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Hospitalidade universal mitigada: políticas raciais e pensamento constitucional brasileiro

Universal hospitality mitigated: racial policies and the Brazilian constitutional thought

Resumo

Ensaio teórico orientado pela pergunta de partida: como a seletividade das políticas imigratórias brasileiras influenciam na institucionalização do racismo? Percorre-se, por meio de autores do pensamento constitucional brasileiro, outras literaturas nacionais e internacionais, itinerário histórico das políticas imigratórias brasileiras. Desenvolve-se um conceito de hospitalidade universal mitigada sob à égide das imigrações seletivas.

Palavras-chave:
Política de Branqueamento; Imigração; Pensamento Constitucional Brasileiro

Abstract

Theoretical essay guided by the starting question: how does the selectivity of Brazilian immigration policies influence the institutionalization of racism? Through authors who has Brazilian constitutional thoughts, national and international literatures are explored, because they are historical itinerary of Brazilian immigration policies. This create a concept of universal hospitality is mitigated based on selective immigration.

Keywords:
Whitening policy; Immigration; Brazilian constitutional thought

Introdução

A questão racial foi objeto de estudos com teor de cientificismo durante o século XIX na Europa. No Brasil, entre o final do século XIX e começo do século XX, as ideias de superioridade racial, determinismo biológico e geográfico formulavam debates que mobilizavam a intelectualidade. Discutiam-se o movimento abolicionista e as possíveis repercussões da abolição no contexto social, político e econômico brasileiro. Sobre estas, expoentes intelectuais formularam argumentos sobre eugenia.

O darwinismo social influenciou na desmobilização do movimento progressista e postergou a abolição. Essa e outras teorias raciais alinhavam-se aos interesses da elite e, por possuir como pano de fundo taxonomias científicas, eram vistas como plausíveis às condições degradantes vividas pelos negros no Brasil. Na importação desta “ciência”, Raymundo Nina Rodrigues e Oliveira Viana, em seus respectivos tempos, se destacam na sua adaptação e incorporação ao contexto brasileiro, tornando-a política institucionalizada.

Com a necessidade de modernização, eclode a compreensão da inadiável ruptura com o sistema vigente. O âmbito econômico também veio a ser essencial para o sucesso da abolição. Ocorre que, os defensores mais assíduos do movimento abolicionista, convergiam com os mais conservadores da necessidade de um processo gradual do abolicionismo para amenizar alterações drásticas. Qual seria o futuro da Nação sem a mão de obra escrava e, principalmente, como se organizaria o País com antigos escravos, agora “à solta”? Uma das respostas foi a política de branqueamento e institucionalização do incentivo à imigração dos “indivíduos civilizados”: brancos e europeus, em prol de uma Nação mais “pura”.

Cor, raça e preconceito permaneceram elementos significativos no País, após a abolição, e ainda estão enraizados no sistema brasileiro, caracterizado de racismo estrutural. A estigmatização de negros é institucionalizada com a política de branqueamento, a qual objetivava, a extinção dos negros por meio de “degraus intergeracionais”. É nesse contexto que se evidencia a correlação entre as políticas imigratórias brasileiras e o racismo, dada a adoção de parâmetros seletivos para admissão de fluxo imigratório no território nacional. O posicionamento do Brasil frente aos imigrantes varia de acordo com os contextos políticos e ideológicos. As Constituições, as normas infraconstitucionais e os atos normativos de cada período demonstram oscilações entre políticas restritivas ou incentivadoras de migração.

Frente a este contexto, formulou-se a pergunta de partida: como a seletividade das políticas imigratórias brasileiras influenciam na institucionalização do racismo? Parte-se do pressuposto que, assim como o teor racista era pano de fundo para o projeto de branqueamento institucionalizado pelo incentivo à imigração europeia, institucionalizam-se políticas de hospitalidade universal mitigada. A fim de responder à pergunta expressa, percorrer-se-á itinerário histórico, compreendido entre o período pré-abolicionista à atual Lei de Migração no 13.445, de 24 de maio de 2017, sob à égide de autores que influenciariam a formação do pensamento constitucional brasileiro em diálogo com outras literaturas internacionais e nacionais que versam sobre temáticas pertinentes ao estudo.

A partir do corte epistemológico do estudo, realizou-se análise da influência das políticas imigratórias na institucionalização do racismo com ênfase no pensamento constitucional brasileiro. Com vista a consecução desse objetivo ensejou-se: discutir a incorporação do racismo científico na sociedade e no Estado brasileiro, compreender os contextos das políticas imigratórias nos períodos constitucionais brasileiros, examinar as correlações entre as “imigrações seletivas” e a institucionalização de políticas raciais e identificar a existência de uma hospitalidade universal mitigada brasileira.

Optou-se por desenvolver um ensaio teórico, de cunho qualitativo, de abordagem sócio-histórica, o qual permite uma leitura analítica do fenômeno a partir do itinerário histórico, circunscrito ao exame do social que reflete e é refletido na historicidade. Trata-se de uma forma de análise da realidade, conferindo-lhe um posicionamento crítico-analítico-reflexivo com a intencionalidade de articular conceitos, fatos, concepções, por meio de problematização, argumentação e interpretação, num diálogo que incorpora informações documentais, com ênfase nos textos constitucionais e pensamentos correntes.

Na perspectiva epistêmico-compreensiva recorreu-se à base bibliográfica de autores que participaram do construto do pensamento constitucional brasileiro, convergentes com a temática. Ademais, estabeleceu-se diálogo com autores nacionais e internacionais que versam sobre os eixos temáticos: o fenômeno da imigração frente a (in)existência de uma hospitalidade universal brasileira; o racismo, com ênfase na face vinculada à institucionalização do estado e as vertentes do pensamento constitucional brasileiro.

Autores que contribuem para a construção de valores constitucionais em seu tempo ou a posteriori são evidenciados. José Bonifácio, Tobias Barreto e Joaquim Nabuco antecipavam valores constitucionais que já orbitavam os debates políticos e jurídicos que aludiam à abolição da escravidão. Evidencia-se, por exemplo, a defesa destes pela igualdade e liberdade relatada em “Da senzala à colônia” de Emília Viotti da Costa. O reconhecimento desses pensadores nacionais auxilia na contextualização e inserção temporal, ademais, a construção do pensamento constitucional brasileiro restringe a ideias progressistas. Oliveira Viana é intelectual relevante à formação desse pensamento, suas percepções sobre raças e imigração estão fundadas em teorias eugênicas e refletiram de forma incisiva na Era Vargas.

Registra-se que a contribuição teórica deste artigo se assenta na análise das políticas raciais do Brasil no que concerne ao regimento imigratório e suas repercussões no ordenamento jurídico e ordens constitucionais; suplantando, assim, à dimensão histórica descritiva ao avançar para uma reflexão crítica da institucionalização de políticas imigratórias que, subjetivamente ou expressamente, são indutoras do racismo estrutural. Ademais, políticas imigratórias seletivas ainda se fazem presente no Brasil. Admite-se avanços normativos, contudo, discursos e deliberações governamentais recentes convergem na contemporaneidade dessa seletividade; o que se nominou de hospitalidade universal mitigada como uma extensão interpretativa da filosofia criticista kantiana de hospitalidade universal desenvolvida na obra A paz perpétua.

1. Racismo científico e abolição da escravatura: heranças entranhadas no Brasil

A elite intelectual por meio de técnicas “científicas” constituiu a lógica racial no Brasil. Importando da Europa a teoria eugênica, a sociedade incorpora valores de hierarquia racial, fundamentais para produção da subjetividade do racismo e como prática de discursos formadores das relações de poder. As teorias que tinham como concepção o evolucionismo e o determinismo biológico, a partir do Darwinismo Social, no século XIX, classificavam os grupos de modo hierárquico. A expansão da lógica dominante pós-cientificismo reverbera diretamente no social e institucional, incialmente na Europa e, a partir de 1920, no Brasil, com destaque na política pública de branqueamento (MAIA e ZAMORA, 2018MAIA, Kenia Soares; ZAMORA, Maria Helena Navas. O Brasil e a lógica racial: do branqueamento à produção de subjetividade do racismo. Psicol. clin., Rio de Janeiro, v. 30, n. 2, p. 265-286, 2018.).

Em via contrária, Pe. Antônio Vieira, antes da campanha abolicionista, defendia, no século XVII, tratamento humanitário aos escravos por meio do ideal bíblico de igualdade e condenava o tráfico negreiro e crueldades. Em um de seus sermões repreendeu atitudes dos senhores e da realeza, por não ser compatível com o catolicismo o pensamento de superioridade. Se quiserem que Deus não se ofenda com as atitudes e possa ouvi-los, é necessário que “desçam-se primeiro desse pensamento, que na maior alteza é altivo, reconheçam a todos por irmãos, e por iguais na nobreza como filhos do mesmo Pai: porque este é o foro em que Cristo nos igualou a todos, [...] sem diferença” (VIEIRA, 1993VIEIRA, Antônio. Segundo Sermão: Sermões do Rosário. In: OBRAS completas de Antônio Vieira. Porto: Lello, 1993. v. 10, p. 17-25., p. 316).

