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Comunicando ciência: o uso das redes sociais públicas pelos periódicos científicos brasileiros da Área “Comunicação e Informação”

RESUMO

Introdução:

Em 2002, com a Iniciativa de Acesso Aberto de Budapeste (BOAI), as comunidades científicas de muitos países começavam a apoiar ações em prol do Acesso Aberto ao conhecimento científico. Desde então, outras atitudes surgiram, como a definição de diretrizes para reprodutibilidade dos estudos e abertura de dados de pesquisa, baseadas na realização de pesquisas científicas mais colaborativas e democratização do acesso aos seus resultados, culminando em práticas de Ciência Aberta. Quanto a esta democratização, os periódicos científicos são os canais mais utilizados para a comunicação dos resultados dos estudos, portanto possuem a potencialidade de, também, informar tais resultados ao público não especializado, dando evidência aos cientistas e suas instituições.

Objetivo:

Analisar o engajamento das postagens realizadas no Instagram, Facebook e Twitter pelos periódicos científicos avaliados com Qualis A1 e A2, pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (2017-2020), na área “Comunicação e Informação” e se as postagens possuem conteúdo considerado inteligível ao público não especializado.

Metodologia:

Levantamento informacional, análise de conteúdo e cálculo de engajamento das páginas e postagens dos periódicos nas referidas redes sociais. Identificaram-se sete periódicos, sendo analisadas 341 postagens realizadas entre agosto de 2022 a janeiro de 2023, das quais 173 foram categorizadas como “Promoção de manuscrito científico, número ou volume”, de interesse do estudo.

Resultados:

A rede social Facebook tem maior número de seguidores nos perfis de todos os periódicos pesquisados, mas quando se verifica o cálculo de engajamento versus número de seguidores, Instagram e Twitter aparecem com percentual maior de interações. Em todas as redes sociais públicas pesquisas, a ferramenta "comentário" é pouco utilizada. A maioria das postagens do tipo “Promoção de manuscrito científico, número ou volume” são uma imagem com título do artigo e nomes dos autores, com partes do resumo da obra na descrição, com exceção de um periódico que divulga os manuscritos com vídeos dos próprios autores, que explicam o teor da pesquisa.

Conclusão:

Com o cálculo de engajamento das postagens e sua relação com o número de seguidores das páginas, conclui-se que os periódicos possuem potencial para utilizar as redes sociais públicas para alcançar o público leigo, desde que considerem a principal pergunta da divulgação científica: a quem se destina?

PALAVRAS-CHAVE:
Comunicação científica; Divulgação científica; Periódicos científicos; Ciência Aberta

ABSTRACT

Introduction:

In 2002, with the Budapest Open Access Initiative (BOAI), the scientific community in many countries began to support actions in favor of Open Access to scientific knowledge. Since then, other attitudes have emerged, such as the definition of guidelines for the reproducibility of studies and the opening of research data, based on conducting more collaborative scientific research and democratizing access to its results, culminating in Open Science practices. As for this democratization, scientific journals are the most used channels for communicating the results of studies, therefore they have the potential to also inform such results to the non-specialized public, giving evidence to scientists and their institutions.

Objective:

To analyze the engagement of posts made on Instagram, Facebook and Twitter by scientific journals evaluated with Qualis A1 and A2, by the Coordination for the Improvement of Higher Education Personnel (2017-2020), in the “Communication and Information” area and whether the posts have content intelligible to the non-specialized public.

Methodology:

Informational survey, content analysis and calculation of engagement of journal pages and posts on the aforementioned social networks. Seven journals were identified, and 341 posts made between August 2022 and January 2023 were analyzed, of which 173 were categorized as “Promotion of scientific manuscript, number or volume”, of interest to the study.

Results:

The social network Facebook has a greater number of followers in the profiles of all the journals surveyed, but when calculating engagement versus number of followers, Instagram and Twitter appear with a higher percentage of interactions. In all public social networks polls, the "comment" tool is little used. Most posts like “Promotion of a scientific manuscript, number or volume” are an image with the title of the article and the names of the authors, with parts of the abstract of the work in the description, with the exception of a journal that publishes the manuscripts with videos of the authors themselves, which explain the content of the research.

Conclusion:

With the calculation of the engagement of the posts and its relationship with the number of followers of the pages, it is concluded that journals have the potential to use public social networks to reach the lay public, as long as they consider the main question of scientific dissemination: who is it intended for?

KEYWORDS:
Scientific communication; Scientific dissemination; Scientific journals; Open Science

1 INTRODUÇÃO

Desde a crise dos periódicos científicos na década de 1980, marcada pelos elevados preços das assinaturas por parte das editoras, as comunidades científicas de diferentes localidades do mundo têm adotado medidas em prol do desenvolvimento de práticas científicas mais abertas, transparentes e colaborativas (Oliveira, 2020OLIVEIRA, L. P. de. Movimento acesso livre e aberto: origens, desenvolvimento, prerrogativas e produtos resultantes. In: GOMES, S. H.; et al. (org.). Letramento informacional: entendendo a ciência e a comunicação científica. Goiânia: Gráfica UFG, 2020.). Tais práticas foram fortalecidas pelo Budapest Open Access Initiative (BOAI), evento realizado em Budapeste em 2002, cujos frutos ficaram mundialmente conhecidos como Movimento pelo Acesso Aberto.

No contexto do Acesso Aberto, outras declarações, de diferentes países, surgiram como a Bethesda Statement on Open Access Publishing (2003) e a Berlin Declaration on Open Access to Knowledge in the Sciences and Humanities (2003). No Brasil, ações consoantes aos objetivos do Acesso Aberto foram encabeçadas pela Scientific Electronic Library (SciELO), inclusive antes do BOAI, uma vez que em 1998 já iniciava a abertura de suas publicações científicas (Packer, 2021). Outro órgão brasileiro que se destaca é o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) com a adoção, personalização e tradução do Open Journal System (OJS), um software open source (código aberto) desenvolvido pelo Publick Knowledge Project (PKP) com o objetivo de gerenciar e publicar periódicos, principalmente, vinculados a Instituições de Ensino Superior. O IBICT também foi o responsável pela criação do Banco de Teses e Dissertações (BDTD).

Ao longo dos últimos vinte anos, “diversos outros movimentos foram tomando forma em sintonia com as propostas originais do movimento pelo Acesso Aberto e dos movimentos pelo software aberto, [...] conformando-se um movimento mais amplo pela Ciência Aberta” (Appel, 2019APPEL, A. L. Dimensões tecnopolíticas e econômicas da comunicação científica em transformação. 2019. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) Universidade Federal do Rio De Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.).

Nesse sentido podem ser citadas iniciativas como a Horizon Europe (2020), da União Européia, 5th U.S. National Action Plan for Open Government (2022-2024), dos Estados Unidos da América, Australian National Data Service (2008), da Austrália, entre outras, porém descrevê-las não está no escopo deste estudo. O ponto de interesse aqui é o fato de que tais documentos orientadores incluem ações que vão desde a produção de pesquisas científicas com métodos e recursos abertos, acessíveis e verificáveis, até a disseminação dos resultados de tais pesquisas.

Uma preocupação que emerge das discussões sobre Ciência Aberta é que esses resultados sejam compreensíveis e disponibilizados ao público geral e não somente à própria comunidade científica, culminando nas discussões sobre divulgação científica.

