o trabalho. Perspectivas em Gestão & Conhecimento. 2020;10(3):280-94., ao mesmo tempo em que encoraja a disputa por recursos entre os grupos para produzir resultados sem grandes questionamentos. Por conseguinte, se desenvolve nas organizações contemporâneas o silêncio organizacional - no qual trabalhadores operacionais são impedidos de falar sobre os problemas do campo e gestores preferem não os conhecer - bem como o exercício do poder, seja ele mais direto ou sutil, dos gestores sobre os seus subordinados1818. Rocha R. Espaços de debate e poder de agir na construção da segurança das organizações. Laboreal [Online]. 2017; 13(1)..

Uma vez que o conflito e a divergência são frequentemente desestimulados pela gestão, somente poucos valores, crenças e comportamentos são, de fato, compartilhados entre os grupos e indivíduos. Em função disso, torna-se mais apropriado se pensar em culturas (no plural) de segurança1919. Antonsen S. Safety culture and the issue of power. Saf Sci. 2009; 47(2): 183-91., já que as práticas e os valores se referem sempre a grupos específicos, que operam com lógicas próprias, e não a elementos uníssonos para toda a organização.

É nesse sentido que pesquisas clássicas, como a de Hofstede2020. Hofstede G. Dimensions of national cultures. In Rath R, Asthana HS, Sinha D, Sinha JBH, eds. Diversity and unity in cross-cultural psychology. Lisse: Swets and Zeitlinger; 1982: p. 173-187. - que ainda domina a representação de muitos especialistas em cultura organizacional -, acabam sendo criticadas, como fez em diferentes momentos o pesquisador Alain Wisner. Ao analisar as políticas da IBM, nos anos 1960, Hofstede chegou a quatro dimensões principais na dinâmica cultural de um país: distância de poder, aversão à incerteza, masculinidade-feminilidade e individualismo. Países industrialmente desenvolvidos teriam baixa distância de poder, baixa aversão à incerteza, forte individualismo e dimensão masculinidade-feminilidade separada entre países anglo-americanos com dimensão de masculinidade (autoritarismo, gosto por dinheiro e bens, negligência sobre o outro) e países nórdicos com dimensão de feminilidade, e consequentemente com características opostas.

Wisner2121. Wisner A. A inteligência no trabalho. São Paulo: Fundacentro; 1994. argumenta que essa tipologia cai em generalizações e “lugares-comuns em matéria cultural” (p. 177) porque, além de podermos ter essas características combinadas entre si (sermos, por exemplo, desinteressados e autoritários ao mesmo tempo, ou gostarmos de bens, mas também nos preocuparmos com o outro), Hofstede negligencia a heterogeneidade dos países estudados. Assim, Wisner2121. Wisner A. A inteligência no trabalho. São Paulo: Fundacentro; 1994. pergunta: que parte da população da África do Sul foi estudada, os negros e/ou brancos? No Canadá, os habitantes do Quebec têm os mesmos valores que os de língua inglesa? As grandes minorias negras e hispânicas dos EUA têm a mesma cultura que os brancos anglo-saxões protestantes?

Desconsiderar as diferenças entre práticas e valores no interior dos grupos sociais, sejam eles indústrias, sejam países, nos leva a “lugares-comuns” ao abordar o tema, ou à produção de estereótipos sem o devido aprofundamento da reflexão. Essa é uma perspectiva de diferenciação na cultura organizacional, em oposição à perspectiva de integração, uma vez que as organizações são frequentemente caracterizadas pelo conflito, sobretudo na disputa por recursos, e pelo exercício do poder entre grupos hierárquicos.

A relação dos indivíduos com as regras

Ao se debruçar sobre a dimensão moral do desenvolvimento humano, Piaget2222. Piaget J. O juizo moral na criança. São Paulo: Summus; 1994. definiu três grandes fases pelas quais toda criança passa. A primeira é a Anomia, na qual a noção de que as ações podem ser valoradas por regras ainda não permeia o universo moral da criança. Ao longo do desenvolvimento, ela passa a adotar um posicionamento de obediência às regras exteriores e a uma responsabilidade objetiva. Essa é a fase da Heteronomia, na qual as regras são compreendidas de forma literal a partir de uma autoridade (o adulto). Por fim, na fase da Autonomia, a criança é capaz de demonstrar respeito mútuo, cooperação e inclusão do outro, abrindo a possibilidade de questionar e modificar as regras antes de segui-las como um imperativo.