José Bonifácio, precursor do movimento abolicionista, defendia emancipação gradual do sistema escravocrata. Entre as etapas desse processo fora proposta a melhoria em mecanismo agrícola e a substituição de mão de obra escrava daqueles que já não estavam aptos aos trabalhos braçais. Bonifácio, por meio de projeto na assembleia constituinte para a elaboração da primeira constituição brasileira, em 1823, antecipou argumentos e medidas que seriam utilizados décadas depois em prol da abolição (COSTA, 2007COSTA, Emilia Viotti da. Da senzala à colônia: Corpo e alma do Brasil. 4ed. São Paulo: Unesp, 2007.). Muitos dos valores propostos por Bonifácio permearam os discursos do movimento abolicionista, influenciando o pensamento constitucional, com princípios expressos na Constituição Federal de 1988.

Durante a calorosa campanha abolicionista, ainda era preciso contornar argumentos que justificam a escravidão do negro baseados na inferioridade racial. Essa falsa percepção disseminada, inclusive no âmbito científico, levou indivíduos ilustrados como “Sílvio Romero e Pereira Barreto, acreditarem na inferioridade racial do preto e chegavam a considerar benéfico o cativeiro, que assumia aos seus olhos aspecto civilizador” (COSTA, 2007COSTA, Emilia Viotti da. Da senzala à colônia: Corpo e alma do Brasil. 4ed. São Paulo: Unesp, 2007., p. 413).

Ainda sob a ótica de Emília Viotti da Costa (2007)COSTA, Emilia Viotti da. Da senzala à colônia: Corpo e alma do Brasil. 4ed. São Paulo: Unesp, 2007., a compreensão das raízes de marginalização de setores da população brasileira, remete às instituições democráticas e à ideologia liberal. A autora apresenta significativa contribuição para o pensamento constitucional brasileiro por meio da obra Da senzala à colônia, a utilização de fontes primárias dos múltiplos debates que ocorreram no período compreendido entre pré e pós-abolicionista colaboram na melhor apreensão do cenário nacional à época. Destaca-se a premissa: mesmo os que defendiam o abolicionismo não propunham algo emergente, pois um processo gradual evitaria um colapso; a abolição possui um significado limitado e há permanência dos valores escravistas e racistas na sociedade brasileira (COSTA, 2007COSTA, Emilia Viotti da. Da senzala à colônia: Corpo e alma do Brasil. 4ed. São Paulo: Unesp, 2007.).

Numa perspectiva emancipatória não houve libertação. Há persistência do racismo. A tese apresenta pela historiadora demonstra que a abolição golpeou a velha classe senhorial, apenas como face de liquidação da estrutura colonial. Inaugurava-se uma nova forma de organização social e econômica com a transição da sociedade senhorial para a empresarial.

A Escola do Recife, movimento intelectual importante na construção do pensamento constitucional brasileiro, não ficou omissa nos embates sobre a abolição. Tobias Barreto, com discurso a favor da abolição, evidenciava relações entre cidadania e questão racial. Essa abordagem de igualdade racial não era apresentada por outros setores que defendiam a abolição. Em sua obra Menores e loucos se manifesta contrário ao determinismo biológico e à tese de Cesare Lombroso (BARRETO, 1991BARRETO, Tobias. Menores e loucos. In: MERCADANTE, Paulo; PAIM, Antonio (org.). Tobias Barreto: estudos de direito II. 2 ed. Rio de Janeiro/Aracaju: Record/Governo de Sergipe, 1991.). Apresentou-se outra realidade: o agir humano como essencial na construção do comportamento e não a predeterminação biológica (HORA, 2012HORA, Graziela Bacchi. A escola do recife como expressão dos movimentos intelectuais do século XIX. In: BRANDÃO, Cláudio; SALDANHA, Nelson; FREITAS, Ricardo (coords.). História do direito e do pensamento jurídico em perspectiva. São Paulo: Atlas, 2012.). Assim, por meio de suas denúncias e análises críticas, Tobias Barreto transcende à sua época e propõe abordagem humanista, sociológica e cientista política no pensamento constitucional diante dos problemas sociais nacionais.

Clóvis Beviláqua e Sílvio Romero, da mesma Escola, analisam a temática racial sob a ótica darwinista. Clóvis trilha a defesa realizada por Nina Rodrigues da existência da desigualdade “científica” das raças (BEVILÁQUA, 1896BEVILAQUA, Clovis. Criminologia e direito. Bahia: Livraria Magalhães, 1896.). Sílvio segue o determinismo geográfico e biológico ao considerar que as raças inferiores tendem a surgir em determinadas condições climáticas. Essa compreensão de facilidade de tais raças no Brasil leva à defesa da mestiçagem brasileira (ROMERO, 1953ROMERO, Sílvio. História da literatura brasileira. 5 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1953.). Estes juristas com ideias progressistas corroboraram a concepção do racismo científico.

A presença de discursos raciais sob o manto de “cientificíssimo” reforça estigmas segmentados na sociedade. Diante do enraizamento de valores, Joaquim Nabuco, considerado um dos mais radicais abolicionistas brancos, evidenciava a preocupação da formação social e cidadã do Brasil após a abolição. Para o político pernambucano que atuou vigorosamente em prol do fim da escravidão, não deveria ser o fim do movimento abolicionista a liberdade dos escravos, mas, para romper com a fossilização do estigma e para uma emancipação da ideia de “maldição da cor” era indispensável a superação da ignorância por meio de “uma educação civil viril e séria” (NABUCO, 2003NABUCO, Joaquim. O Abolicionismo. Conselho Editorial Senado Federal: Brasília, 2003., p. 28).

Argumentos inspirados no iluminismo e no positivismo também foram utilizados para legitimar a escravidão. Eduardo Spiller (2001)SPILLER, Eduardo Pena. Pajens da casa imperial: jurisconsultos, escravidão e a lei de 1871. Campinas, SP: Unicamp, 2001. retrata que esses mesmos argumentos foram utilizados para tecer críticas a escravidão, assim, conforme as motivações esses teores argumentativos versavam em prol de uma vertente ou de outra. Tendo como objeto na obra Pajens da casa imperial: jurisconsultos, escravidão e a lei de 1871, as contradições argumentativas dos debates à época, Spiller (2001)SPILLER, Eduardo Pena. Pajens da casa imperial: jurisconsultos, escravidão e a lei de 1871. Campinas, SP: Unicamp, 2001. exemplifica uma destas diante da utilização de argumentos abolicionistas inspirados no Iluminismo utilizados por Azeredo Coutinho e Caetano Soares nas suas respectivas motivações políticas e filosóficas que orbitaram suas obras, por meio de críticas à legitimidade da escravidão. Entretanto, há paradoxo nas ideias de filósofos citados pelo próprio Soares, qual seja, o iluminismo utilizado para fundamentar o movimento contrário à abolição. Como evidenciado por Spiller (2001)SPILLER, Eduardo Pena. Pajens da casa imperial: jurisconsultos, escravidão e a lei de 1871. Campinas, SP: Unicamp, 2001., o fundamento “racional” também fora incorporado para justificar a escravidão.

A influência do determinismo geográfico exposto por Spiller demonstra que o darwinismo social e o evolucionismo fizeram parte do teor argumentativo dos “homens de sciencia” que objetivam administrar, no período da República Velha, as movimentações sociais e políticas (NUNES, 2006NUNES, Sylvia da Silveira. Racismo no Brasil: tentativas de disfarce de uma violência explícita. Psicol. USP, São Paulo, v. 17, n. 1, p. 89-98, Mar. 2006.). O determinismo biológico também influenciou as ideias Arthur de Gobineau, especialmente a de hierarquia racial, referências no pensamento racial brasileiro que repercutiu no processo republicano. A influência de Gobinaeu, indicado ao cargo equivalente a diplomata da França no Brasil, na formação de uma sociedade disciplinar brasileira, foi traduzida pelo Imperador D. Pedro II, entusiasmado com a chegada do intelectual, como “encontro perfeito entre o soberano e a teoria das raças superiores.” (MAIA e ZAMORA, 2018MAIA, Kenia Soares; ZAMORA, Maria Helena Navas. O Brasil e a lógica racial: do branqueamento à produção de subjetividade do racismo. Psicol. clin., Rio de Janeiro, v. 30, n. 2, p. 265-286, 2018., p. 271). A aproximação da lógica racial com a figura máxima da política brasileira demonstra, com clareza, que as teorias eram pilares para um projeto econômico, social e político.

Lilia Schwarcz (1993)SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil do século XIX. Editora Companhia das Letras, 1993. afirma que o surgimento do racismo científico e seus respectivos desdobramentos se sobrepuseram à dogmática religiosa e seus mandamentos que eram, na concepção da autora, até o Século XIX, reinantes. As teorias raciais incorporadas por status de cientificíssimo permitiram “justificar” as desigualdades sociais por meio da classificação hierárquica dos indivíduos com o uso de sofisticadas taxonomias que incorporam o conceito de “raça como objeto científico.