Interessadas em acompanhar o movimento pela Ciência Aberta, agências brasileiras de fomento à pesquisa já incluem em seus editais de concessão de financiamento, a necessidade de que os pesquisadores informem como os resultados serão divulgados à comunidade geral, a exemplo do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ, 2022). Em direção similar, estudos que fazem parte da área denominada altmetria, indicados em Fachin (2022FACHIN, J. Métricas alternativas e suas aplicações: mapeamento do conhecimento científico em torno da altmetria. 2022. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Universidade Federal de Santa Catarina - Centro de Ciências da Educação, Florianópolis.), têm considerado métricas alternativas, de cunho social, para medir a visibilidade e alcance dos resultados dos estudos científicos. Ainda neste contexto de visibilidade e alcance, necessário se faz pontuar a grande importância que os editores dão ao impacto das publicações científicas dos periódicos que, em geral, é medido por fatores mundialmente ou regionalmente estabelecidos e difundidos. Estes fatores de impacto passam a considerar métricas alternativas, como a presença em plataformas de redes sociais, tanto acadêmicas, quanto não acadêmicas.

“As redes sociais acadêmicas são plataformas digitais que promovem redes de comunicação entre indivíduos direta ou indiretamente envolvidos com o universo acadêmico” (UNIFESP, 2020). Algumas dessas redes sociais incluem Academia.edu1 1 https://www.academia.edu/ , Mendeley2 2 https://www.mendeley.com/ , Research Gate3 3 www.researchgate.net e outras. Já as redes sociais não acadêmicas, ou públicas, agregam uma infinidade de pessoas, com incontáveis interesses, inclusive acadêmicos, mas não somente estes, como Instagram, Facebook, Twitter, Youtube, entre outras.

Diante disso, surgem os seguintes questionamentos: É possível estabelecer relações entre as métricas alternativas dos fatores de impacto dos periódicos e a divulgação científica? Os conteúdos de divulgação de resultados de pesquisas científicas, publicados pelos periódicos científicos nas redes sociais públicas demonstram o interesse destes agentes em se aproximar do público leigo, com linguagem acessível e variados tipos de formatos, visando facilitar o entendimento?

Na tentativa de esclarecer estes questionamentos, este estudo se propõe a analisar os perfis e publicações nas redes sociais Instagram, Facebook e Twitter, dos periódicos científicos brasileiros avaliados com Qualis A1 e A2 na Área “Comunicação e Informação” (C&I) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), na última avaliação disponibilizada (2017-2020).

O Qualis é um método de análise no qual comitês, compostos por consultores de cada área de avaliação, aferem a produção científica dos cursos stricto sensu de pós-graduação brasileiros (mestrado e doutorado), por meio de uma medição da qualidade dos periódicos científicos nos quais docentes e discentes publicam manuscritos científicos (artigos, resenhas etc.). O Qualis 2017-2020 possui estratos: A1, mais elevado; A2; A3; A4; B1; B2; B3; B4; C, decrescentemente, a partir da observância de boas práticas editoriais, exogenia, presença em indexadores, entre outros aspectos (CAPES, 2023).

Sabidamente, os periódicos científicos são canais de comunicação formal entre os pares, porém as redes sociais públicas alcançam tanto o público especializado, quanto o não especializado. Assim, embora se saiba que elementos do contexto digital atual impulsionam os periódicos a criarem perfis nas redes sociais não acadêmicas, a divulgação científica praticada tem trazido conteúdo atualizado, em linguagem acessível e que de fato alcança o público leigo? Motivados por este questionamento, encaminham-se na próxima seção as discussões de teóricos sobre os temas que circundam a problemática proposta.

2 REVISÃO DE LITERATURA

Os periódicos científicos surgiram na segunda metade do século XVII com os objetivos de tornar a comunicação científica mais eficiente, formalizá-la e torná-la registrada, de modo a ser acessada por longos períodos de tempo e a um público amplo (Meadows, 1999MEADOWS, A. J. A comunicação científica. Tradução de Antonio Agenor Briquet de Lemos. Brasília: Briquet de Lemos, 1999.). Caracterizam-se por ser um conjunto de artigos escritos por diferentes autores e distribuídos por intervalos determinados pela equipe responsável, o comitê editorial (Meadows, 1999).

Desde o seu surgimento, os periódicos têm sido o principal canal de comunicação dos resultados das pesquisas dentro de um mesmo campo científico, sendo que o impacto das produções costumava ser medido por métricas tradicionais, como o número de citações (fator de impacto). Com a popularização da internet, a crescente utilização das mídias sociais e, em especial, as discussões sobre Ciência Aberta, emergiu a necessidade de, também, comunicar os resultados das pesquisas científicas ao público não especializado.

Se os resultados das pesquisas científicas, ainda são, em sua maioria, publicados por meio dos periódicos científicos, vislumbra-se a potencialidade de que, também, sejam os protagonistas na popularização da ciência, dando evidência aos cientistas e suas instituições de vínculo (Barata, 2010BARATA, G. F. Nature e Science: mudanças na comunicação da ciência e a contribuição da ciência brasileira (1936-2009). 2010. Tese (Doutorado em História) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.).

Desse modo, o impacto das produções científicas pode, além das métricas tradicionais, ser medido por indicadores alternativos, próprios dos ambientes digitais, como visibilidade e engajamento. Para além desse aspecto, nosso olhar se volta para o público leigo, no intento de que as redes sociais públicas sejam, de fato, utilizadas para comunicar ciência de maneira inteligível a qualquer pessoa. Nas subseções que se seguem, apresentam-se os constructos teóricos que respaldam as necessidades tanto de medição de impacto, quanto de práticas de divulgação científica.

2.1 A comunicação científica pelo viés da divulgação

A comunicação científica é um termo amplo que, em consonância com Bufrem (2019BUFREM, L. S. Comunicação do conhecimento científico. Brasília: CAPES - UAB; Rio de Janeiro: Departamento de Biblioteconomia, FACC/UFRJ, 2019.), engloba as atividades de produção, disseminação e uso da informação científica. Entretanto, há uma distinção clara entre suas práticas: as comumente destinadas aos pares, ou seja, aos cientistas dentro do mesmo campo científico, sendo formalmente definidas como comunicação ou disseminação científica; e àquelas remetidas ao público leigo (ou não especializado), a chamada divulgação ou popularização científica (Caribé, 2015CARIBÉ, R. de C. do V. Comunicação científica: reflexões sobre o conceito. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.25, n.3, p. 89-104, setembro/dezembro, 2015.).

Quando se fala na primeira, os canais utilizados são, predominantemente, os periódicos científicos. As publicações veiculadas por esses canais cumprem uma das funções pretendidas pela comunicação científica que é transmitir o conhecimento adquirido, após o rigor da avaliação pelos pares (Bernal, 1946BERNAL, J. D. The social function of science. London: George Routledge & Son LTD, 6874, Carter Lane, E-C, 1946. 482 p.), uma característica que se mantém inalterada, desde os periódicos exclusivamente impressos.

Ocorre que esse tipo de publicação tem, na maioria das vezes, uma linguagem que é própria dos membros das instituições de pesquisa, com termos técnicos e expressões rebuscadas que dificultam seu entendimento pelo público não especializado. A divulgação ou popularização científica surge para mitigar essa lacuna e tornar a ciência e, consequentemente, seus resultados acessíveis e compreensíveis ao público leigo.