Mesmo se tratando de uma teoria do desenvolvimento infantil, e considerando toda a distância que há para o desenvolvimento cognitivo de adultos, a teoria piagetiana pode nos ajudar a compreender a relação entre os indivíduos, as regras e a segurança.

O conceito de Anomia já havia sido abordado por outras disciplinas. Primeiramente, na Sociologia, Durkheim2323. Durkheim, E. Da divisão do trabalho social. Martins Fontes, São Paulo, 2010. o considerava como a dificuldade de adultos em interpretar leis ou a estrutura na qual o mundo está organizado. Posteriormente, na Teoria da Guerra2424. Clausewitz CV. On War. 1st ed. New York: Alfred A. Knopf; 1993., o conceito também foi trabalhado ao tratar da necessidade de se evitar o pânico no campo de batalha pela percepção, no interior de um mesmo batalhão, de que as regras e estratégias de combate estão sendo alteradas sem que o grupo compreenda com clareza as razões disso. Por fim, na Filosofia Política, a Anomia é vista também como estratégia de dominação, uma vez que a ausência de regras claras gera medo nos governados, e, com isso, pensamentos mais regressivos e visões de mundo simplificadas(25). Dessa forma, o poder e a autoridade são mais facilmente transferidos para uma instância superior, um mito, ou o leviatã de Thomas Hobbes, que poderia salvar os indivíduos do caos.

Na Heteronomia de Piaget2222. Piaget J. O juizo moral na criança. São Paulo: Summus; 1994., a criança acredita que as regras são imutáveis, advindas de uma autoridade externa e devem ser cumpridas de forma literal por medo de punição. Essa é uma forma de tratamento comum também entre adultos, utilizada pelos modelos clássicos de gestão e pelo campo da Engenharia de Segurança do Trabalho tradicional. Baseada na lógica do comando-controle, o principal argumento defendido é que, se o trabalhador não cumpre a regra, um evento não-desejado poderá surgir, colocando a situação em risco. Como consequência, a responsabilidade é integralmente transferida para o trabalhador envolvido e as soluções apresentadas geralmente se resumem a treinamentos para eliminação dos erros e para conformidade do comportamento à regra. Uma das mais famosas empresas de consultoria que representa esse tipo de abordagem é a Dupont, com intervenções comerciais tais como a STOP Dupont2626. DSS+. dss+ Stop [Internet]. Paradiso: DSS+; 2023 [cited 2023 Aug 29]. Disponível em: https://www.consultdss.com/build-capabilities-through-training/learning-workshops-virtual-and-classroom-based-learning/dss-stop/.
https://www.consultdss.com/build-capabil...
, incluindo checklists para registro de comportamentos inseguros no trabalho2727. Thieme AL. Modelo teorico-conceitual de comportamento seguro com base no conhecimento produzido sobre Behavior Based Safety - BBS [Dissertação]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2020..

Por fim, a Autonomia reconhece que a lei é sempre uma formação insuficiente, local e precária e que o limite da regra normalmente não é claro, necessitando da apropriação do sujeito de acordo com a sua realidade. É nesse sentido que o campo do Direito faz a distinção entre lei e justiça. Diferente da lei, a justiça é uma demanda que está muito além do ordenamento jurídico e ultrapassa todos os regramentos objetivos que o ser humano é capaz de produzir2828. Albuquerque A, Menegaz M. Segurança do Paciente e Justiça Restaurativa. In Aline A, ed. Bioética e justiça restaurativa. Ponta Grossa: Atena; 2021: 110-125..

Exigir obediência total e irrestrita às regras e aos procedimentos, ignorando as contingências e variabilidades do meio, é o mesmo que enquadrar os trabalhadores em uma abordagem heteronômica. Em outras palavras, é colocar o adulto no lugar de uma criança. Infantiliza-se o trabalhador, encaixando-o numa posição de que ele pouco sabe e, por isso mesmo, deve seguir rigorosamente aquilo que foi escrito por outro, que é sua autoridade e sabe mais do que ele.