A propagação da ideia de pureza racial deságua na teoria de degeneração provocada pela mistura racial, e, assim, se justifica a importância social que o branqueamento exerce, em especial, na elite brasileira. As incertezas do futuro da Nação que caminhava para abolição se alinhavam com as teorias europeias que seguiam percepções de teorias raciais. Assim, há adaptações das teses à situação brasileira (HOFBAUER, 2007HOFBAUER, Andreas. Branqueamento e democracia racial: sobre as entranhas do racismo no Brasil. Santa Maria: EDUFSM, 2007.). Nina Rodrigues, no curso do abolicionismo, e Oliveira Viana, na Era Vargas, são nomes que se sobressaem na incorporação da lógica racial no contexto brasileiro.

Médico, antropólogo e professor, Nina Rodrigues se dedicou aos estudos dos africanos no Brasil, com ênfase na responsabilidade penal, consoante as ideias de Cesare Lombroso. Em sua teoria racial se destaca a ideia da inimputabilidade penal do negro que, por natureza, seria incapaz de se recuperar no sistema prisional, pois, após séculos de contato com os povos superiores, não se civilizou. “Os negros africanos são o que são: nem melhores nem piores que os brancos; simplesmente elles pertencem a uma outra phase do desenvolvimento intellectual e moral” (RODRIGUES, 1956RODRIGUES, Raymundo Nina. As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil . Rio de Janeiro, Guanabara, 1956., p. 120).

A escravidão, para Rodrigues (1956)RODRIGUES, Raymundo Nina. As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil . Rio de Janeiro, Guanabara, 1956., era primordial para o desenvolvimento sociológico do negro. Diferentemente, Oliveira Viana (1956)VIANA, Francisco de Oliveria. Evolução do Povo Brasileiro. Rio de Janeiro: José Olympio. 1956. vê na ciência um caminho a ser construído no Brasil para um tipo legitimamente brasileiro mais purificado mediante a evolução ocasionada pela mistura de raças superiores com inferiores. Essa arianização progressiva se tornaria a política pública de branqueamento (MAIA e ZAMORA, 2018MAIA, Kenia Soares; ZAMORA, Maria Helena Navas. O Brasil e a lógica racial: do branqueamento à produção de subjetividade do racismo. Psicol. clin., Rio de Janeiro, v. 30, n. 2, p. 265-286, 2018.). A extinção ou redução da população negra se tornou objetivo republicano de transformação civilizatória no Brasil. Uma das ações governamentais para este fim foi a adoção ao incentivo migratório de europeus, considerados indivíduos civilizados. O mito do branqueamento foi e é “operador lógico que organiza a nossa sociedade” (MAGGIE, 1996MAGGIE, Yvonne. Aqueles a quem foi negada a cor do dia: as categorias de cor e raça na cultura brasileira. In: MAIO, Marcos Chor; SANTOS, Ricardo Ventura. Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1996, p. 225-234., p. 232).

A construção da imagem nacional de uma sociedade mestiça era preocupação da elite brasileira. A partir dos meados de 1930, a reflexão sobre raça na seara das Ciências Sociais começa a ser analisada por outras égides. Gilberto Freyre (2001)FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: introdução à história da sociedade patriarcal no Brasil. 43. ed. São Paulo: Record, 2001. abre mão de teorias deterministas em prol de uma matriz cultural fundadora da sociedade brasileira. Casa-Grande e Senzala é a primeira obra que não coloca culpabiliza os problemas do Brasil na heterogenia racial; e a miscigenação é interpretada como elemento positivo. Este fenômeno é abordado numa perspectiva cultural e não biológica, como era proposta até então.

O movimento de construção da nação brasileira mestiça é visto por Freyre como exitoso. A formação nacional já não está pautada em uma base racional homogênea, mas em uma cultura nacional, unitária e orgânica. A identidade nacional multirracial e multicultural proposta por Freyre é, para Skidmore (2012)SKIDMORE, Elliot. Thomas. Preto no branco: raça e nacionalidade no pensamento brasileiro (1870-1930). São Paulo: Companhia das Letras, 2012., uma herança deixada pela obra Casa-Grande e Senzala que todas as raças componentes da sociedade brasileira são igualmente valiosas. A riqueza cultural brasileira é a mestiçagem. Essa percepção rompe com o ideal de branqueamento e a construção desse novo raciocínio da preciosidade cultural de todas as raças influencia nas pesquisas e nos pensadores. O ideário de democracia racial no Brasil é consolidado nas obras de Gilberto Freyre.

Florestan Fernandes (2013)FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes: o legado da “raça branca”, v.1 São Paulo: Globo, 2013. reconhece os avanços advindos das obras de Gilberto Freyre, mas denuncia a democracia racial como um mito. A romantização da violência sexual sofrida pelas africanas e indígenas por parte do “branquinho” que enfeitiçava as mulheres de outras raças é umas das críticas realizadas pelo autor, que também tenciona “O homem cordial” de Sérgio Buarque, pois repete em Raízes do Brasil lacunas sociais e banalização de determinadas problemáticas se fazem presentes em Casa-Grande & Senzala. A índole de cordialidade presente na mestiçagem brasileira permitia a sujeição desta perante o senhor e, consequentemente, a escravidão. Fernandes (2013)FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes: o legado da “raça branca”, v.1 São Paulo: Globo, 2013. tenciona em Integração do negro na sociedade de classes a herança da aplicabilidade errônea da democracia racial. Pois, camufladas de desigualdades sociais e econômicas há a discriminação racial conservadas por uma perpetuação infinita com a finalidade da permanência do distanciamento social. A observação de quaisquer análises que não versem sobre a relações raciais entre escravocrata e senhorial criam uma realidade preocupante.

A análise da categoria racismo não se dá de forma objetiva, mas circunscrita a contexto que é afeito à determinação de cunho histórico, social, político, econômico e jurídico. Portanto, configura-se como fenômeno multidimensional – situação que denota a complexidade de conceituá-lo, embora muitos autores tenham se empenhado nesta busca. Para Taguieff (2001)TAGUIEFF, Pierre-André. The force of prejudice: on racism and its doubles. Minneapolis, University of Minnesota Press. 2001., este desafio está relacionado à carga política que envolve o fenômeno e a raiz do termo – raça – a qual apresenta distintas acepções contextuais. Luiz Almeida (2018)ALMEIDA, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte: Letramento, 2018. no livro “O que é racismo estrutural?” corrobora este desafio e o define como:

Forma sistemática de discriminação que tem a raça como fundamento, e que se manifesta por meio de práticas conscientes ou inconscientes que culminam em desvantagens ou privilégios, a depender ao grupo racial ao qual pertençam (ALMEIDA, 2018ALMEIDA, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte: Letramento, 2018., p. 25).

O racismo estrutural no Brasil passou pelo processo de abolicionismo sem inclusão dos negros e alcançou a política de branqueamento, a partir da perspectiva racial que ainda reverbera em diversas searas. Abdias do Nascimento (1978)NASCIMENTO, Abdias do. O genocídio do negro brasileiro: processo de u racismo mascarado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. depreende que no racismo mascarado no Brasil há o encarceramento em massa da população negra que somado a outros fatores caracteriza o genocídio do negro brasileiro. As estruturas sociais hierárquicas políticas e econômicas coadunam com o processo de exclusão. A taxa de homicídio de pretos ou pardos, no Brasil, é quase três vezes maior que a de brancos (IBGE, 2019).

Outro diagnóstico da permanência de desigualdade e persistência do sistema discriminatório está na renda de pretos ou pardos que é metade da obtida pelos brancos. A pobreza atinge sobretudo esta população, que representa 72,7% dos pobres, 38, 1 milhões de pessoas. O desafio de mudança nesse quadro também passa pela representatividade desta população no âmbito democrático: menos de um quarto dos deputados federais são pretos ou pardos. Em 2018, apenas 24,4% dos deputados federais eleitos se declararam pertencendo a essa parcela populacional, que representa 55,8% do total de brasileiros (IBGE, 2019). O projeto de branqueamento das nações, comum na América Latina, faz parte da estratégia biopolítica de controle que impacta e reproduz efeitos por meio do mito da democracia racial (BAGGIO et al, 2019BAGGIO, Roberta Camineiro; et al. Raça e Biopolítica na América Latina: os limites do direito penal no enfrentamento ao racismo estrutural. Revista Direito e Práxis, v. 10, n. 3, p. 1834-1862, set. 2019.). As políticas e ações institucionalizadas tendem a corresponder aos interesses da elite. É perceptível a estigmatização racial de negros e pardos com reverberações nas teorias científicas.