Torna-se importante, então, que as instituições de pesquisa e os pesquisadores se preocupem com a democratização do conhecimento científico, desde as primeiras etapas da produção das pesquisas. Tal democratização, aliada a processos colaborativos de desenvolvimento de pesquisas científicas, são alguns dos objetivos do movimento pela Ciência Aberta (Packer; Santos, 2019PACKER, A. L.; SANTOS, S. Ciência aberta e o novo modus operandi de comunicar pesquisa - Parte I [online]. SciELO em Perspectiva, [São Paulo, SP], 2019. Disponível em: https://acesse.dev/c5AOT. Acesso em: 23 fev. 2023.
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), o qual prevê ações como iniciativas governamentais, abertura gradual da revisão por pares, publicação de manuscritos científicos que comuniquem resultados de pesquisas, preferencialmente, em acesso aberto, compartilhamento de dados científicos (desde que não sejam protegidos por lei, como é o caso dos dados pessoais), entre outras iniciativas.

Pereira (2022PEREIRA, D. R. M. Os impactos da ciência aberta na divulgação científica. Leitura: Teoria & Prática, Campinas, SP, v. 40, n. 86, p. 69-86, 2022. Disponível em: https://ltp.emnuvens.com.br/ltp/article/view/943/678. Acesso em 23 fev. 2023.
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, p. 75) alerta que “[...] possíveis e esperados efeitos desse movimento são o compromisso social da ciência e a maior visibilidade e reconhecimento dos pesquisadores”, acrescenta-se o fato de que a divulgação científica pode “[...] despertar o interesse da opinião pública em geral pelos assuntos da ciência [...]” (Brandão, 2006BRANDÃO, E. P. Usos e significados do conceito comunicação pública. In: ENCONTRO DOS NÚCLEOS DE PESQUISA DA INTERCOM, 6, 2006, Brasília. Anais do [...]. São Paulo, SP: Intercom, 2006. Disponível em: https://encurtador.com.br/ELQ09. Acesso em: 23 fev. 2023.
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, p. 3).

No Brasil, motivados pelo ensejo em aprimorar e criar ações e políticas públicas de popularização da ciência o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) realizam, de tempos em tempos, a pesquisa “Percepção Pública da Ciência e Tecnologia (C&T)”. A primeira foi realizada em 1987 e as demais em 2006, 2010, 2015 e 2019. Os resultados dessa última apontam que 61% dos entrevistados afirmaram ser “interessados” ou “muito interessados” em C&T, principalmente, nos temas de saúde, meio ambiente e tecnologia (Brasil, 2019).

A referida pesquisa (Brasil, 2019) apontou, também, que, embora o consumo de informações sobre C&T, por meio das diferentes mídias de comunicação, esteja sempre abaixo de 22%, houve uma alteração significativa, de 2015 para 2019, entre aqueles que utilizam as mídias para se informar sobre esses temas, destacando que a internet ultrapassou a televisão como principal fonte de informação sobre C&T, entre todas as faixas etárias e classes sociais pesquisadas.

Desse modo, é necessário refletir sobre como os resultados das pesquisas científicas chegam ao público não especializado. Ademais, uma justificativa simples e plausível sobre a importância da divulgação científica se dá pelo fato de que tudo ao nosso redor é fruto do conhecimento adquirido, assim como citado por Bernal (1946BERNAL, J. D. The social function of science. London: George Routledge & Son LTD, 6874, Carter Lane, E-C, 1946. 482 p.), ou seja, fruto de ciência, desde a cadeira ou a estrutura predial do imóvel em que nos encontramos agora, lendo esse texto, até os inúmeros processos, análises e testes que culminam em vacinas, que possibilitam proteção contra doenças e ampliam a expectativa de vida da população.

Nesse contexto, emerge o fato de que a pandemia da Covid 19, que dizimou mais de 6 milhões de indivíduos em todo o planeta, fez crescer nas pessoas, de maneira geral, o interesse pela ciência, num misto de curiosidade, sobre como os estudos são realizados, e de esperança, para que fossem encontradas soluções, antes que se tivesse a própria vida, ou a de pessoas queridas, ceifadas.

Ponderando que, no Brasil, a última pesquisa sobre a percepção pública da ciência foi realizada em 2019, ou seja, num período anterior à pandemia, acredita-se que o próximo estudo desta série a ser realizado trará um perfil de indivíduos ainda mais interessados pela temática da C&T. Entretanto, paralelamente ao interesse, surgem preocupações: a desinformação e a manipulação de conteúdos. Este entendimento coaduna com os resultados de um estudo nacional conduzido pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e da Tecnologia (INCT-CPCT), em 2022, no qual verificou-se que no Brasil a confiança na ciência foi afetada negativamente por campanhas de desinformação durante a pandemia da Covid 19, logo “[...] o papel de políticas de divulgação científica e de educação em ciências mais sólidas, continuadas e bem estruturadas fica evidente [...]” (INCT-CPCT, 2022).

Assim, defende-se que a desinformação se combate compartilhando informações verídicas, divulgando adequadamente, de maneira inteligível, conhecimentos científicos (INCT-CPCT, 2022). Ainda assim, há de se considerar que o caminho não é tão simples, não basta transpor os conteúdos de um periódico científico para uma rede social digital, que possui linguagem e estética de conteúdo próprias. Na próxima seção apresenta-se uma reflexão sobre o uso das mídias sociais na divulgação científica.

2.2 Mídias Sociais e ciência

Iniciaremos as reflexões sobre mídias sociais, situando-as num contexto anterior, o da internet, que pode ser vislumbrada tanto a partir dos aspectos de infraestrutura tecnológica, quanto com base nas ideias que vêm emergindo e se modificando com ela, ao longo dos anos (Spyer, 2011SPYER, J. Nem santa nem bruxa: a Internet é você. In: BRAMBILLA, A. (org.). Para entender as mídias sociais. Salvador: Edições VNI, 2011.). Esse artigo se enquadra no segundo caso, mais especificamente, na revolução causada pelas mídias sociais.

Desde seu surgimento, idos de 1960, e até os dias de hoje, a internet vem sendo aprimorada e apropriada por diferentes nações e indivíduos, para as mais distintas finalidades. Muitos desses avanços foram possíveis graças à reestruturação do capitalismo, na década de 1970 (Castells, 1999CASTELLS, M. A sociedade em rede. Tradução de Roneide Venancio Majer. São Paulo, SP: Paz e Terra, 1999. 698 p. (A era da informação : economia, sociedade e cultura, v.1). ISBN 9788577530366.) e do fomento de muitos países, como EUA, China e Japão, que tinham interesses econômicos e políticos no desenvolvimento rápido de tecnologias de informação e comunicação (TICs).

As TICs, tanto do ponto de vista ferramental, quanto lógico, referindo-se aos sistemas informacionais, são as principais responsáveis pelo crescimento exponencial de informação circulante, por exemplo, os celulares que atualmente acumulam diversas funções e são responsáveis pela disseminação rápida e quase instantânea de conteúdos, em diferentes formatos. Com isso, a comunicação mediada por esses equipamentos tecnológicos, computadores, celulares, tablets etc. tem o poder de gerar comunidades virtuais, a chamada Web social (Valerio, 2012VALERIO, P. M. Comunicação científica e divulgação: o público na perspectiva da Internet. In: PINHEIRO, L. V. R.; OLIVEIRA, E. da C. P. de (org.). Múltiplas facetas da comunicação e divulgação científicas: transformações em cinco Séculos. Brasília: Ibict, 2012. p. 150-167.).