A lógica punitivista sobre erros e violações às regras

Erro humano pode ser definido como “a condição resultante das ações de uma pessoa, quando há um acordo geral de que as ações deveriam ter sido diferentes do que foram” (2929. Reason J. Managing the risks of organizational accidents. London: Ashgate Publishing; 1997. (p. 151, tradução nossa), enquanto violações são “desvios de procedimentos operacionais de segurança, padrões ou regras” (2929. Reason J. Managing the risks of organizational accidents. London: Ashgate Publishing; 1997. (p. 72, tradução nossa).

A divisão por vezes aceita no campo das Safety Sciences, de que erro humano seria sempre involuntário, enquanto violações às regras seriam voluntárias, apresenta controvérsias. O próprio James Reason, um dos precursores dessa discussão, já admitiu que sempre haverá um “meio-termo”, ou um componente de involuntariedade nas violações, ao mesmo tempo em que os erros são “ao menos em parte, ações voluntárias” (2929. Reason J. Managing the risks of organizational accidents. London: Ashgate Publishing; 1997. (p. 127, tradução nossa). É por isso que, quando se refere a violações, Reason costuma utilizar o termo “violações errôneas” (2929. Reason J. Managing the risks of organizational accidents. London: Ashgate Publishing; 1997..

A classificação de erro costuma ser bastante conhecida no mundo do trabalho: ações com intenção correta, mas execução errada (slip); ações com a intenção errada independentemente de sua execução (mistakes); ou omissão na realização de ações sabidamente necessárias (lapse) (2929. Reason J. Managing the risks of organizational accidents. London: Ashgate Publishing; 1997.. Mas as violações também apresentam classificações que merecem destaque. Podemos ter a intenção de violar uma regra por diferentes razões, de acordo com o contexto: porque já se tornou uma prática comum em determinadas situações (violação rotineira), porque a situação não é prevista pela regra (violação excepcional), porque se espera melhorar o resultado (violação de otimização) ou porque, ao seguir a regra, a atividade pode ser interrompida (violação necessária ou situacional) (3030. Reason J. Human Error. Cambridge: Cambridge University Press; 1990..

Se Reason classifica as violações de acordo com o contexto da ação, encontramos em Bobbio et al. (3131. Bobbio N, Matteucci N, Pasquino G. Dicionário de política. Brasília, DF: Universidade de Brasília; 1998. três circunstâncias nas próprias leis que ensejam essa desobediência: leis injustas; leis ilegítimas ou produzidas por quem não tem capacidade de legislar; e leis ilegais ou inconstitucionais. A Teoria da Desobediência Civil3232. Thoreau HD. Desobediência civil. Porto Alegre: L± 2012., longamente tratada pela filosofia política, repousa sobre o fundamento de que desobedecer a regras tem a finalidade de cessar injustiças, e dessa forma produzir normas mais adaptadas à realidade. Ela se refere a um direito fundamental dos indivíduos no exercício da resistência à obediência às regras injustas, ilegítimas ou ilegais. É, portanto, um direito à violação e “um ato inovador mais que destruidor” (3131. Bobbio N, Matteucci N, Pasquino G. Dicionário de política. Brasília, DF: Universidade de Brasília; 1998. (p. 335).

Em todos esses casos, a intenção da violação sempre foi “acertar”, ou seja, chegar ao objetivo previamente determinado de produzir com segurança. Isso é alcançado na maior parte das vezes, uma vez que a violação, assim como o erro, tem sempre um forte componente de proteção do sistema e, com exceção de atos de sabotagem, nunca terão “o objetivo de causar lesão ou dano” (3030. Reason J. Human Error. Cambridge: Cambridge University Press; 1990. (p. 1316).