O estrangeirismo emerge “como a grande esperança nacional de progresso por saltos” (FERNANDES, 2013FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes: o legado da “raça branca”, v.1 São Paulo: Globo, 2013., p. 33). O progresso e a construção de um novo Estado após a abolição pareciam estar vinculados ao processo de branqueamento da população brasileira. Reconhecendo a relevância dessa política enraizada em valores raciais, se faz necessário analisar como a política de branqueamento se institucionalizou, a forma como foi recebida pela Constituição de 1891 e a atuação dos governos e constituintes brasileiros frente aos fluxos migratórios que mitigam o projeto de hospitalidade universal.

2. A política de branqueamento na república velha

A trajetória histórica de imigração brasileira é marcada por políticas institucionalizadas complexas, presa às subjetividades do preconceito e racismo. É necessário analisar esse curso histórico sob a crítica das proposituras governamentais, positivadas legalmente ou constitucionalmente, que seccionam imigrantes bem-vindos ao Brasil e aqueles marginalizados. A construção científica de inferioridade racial, a observação do segmento eurocentrista e a concepção negativa da pluralidade racial na construção social brasileira são objetos que coadunam com as legislações de incentivo, ou de não incentivo migratório, a partir da vinculação de qual contingente migratório pertencem.

O início do processo imigratório brasileiro se dá com a colonização portuguesa, oriunda da expansão marítima. O projeto de apropriação econômica e territorial introduziu a imigração africana forçada por meio do tráfico de mão de obra escrava. Essa política perdurou oficialmente por três séculos, deixou profundas marcas culturais e socais, até mesmo após o período abolicionista que ocorrera em 1888 (PATARRA e FERNANDES, 2011PATARRA, Neide; FERNANDES, Duval. Brasil: país de imigração? Revista Internacional em Língua Portuguesa, Lisboa, n. 24, p. 65 -96, 2011.).

A primeira política migratória brasileira foi voltada para a obtenção de mão de obra escrava, para concretizar o objetivo português de exploração. A dimensão desta pode ser vista no fato de que, até 1850, três séculos de sociedade escravocrata, a colônia brasileira “recebeu” cerca de quatro milhões de africanos (PATARRA e FERNANDES, 2011PATARRA, Neide; FERNANDES, Duval. Brasil: país de imigração? Revista Internacional em Língua Portuguesa, Lisboa, n. 24, p. 65 -96, 2011.). Tão impactante quanto, ou mais que esse número, se faz a instituição das políticas de branqueamentos que, após a Lei Áurea, trouxe para o Brasil 3,99 milhões de imigrantes europeus, em apenas trinta anos. Para a autora Maria Bento (2002)BENTO, Maria Aparecida Silva. Branqueamento e branquitude no Brasil. In: BENTO, M. A. S.; CARONE, Iray (org.). Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. 25-57., que apresenta os dados, o medo do negro ser majoritário na composição do contingente populacional brasileiro incentivou, de forma direta, o programa de imigração europeia. Aqui é observado o quanto essa política real do Estado brasileiro realizou forte estímulo à imigração “branca”.

O processo de incentivo à imigração europeia ganha destaque após o período da abolição da escravatura. Todavia, anteriormente já existiam políticas em prol de colonização europeia no Brasil. Em 1818, D. João VI assinou o tratado de Nova Friburgo de incentivo imigratório de europeus, em especial dos suíços. Não se tratava de um mero incentivo em prol do avanço agrícola: a questão racial estava implícita. O artigo 18 do referido documento prevê a criação de milícia composta por 150 suíços, com o poder de porte de arma, a fim de manutenção dos regimentos portugueses de cor branca. O termo “cor branca” é, por si, significativa nesta política imigratória que inaugura o conjunto de políticas e incentivos que tornariam a ser denominadas de “políticas de branqueamento” (SEYFERTH, 2002SEYFERTH, Giralda. Colonização, imigração e a questão racial no Brasil. In: Revista USP, São Paulo, n. 53, p. 117-149, mar/mai, 2002.).

Surge a razão geopolítica de povoamento visando a que também houvesse colonização de indivíduos considerados civilizados, o que se deixa traduzir por brancos europeus. Elegeu-se entre os imigrantes o incentivo, em especial aos alemães, considerados agricultores eficientes. Os agricultores brancos, vindos com suas famílias, receberam incentivo até 1830, ano da aprovação da lei que inviabiliza o agenciamento e gastos com imigração. Políticas de incentivo à imigração europeia são retomadas com a Lei de Terras e a Lei Eusébio de Queiroz, ambas de 1850, o que demonstra a relação intrínseca com a abolição da escravatura nas colônias (SEYFERTH, 2002SEYFERTH, Giralda. Colonização, imigração e a questão racial no Brasil. In: Revista USP, São Paulo, n. 53, p. 117-149, mar/mai, 2002.).

O papel da imprensa, as demandas sociais e econômicas em curso não eram abordadas nos estudos sobre as temáticas que relacionavam a legislação emancipadora à atuação dos movimentos abolicionistas do imperador D. Pedro II e da princesa Isabel. A expansão da cultura cafeeira e a dificuldade de mão de obra que não fosse negra contribuíram para a continuação do tráfico e do regime escravocrata. A permanência do sistema escravista foi fruto das dificuldades na transição para o trabalho livre, pois era quase impossível recrutar imigrantes para o Brasil (COSTA, 2007COSTA, Emilia Viotti da. Da senzala à colônia: Corpo e alma do Brasil. 4ed. São Paulo: Unesp, 2007.). Para tanto, o governo propõe políticas de branqueamento que não demonstravam objetivamente o teor racista. Porém, estava presente no discurso a necessidade de mão de obra que não fosse negra, expressando discriminação quanto aos tipos de trabalhos.

O Estado brasileiro no final do século XIX buscava melhor definição da formação da autoimagem nacional, apresentando o ideal de branqueamento que, somado à necessidade de substituição da mão de obra escrava, ensejou o incentivo aos migrantes advindos dos países europeus. Para Skidmore (2012)SKIDMORE, Elliot. Thomas. Preto no branco: raça e nacionalidade no pensamento brasileiro (1870-1930). São Paulo: Companhia das Letras, 2012. a popularidade do ideal de branqueamento não era acidental; mas resultado da ação da elite e de intelectuais que representavam pensamento a maquiar a teoria racista. O almejado liberalismo, na visão daqueles que defendiam a política do branqueamento, seria alcançado por meio de “um país mais branco”. O “laissez-faire subjacente na teoria liberal dava o pretexto necessário para o abandono das massas, das quais fazia parte a maioria dos não brancos” (SKIDMORE, 2012SKIDMORE, Elliot. Thomas. Preto no branco: raça e nacionalidade no pensamento brasileiro (1870-1930). São Paulo: Companhia das Letras, 2012., p. 200).

A “grande imigração” durante a República Velha trouxe mudanças na proporcionalidade da população negra e da população de branca. A migração direcionada para o branqueamento da população e o incentivo à imigração europeia ocasionaram alteração no quadro populacional. Em 1872, 40% da população brasileira era de origem branca, em 1950, essa proporção passou para 60%. Nesse mesmo período, houve decréscimo da população negra de 30% para menos de 20% (AVRITZER e GOMES, 2013AVRITZER, Leonardo; GOMES, Lilian C. B. Política de reconhecimento, raça e democracia no Brasil. Dados - Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 56, n. 1, p. 39-68, 2013.). A política governamental foi destinada à questão racial por trás da justificativa imigratória.

O período da República Velha representa antagonismos e incoerências, ao mesmo tempo em que o Brasil buscava alcançar o processo da belle époque por meio das mudanças políticas e econômicas que visavam a “civilização” dos novos tempos, permaneciam com o descompasso social, a partir do fim legal da escravidão. O projeto de higienização e “belezura” foram implementados na capital, Rio de Janeiro. Concomitante aos processos estruturais de construções modernas, a problemática social tornava-se mais recorrente. A marginalização, a miséria e a injustiça permaneciam recorrente diante da cultura de branqueamento, o ideal de civilidade convivia com todas essas problemáticas. A mentalidade escravocrata permaneceu (BENEDICTO, 2019BENEDICTO, Maria Margarete dos Santos. Quaquaraquaquá quem riu? Os negros que não foram...A representação humorística sobre os negros e a questão do branqueamento da belle époque aos anos 1920 no Rio de Janeiro. Tese (doutorado). Universidade de São Paulo. São Paulo, 2019.).

O status quo interligado ao fator racial, impulsionado pela cultura de branqueamento, dificulta a inserção social dos negros e seus descendentes. Vincular os termos “negro” e “preto” a um indivíduo era sinônimo associação à vida escrava. Portanto, para a sociedade, os negros deveriam amenizar os traços raciais negroides a fim de ascender socialmente pois, a cor branca estava concatenada à liberdade (HOFBAUER, 2003).

A partir do Decreto No 58-A, de 14 de dezembro de 1889, durante o Governo Provisório de Deodoro da Fonseca, é concedida cidadania, de forma tácita, para estrangeiros que cumprissem requisitos:

Art. 1º São considerados cidadãos brasileiros todos os estrangeiros que ja residiam no Brazil no dia 15 de novembro de 1889, salvo declaração em contrário feita perante a respectiva municipalidade, no prazo de seis mezes da publicação deste decreto.

