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Política de estabilização no Brasil: algumas lições do Plano Cruzado* * Versão revisada de trabalho apresentado no painel “Aspectos Teóricos dos Planos Cruzado, Austral e de Israel”, realizado durante o XIV Encontro da ANPEC em Brasília, 10.12.1986. Originalmente este ensaio foi concebido como um comentário ao trabalho apresentado pelo professor Simonsen neste mesmo painel: M. H. Simonsen, “Rational Expectations, Incomes Policies and Game Theory”, Ensaios Econômicos EPGE, n. 90, out. 1986, ou Revista de Econometria, 6, nov. 1985, ou Anais de XIV Encontro Nacional de Economia, ANPEC. O autor agradece os comentários de Marco A. Guarita, Edmar L. Bacha e José Márcio Camargo. (versão revista com dados até março de 1987.)

Stabilization Plan in Brazil: some lessons from the Cruzado Plan

RESUMO

O sucesso de um programa de estabilização depende de uma série de fatores. As experiências recentes com planos “heterodoxos” são fontes de lições importantes tanto para futuras tentativas de estabilização quanto para desenvolvimentos teóricos. Esta peça enfoca as lições aprendidas com o Plano Cruzado.

PALAVRAS-CHAVE:
Inflação; estabilização; Plano Cruzado

ABSTRACT

the success of a stabilization program depends on a series of factors. The recent experiences with “heterodox” plans are sources of important lessons for both future stabilization attempts and for theoretical developments. This piece focuses on the lessons learned from the Cruzado Plan.

KEYWORDS:
Inflation; stabilization; Cruzado Plan

Nos últimos anos, tem havido extraordinários progressos no tocante ao entendimento do fenômeno inflacionário e das dificuldades inerentes à implementação de políticas de estabilização. Esses progressos são um resultado inequívoco de um amplo esforço de pesquisa, não só no Brasil, mas em vários países, cuja motivação pode ser facilmente associada à própria experiência dos anos 70 e 80 especialmente na América Latina. Esses avanços ao nível de teoria tiveram um papel destacado na elaboração e implantação dos planos de estabilização “heterodoxos”, mas nem por isso a avaliação dos progressos teóricos deve se confundir com o debate em torno dos resultados práticos dos planos Austral, Inti e Cruzado. O sucesso de um plano de estabilização depende de muitos fatores conjunturais, de política, talento e liderança, e a falta de qualquer um destes pode comprometer um plano inicialmente bem estruturado ou teoricamente bem fundamentado. Por outro lado, as experiências de estabilização “heterodoxas” geraram lições de extraordinária importância, tanto por sancionar (ou não) os pretensos progressos da teoria, quanto por revelar novos problemas não propriamente considerados ex-ante. No caso particular do Plano Cruzado, o sentimento de frustração quanto aos seus resultados não deve encobrir o fato de que se aprendeu muitíssimo com a experiência, e essas lições devem ser cuidadosamente estudadas a fim de que os erros cometidos não sejam repetidos em tentativas futuras. Neste trabalho são identificadas algumas dessas lições, e talvez o aspecto mais importante destas é o de que, embora parecendo triviais, nenhum desses pontos era aceito uma década atrás. Assim, se é verdade que a experiência do Plano Cruzado nos permite realmente tomar como aprendidas essas lições, isso será evidência de que nosso entendimento sobre políticas de estabilização terá registrado um notável avanço.