A violação de uma regra é, portanto, frequentemente legítima e o problema geralmente reside não no indivíduo, que procura produzir com segurança, mas sim no contexto ou na própria regra, por vezes descolada da realidade vivida. Apesar disso, a lógica heteronômica utilizada pela maior parte dos modelos organizacionais da atualidade defende que, para se gerar prevenção, seria necessário punir (exemplarmente) os erros e violações ocorridos. A punição a esses indivíduos é, assim, utilizada como instrumento de poder e dominação, sejam elas mais diretas ou mais sutis3333. Antonsen S. Safety culture: theory, method and improvement. Farnham: Ashgate; 2009..

Formas de poder e dominação no trabalho

A ideia de cultura de segurança vem recebendo críticas ao longo da história, sendo inclusive abandonada por autores diversos. O sociólogo americano Charles Perrow, por exemplo, ao ser perguntado por que não trabalha com a noção de cultura em seu célebre livro Normal Accidents, de 1984, afirma que “duvida da sua utilidade” e que, para ele, “a questão principal é o poder” (3333. Antonsen S. Safety culture: theory, method and improvement. Farnham: Ashgate; 2009. (p. 47, tradução nossa). Nessa mesma perspectiva, Hale3434. Hale AR. Culture's confusions. Saf Sci. 2000;34(1-3):1-14. - em sugestivo editorial na Revista Safety Science intitulado “Culture’s Confusion” (fazendo clara alusão ao livro Culture’s Consequence, de Hofstede) - e Hopkins3535. Hopkins A. Safety, Culture and Risk: the organizational causes of disasters. Sydney: CCH; 2005., no livro Safety, Culture and Risk, defendem o abandono do termo por não acreditarem que ele traga contribuição significativa na discussão sobre segurança. Antonsen1919. Antonsen S. Safety culture and the issue of power. Saf Sci. 2009; 47(2): 183-91. também levanta diversos questionamentos a respeito, mostrando que as ferramentas de avaliação de CS não levam a nenhuma transformação prática caso não haja provisão de garantias e recursos a favor da segurança por parte dos gestores com poder de decisão das empresas. Por fim, Haavik et al. (3636. Haavik TK, Antonsen S, Rosness R, Hale A. HRO and RE: A pragmatic perspective. Saf Sci. 2019;117:479-89. argumentam que, mais importante que o termo em si, é a necessidade de estreitamento teórico e integração da noção de poder entre as abordagens que trabalham com o conceito de CS.

Antonsen3333. Antonsen S. Safety culture: theory, method and improvement. Farnham: Ashgate; 2009., um dos poucos autores que desenvolve a noção de poder no campo da segurança, mobiliza a teoria elaborada por Steve Lukes3737. Lukes S. Power: A Radical View. London: Macmillan; 2005 [1974]., que propõe dimensões do poder ligadas às relações sociais entre os indivíduos a partir da capacidade deles em reconhecer, articular e alcançar seus interesses.

A primeira dimensão se refere à capacidade de um ator político impor sua vontade sobre outros atores, muitas vezes de forma explícita e perceptível. Envolve a aplicação de políticas organizacionais, a tomada de decisões e a capacidade de influenciar os resultados em benefício próprio. Trata-se do poder facilmente observado e contestado. Por isso, é também chamado de poder manifesto. As fontes dessa forma de poder advêm de posições hierárquicas, concentração de informação e expertise, controle de recursos e recompensas, poder coercitivo, rede de alianças e relacionamentos, carisma e poder pessoal.

Já na segunda dimensão do poder, alguns interesses são camuflados ou formulados de maneira sutil nos processos decisórios que levam em conta os interesses daqueles que estão sentados à mesa de negociação. Assim, diz respeito à capacidade de moldar a agenda política, influenciar o debate público e controlar o acesso aos recursos e às decisões. Nessa dimensão, o poder opera de forma mais discreta e indireta, exercendo controle sobre quais questões são discutidas ou excluídas do debate. Por isso, é também conhecido como poder oculto, podendo envolver a manipulação da informação, a definição de prioridades e a capacidade de influenciar as regras do jogo.