Art. 2º Todos os estrangeiros que tiverem residencia no paiz durante dous annos, desde a data do presente decreto, serão considerados brazileiros, salvo os que se excluirem desse direito mediante a declaração de que trata o art. 1º (BRASIL, 1889).

Esse movimento foi denominado de “Grande Naturalização”. Visando facilitar o primeiro artigo, é constituído um novo Decreto no 396, de 15 de maio de 1890 (BRASIL, 1890). Assim, a “Grande Naturalização” de 1890 declarava cidadãos brasileiros todos os estrangeiros que em seis meses não manifestassem o expresso desejo de manter sua cidadania original. Esse processo de naturalização tácita permitiu a aquisição de nacionalidade por partes dos imigrantes, quando estes não se manifestavam (BRASIL, 1891BRASIL. Constituição de 1891. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de fevereiro de 1891. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm. Acesso em: 16 out. 2019.
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). A medida objetivava potencializar a fixação e a atração do imigrante.

No âmbito constitucional, a “Grande Naturalização” foi recepcionada na Constituição de 1891 aplicando a naturalização tácita. O artigo 69, §4º, postergou o prazo de seis meses após a publicação do primeiro decreto para seis meses após a entrada em vigor da Constituição (BRASIL, 1891BRASIL. Constituição de 1891. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de fevereiro de 1891. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm. Acesso em: 16 out. 2019.
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). As Constituições futuras consagraram a adoção da espécie da naturalização tácita; todavia, não contemplada nas hipóteses da Constituição de 1988.

Nesta conjuntura é promulgada, em 24 de fevereiro de 1891, a primeira Constituição Republicana do Brasil, advento da proteção aos estrangeiros que residem no País, assegurando, em seu artigo 72: “a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade” (BRASIL, 1891BRASIL. Constituição de 1891. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de fevereiro de 1891. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm. Acesso em: 16 out. 2019.
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). Os direitos subjetivos destinados aos brasileiros passaram a ser destinados aos estrangeiros domiciliados, residentes ou submetidos à jurisdição brasileira (SOARES, 2004SOARES, Guido Fernando Silva. Os direitos humanos e a proteção dos estrangeiros. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, v. 99, p. 403-460, 1 jan. 2004.). São estabelecidos direitos civis e políticos assim como aos cidadãos natos. Os estrangeiros poderiam desempenhar todos os cargos públicos, exceto o de Chefe de Estado. O posicionamento de equivalência de direitos entre nacionais e estrangeiros é uma tendência história que repercute até a Constituição de 1988.

O incentivo e a abertura aos imigrantes, embora restritivos, se faziam presentes nas políticas brasileiras à época. O pensamento constitucional brasileiro a respeito da Constituição de 1891, da República Velha, é fortemente influenciado pela política de branqueamento, por meio do claro incentivo ao fluxo migratório europeu pautado inclusive no “cientificismo” da teoria eugênica vastamente disseminado no Brasil.

As Constituições posteriores e, consequentemente, as respectivas legislações ordinárias, já adotavam políticas de não incentivo à imigração, até mesmo de limitação imigratória. A visão presente na Constituição de 1891 não se mantem nas demais Constituições. É possível observar que há seletividade no recebimento ou não de fluxos migratórios e que os ideias políticos dos contextos posteriores à República Velha: a criação da imagem do imigrante que chega ao Brasil para “roubar emprego” e outras propagandas enraizadas de discurso de ódio fizeram com que a própria sociedade brasileira observasse o outro com ausência de alteridade. As políticas imigratórias restritivas presentes no contexto brasileiro posteriores à política de branqueamento devem ser analisadas de forma simultânea com os ânimos políticos. Estes exerceram influência direta na forma como o Constituinte, Legisladores e o Executivo se comportavam diante das políticas migratórias.

3. Hospitalidade universal mitigada: imigração seletiva e discurso de ódio

A chegada a um novo país significa uma oportunidade de vida digna e, por vezes, a única possibilidade viável de sobrevivência quando se observam as imigrações forçadas. Ultrapassar a fronteira de um país seguro e por ele ser recebido é o objetivo daqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade. Para estes, ultrapassar a fronteira é não ficar à margem da legitimação soberana de um país, e vencer a vulnerabilidade da exclusão e da violência. Neste sentido, a coordenação de circulação de corpos entre territórios relaciona-se com a soberania estatal que é responsável por disciplinar o fluxo migratório no seu poder de mando (LACERDA e GAMA, 2016LACERDA, Ana Luiza; GAMA, Carlos Frederico. O solicitante de refúgio e a soberania moderna: A identidade na diferença. Lua Nova, São Paulo, n. 97, p. 53-80, abr. 2016.). Desta forma, para compreender a coordenação de circulação de corpos no Brasil, analisam-se as Constituições de 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988, a partir das políticas migratórias, com fulcro na soberania territorial, frente à preservação da dignidade e dos direitos da pessoa humana.

O território e a delimitação das fronteiras distinguem o cidadão que está no Estado daqueles que estão “de fora”. A relação entre o Estado e o cidadão esteve, historicamente, associada à filiação nacional. Ocorre que há necessidade da retomada de discussões sobre soberania e cidadania, visto que a globalização afasta a cidadania da filiação nacional e se aproxima da cidadania de residência. Esse cenário político pós-westfaliana de fortalecimento ao direito cosmopolita desafia a soberania do Estado (BENHABIB, 2012BENHABIB, Seyla. O declínio da soberania ou emergência de normas cosmopolitanas? Repensando a cidadania em tempos voláteis. Civitas-Revista de Ciências Sociais, v. 12, n. 1, 2012.).

Na obra A paz perpétua é desenvolvido um projeto kantiano das relações internacionais no que diz respeito ao alcance de uma paz ideal, a qual é reconhecida pelo filósofo como inalcançável. Contudo, as premissas defendidas por Kant, são compreendidas por ele como acessíveis a partir da efetivação das condições estipuladas (KANT, 2008KANT, Imannuel. A paz perpétua: Um projecto filosófico. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 2008.). Reconhecendo, assim como afirmado por Habermas que, desde que à paz perpétua foi escrita, o contexto internacional passou por diversas transformações. “Kant certamente não havia aprendido ainda que o desenvolvimento capitalista iria resultar em um conflito entre classes sociais que ameaçaria a paz e a presumível disposição para a paz, demonstrada pelas sociedades politicamente liberais” (HABERMAS, 2002HABERMAS, Jürgen. A ideia kantiana de paz perpétua: a distância histórica de 200 anos. In: A inclusão do outro: estudos de teoria política. São Paulo: Edições Loyola, 2002., p. 194).

Alguns construtos kantianos possuem inaplicabilidade de inserção no contexto atual, entretanto, compreende-se que o princípio da hospitalidade universal, associada com os documentos internacionais de defesa dos direitos humanos, deve guiar os Estados quando o assunto for referente a imigração. A hospitalidade universal não se trata de uma percepção apenas filantrópica, mas de um direito inerente ao imigrante de “não ser tratado com hostilidade em virtude de sua vinda ao território de outro.” (KANT, 2008KANT, Imannuel. A paz perpétua: Um projecto filosófico. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 2008., p.22). Essa complexidade não deve ser afastada dos debates e discussões, pois, embora a obra de Kant seja produzida no século XVIII, vários documentos internacionais possuem o sopro filosófico kantiano, em especial, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e esta permanece em vigência. Assim como a hospitalidade universal é fonte de inspiração para este documento.

A problemática da imigração seletiva trás à tona o imperativo ético da hospitalidade. Os avanços normativos cunhados no advento da Constituição de 1988, da Lei de Migração no 13.445, de 24 de maio de 2017 não implica, necessariamente, em avanço prático. O Brasil, conforme mudanças constitucionais ou governamentais, tende a possuir comportamentos adversos no que concerne à imigração. Importante evidenciar que a incorporação de determinadas políticas imigratórias caracterizadas como seletivas estão associadas diretamente ao contexto vivenciado, aos valores incorporados pelos detentores da organização estatal e, até mesmo à sociedade civil.

3.1 Recepções seletivas: mudanças de regimes e políticas de imigração

A mudança no quadro migratório brasileiro em prol do fortalecimento da segurança nacional e da soberania reflete diretamente nos fluxos imigratórios e na consequente marginalização desse contingente populacional. Assim, o incentivo às migrações não era mais condizente com o projeto de nacionalização da Era Vargas. Determinados imigrantes tornaram-se ameaça à formação deste projeto (GERALDO, 2009GERALDO, Endrica. A “Lei de Cotas” de 1934: controle de estrangeiros no brasil. Cadernos AEL, Campinas, v.15, n.27, 2009.). O incentivo à imigração europeia, que iniciara por D. João VI, é objeto de debates durante a Era Vargas sobre qual seria o imigrante ideal para preencher os territórios, em especial, os rurais no Brasil. Os pensamentos eugênicos são implementados durante a primeira fase varguista por meio da seleção e do controle dos imigrantes a partir do critério étnico. De forma gradual a política de incentivo exacerbado presente na República Velha é substituída pela restrição e direcionamento para determinados contingentes populacionais (WOLFF, 2013WOLFF, Marcus. Música e identidade na “Suíça brasileira”: mito e verdade na construção das comunidades de Nova Friburgo, RJ. Música e cultura: revista da ABET, vol. 8, n. 1, p. 78-85, 2013.).