SOBRE A “DISPOSIÇÃO POLÍTICA” OU A “SOLUÇÃO SIMPLES”

Talvez o mais frequente dos clichês relativos ao combate à inflação seja o de que “as causas da inflação são simples e conhecidas e que só falta ao governo coragem ou disposição política para levar adiante a estabilização”. Esse tipo de argumentação parte invariavelmente de economistas de orientação conservadora, para os quais o problema da estabilização resume-se a uma administração “corajosa” da política monetária. Amostras podem ser encontradas às dezenas, por exemplo, nos Relatórios da Fazenda do período imperial. Ao longo do século XX diversos “financistas” revezaram-se com essa bandeira: Joaquim Murtinho, Leopoldo Bulhões, Pandiá Calógeras, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, Ramalho Ortigão, Eugênio Gudin, Otávio Gouvêa de Bulhões, Roberto Campos e os Chicago boys de hoje. A ideia de que só falta “coragem” sobreviveu a alguns notáveis reveses, especialmente nos anos 50 e 60 aqui e em outros países da América Latina onde programas de estabilização de corte ortodoxo coletaram sucessivos fracassos, além do que alguns notáveis sucessos foram obtidos em programas apoiados em esquemas como “pactos sociais”, notadamente na Argentina. Assim mesmo, o mito da solução monetária simples não só sobreviveu como alimentou-se de algumas novas teorias geradas pelos economistas ligados à escola das expectativas racionais: a “mudança de regime” do professor Sargent pode ser vista como um problema de “coragem” no uso das políticas monetária e fiscal, para não dizer de puro heroísmo.1 1 O mais conspícuo dentre estes heróis, geralmente presidentes de bancos centrais, é o alemão Schacht, que ao resistir às demandas “inflacionistas” do governo teria assegurado o fim da hiperinflação em 1923. Veja-se Thomas Sargent, “Os Finais de Quatro Hiperinflações”, em J. M. Rego (org.) Inflação Inercial, Teorias sobre Inflação e o Plano Cruzado, Rio de Janeiro, 1986.

Nesse sentido, é bastante digno de nota no contexto da discussão brasileira que, em trabalho recente,2 2 M. H. Simonsen, “Rational Expectations ... “, op. cit. o professor Simonsen reconheça explicitamente que o problema não é só “coragem”, ou só política monetária (e fiscal), e que a estabilização envolve também e essencialmente alguma “política de rendas”, ou mais precisamente algum mecanismo destinado a coordenar as decisões individuais de fixação de preços e salários na economia. Não há absolutamente nada de trivial nessa conclusão: a ideia de que mecanismos de coordenação ad hoc são necessários para deter inflações grandes é uma conquista muito recente e ainda não totalmente estabelecida. Muitos ainda relutam em reconhecer os problemas de coordenação decisória inerentes à implementação de políticas de estabilização ou acreditam, em alguma medida, na mágica da “mudança de regime” do professor Sargent.3 3 Veja-se Thomas Sargent, “Os Finais de ... “, op. cit.

É claro que inflações “pequenas” sempre podem ser dominadas à custa de recessões suportáveis ao longo de uma curva de Phillips, ou podem, evidentemente, ser tratadas por remédios menos convencionais, tais como políticas de renda, acordos tripartites, congelamentos, etc. O ponto importante é que a primeira alternativa não se apresenta no caso de inflações “grandes”. Pelo que se sabe sobre curva de Phillips no Brasil pode-se com segurança afirmar que a ordem de magnitude dos efeitos sobre a inflação de contrações de demanda agregada é muito pequena: de acordo com os parâmetros de uma estimativa recente, uma inflação de 100%, na ausência de outras influências, seria trazida para 20% se o hiato do produto fosse mantido em 20% durante dez anos.4 4 Veja-se Rubens P. Cysne, “A Relação de Phillips no Brasil: 1964-66 x 1980-84”, Revista Brasileira de Economia, 39 out.-dez. 1985. Considerando-se que o coeficiente da variável hiato do produto é 0,4, tomando-se um hiato de 0,2, a contribuição anual sobre a inflação seria de -8%, cf. p. 417.