Valerio (2012VALERIO, P. M. Comunicação científica e divulgação: o público na perspectiva da Internet. In: PINHEIRO, L. V. R.; OLIVEIRA, E. da C. P. de (org.). Múltiplas facetas da comunicação e divulgação científicas: transformações em cinco Séculos. Brasília: Ibict, 2012. p. 150-167.) acrescenta que nessas comunidades, usuários e criadores de conteúdos se confundem e há uma relação muito próxima entre os processos sociais estabelecidos, onde uma pessoa produz, por exemplo, um material audiovisual, mas ele é manipulado, compartilhado, assimilado por um número incontável de pessoas. Desse modo, embora em alguns momentos se tenha a sensação de que a tecnologia exista como um fim em si mesma, os indivíduos é que representam a revolução atual da internet, na qual as mídias sociais, em especial as redes sociais, têm proporcionado os diversos tipos de interações, quase sempre instantâneas, cujo alcance e tipos de manipulações derivados é algo inimaginável.

Clementi et a.l (2017CLEMENTI, J. A. et al. Mídias sociais e redes sociais: conceitos e características. In: SEMINÁRIO UNIVERSIDADES CORPORATIVAS E ESCOLAS DE GOVERNO. 1, 2017, Florianópolis. Anais do [...]. Florianópolis: [s.n.], 2017, p. 456-465. Disponível em: https://anais.suceg.ufsc.br/index.php/suceg/article/view/80/33. Acesso em: 14 jul. 2023.
https://anais.suceg.ufsc.br/index.php/su...
, p. 459-460) ao fazerem uma análise das diferentes definições existentes na bibliografia para o termo mídias sociais ponderam que há entre elas “ [...] o consenso de que um usuário comunica determinado conteúdo (informação, conhecimento, ideia…) num ambiente que propicia a interação”. Nesse mesmo sentido, Recuero (2011RECUERO, R. A nova revolução: as redes são as mensagens. In: BRAMBILLA, A. (org.). Para entender as mídias sociais. Salvador: Edições VNI, 2011., p.14) traz que mídias sociais compreendem um “[...] conjunto de novas tecnologias de comunicação mais participativas, mais rápidas e mais populares e as apropriações sociais que foram e que são geradas em torno dessas ferramentas”.

Ao mencionar as apropriações sociais, se estabelecem conexões com as interações dos próprios indivíduos, uma vez que, sendo seres sociais, estão constantemente constituindo laços e trocas com outros, isso é o que, de fato, pode-se chamar de redes sociais, e elas ocorrem tanto nas vivências no ambiente físico, quanto no virtual. Os ambientes digitais potencializam essas redes, ampliam o número de pessoas com quem se pode criar relações, aparecendo um conceito subjacente, o das plataformas digitais de redes sociais (Recuero, 2011RECUERO, R. A nova revolução: as redes são as mensagens. In: BRAMBILLA, A. (org.). Para entender as mídias sociais. Salvador: Edições VNI, 2011.).

Nessas plataformas, as redes sociais estão permanentemente conectadas e possibilitam comunicações tanto síncronas, quanto assíncronas onde “[...] a informação circula, é filtrada e repassada; conectada à conversação, onde é debatida, discutida e, assim, gera a possibilidade de novas formas de organização social baseadas em interesses das coletividades” (Recuero, 2011RECUERO, R. A nova revolução: as redes são as mensagens. In: BRAMBILLA, A. (org.). Para entender as mídias sociais. Salvador: Edições VNI, 2011., p.15).

Muitos são os estudos que analisam os perfis em plataformas digitais de redes sociais com base em uma multiplicidade infinita de interesses, como a pesquisa de postagens sobre o zika vírus no Twitter e Facebook (Barata; Shores; Alperin, 2018BARATA, G. F.; SHORES, K.; ALPERIN, J. P. Local chatter or international buzz? Language differences on posts about Zika research on Twitter and Facebook. PLoS UM, San Francisco, EUA, v. 13, n.1, 2018.) ou o uso de redes sociais para o ensino de Astronomia (Silva Filho; Galluzzi, 2021SILVA, I. O. da; GOUVEIA, F. C. Engajamento informacional nas redes sociais: como calcular?. AtoZ: novas práticas em informação e conhecimento, Curitiba, PR, v. 10, n. 1, p. 94 - 102, 2021. DOI: http://dx.doi.org/10.5380/atoz.v10i1.76633.
http://dx.doi.org/10.5380/atoz.v10i1.766...
). No artigo aqui apresentado, volta-se, especificamente, para os perfis no Instagram, Facebook e Twitter dos periódicos científicos brasileiros com Qualis A1 e A2, na área de avaliação da CAPES Comunicação e Informação (C&I). O questionamento busca entender se os conteúdos de divulgação de resultados de pesquisas científicas publicados por eles são voltados para o público leigo ou apenas uma transposição da comunicação científica para essas mídias. Além da indagação sobre os impactos das produções científicas diante de tais postagens.

Na próxima subseção apresentam-se motivações, pelas quais os periódicos científicos brasileiros criam perfis em redes sociais públicas, ao mesmo tempo em que se tenta sanar as questões postas anteriormente, no que concerne à divulgação científica.

2.3 Altmetria e Divulgação Científica

O surgimento da imprensa e, posteriormente, do computador representou uma revolução no modo de se divulgar os resultados das pesquisas científicas. Se, em seus primórdios, utilizavam-se basicamente cartas ou eventos acadêmicos, com os mecanismos da impressão e depois da internet foi possível disseminar as descobertas científicas a um número maior de pares, chegando, inevitavelmente, a quantidades de publicações científicas que se multiplicam de maneira exponencial (Gomes; Santos; Reis, 2020GOMES, S. H. de A.; SANTOS, A. P. dos; REIS, F. Ciclo da comunicação científica: estrutura e evolução. In: GOMES, Suely Henrique; et al (org). Letramento informacional: entendendo a ciência e a comunicação científica. Goiânia: Gráfica UFG, 2020.).

Diante disso, surgiram preocupações da comunidade científica quanto à qualidade e impacto daquilo que tem sido publicado. Sobre o problema da qualidade, um dos caminhos encontrados foi a revisão por pares, pela qual o resultado de uma pesquisa passa a ter mais confiabilidade e credibilidade quando avaliado por outros pesquisadores dentro do mesmo campo científico (Miranda; Carvalho; Costa, 2018MIRANDA, A. C. C. de; CARVALHO, E. M. R. de; COSTA, M. I. da. O impacto dos periódicos na comunicação científica. Biblos: Revista do Instituto de Ciências Humanas e da Informação, Rio Grande, RS, v. 32, n. 1, p. 1-22, jan./jun. 2018.). Para a segunda inquietação, os pesquisadores Eugene Garfield e Irving H. Sher, na década de 1960, criaram o fator de impacto (FI), um cálculo simples no qual se estabelece a razão entre o número de citações dos itens publicados em um periódico nos últimos dois anos e o número de artigos publicados neste mesmo período, por este mesmo periódico (Fachin, 2022FACHIN, J. Métricas alternativas e suas aplicações: mapeamento do conhecimento científico em torno da altmetria. 2022. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Universidade Federal de Santa Catarina - Centro de Ciências da Educação, Florianópolis.). O FI pode ser melhor compreendido pela Figura 1.

Figura 1.Cálculo
do Fator de Impacto

Um “bom fator de impacto” pode variar a depender da área ou do escopo da revista, uma vez que, ele serve apenas para criar um ranking e comparar os periódicos que possuem melhor classificação em relação a outro. Desse modo, o FI passou, também, a ser utilizado como um indicador de qualidade (em paralelo à revisão por pares) dos periódicos científicos.

A popularização da internet e das mídias sociais, somada à emergência de práticas de Ciência Aberta, ou seja, “[...] o acesso, o compartilhamento, a cooperação, transparência, a ética entre outros aspectos evolutivos do fazer da comunicação científica” (Fachin, 2022FACHIN, J. Métricas alternativas e suas aplicações: mapeamento do conhecimento científico em torno da altmetria. 2022. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Universidade Federal de Santa Catarina - Centro de Ciências da Educação, Florianópolis., p. 16) fizeram com que medidas como essas, do FI, embora úteis, se tornassem insuficientes.