Finalmente, a terceira dimensão refere-se à capacidade de influenciar as percepções, valores e crenças dos indivíduos, moldando as suas preferências e limitando suas possibilidades de ação. Aqui, o poder opera de maneira ainda mais sutil e profunda, impactando as estruturas cognitivas e normativas dos indivíduos. Essa dimensão engloba a capacidade de estabelecer hegemonia e determina o que é considerado aceitável pelo grupo. Por essa razão, esse poder é também chamado de ideológico. Como consequência, as vontades e desejos dos indivíduos e grupos são manipulados de forma que os seus reais interesses são obscurecidos por interesses políticos e subjetivos gerados pelas estruturas sociais que os cercam. Essa costuma ser a forma de poder mais eficiente, uma vez que envolve o engajamento subjetivo dos indivíduos e não é nem mesmo percebido por aqueles que são dominados.

Sob essa perspectiva, a engenhosidade utilizada para dominar os trabalhadores envolve tanto estratégias explícitas - definidas por posições hierárquicas, concentração de informação, controle de recursos e recompensas, alianças ou carisma - como também outras mais sutis, constituídas nas mesas de negociação, nos processos políticos de tomadas de decisão e na manipulação do engajamento subjetivo dos indivíduos.

Retorno da experiência como motor na construção de organizações seguras

As diferentes formas de dominação definidas por Lukes3737. Lukes S. Power: A Radical View. London: Macmillan; 2005 [1974]. nos ajudam a compreender as relações de poder e as possibilidades de conflito entre grupos sociais de uma organização. Apesar disso, há que se considerar que a cultura de um grupo não é exclusivamente determinada pela dominação presente nas relações de poder. Fosse assim, seria possível implementar de maneira fiel as práticas e os valores definidos pelos gestores e reproduzir uma cultura homogênea para toda a organização. Mas indivíduos com menos poder não são fontes passivas das determinações superiores, e produzem, de acordo com as próprias experiências, valores próprios ao grupo. Dessa maneira, a cultura é produzida e reproduzida por meio da interação diária entre as ordens superiores com as situações reais3838. Meyerson D. Acknowledging and uncovering ambiguities in cultures. In Frost PJ, Moore LF, Louis MR, Lundberg CC, Martin J, eds. Reframing Organizational Culture. Newbury Park: Sage; 1991. p. 254-70..

Assim sendo, os estudos sobre cultura devem também ter o foco no conhecimento das situações e experiências cotidianas vividas pelos indivíduos. Organizações diversas reconhecem isso e buscam, em maior ou menor grau, desenvolver métodos e dispositivos com o intuito de compartilhar as experiências do campo operacional. Formações e treinamentos, difusão de boas práticas, divulgação de análises de acidentes, sistemas de notificação de incidentes ou acidentes e reuniões sobre segurança (conhecidas como “diálogos diários de segurança” ou “minuto da segurança”) são alguns dos exemplos mais conhecidos. A esse conjunto de métodos, dispositivos e práticas que objetivam gerar aprendizado a partir de experiências reais, dá-se o nome de Operational Experience Feedback3939. International Atomic Energy Agency. Reviewing operational experience feedback. Supplementary guidance and reference material for IAEA Operational Safety Review Teams. Vienna: International Atomic Energy Agency; 1991. ou Retorno de Experiência (REX) (4040. Rocha R, Daniellou F, Mollo V. O retorno de experiência e o lugar dos espaços de discussão sobre o trabalho: uma construção possível e eficaz. Trab. Educ. 2014;23(1):61-74., podendo ganhar formas, objetivos e métodos de implantação bastante distintos entre si.

Para que sistemas de REX sejam efetivos e cumpram a sua função, é necessário que algumas premissas sejam respeitadas.

Primeiramente, está a necessidade em se discutir sobre a atividade concreta de trabalho. Por receio de punições, sanções ou retaliações das mais variadas formas, ou mesmo por desacreditarem em qualquer possível tratativa por parte da gestão acerca de uma situação de risco levantada, os trabalhadores se calam e o único retorno de experiência possível acaba sendo dos eventos impossíveis de serem ocultados, por exemplo, quando da danificação de material ou peça avariada1818. Rocha R. Espaços de debate e poder de agir na construção da segurança das organizações. Laboreal [Online]. 2017; 13(1)..