A fronteira entre essas inflações “grandes” e “pequenas” é muito difícil de ser demarcada. Mesmo inflações à primeira vista grandes podem ser tratadas com remédios ortodoxos: a “tolerância” da sociedade para com as consequências recessivas de um plano desse tipo pode ser tomada irrelevante por um regime autoritário. Os casos clássicos desse fenômeno são o do nosso PAEG e o do plano de estabilização posto em prática pelo general Pinochet a partir de 1973. Em ambos os casos, contudo, sabe-se que o tratamento ortodoxo contribuiu apenas parcialmente para o resultado final: choques agrícola e cambial, além do arrocho salarial promovido por ambos, contribuíram possivelmente de forma muito mais importante que as respectivas recessões para a queda da inflação.5 5 Veja-se Alejandro Foxley, Latin American Experiments in Neoconservative Economics, Berkeley, 1983, e André Lara-Rezende, ‘’ A Política Brasileira de Estabilização: 1963-68’’, Pesquisa e Planejamento Econômico, 12, dez. 1982.

De um modo ou de outro, esses problemas com respeito à eficácia de políticas de estabilização ortodoxas, que facilmente podem ser encarados como peculiaridades desse continente,6 6 A ideia de que a América Latina é “diferente” é muito frequentemente ironizada. Reza, por exemplo, a 6ª.lei de Kafka que “a lógica inventada pelos gregos do hemisfério norte não tem aplicação ao sul do equador”. Cf. R. Campos, A Técnica e o Riso, Rio de Janeiro, 1976, p. 34. vêm sendo levantados há muitos anos pelos críticos dos programas de austeridade patrocinados pelo FMI, geralmente economistas da “escola” estruturalista. Estes, no entanto, nunca de fato tiveram muito a dizer sobre essas “políticas de rendas” de que fala o professor Simonsen: as poucas experiências latino-americanas nesse sentido, destacadamente na Argentina de Perón, não buscaram sua inspiração nos ensinamentos da CEPAL. Mas de qualquer modo é interessante que a passagem do tempo venha resgatar essa crítica aos programas de estabilização ortodoxos.

Não há nada de simples, portanto, com as causas da inflação ou com o desenho de políticas de estabilização. O problema não se resolve unicamente através de políticas monetária e fiscal, e inflações “grandes” são pouco afetadas (relativamente à sua própria ordem de magnitude) por recessões prolongadas. Nada disso, convém repetir, era aceito há alguns anos.

A SUPOSTA INEVITABILIDADE DOS SACRIFÍCIOS

Um aspecto muito importante e pouco observado da chamada curva de Phillips é o de que ela trazia implícita uma ética de grande apelo ao senso comum: a inflação era produto de “excessos” (fiscais, monetários ou salariais), e para combatê-la seria preciso incorrer em sacrifícios, “expiar os pecados” ou “apertar os cintos”. A inevitabilidade desse sofrimento aparecia como algo quase-religioso ou moral, que bem se ajustava à ética mais mundana do mundo de negócios anglo-saxão: there is no such a thing as a free lunch.

Apesar de moralmente robusto, o trade-off não se revelou inexpugnável. Vários economistas trabalharam no problema, desde os próceres das expectativas racionais até os “heterodoxos” de hoje, e algumas possibilidades nessa área foram estabelecidas e aceitas. A chave do problema é observar que o desempenho da economia é o resultado da interação de muitos agentes individuais, e não necessariamente o agregado preserva as propriedades que caracterizam a racionalidade ao nível individual. Na verdade, isso só se observa em uma economia de um só agente, onde, por construção, a racionalidade “coletiva” é igual à individual. De resto, o comportamento agregado da economia frequentemente, talvez sempre, se mostra “irracional”. Um exemplo muito comum nesse sentido é o fenômeno do desemprego: há máquinas paradas e homens desempregados, há produtos encalhados (superprodução) e pessoas com fome (subconsumo). Hoje se sabe que não há trade-off envolvido e que se pode, ao mesmo tempo, ocupar as máquinas e os trabalhadores sem necessariamente impor a estes o sacrifício de menores salários. Há, portanto, “free lunch”!