Surgiu, então, a altmetria, na tentativa de suprir a necessidade de métricas alternativas que avaliassem o impacto das publicações no ambiente online, por conseguinte, nas mídias sociais (Priem et al., 2010PRIEM, J., TARABORELLI, D., GROTH, P., NEYLON, C. Altmetrics: a manifesto. 2010. Disponível em: http://altmetrics.org/manifesto. Acesso em 11 nov. 2022.
http://altmetrics.org/manifesto...
).

Fachin (2022FACHIN, J. Métricas alternativas e suas aplicações: mapeamento do conhecimento científico em torno da altmetria. 2022. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Universidade Federal de Santa Catarina - Centro de Ciências da Educação, Florianópolis.) apresenta um compilado de indicadores alternativos de impactos, nas perspectivas de vários teóricos (Quadro 1).

Quadro 1
Indicadores alternativos de impacto da produção científica em ambiente online

Com base no Quadro 1, infere-se que cada indicador pode ser utilizado para mensurar um comportamento específico da comunicação científica (Fachin, 2022FACHIN, J. Métricas alternativas e suas aplicações: mapeamento do conhecimento científico em torno da altmetria. 2022. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Universidade Federal de Santa Catarina - Centro de Ciências da Educação, Florianópolis.), sendo que não há uma métrica a ser usada exclusivamente, ou que possa ser considerada melhor que as outras. Cada indicador pode ser utilizado de acordo com a análise que se deseja fazer, inclusive, em concomitância com as métricas tradicionais.

Observa-se ainda que, em geral, quando se trata de redes sociais públicas, esses indicadores não analisam especificamente o conteúdo publicado. Isso quer dizer que em postagens com bom engajamento (número elevado de curtidas, comentários ou compartilhamentos) não se verifica se possui conteúdo e linguagem compreensíveis ao público não especializado.

Retorna-se, então, ao dilema do aumento exponencial do número de produções científicas e a necessidade de que os resultados de tais pesquisas sejam inteligíveis não somente à própria comunidade científica. Acerca disso, Valério (2012, p. 154) pondera que “desde os seus primórdios, o sistema de comunicação da ciência depara-se com a relação crescimento da informação versus distribuição, tendo já algum tipo de tecnologia como auxiliar na solução dos novos fluxos de informação, demandadas ou não pela sociedade”.

Pode-se afirmar que o Acesso Aberto, precursor do Movimento em prol da Ciência Aberta, possibilita que qualquer pessoa, especializada ou não, tenha acesso aos resultados das pesquisas científicas na forma de artigos ou outros manuscritos. Quando se retoma a preocupação da Ciência Aberta com práticas científicas mais colaborativas, transparentes e acessíveis, não se pode perder de vista que, por acessível, “se faz necessário que o conhecimento erudito seja repassado e entendido por maior parcela da população, numa relação dialética entre a ciência e público” (Valerio, 2012VALERIO, P. M. Comunicação científica e divulgação: o público na perspectiva da Internet. In: PINHEIRO, L. V. R.; OLIVEIRA, E. da C. P. de (org.). Múltiplas facetas da comunicação e divulgação científicas: transformações em cinco Séculos. Brasília: Ibict, 2012. p. 150-167., p. 154).

Democratização do conhecimento científico ao público leigo já seria uma boa justificativa para que os resultados das pesquisas científicas também fossem divulgados nas redes sociais públicas, mas é inquestionável que os periódicos científicos compõem um universo, na maioria das vezes, acadêmico, cujas preocupações extrapolam a divulgação científica e se assentam em exigências institucionais, de órgãos financiadores e de preocupações com a qualidade e impacto dos conteúdos publicados. Logo, as determinações do universo acadêmico podem impulsionar a presença dos periódicos científicos nas redes sociais públicas, como se elucidará a seguir.

Se nota que, desde meados de 2010, com o Manifesto de Priem et al. (2010PRIEM, J., TARABORELLI, D., GROTH, P., NEYLON, C. Altmetrics: a manifesto. 2010. Disponível em: http://altmetrics.org/manifesto. Acesso em 11 nov. 2022.
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), o impacto das publicações científicas passa a ser medido, também, por métricas alternativas, como a presença em plataformas de redes sociais. Inclusive, bases indexadoras, como a Scientific Eletronic Library Online (SciELO), versão Brasil, já avaliam o desempenho individual dos periódicos científicos, para admissão e permanência na Coleção SciELO Brasil, com critérios que incluem indicadores de presença nas redes sociais, tanto acadêmicas, quanto públicas (SciELO Brasil, 2020).

No mesmo sentido, agências de fomento às pesquisas brasileiras, como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), têm incluído em seus editais de concessão de financiamento, a necessidade de elaboração de um Plano de Divulgação Científica, com vistas a “[...] contribuir com a popularização da ciência e incluir todas as atividades destinadas a fazer a difusão do conhecimento científico para o público não especializado” (CNPq, 2022).

Além disso, a partir das orientações da Parceria para Governo Aberto (Open Government Partnership - OGP), aderida por mais de 78 países, o Brasil, em seu 5º Plano de Ação, estabeleceu no Compromisso 8 - Transparência em Ciência: novos mecanismos de avaliação para o avanço da Ciência Aberta, o Marco 4 - Proposição de Indicadores de Métricas Alternativas (altmetrics) para medição de Impacto de Pesquisas Científicas (Brasil, 2021). Iniciativas que demonstram que os órgãos brasileiros, envolvidos com pesquisas científicas, estão empenhados em práticas científicas mais abertas e acessíveis a todos os públicos. Entretanto, este artigo foi construído com base na hipótese de que os conteúdos publicados nas redes sociais públicas, nos perfis de periódicos científicos, permanecem sendo destinados à comunidade científica e não ao público não especializado.

Defende-se, em consonância com Cosmo, Sena e Muriel-Torrado (2021), que no contexto da divulgação científica a utilização das mídias sociais pelos periódicos científicos requer definição clara de quais métricas se deseja alcançar, a produção de conteúdos a partir do delineamento do público-alvo e constante avaliação, monitoramento e eventuais ações de melhorias de tais conteúdos. Portanto, busca-se nesse estudo estabelecer uma relação entre métricas alternativas de impacto e divulgação científica, valendo-se de uma seleção de métricas apontadas no Quadro 1 e da análise de conteúdo das páginas de periódicos científicos brasileiros, apontados como A1 e A2 na área de avaliação da CAPES C&I, no Instagram, Facebook e Twitter.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Do ponto de vista da abordagem, este é um estudo misto, trazendo um levantamento informacional com características quantitativas e qualitativas. Quanto aos procedimentos e objetivos, o estudo utiliza a metodologia e técnica de análise de conteúdo, cujo escopo será delineado a seguir, conforme Bardin (2011BARDIN, L. A análise de conteúdo. Tradução Luís Antero Neto e Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011.).

Em relação à abordagem de análise de conteúdo, Bardin (2011BARDIN, L. A análise de conteúdo. Tradução Luís Antero Neto e Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011.) aponta para a natureza quanti-qualitativa desse tipo de estudo, sendo que a abordagem quantitativa é mais objetiva, pois a quantificação dos dados descritivos é mais bem controlada. Já a abordagem qualitativa é adaptável ao fenômeno que se avalia. Além disso, Bardin (2011) defende o estabelecimento de hipóteses.

