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Accountability: a razão de ser da contabilidade

EDITORIAL

Accountability: a razão de ser da contabilidade

Com a deliberação do Banco Central do Brasil e da Comissão de Valores Mobiliários de tornar obrigatória a elaboração e divulgação das demonstrações financeiras pelos bancos brasileiros e companhias abertas, de acordo com os padrões contábeis internacionais estabelecidos pelo International Accounting Standards Board (IASB), surgiu no Brasil uma oportunidade única para a reengenharia dos seus processos de educação contábil. Entretanto, devido à cultura code law da nossa sociedade, corre-se, ainda, o risco de não se verificar mudança significativa de comportamento ético dos nossos operadores da Contabilidade em relação às barreiras culturais a que se refere o Ofício-Circular/CVM/SNC/SEP Nº01/2005.

Este texto tem como objetivo estratégico estimular debates institucionais, com a participação não só dos acadêmicos e profissionais da Contabilidade, como também dos representantes dos mais diversos segmentos públicos e privados da sociedade, com o objetivo de encontrar-se o ponto de convergência no entendimento do que é a Contabilidade em sua essência. Segundo Iudícibus, para se saber o que a Contabilidade é em sua essência é necessário observar atentamente o que ela realiza no mundo dos negócios. Para Ijiri, a accountability é a razão de ser da Contabilidade. De acordo com Hendriksen e Breda, a accountability é o início e o fim da Contabilidade. Mas, afinal de contas, o que é accountability? Etimologicamente, tem o significado de confiabilidade e, epistemologicamente, surge como o resultado de um adequado nível de evidenciação.

No trabalho intitulado Governança Empresarial publicado em 2004, a International Federation of Accountants (IFAC) aponta para a existência de duas formas de accountability: (1) Accountability exógena, que decorre da necessidade de o Conselho de Administração realizar prestação de contas (evidenciação) à Assembléia Geral Ordinária dos acionistas e stakeholders. Essa forma de quitação de accountability tem como base técnica a atividade de contabilização (bookeeping) sob a responsabilidade legal e técnica do contador, visando a demonstrar a conformidade da empresa às leis que regulam suas atividades e (2) Accountability endógena, direcionada pela necessidade de os dirigentes da empresa realizarem a prestação de contas (evidenciação) da eficiência e eficácia de seu plano estratégico de negócios perante o seu Conselho de Administração. Essa forma de quitação de accountability é realizada com base na atividade de Contabilidade (accounting) da empresa, sob a responsabilidade técnica de seus contadores gerenciais ou controllers, capacitados a interpretar e comunicar a todos os gestores de negócio da empresa e seus stakeholders os riscos associados aos fenômenos direcionadores do desempenho da empresa e seus administradores, com especial destaque à estimativa dos fluxos de caixa de futuros negócios.

Seria o instituto da accountability aplicável também ao setor público? De acordo com Cameron, accountability é um importante elemento que caracteriza a boa governança no setor governamental. O conceito envolve a obrigação de se prestarem contas (evidenciação) pelos resultados de decisões ou ações, com freqüência, para prevenir o mau uso do poder e outras formas inadequadas de comportamento de outrem. No âmbito das organizações públicas, essa obrigação pode ser entendida como um dever imposto àqueles que detêm o poder de Estado, no sentido de que dêem visibilidade aos seus atos e, conseqüentemente, gerem um maior grau de confiança entre governantes e governados. Parece haver consenso, na literatura, de que o fundamento dos sistemas democráticos está verdadeiramente na accountability, já que a informação é um pressuposto básico da transparência dos negócios públicos em uma verdadeira e legítima democracia. Sem informações apropriadas a respeito da gestão pública, os cidadãos ficam privados de realizar julgamentos adequados em relação aos atos praticados por seus governantes.

No contexto da Lei de Responsabilidade Fiscal, essa obrigação ganha dimensões relevantes, haja vista o conjunto de sanções que dela resultam para as autoridades públicas que sonegarem informações sobre suas práticas. Esse tema tem sido tratado com tanto interesse ultimamente que já se considera como imprescindível o fortalecimento de instituições independentes do governo para oferecer à coletividade as informações de que ela precisa para o efetivo exercício da cidadania.

Para aqueles que as desejarem, referências bibliográficas poderão ser obtidas no artigo publicado, na íntegra, na Revista Eletrônica do Conselho Federal de Contabilidade (CFC).

Masayuki Nakagawa

Professor Titular Colaborador do EAC/FEA/USP,

Membro do Instituto Brasileiro de Atuária,

Chair Professor Ford de Logística Integrada à Controladoria e Negócios (LOGICON),

Pesquisador Sênior da FIPECAFI e

Professor dos Cursos de Graduação em Ciências Contábeis e

de Pós-Graduação em Controladoria e Contabilidade da FEA/USP.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2008
  • Data do Fascículo
    Ago 2007
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