O fenômeno da inflação pode ser visto de forma muito semelhante ao do desemprego. É uma irracionalidade do ponto de vista coletivo, que não faz sentido algum em um mundo de um só agente: Robinson Crusoe não verá sentido em correr atrás da própria sombra. Dessa maneira, sendo a inflação precipuamente um mal para a coletividade, qualquer equilíbrio sem inflação é superior a um equilíbrio inflacionário: ou seja, um equilíbrio com inflação não é Pareto ótimo, de modo que há ganhos, e não sacrifícios, ao passar de um ao outro. A fábula do estádio de futebol, originalmente associada a Tobin e abrasileirada por Edmar Bacha,7 7 Veja-se Edmar L. Bacha, “A Inércia e o Conflito: o Plano Cruzado e seus Desafios”, Departamento de Economia da PUC-RJ, Textos para Discussão, n, 131, jul. 1986. bem expressa o problema: do momento em que alguém se levanta para ver melhor, os que estão atrás são forçados a se levantar, e, assim se estabelece um equilíbrio não cooperativo que tende a se perpetuar, a menos que algum mecanismo de coordenação ad hoc seja criado para induzir a ação coletiva na direção de um equilíbrio onde todos estejam melhor.8 8 Note-se que diferenças de estatura prevalecem mesmo quando todos estão sentados. Embora essas diferenças possam gerar tensões “distributivas” sérias, o ponto é que é melhor, ou pelo menos mais cômodo, discuti-las com todos sentados que com todos em pé. Para passar de um equilíbrio a outro é necessária alguma “política de rendas”, como já foi observado. Mas como, em princípio, a coletividade atinge um nível superior de utilidade no novo equilíbrio, há ganhos líquidos a serem repartidos e não há por que imaginar que algum sacrifício necessariamente tenha de ser incorrido individual ou coletivamente.

O MITO DO IDEAL COMPETITIVO

A ideia de que um equilíbrio em competição perfeita é Pareto ótimo leva muitos a acreditar, a despeito das teorias de second best, que uma economia mais competitiva é sempre mais eficiente que outra sujeita às distorções geradas por oligopólios, monopólios, sindicatos e outras instituições que, por definição, interferem no livre funcionamento dos mercados. Na verdade, é bastante disseminada a crença de que são precisamente essas distorções que dão origem ao fenômeno da inércia inflacionária e da ineficácia dos planos de estabilização ortodoxos. No entanto, pode-se perfeitamente argumentar no sentido oposto. No texto do professor Simonsen, por exemplo, chega-se à aparentemente paradoxal conclusão de que o interlúdio estagflacionário associado às políticas de estabilização tradicionais, política monetária no caso, é tanto maior quanto mais atomizada é a econornia.9 9 M. H. Simonsen, “Rational Expectations ... “, op. cit. Essa conclusão (que, aliás, Simonsen argumenta que não deve ser levada muito a sério) está longe de ser um resultado isolado. Resultados semelhantes vêm sendo obtidos por diversos caminhos e por diversos autores, além do que vêm recebendo notável apoio empírico.10 10 Uma listagem parcial pode ser encontrada em meu próprio trabalho “Inertia, Coordination and Corporatism”, Departamento de Economia da PUC-RJ, Textos para Discussão, n? 141, out. 1986. Argumenta-se, por exemplo, tal como Simonsen, que o problema de estabilização é essencialmente um problema de coordenação e que “estabilidade de preços” pode ser considerada um bem público, já que nenhum agente pode ser “excluído” do seu “consumo”. Com isso há uma tendência para que os agentes se abstenham de contribuir para o esforço de estabilização na exata medida do benefício que auferem do programa. Este é, aliás, um problema comum no tocante à provisão de bens públicos: o problema do franco-atirador (o free rider). Mostra-se, nesse sentido, que a propensão a comportamentos desse tipo é tanto maior quanto maior for a própria comunidade,11 11 A contribuição pioneira nessa área é o livro de Mancur Olson “The Logic of Colective Action “, Cambridge, 1965. isto é, a “coordenação” ou a “política de rendas” necessária para fins de estabilização se torna mais e mais difícil quanto mais atomizada é a economia, e mais fácil quanto mais “organizada” ou “corporativista”12 12 No contexto da discussão europeia o termo corporativismo (corporatism no original) é utilizado para descrever economias dotadas de algumas características específicas: um alto grau de sindicalização e de federalização sindical e patronal, relações estreitas entre o movimento sindical e o partido político correspondente (geralmente a social-democracia) e com isso, no contexto de regimes parlamentaristas, observase maior grau de participação nas decisões de política econômica. Há também o fato de que em países ditos mais “corporativistas” as negociações coletivas são conduzidas a nível nacional e não a nível de fábrica, e que os contratos coletivos não são referendados em assembleias. Embora possa haver parentesco, o sentido desse “corporativismo” não é o mesmo daquele associado ao termo, por exemplo, no contexto da discussão em torno do trabalhismo durante o primeiro governo Vargas. é a economia. Há uma crescente literatura a esse respeito, tendo como objeto a melhor performance das economias ditas mais corporativistas nas últimas duas décadas, na área da OCDE.13 13 Veja-se especialmente M. Bruno e J. Sachs, “Economics of Worldwide Stagflation’”, Cambridge, 1985, cap. 11, e C. Crouch, “Conditions for Trade Union Restraint”, em L. N. Lindberg e C. S. Maier (orgs.), “The Politics of lnflation and Economic Stagnation “, Washington, 1985. O que esses trabalhos revelam é que o aprofundamento da social-democracia, o avanço na organização dos interesses econômicos, longe de causar “distorções”, estabelece arenas para solução de conflitos, e mecanismos institucionalizados de coordenação, ou para a implementação de “políticas de renda”, que permitem a solução do problema inflacionário, de acordo com a terminologia da teoria dos jogos, como um jogo cooperativo. Nesse sentido, a organização dos interesses econômicos se apresenta como o canal através do qual cresce o grau de participação dos diversos segmentos da sociedade nas decisões de política econômica.