Bardin (2011BARDIN, L. A análise de conteúdo. Tradução Luís Antero Neto e Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011., p. 145) apresenta que é importante considerar o contexto da mensagem, ou seja, “quem é que fala e a quem e em que circunstâncias”. Logo, “a quem se fala” se mostra como ponto crucial deste estudo. No qual verificamos se “quem é que fala”, no caso os periódicos científicos brasileiros apontados como A1 e A2 na área de avaliação da CAPES C&I, estão “falando” apenas aos pares ou também para o público não especializado.

Ainda segundo Bardin (2011BARDIN, L. A análise de conteúdo. Tradução Luís Antero Neto e Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011.), estudos que se dispõem a realizar análise de conteúdo, o fazem a partir de algumas etapas, as quais serão caracterizadas de acordo com o estudo realizado.

1 - Pré-análise: no primeiro momento, optou-se pela área de avaliação C&I da CAPES, pois é a área de pesquisa em que as autoras estão inseridas e, também, a área onde está concentrado um grande número de pesquisas que relacionam comunicação e divulgação científicas com as mídias sociais. Posteriormente, foram selecionados os periódicos científicos brasileiros avaliados como A1 e A2 na última avaliação publicada na página da CAPES na internet, até o momento do levantamento, em fevereiro de 2023, ou seja, a avaliação Qualis CAPES 2017-2020.

Partiu-se, então, para verificação das páginas na internet destes periódicos, selecionando-se aqueles que divulgam os links para suas redes sociais públicas e possuem foco e escopo correlatos às áreas básicas da C&I: Arquivologia, Biblioteconomia, Ciência da Informação, Comunicação, Jornalismo e Museologia, conforme documento de área da CAPES (2019).

Nesta pré-análise formou-se a hipótese de que os conteúdos publicados nas redes sociais públicas permanecem sendo destinados à comunidade científica e não ao público não especializado, para comprová-la ou refutá-la partiu-se para a próxima etapa da análise de conteúdo, discutida a seguir.

2 - Exploração do material: estabeleceu-se como recorte a análise das postagens dos periódicos da amostra nas redes sociais Instagram, Facebook e Twitter, nos últimos seis meses que antecederam o levantamento (agosto de 2022 a janeiro de 2023). Para a coleta dos dados foi utilizado o modelo apresentado no Quadro 2, com informações gerais sobre a página analisada e sobre cada postagem.

Nesse momento, foi possível estabelecer relações com os indicadores alternativos de impacto da produção científica em ambiente online apresentados no Quadro 1. Além disso, cada postagem foi categorizada em uma das sete opções: A - Promoção de manuscrito científico, número ou volume; B - Sobre; C - Chamadas; D - Links externos; E - Eventos; F - Datas comemorativas; G - Outra. Esse processo de categorização agrupa as postagens em “unidades analíticas que materializam as questões a serem verificadas” (Sampaio; Lycarião, 2021SAMPAIO, R. C.; LYCARIÃO, D. Análise de conteúdo categorial: manual de aplicação. Brasília: Enap, 2021., p. 58) o que permite uma análise quali-quantitativa dos conteúdos veiculados nas páginas dos periódicos nas redes sociais.

Quadro 2
Planilha para coleta dos dados

A partir do objetivo da pesquisa, voltou-se para as postagens categorizadas como “Promoção de manuscrito científico, número ou volume”. Desse modo, realizou-se o tratamento dos resultados, última etapa da análise de conteúdo, segundo Bardin (2011BARDIN, L. A análise de conteúdo. Tradução Luís Antero Neto e Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011.), e que será apresentada na próxima seção.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A área de avaliação da CAPES denominada “Comunicação e Informação” (C&I) “é constituída pelas áreas básicas Comunicação, Ciência da Informação e Museologia e abrange programas de Pós-Graduação em Arquivologia, Biblioteconomia, Ciência da Informação, Comunicação, Jornalismo e Museologia” (CAPES, 2019, p. 3).

Considera-se que a comunicação e a informação são elementos de empoderamento do indivíduo e se abrem para as possibilidades de emancipação social. Entretanto, estes elementos, em geral, não estão acessíveis a determinadas camadas sociais, dificultando a reflexão e a crítica sobre fatos e situações vivenciadas na realidade (CAPES, 2019, p. 3).

Nessa perspectiva é que se reconhece que os pesquisadores e periódicos da área possuem o potencial inovador de responder à emergente necessidade de divulgação científica, sobretudo, em observância à Ciência Aberta e ao direito de acesso à informação.

A CAPES, no documento de apresentação da referida área, aponta para a sua expansão, que acompanha o crescimento dos números de programas de pós-graduação e de periódicos científicos no Brasil, essencialmente a partir do ano 2000, paralelamente às transformações sociais, modernização das TICs e das mídias (CAPES, 2019).

Na avaliação da área C&I, para o período 2017-2020, foram identificados 273 e 288 periódicos com Qualis A1 e com Qualis A2, respectivamente, dos quais 115 e 140 são brasileiros.

As problemáticas sociais, principais motivadoras das investigações nos campos científicos da C&I, a saber: da Comunicação, Ciência da Informação, Museologia, Biblioteconomia, Arquivologia e afins; têm evidenciado uma característica contemporânea, o caráter multi/pluri, inter e/ou transdisciplinar das pesquisas científicas, o que faz com que pesquisadores de uma área temática publiquem os resultados de suas pesquisas em periódicos científicos de uma diversidade de focos e escopos. Isso justifica o aumento do número de periódicos brasileiros avaliados dentro da área C&I, quando se comparam as duas últimas avaliações Qualis Capes (Gráfico 1).

Gráfico 1
Número de periódicos brasileiros avaliados na área C&I da CAPES

Vale ressaltar que as quantidades expressas no Gráfico 1 excluem as repetições, pois alguns títulos aparecem tanto em suas versões impressas, quanto eletrônicas. Além disso, embora os valores da avaliação 2017-2020 sejam maiores, quando analisamos o foco e escopo dos periódicos em suas páginas na internet, nota-se que aqueles que se relacionam à Área C&I aparecem em menor quantidade (Gráfico 2).

Essa constatação foi possível por meio de consulta nas páginas web de cada um dos 255 periódicos brasileiros avaliados como A1 e A2 dentro da referida área. Ao verificar o foco e o escopo de cada periódico notou-se que almejam a publicação de uma variedade de temas, a saber: Administração e assuntos correlatos; Educação, ensino e afins; Antropologia; História; Geografia; Ciências Sociais; Política; Direito; entre outros e que apenas 23 periódicos publicam artigos sobre Arquivologia, Biblioteconomia, Ciência da Informação, Comunicação, Jornalismo e Museologia, concernentes à Área Comunicação e Informação da CAPES.

Gráfico 2
Comparativo da quantidade de periódicos da C&I em relação ao total de periódicos avaliados dentro da mesma área para o período 2017-2020

Conforme o Gráfico 2, os sete periódicos brasileiros avaliados como A1 são: Acervo: Revista do Arquivo Nacional; Anais do Museu Paulista; Estação Científica; Matrizes; Opinião Pública; Texto Livre; Transinformação, destes, três divulgam em suas páginas web os links para suas redes sociais públicas, conforme apresentado no Quadro 3.

Os 16 periódicos avaliados como A2, dentro da mesma área, tratam-se de: Brazilian Journalism Research; E-Compós (Brasília); Em Questão; Encontros Bibli; Habitus; Infodesign; Informação & Informação; Informação & Sociedade; Intercom (São Paulo); Perspectivas em Ciência da Informação; Politics; Revista CPC (USP); Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia; Revista Famecos; Revista Memória em Rede; Revista Observatório, dos quais quatro foram selecionados por divulgarem os links para suas redes sociais (Quadro 3).