Mas para que o trabalho real seja discutido, os espaços de retorno da experiência devem ser protegidos, livres de culpa, de maneira que os participantes tenham condição de falar a respeito da própria atividade e para que os conflitos entre as regras e a realidade possam aparecer. Ao mesmo tempo devem estar acompanhados de tratativa e feedback por parte dos gestores, além de buscar desenvolver a autonomia dos indivíduos participantes1414. Rocha R, Mollo V, Daniellou F. Contributions and conditions of structured debates on work on safety construction. Saf Sci. 2019; 113:192-9..

Por fim, a grande maioria das formas de REX existentes nas organizações são focadas em sistemas exclusivamente retrospectivos, baseados em eventos indesejados com desfecho já encerrado (como acidentes ou incidentes), limitando a capacidade de aprendizagem sobre o trabalho e a segurança. Para ultrapassar essa lógica, os sistemas de REX devem estar voltados, sobretudo, à identificação dos sinais fracos4141. Amalberti R, Rocha R, Vilela RAG, Almeida IM. Gestão de segurança em sistemas complexos e perigosos - teorias e práticas: uma entrevista com René Amalberti. Rev Bras Saude Ocup 2018;43:e9. e à análise das situações “normais”, ou as situações concretas que ainda não geraram problema. Assim, passamos de sistemas retrospectivos para prospectivos, com maior potencial de aprendizagem e geração de prevenção1717. Rocha R. Ressignificar o retorno de experiência para romper com o silêncio organizacional: o lugar do debate sobre o trabalho. Perspectivas em Gestão & Conhecimento. 2020;10(3):280-94..

Considerações finais

A gestão de uma organização nunca é politicamente neutra, mas tende a refletir os valores e visões de mundo dos grupos dominantes. Algumas organizações da atualidade, certamente a maior parte delas, continuam optando por fortalecer a lógica taylorista de comando-controle fortemente desenvolvida na primeira metade do século XX, bem como as suas formas posteriores, muitas vezes mais sofisticadas, de dominação dos indivíduos. Assim, buscam eliminar as contradições, evitar a participação dos trabalhadores nos processos de gestão, exigir a obediência irrestrita aos procedimentos e desenvolver formas de dominação explícitas e/ou indiretas aos seus subordinados.

Diferente disso, um sistema de produção seguro é aquele que valoriza, acima de tudo, as contradições do trabalho, a participação e a experiência dos indivíduos na gestão dos riscos. Compreender as dinâmicas de poder por trás da interação entre eles nesse processo é fundamental. Isso é ainda mais relevante em se tratando do cenário brasileiro, já que as formas de dominação e poder estão incrustadas em seu rastro histórico desde a dominação portuguesa no País. Diversos são os exemplos que ilustram a estrutura de violência e punição em nossa sociedade, como o massacre de povos indígenas, que perdura desde a colonização do Brasil até os dias atuais; os mais de 350 anos de escravidão, que tornou o Brasil o último país do Ocidente a abolir a prática; a violenta ditadura militar, influenciada pelo segundo maior partido fascista do mundo; dentre tantas outras histórias de massacres a povos que jamais tiveram a devida reparação. Sob esse cenário, incorporar a noção de poder na discussão sobre cultura de segurança no Brasil torna-se ainda mais relevante.

Se iremos continuar ou não utilizando o termo “Cultura de Segurança” não nos parece o mais importante nessa discussão, desde que a perspectiva do poder esteja presente quando da mobilização desse tema. É hora de trazer o poder para o centro do debate e para a mesa de negociação das empresas e buscar, de forma efetiva, modelos de produção e de sociedade mais dignos e seguros.

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Disponibilidade de Dados:

  • os autores declaram que todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
  • Financiamento:

    os autores declaram que o trabalho não foi subvencionado.
  • Apresentação do estudo em evento científico:

    os autores informam que o trabalho não foi apresentado em evento científico e que não foi baseado em dissertação ou tese.

Editado por

Editor-Chefe

José Marçal Jackson Filho

Disponibilidade de dados

os autores declaram que todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    11 Out 2022
  • Revisado
    23 Jul 2023
  • Aceito
    15 Ago 2023
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