A relevância dessas observações para o caso brasileiro é muito óbvia. O grau de “organização” do movimento sindical, por exemplo, é muito baixo, o que pode ser diretamente associado à longa sobrevida da CLT. A organização sindical é fragmentada, descentralizada, financeiramente dependente do governo, que aliás detém grande poder de controle sobre os sindicatos, disso resultando a reduzida representatividade das organizações sindicais e sua clara inoperância. É em função exatamente dessa fraqueza do movimento sindical que se torna difícil elevar seu grau de participação na condução de um experimento de estabilização e da política econômica em termos mais gerais. A ausência de interlocutores representativos define como pouco relevantes as tentativas frequentemente conduzidas nos últimos anos de se forjar um “pacto social” nos moldes europeus. Nesse sentido, no âmbito de um plano de estabilização, a solução coercitiva representada pelo congelamento de preços termina fazendo o papel de um “pacto social”, ou de um mecanismo de coordenação decisória, que de outra forma jamais alcançaria a dimensão necessária para permitir um experimento de estabilização.

Em suma, em economias atomizadas os problemas de coordenação inerentes à estabilização se tornam impossíveis de ser resolvidos, senão por soluções coercitivas. Assim, a organização dos interesses econômicos em termos mais gerais parece o caminho para tornar possíveis experiências tais como “pactos sociais” ou “políticas de rendas”, uma vez que acordos são mais fáceis, e também mais eficazes, em economias “organizadas”, onde o número de interlocutores é menor.