Quadro 3
Periódicos utilizados no estudo

No Quadro 3 nota-se que apenas dois periódicos possuem perfis nas três redes sociais públicas pesquisadas, entretanto, de maneira geral, aqueles que possuem página em mais de uma rede social realizam as mesmas postagens em ambas, com pequenas variações, normalmente possibilitadas pelas funcionalidades daquela rede.

No Quadro 4 apresentam-se características dos periódicos da amostra, bem como de suas páginas nas redes sociais. Destaca-se que foram analisadas as postagens de agosto de 2022 a janeiro de 2023.

Quadro 4
Características dos periódicos e seus perfis nas redes sociais pesquisadas. Período agosto de 2022 a janeiro de 2023

Todas as postagens (Quadro 4) foram categorizadas em uma das opções: A - Promoção de manuscrito científico, número ou volume; B - Sobre; C - Chamadas; D - Links externos; E - Eventos; F - Datas comemorativas; G - Outra, sendo que as categorias A e C foram as mais expressivas em todos os perfis analisados (Gráfico 3).

Gráfico 3
Categorização das postagens de todas as páginas analisadas

De acordo com as análises que geraram o Gráfico 3, mais de 50% das postagens de agosto de 2022 a janeiro de 2023 (em azul no gráfico) referem-se a novas publicações dos periódicos, sendo um novo artigo ou novo número (ou volume). Em segundo lugar, são comuns chamadas para próximas publicações (17% - em verde no gráfico) ou repostagens de conteúdos correlatos à área de interesse do periódico, com links que levam para outras páginas ou sites (16% - em roxo no gráfico).

Como mencionado, os periódicos que possuem mais de uma rede social realizam as mesmas postagens em ambas. Nesse caso, a postagem foi computada apenas uma vez e registradas as interações nas diferentes redes, quando havia. Por exemplo: Postagem X (interações no Instagram; interações no Facebook; interações no Twitter).

A partir desse levantamento, retomou-se o objetivo inicial de analisar o engajamento dos conteúdos de divulgação de resultados de pesquisas científicas, publicados nas redes sociais públicas pelos periódicos, buscando verificar se os mesmos são voltados para o público leigo ou apenas uma transposição da comunicação científica para essas mídias.

Desse modo, esse estudo focou nas postagens categorizadas como “A - Promoção de manuscrito científico, número ou volume”, sendo analisadas as seguintes quantidades de postagens para cada periódico: Acervo: Revista do Arquivo Nacional - 107; Transinformação - 12; Em Questão - 34; Encontros Bibli - 4; Perspectivas em Ciência da Informação - 15; Revista Observatório - 1. O periódico Texto Livre não postou nenhum conteúdo com a referida categoria no período analisado.

Como o estudo prevê uma análise quanti-qualitativa, realizou-se um cálculo de engajamento informacional, conforme proposto por Silva e Gouveia (2021SILVA, I. O. da; GOUVEIA, F. C. Engajamento informacional nas redes sociais: como calcular?. AtoZ: novas práticas em informação e conhecimento, Curitiba, PR, v. 10, n. 1, p. 94 - 102, 2021. DOI: http://dx.doi.org/10.5380/atoz.v10i1.76633.
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) na Figura 2 e uma análise da linguagem empregada nas postagens, verificando se utiliza apenas termos científicos para promover o conteúdo do periódico ou se há um esforço em comunicá-lo de maneira inteligível ao público não especializado.

Figura 2
Cálculos para Engajamento Total da Amostra (ETA)

Segundo Silva e Gouveia (2021SILVA, I. O. da; GOUVEIA, F. C. Engajamento informacional nas redes sociais: como calcular?. AtoZ: novas práticas em informação e conhecimento, Curitiba, PR, v. 10, n. 1, p. 94 - 102, 2021. DOI: http://dx.doi.org/10.5380/atoz.v10i1.76633.
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) a utilização das cinco fórmulas apresentadas na Figura 2 permite um cálculo de engajamento informacional aplicável às diferentes redes sociais, uma vez que se definem pesos para cada uma das ferramentas disponíveis naquela rede. No Twitter e no Facebook, por exemplo, há a opção de retweetar / compartilhar conteúdo postado por outro perfil em sua própria página, mas no Instagram esse compartilhamento só é possível via direct (mensagens privadas), o que impossibilita a contagem desse tipo de interação. Desse modo, pode-se adaptar a fórmula de acordo com o número de ferramentas disponíveis. No caso do Instagram, no denominador das fórmulas (2), (3) e (4), multiplicou-se o ETA por dois.

Os Quadros 5, 6 e 7 retratam o cenário dos conteúdos da categoria A, postados nas redes sociais Instagram, Facebook e Twitter, o engajamento encontrado a partir da aplicação das fórmulas apresentadas na Figura 2 e, na última coluna, uma proporção simples entre o engajamento encontrado e o número de seguidores na página do periódico pesquisado.

O cálculo de proporção se fez necessário, uma vez que as fórmulas elaboradas por Silva e Gouveia (2021SILVA, I. O. da; GOUVEIA, F. C. Engajamento informacional nas redes sociais: como calcular?. AtoZ: novas práticas em informação e conhecimento, Curitiba, PR, v. 10, n. 1, p. 94 - 102, 2021. DOI: http://dx.doi.org/10.5380/atoz.v10i1.76633.
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) foram inicialmente pensadas para criar um ranking de engajamento entre as postagens. No estudo aqui proposto, todas as postagens analisadas nessa etapa da pesquisa são do mesmo tipo (categoria A) o que não justifica o estabelecimento do ranking. Em contrapartida, interessa ao estudo, uma relação entre o engajamento encontrado e a visibilidade (número de seguidores) da página.

Quadro 5
Análise das postagens de promoção de manuscrito científico, número ou volume (Categoria A) no Instagram

Ao comparar o Quadro 5 com os demais Quadros (6 e 7) observa-se que a relação Seguidores versus Engajamento é mais expressiva no Instagram. No Quadro 6, por exemplo, todos os periódicos da amostra que possuem página no Facebook apresentam número de seguidores acima de 1.000, mas para o mesmo cálculo da relação Seguidores versus Engajamento, os resultados ficam abaixo de 10%.

Quadro 6
Análise das postagens de promoção de manuscrito científico, número ou volume (Categoria A) no Facebook

Assim como nos Quadros 5 e 7, no Quadro 6, também, nota-se que a interação do tipo “comentário” é pouco utilizada e, quando ocorre, se trata, em geral, de elogios ou marcações de perfis de outros usuários na rede. Chama atenção o número de seguidores no Facebook da Revista Observatório, 28.000, portanto com uma boa abrangência e possibilidade de realizar divulgação científica nesse canal, porém, como se viu no Quadro 4, a referida revista realizou apenas seis postagens no período analisado e, destas, apenas uma referente à divulgação de um novo número.

Outro periódico com número expressivo de seguidores é a Acervo - Revista do Arquivo Nacional, que também está presente no Twitter (Quadro 7) com número de seguidores acima de 1.000.

Quadro 7
Análise das postagens de promoção de manuscrito científico, número ou volume (Categoria A) no Twitter

Relembrando que os periódicos que possuem páginas em mais de uma rede social realizam as mesmas postagens em ambas e que no total foram analisadas 173 postagens referentes à promoção de manuscrito científico, número ou volume, verificou-se que 169 delas combinam imagem e texto, sendo um cartaz com título da nova publicação e, quando se trata de manuscrito científico, nomes dos autores e uma descrição textual, com trechos do resumo da obra e link para a página web do periódico, assim como todas as postagens analisadas no Quadro 7.