A Revolução de 1930 foi importante para o surgimento da tardia Weimar brasileira - Constituição de 1934. Para Amaral (2004)AMARAL, Roberto. O constitucionalismo da Era Vargas. Revista de Informação Legislativa, Brasília, a. 41, n. 163, p. 85-92, 2004., o movimento de 1930 não se configura como um processo revolucionário, pois não há uma ruptura do sistema. Todavia, é relevante por responder pela ruptura da institucionalidade e reorganização constitucional. Bonavides (2009)BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. compreende que a Constituição de 1891 carecia de força normativa e que, frente aos movimentos revolucionários, foi priorizada a segurança nacional.

Os conceitos de eugenia, antissemitismo e arianismo são retomados no âmbito brasileiro, por meio de Oliveira Viana, e recorrentemente utilizados nas esferas acadêmica e política. O Governo Provisório já demonstrava indicativos de políticas restritivas que marcaram a Era Vargas, visando reprimir o fluxo migratório de sujeitos marginalizados, denominados de “passageiros estrangeiros de terceira classe”. Em 12 de dezembro de 1930 foi instituído o Decreto nº 19.482. O referido ato normativo, no art. 3º, determinou que o quadro de funcionários das empresas e demais organizações comerciais deveriam ser constituídas por, ao menos, dois terços de brasileiros natos. A “Lei dos 2/3” (BRASIL, 1930).

Durante o processo de elaboração da Constituição de 1934 havia debates envoltos da temática imigratória, a partir dos postulados eugênicos e nacionalistas (CARNEIRO, 1990CARNEIRO, Maria Luiza Tucci. Sob a máscara do nacionalismo: Autoritarismo e anti-semitismo na Era Vargas (1930-1945). Estudios Interdisciplinares de America Latina y el Caribe. Vol 1, n. 1,1990.). A forte pressão na Assembleia Nacional Constituinte resultou na incorporação da “Lei de Cotas”, no art. 121, parágrafo 6º da Constituição de 1934, que impunha restrições à entrada de corrente imigratória. O fluxo imigratório do país não poderia exceder, anualmente, o teto de 2% do número dos que, nos últimos cinquenta anos, já estavam fixados no Brasil. Tais restrições eram necessárias para que fosse garantida a integração étnica. Nessa mesma senda, o parágrafo 7º vedava a concentração de imigrantes (BRASIL, 1934).

A demonstração é que, quando não houve mais interesse político, social e econômico na chegada de imigrantes, o Estado alterou seu quadro normativo. A formação do Estado Nacional brasileiro proposto por Vargas passava por processo de reconstrução política, sustentado no sentimento nacionalista e de estigmatização de grupos semitas, comunistas e o perigo “amarelo”, por exemplo. Em meio a essa estratégia de criação de “monstros políticos” que colocavam em xeque a formação do Estado Nacional, havia a permanência do viés restritivo das políticas migratórias na Constituição outorgada de 1937. A identidade nacional idealizada na Era Vargas, somada ao receio do movimento operário disseminado pelos europeus revolucionários, com destaque para Primeira Greve Geral, gerou o temor de novos movimentos revolucionários (CARNEIRO, 1990CARNEIRO, Maria Luiza Tucci. Sob a máscara do nacionalismo: Autoritarismo e anti-semitismo na Era Vargas (1930-1945). Estudios Interdisciplinares de America Latina y el Caribe. Vol 1, n. 1,1990.).

O governo brasileiro mudou a maneira de ver o imigrante, entre 1915 e 1937 foram publicados doze decretos que tratavam sobre políticas imigratórias e entre 1938 e 1939 foram mais de vinte decretos consoantes a temática. Todavia, não houve proporcionalidade nas referidas medidas restritivas e na quantidade de imigrantes no Brasil (KOIFMAN, 2015KOIFMAN, Fábio. Imigrante ideal: o Ministério da Justiça e a entrada de estrangeiros no Brasil (1941-1945). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015.). No âmbito constitucional, a “Lei de Cotas” é recebida no art. 151 da Constituição de 1937.

A negação da democracia e o fortalecimento das ideias dos “fantasmas” que não permitiam a formação do Estado Nacional Brasileiro coadunam com a instauração da Constituição “polaca”, assentada em regimes totalitários europeus. Ademais, a Constituição de 1937 se fundamentou no decisionismo da política sobre o direito, vigente em quase todos os países europeus. O autoritarismo típico do Estado Novo também contemplava as migrações. O contexto internacional da Segunda Guerra Mundial e da percepção internacional do estigma e marginalização de determinados setores políticos, ideológicos e raciais reforçam a política restritiva, e, dentre outras, foram elaboradas medidas “de caráter sigiloso que visavam impedir a entrada de refugiados judeus” (GERALDO, 2009GERALDO, Endrica. A “Lei de Cotas” de 1934: controle de estrangeiros no brasil. Cadernos AEL, Campinas, v.15, n.27, 2009., p. 176).

As políticas restritivas também atuavam na limitação da atuação dos estrangeiros no Brasil. Coadunando com a perspectiva ditatorial da estrutura governamental do Estado Novo, há o Decreto-Lei no 383, de 18 de abril de 1938. O referido documento normativo veda a estrangeiros a atividade política no Brasil assim, impossibilita manifestações e organizações de evento que estivessem vinculados a quaisquer caráteres políticos (BRASIL, 1938). Deve ser ressaltado, porém, que a proibição de idiomas estrangeiros, especialmente o alemão durante o Estado Novo, objetivava também o combate à formação, consolidação e regular funcionamento de células do Partido Nazista em solo brasileiro. De forma simultânea, há as campanhas de nacionalização compulsória: implementação do ensino da língua portuguesa de maneira obrigatória em escolas privadas e públicas (WOLFF, 2013WOLFF, Marcus. Música e identidade na “Suíça brasileira”: mito e verdade na construção das comunidades de Nova Friburgo, RJ. Música e cultura: revista da ABET, vol. 8, n. 1, p. 78-85, 2013.).

Oliveira Viana, intelectual de realce na Era Vargas, exerceu influência direta no pensamento constitucional à época. Um dos problemas nacionais destacados pelo autor foi, em sua concepção, o “liberalismo” da legislação de imigração da República Velha que viabilizou uma formação disforme da sociedade brasileira ao não cuidar “da qualidade do imigrante”. Sob à égide do seu prestígio no período varguista correlacionado com os valores estabelecidos pelos governos, Oliveira Viana (1991)VIANA, Francisco de Oliveira. Imigração e Colonização Ontem e Hoje. In: Ensaios Inéditos. Campinas, Editora da Unicamp, 1991. vê suas percepções serem incorporadas no ordenamento jurídico. Acompanhado das teorias eugênicas difundida pelo mesmo, observa-se seletividades expressas nos documentos normativos diante de compromisso de “uniformidade cultural brasileira” convergente com a doutrina da Segurança Nacional.

O processo de redemocratização do País ocorreu por meio da queda do governo autoritário de Vargas. Tratava-se de um novo contexto político e institucional brasileiro. Entretanto, no que concerne à imigração, as alterações não coincidiram com o novo quadro. A Constituição de 1946 manteve a competência legislativa da União sobre a temática, que repercute na determinação de critérios para naturalização e expulsão e na seleção de imigrantes, de acordo com o “interesse nacional”. Essa escolha discricionária caberia ao Conselho de Imigração e Colonização (OLIVEIRA, 2013OLIVEIRA, Ione. “Imigrantes e refugiados para o Brasil após a Segunda Guerra Mundial.” Simpósio Nacional da ANPUH, 27, 2013.).

Foram estabelecidos, após 1945, princípios gerais que regiam a política imigratória na época e caracterizavam-se como diretrizes que definiam as restrições para o Brasil. Importante destacar que também foram estabelecidos critérios para o corpo diplomático realizar a seleção das solicitações de ingresso (BRASIL, 1946). Dentre esses critérios, destacam-se a caracterização de indesejáveis aos imigrantes que não possuíam ascendência europeia e a qualificação, pois havia a priorização de admissão de trabalhadores técnicos, rurais e operários. A distribuição dos fluxos migratórios no território brasileiro também era orientada pelas políticas governamentais, a partir da observação do padrão de vida, clima do país de origem e aptidão para o trabalho (OLIVEIRA, 2013OLIVEIRA, Ione. “Imigrantes e refugiados para o Brasil após a Segunda Guerra Mundial.” Simpósio Nacional da ANPUH, 27, 2013.). Os referidos princípios demonstram a clara destinação das medidas restritivas migratórias por exclusão: aqueles que não cumpriam os requisitos solicitados seriam considerados indesejáveis. Referida normatização não deixa dúvida sobre a seletividade que, por vezes, tenta ser camuflada.