As páginas no Instagram e Facebook do periódico “Encontros Bibli” se diferem, pois as quatro postagens referentes à promoção de manuscritos científicos são vídeos curtos, produzidos pelos pesquisadores e que explicam o teor da pesquisa. Além disso, o vídeo é acompanhado de um conteúdo textual com o título e resumo do manuscrito.

Tais análises permitem retomar a pesquisa brasileira sobre percepção pública da ciência, na qual nota-se que, na análise histórica, se manteve reduzida a fração de brasileiros que consegue mencionar o nome de um cientista ou instituição de pesquisa brasileiros (Brasil, 2019). Considera-se a Ciência Aberta para mitigar essa lacuna, por meio da ampliação da confiança da comunidade geral nos resultados das pesquisas científicas, realizadas colaborativamente, de modo transparente e comunicadas amplamente, tanto entre os pares, quanto ao público não especializado.

Se os manuscritos científicos, frutos das pesquisas científicas, ainda são, em sua maioria, publicados por meio dos periódicos científicos, estes são os atores dotados dos melhores recursos, como contato com os cientistas e obtenção em primeira mão dos resultados das pesquisas. Além disso, “a adesão intensa e acelerada dos brasileiros às mídias sociais se constitui em fato inconteste” (Bueno, 2018BUENO, W. da C. A divulgação científica no universo digital: o protagonismo dos portais, blogs e mídias sociais. In: PORTO, C.; OLIVEIRA, K. E., ROSA, F. Produção e difusão de ciência na cibercultura: narrativas em múltiplos olhares. Ilhéus, BA: Editus, 2018., p. 55), o que permite aos periódicos científicos utilizarem esses espaços para divulgação científica.

Essa divulgação científica pode ser encorajada pelas instituições de vínculo dos periódicos, pelas agências de fomento à pesquisa e pelos indexadores mais conceituados pela comunidade científica. Esses órgãos preocupam-se com a qualidade do que é publicado pelos periódicos científicos e pelo impacto das publicações científicas. Os indicadores alternativos de impacto, como a visibilidade e o engajamento, utilizados nesse estudo, são métricas que podem ajudar os periódicos a consolidarem suas páginas nas redes sociais.

5 CONCLUSÃO

Este estudo buscou analisar as páginas e postagens no Instagram, Facebook e Twitter dos periódicos científicos brasileiros avaliados com Qualis A1 e A2, pela CAPES, na avaliação 2017-2020, na área C&I. Objetivou-se mensurar o engajamento nas postagens realizadas de agosto de 2022 a janeiro de 2023 e se as mesmas possuíam conteúdo inteligível ao público não especializado. Com a apresentação dos resultados, na seção anterior, notou-se que a visibilidade mais expressiva dos periódicos é no Facebook, com número de seguidores acima de 1.000, mas a proporção “seguidores versus engajamento” mantém-se abaixo de 10%. As demais redes sociais, embora com número de seguidores inferior, apresentam valores mais altos para o mesmo cálculo de proporção.

Portanto, considera-se que as três redes sociais possuem potencialidade para expansão dos valores das métricas alternativas de impacto das produções científicas, mas precisam considerar, também, outro aspecto: o conteúdo das postagens.

Como se viu, com exceção de um periódico, as postagens selecionadas para a amostra do estudo, ou seja, aquelas categorizadas como sendo “Promoção de manuscrito científico, número ou volume” combinam uma imagem com elementos textuais (título do artigo e nomes dos autores) e uma descrição, também, textual, com resumo dos manuscritos científicos publicados na página web do periódico. Essa combinação é útil para informar os pares sobre o lançamento de novos manuscritos científicos, entretanto não se apresenta como a mais indicada para comunicar ciência ao público não especializado.

As afirmações do parágrafo anterior poderiam supor, equivocadamente, que o texto é um vilão nas práticas de divulgação científica, sobretudo, nas redes sociais. Entretanto, é preciso esclarecer que esse tipo de formato tem o potencial de mitigar barreiras que outros formatos exigem, como domínio de ferramentas de edição de imagem ou vídeo, estrutura física, aparelhos de gravação de som e imagem, entre outros. Diante deste contexto, parece correto afirmar que o essencial na divulgação científica não é o formato, mas sim a resposta à seguinte indagação: a quem se destina a sua postagem?

Se a resposta à pergunta apresentada anteriormente for “os pares”, por conseguinte, o modo como os periódicos têm publicado conteúdo nas redes sociais parece poder permanecer no mesmo caminho. Porém, se a intenção for avançar, no sentido de se alinhar às práticas de Ciência Aberta, principalmente, nos últimos estágios da comunicação científica, disseminação e uso, e, com isso, fortalecer a democratização ao conhecimento científico, há algumas possibilidades a serem consideradas pelos periódicos científicos no uso das redes sociais públicas.

Obviamente, práticas de divulgação científica requerem um profissional especializado, como um jornalista científico, ou uma equipe e cursos de formação específicos, entretanto sabese que a realidade das equipes dos periódicos, principalmente aqueles geridos pelas Instituições de Ensino Superior, são limitadas, com profissionais envolvidos em inúmeras outras atividades acadêmicas. Por motivos como esses, torna-se importante não perder de vista o público que se deseja alcançar, além da necessidade de um planejamento do que se deseja comunicar, com elementos básicos como tema geral, tema específico, informações relevantes, fechamento com possíveis reflexões e, sobretudo, linguagem inteligível.

Outro aspecto imprescindível na utilização das redes sociais é a interação com os seguidores, por meio de ferramentas como “seguir de volta”, resposta a comentários e perguntas, compartilhamento de conteúdos de terceiros sobre o escopo do periódico, visando atrair seguidores, utilização de linguagem simples e observância às especificidades das distintas redes. Essas ações, alinhadas à qualidade dos conteúdos publicados têm a capacidade de melhorar as métricas alternativas, como visibilidade e engajamento, e, por conseguinte, o impacto das produções científicas, especialmente, porque a presença nas redes sociais pode atrair novos leitores para a página web do periódico, gerando citações e fortalecimento, também, das métricas tradicionais.

Como limitações do estudo, pode ser citado o fato de que 16 periódicos da área C&I, avaliados como A1 e A2 não foram incluídos na amostra por não divulgarem em suas páginas web a existência de perfis nas redes sociais pesquisadas.

Como complemento, para estudos futuros, vislumbra-se a possibilidade de aplicação de questionários online junto a editores de periódicos científicos, no intuito de identificar o quão comprometidos estão com a Ciência Aberta e interessados em promover uma divulgação científica efetiva.

Reconhecimentos

Não aplicável.

REFERÊNCIAS

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  • Financiamento:

    Não aplicável.
  • Aprovação ética:

    Não aplicável.
  • Disponibilidade de dados e material:

    Os conjuntos de dados gerados e/ou analisados durante o presente estudo estão disponíveis no Repositório de Dados científicos Zenodo.
  • JITA:

    HA. Periodicals, Newspapers.
  • ODS:

    9. Indústria, Inovação e Infraestrutura

Editado por

Editor:

Gildenir Carolino Santos

Disponibilidade de dados

Os conjuntos de dados gerados e/ou analisados durante o presente estudo estão disponíveis no Repositório de Dados científicos Zenodo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    21 Mar 2023
  • Aceito
    23 Nov 2023
  • Publicado
    15 Dez 2023
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