A doutrina da Segurança Nacional também deu suporte teórico e legitimidade, no âmbito ideológico, para a instauração e manutenção do regime ditatorial militar brasileiro que perdurou de 1964 a 1987 (GIANNASI, 2011GIANNASI, Carlos Alberto. A doutrina da segurança nacional e o “milagre econômico” (1969/1973). Dissertação. São Paulo: Departamento da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2011.). Por meio do Ato Institucional nº 4 veio a “pseudo promulgação” da Constituição de 1967 que segue com esse viés nacionalista e que, entre outras características, destaca o autoritarismo e o fortalecimento do Poder Executivo em detrimento dos demais. Com a finalidade de se adaptar ao golpe civil-militar de 1964, a Constituição de 1967 traz a doutrina da Segurança Nacional. Para tanto, o nacionalismo é exaltado como forma de camuflar a lógica de um Estado Policial (KENICKE, 2016KENICKE, Pedro Henrique Gallotti. O Estatuto do Estrangeiro e a Lei de Migrações: entre a doutrina da segurança nacional e o desenvolvimento humano. Dissertação (mestrado), Universidade Federal do Paraná, Paraná, Curitiba, 2016.). A propaganda nacionalista foi utilizada para disseminar a referida doutrina.

A inviolabilidade de direitos, com destaque para o direito à liberdade e à vida, de forma antagônica, se fazia presente na Constituição de 1967. No caput do art. 150 é afirmado que tais direitos também se destinavam aos estrangeiros residentes em território brasileiro (BRASIL, 1967). No contexto de endurecimento do regime militar e edição do Ato Institucional no 5, há a retomada da temática imigratória por meio do Decreto-Lei de 941 de 1969, que prevê a expulsão sumária dos estrangeiros considerados nocivos, para garantir ordem pública e social: a segurança nacional é usada nos dispositivos segregacionistas

3.2 Negação de alteridades: a incorporação da universalidade universal mitigada

A retomada da questão migratória é enfatizada na agenda política no início da década de 1980, por intermédio da Lei nº 6.815 de 19 de agosto de 1980 – Estatuto do Estrangeiro. A inospitalidade ao imigrante e a política de segurança nacional foram refletidas materialmente neste estatuto (BRASIL, 1980). Zygmunt Bauman (1998) alude ao reconhecimento de que a adoção na agenda política sobre questões que envolvem negação de alteridades reverbera diretamente nas relações sociais. A adoção de valores por determinada nação que versem sobre xenofobia, racismo e outros discriminatórios se fazem valer, por vezes, do medo e da construção desse na sociedade civil perante o outro. Esse cenário de intolerância torna propenso a instauração de estados totalitários por meio de discursos de ódio explícito ou subjetivado em temáticas como “segurança nacional”.

As formas de negação de alteridades, observadas no Brasil, na percepção de Bauman, diagnosticam a necessidade de olhares atentos e críticos aos movimentos que instigam a violência física e simbólica, o holocausto “nasceu e foi executado na nossa sociedade moderna e racional, em nosso alto estágio de civilização e no auge do desenvolvimento cultural humano” (BAUMAN, 1998, p.9). Observa-se que a criminalização do acesso de grupos “indesejáveis” de imigrantes europeus brancos na vigência da Ditadura Militar é compreendida como uma das formas de manifestação autoritária, também presente no Estado Novo. Assim, Bauman alerta e evidencia os riscos sobre sociedades e Estado regidos sob o medo, o ódio ao outrem e a intolerância.

O estrangeiro como figura de ameaça em potencial e a negação de seus direitos de representação e organização constam do Estatuto do Estrangeiro com a substituição do termo migrante por estrangeiro. A ausência de alteridade é observada no dispositivo que rege a negação do visto do estrangeiro que solicita adentrar em território brasileiro, sendo possível a negação, quando considerada “inconveniente” a sua presença (BRASIL, 1980). O Conselho Nacional de Imigração, regulamentado pelo Decreto nº 840, de 22 de junho de 1993, em vigência da Constituição de 1988, determina competência ao referido Conselho, no art. 1º inciso VI, “estabelecer normas de seleção dos imigrantes” (BRASIL, 1993).

A vigência do Estatuto do Estrangeiro permaneceu até 24 de maio 2017, revogado por meio da Lei de Migração no 13.445, mesmo diante da incompatibilidade de princípios não recepcionados pela Constituição (GUERRA, 2017GUERRA, Sidney. A nova lei de migração no Brasil: avanços e melhorias no campo dos direitos humanos. Revista de Direito da Cidade, [S.l.], v. 9, n. 4, p. 1717-1737, out. 2017.). O potencial subversivo atribuído ao imigrante e a necessidade de vigilância não condizem com a nova ordem constitucional. A carência normativa nesta temática dificultou a efetivação do que a Constituição preconiza “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” (BRASIL, 1988).

O novo marco legal defere aos imigrantes direitos e prerrogativas de proteção dos direitos humanos. Por isso, a Lei de Migração apresenta-se como novo paradigma na matéria (VARELLA et al, 2017VARELLA, Marcelo Dias; et al. O caráter humanista da Lei de Migrações: avanços da Lei n. 13.445/2017 e os desafios da regulamentação. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 14, n. 2, p. 253-266, 2017.). Essa adoção remete à filosofia criticista kantiana. Embora se reconheça que algumas perspectivas kantianas possuem viés idealista, compreende-se que o princípio da hospitalidade universal, associado com os documentos internacionais de defesa dos direitos humanos e ordenamento jurídico pátrio, deve guiar o Estado. Discutir imigração traz o imperativo ético da hospitalidade universal.

Evidenciam-se na nova Lei de Migração substratos da perspectiva da cidadania universal proposta por Kant, a exemplo do tratamento humanitário expresso na mudança de enfoque da segurança nacional para a ênfase nas garantias e nos direitos dos migrantes (OLIVEIRA, 2017OLIVEIRA, Antônio Tadeu Ribeiro de. Nova lei brasileira de migração: avanços, desafios e ameaças. Rev. bras. estud. popul., São Paulo, v. 34, n. 1, p. 171-179, Abr. 2017.). A não utilização do termo “estrangeiro” representa ruptura da concepção sectária das migrações a partir da lógica da segurança nacional (KENICKE, 2016KENICKE, Pedro Henrique Gallotti. O Estatuto do Estrangeiro e a Lei de Migrações: entre a doutrina da segurança nacional e o desenvolvimento humano. Dissertação (mestrado), Universidade Federal do Paraná, Paraná, Curitiba, 2016.). A universalidade, a proteção aos direitos humanos e a igualdade passam a ser princípios reguladores. A vedação da discriminação da condição migratória ou em razão da nacionalidade permitem o acesso livre e igualitário dos migrantes aos serviços públicos (BRASIL, 2017). Todavia, a implementação de políticas de austeridade afetarem diretamente as imigrações, em especial, os fluxos de imigração forçada. O Decreto 25.681 de 1º de agosto de 2018, do Governo de Roraima, determinava o fechamento da fronteira do município de Pacaraima com a Venezuela e limitava o acesso à saúde dos imigrantes.

O Brasil é considerado internacionalmente como “País Receptor” ou “País de Acolhida”. Essa qualidade atribuída ao Estado é oriunda de sua moderna e ampla legislação para atender e abrigar as necessidades de imigrantes e refugiados. Entretanto, a amplitude da legislação não significa que, no cotidiano, os refugiados possuam o mesmo amparo e proteção como previstos. Assim, signatário de documentos internacionais de direitos humanos e amparados por uma ampla legislação o Brasil não faz cumprir o pressuposto de hospitalidade universal. A seletividade destinada às questões raciais ou de nacionalidade não se encontram evidentes no âmbito normativo, contudo, é possível observar uma práxis distinta nas tomadas de decisões governamentais e nas políticas públicas.

Essa dissonância e não incorporações práticas de valores fundamentais para que um País possa ser, de fato, acolhedor não coaduna com o pressuposto kantiano de hospitalidade universal. Mas, por meio de uma extensão interpretativa, é possível compreendê-la como mitigada pois, embora essa hospitalidade esteja presente normativamente, decisões e discursos de agentes estatais evidenciam que esta hospitalidade é mitigada diante de uma seletividade imigratória com fulcro em valores, de uma herança ainda presente, de hierarquia entre raças ou nações. Portanto, tem-se uma hospitalidade universal mitigada.

A segmentação valorativa presente na sociedade possui pilares raciais ou xenofóbicos. O discurso de ódio a outros imigrantes latino-americanos encontra eco na sociedade brasileira, o que demonstra a clara ausência de alteridade. A incorporação da negação e medo a “determinados diferentes” integra a construção da cultura brasileira distante da alteridade, são elementos presentes na gênese do processo das relações raciais no Brasil (BENTO, 2002BENTO, Maria Aparecida Silva. Branqueamento e branquitude no Brasil. In: BENTO, M. A. S.; CARONE, Iray (org.). Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. 25-57.). Esse sentimento não ocorre somente com os imigrantes, mas também em relação aos brasileiros. Célia Azevedo (2004)AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Onda negra medo branco: o negro do imaginário das elites do século XIX. 2 ed. São Paulo: Annablume, 2004. descreve que o medo está nas entranhas do preconceito e destaca essa problemática no próprio título da sua obra “Onda negra, medo branco: o negro do imaginário das elites do século XIX”. A autora, por meio das análises de documentos históricos, reconhece que o medo estava camuflado em meio as teorias muito elaboradas, e que, de toda forma, é impulsionador do mercado do trabalho livre, a partir da substituição da mão-de-obra escrava (AZEVEDO, 2004AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Onda negra medo branco: o negro do imaginário das elites do século XIX. 2 ed. São Paulo: Annablume, 2004.).

Lovecraft (2009)LOVECRAFT, Howard Phillips. Notas sobre a escrita de contos fantásticos. O chamado de Cthulhu e outros contos. São Paulo: Hedra, 2009. sustenta que o medo é a mais forte e antiga emoção humana e a espécie de medo mais velha e poderosa é o medo do desconhecido. Associado ao medo, há o ódio, que, para Bauman (2008)BAUMAN, Zygmunt. Medo Líquido . Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2008., ambos têm a mesma origem, e raramente são experimentados separadamente. Pode ser apenas dois nomes atribuídos a uma mesma experiência, a diferença é que um deles se refere ao que se sente e o outro, ao que se ouve e vê. A forma de disseminação do medo, do ódio e, por conseguinte, do mal se deu por meio da manipulação da propaganda. Os fantasmas evocados pelas sociedades que as assombram com o medo do outro resultam, de forma mais qualificada, em discursos de ódio voltados às minorias. Estes são oriundos de uma ampla herança de valores de superioridade racial, eurocentrista e incorporado diante de manifestações de líderes governamentais que seccionam aqueles que “impulsionarão o desenvolvimento” do País e aqueles que irão “roubar empregos” dos nacionais.

Essas instigações ao medo e a segmentação expressa por autoridades reverberam em um eco com maior alcance e aceitação pela população. O usufruto do medo e da manipulação de propagandas é retratado por Hannah Arendt (1998)ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. como, dentre outros, fundantes da agremiação nos movimentos totalitários por meio da incorporação do discurso por parte da sociedade civil. A culpabilidade de quaisquer problemáticas destinadas a grupos minoritários ou como potenciais riscos foram meios de propagação ideológica do nazismo e, por meio desta atingiu a sua notável dimensão. Arendt (1998)ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. evidencia que a incorporação e a propagação de discursos de ódio foram essenciais para a dominação da massa. Assim, a receptividade segmentada pela sociedade, por atores governamentais, por políticas e pelas simples práticas segregacionistas são fatos que anseiam por olhares atentos.

Por outro lado, identifica-se incentivos na nova política governamental para estrangeiros de países “civilizados”. Reflete-se sobre adoção de medidas de hospitalidade não universais, mas mitigadas, como a que ocorreu na política de branqueamento. A cidadania mundial é materializada pela hospitalidade e tem como reflexo a proteção dos direitos humanos. Os Estados não podem ignorar suas responsabilidades, em especial, o compromisso assumido com a dignidade dos indivíduos, não só daqueles que são seus cidadãos. Assim, sob a luz da filosofia kantiana, os homens e os seus Estados possuem obrigação com o que ele denomina de comunidade dos povos (KANT, 2008KANT, Imannuel. A paz perpétua: Um projecto filosófico. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 2008.). Embora pareça utópica, a superação dos problemas humanitários é factível. Consoante a Kant, Dostoievski (1995DOSTOIÉVSKI, Fiódor. O sonho de um homem ridículo. São Paulo: Editora, v. 34, 1995., p.23) adverte “se todos quisessem, tudo mudaria sobre a Terra num momento”.

Considerações finais

O racismo estrutural no Brasil possui relação intrínseca com as teorias ditas científicas e coadunam com ideias de hierarquia racial e darwinismo social. A elite contrária ao abolicionismo obteve sucesso com a importação dessas teorias em território brasileiro, forjando a estigmatização dos negros e a instalação de preconceitos contra indivíduos de matrizes africanas. A persistência do racismo ainda assola a sociedade brasileira, todavia, hoje se manifesta em meios camuflados e complexos, que, por vezes, são institucionalizadas.

O racismo é um fenômeno sócio histórico, possui sentido multidimensional e, desde as teorias raciais, estabelecem relação assimétrica entre as raças, com um discurso de poder, renomeado em “identidade nacional” e “nacionalismo”. O mestiço, como elemento de transição para a construção de uma nação de branco, é um dos pilares da política de branqueamento, provindo do incentivo de imigração do homem visto como civilizado: branco e europeu. A construção da lógica racial no Brasil é vista na referida política como modo de incidência do racismo na subjetividade, ainda presente. Assim, compreende-se que a política migratória brasileira influenciou na institucionalização do racismo por meio, inclusive, de intelectuais importantes para o pensamento constitucional brasileiro: Oliveira Viana.

O Brasil foi o último país a abolir a escravidão. A inércia diante da temática reforça a dívida histórica evidente na reprodução e incorporação de ações e discursos de cunho racistas, mas, também se encontram de forma camuflada e difusa no cotidiano e no funcionamento de instituições. Esse contexto ocasiona um ciclo de estigmas contínuos, gera desigualdade, por exemplo, no acesso a serviços públicos essenciais. Privilégios usufruídos pela população branca dificultam o acesso da população mestiça e negra às esferas políticas, econômicas e sociais.

Além das vozes que propagavam os discursos racistas, há que se destacar aqueles que, em prol da abolição da escravatura, propuseram valores de liberdade, igualdade e, por conseguinte, de acesso equânime para todos, negros e brancos. Pe. Vieira, José Bonifácio, Tobias Barreto, Joaquim Nabuco, dentre outros, em tempos diferentes impulsionaram, dentro das suas limitações, movimentos progressistas de suma relevância. Embora os referidos valores não tenham possuído seu realce necessário à época, estes são norteadores principiológicos da Constituição Federal de 1988. Assim, é possível observar que o movimento abolicionista e seus ideólogos foram imprescindíveis na formação do pensamento constitucional brasileiro.

A análise das constituições brasileiras posteriores à abolição da escravatura no que concerne às políticas migratórias demonstra a significativa preocupação política e governamental com a temática. A discussão emergente do fim da escravidão trouxe a reflexão sobre a política de branqueamento e o incentivo à imigração europeia, incorporados pela Constituição de 1891. A Constituição de 1934, rompe com a República Velha, traz como marco o cunho nacionalista desenvolvimentista. Para tanto, houve a inclusão de políticas migratórias restritivas, a exemplo da Lei de 2/3 e da “Lei de Cotas”.

Os movimentos operários revolucionários encabeçados pelos imigrantes europeus desencadearam verdadeiras mudanças no panorama legal e político brasileiro, até então desconhecedor do caráter organizativo de tais movimentos. A Constituição de 1937 - Estado Novo – e ordenamento jurídico vigente convergiram com a não recepção imigratória, inclusive, dos refugiados judeus que tiverem seus direitos humanos desconsiderados. Diferentemente, a Constituição de 1946 retoma a possibilidade expressa de imigrantes que satisfizessem requisitos, como a origem europeia, para serem recebidos. É significativa a persistência do mito do branqueamento. A política migratória pós-guerra continuou vinculada à ideia de raça e eugenia.

Foi possível apreender que os regimes autoritários e ditatoriais tendem a não adotarem ações positivas imigratórias, pois a proteção exacerbada da segurança nacional e a visão de que o estrangeiro seria perigoso ao regime constam da Constituição de 1967. A propaganda nacional e o discurso de ódio e medo do outro auxiliaram o governo militar no controle da sua política. Com o advento da Constituição de 1988 há avanços na seara dos direitos dos imigrantes e posteriormente, em 2017, há a promulgação da Lei do Imigrante que altera a própria nomenclatura, até então pejorativa de ‘estrangeiro’.

A percepção do senso comum de que o Brasil é considerado um país de imigração anseia por uma análise desde a concepção de “Brasil”, a partir do processo de colonização que se relaciona com o modus escravocrata até a observação da seletividade nos incentivos a fluxos migratórios; enquanto outros fluxos são marginalizados politicamente, dada a ausência da percepção de alteridade. Portanto, a análise histórica documental e normativa resultou na constatação de que o Brasil apresenta uma política migratória de hospitalidade universal mitigada.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    04 Fev 2020
  • Aceito
    28 Set 2020
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