A INEFICIÊNCIA INFLACIONÁRIA DO SETOR PÚBLICO

O ponto de vista de que a principal causa da inflação no Brasil e o desequilíbrio fiscal é subscrito por muitos dos participantes do debate em torno de políticas de estabilização nos últimos anos. Paralelamente, é talvez unanimemente aceito que o setor público no Brasil conduz de forma extremamente ineficiente o processo de alocação do gasto público e da carga tributária e também a sua atividade reguladora. É muito comum que essas duas ideias, que em princípio não estão necessariamente relacionadas, sejam indevidamente confundidas. A ineficiência assim como os exageros da ação empresarial e reguladora do Estado são certamente temas muito relevantes: a sociedade deve estar atenta aos desperdícios de recursos patrocinados pelo setor público, seja sob a forma de empresas estatais deficitárias, corrupção ou armas atômicas. Estritamente falando, contudo, não é claro que essas “distorções” sejam as causas da inflação brasileira. Ao nível de senso comum a associação causal entre inflação e as ineficiências do setor público é muito frequente: a corrupção é um mal, a inflação outro, nada mais natural no âmbito da retórica antiestatizante que relacioná-los de forma causal. Dessa forma, argumenta-se que nenhum programa de estabilização verdadeiro poderia funcionar sem atacar a corrupção, os desperdícios e sem promover uma redução permanente no tamanho do setor público. No entanto, a associação é absurda: a estatização ou as ineficiências do setor público podem muito bem não se refletir nem mesmo em déficit orçamentário. Pode-se da mesma forma sugerir que o combate à inflação deve começar pela repressão ao tráfico de entorpecentes ou à prostituição.

No tocante à política de estabilização propriamente dita, é preciso considerar em primeiro lugar o tamanho do déficit público, ou seu impacto em termos de demanda agregada. É curioso notar que o Brasil tenha déficits (no sentido operacional) inferiores (5,2% do PIB para 1985 e 4,7% para 1986) aos que se observam no Canadá, Itália, Bélgica, Holanda, Espanha e Suécia (a média dos déficits desses países para 1982 é de aproximadamente 8% do PIB. A média do grupo para a inflação é de 10,8% anuais).14 14 Veja-se Francisco Lopes, O Choque Heterodoxo Rio de Janeiro, 1986, p. 165. Em termos do conceito operacional, esses números seriam menores. Para a Itália e o Canadá, por exemplo, estimativas para o déficit segundo o conceito operacional são da ordem de 4,90/o do PIB para ambos, considerando a média do período 1983-1985. Veja-se Eduardo Modiano, “Mitos e Fatos sobre o Setor Público Brasileiro”, Departamento de Economia da PUC-RJ, Textos para Discussão, n:’ 134, ago. 1986, p. 20. Esse já não é o caso de Israel, por exemplo, que experimenta déficits públicos superiores a 15% do PIB em média para 1968-1980. A Argentina fica a meio caminho.15 15 Com aproximadamente 8% do PIB para 1985, segundo o conceito operacional. Veja-se F. Lopes, O Choque ... , op. cit., p. 160. O ponto relevante aí é que a importância da política fiscal, ou a dimensão do problema fiscal que cada país enfrenta varia muito de caso para caso A questão é empírica, e, na verdade, não é necessariamente um problema. Pode ser importante em Israel em vista da obrigatoriedade em se manter uma economia de guerra em bases permanentes, mas pode não ser o caso brasileiro, onde algumas empresas estatais são grandes geradoras de recursos, ou no caso peruano, onde o serviço da dívida externa é quase que inteiramente responsável pelo déficit.

O tamanho “ideal” do déficit deve ser considerado em conjunto com outra discussão envolvendo mecanismos de financiamento: déficits grandes podem ser financiados por títulos com relativa facilidade em países que têm mercados financeiros desenvolvidos. No Brasil, por exemplo, o estoque de títulos da dívida pública fora do Banco Central representa cerca de 20% do PIB. Se este cresce 10% e a ideia é manter o mesmo grau de endividamento,16 16 Entendido como a razão entre o estoque de títulos da dívida pública retido fora das autoridades monetárias (excluindo, portanto, as dívidas junto a bancos e fornecedores e créditos fiscais e de outras origens junto ao setor privado) e o PIB. então a dívida pública pode prover 2% do PIB para financiar o déficit. Se a base monetária cresce l0% e representa 15% do PIB, temos aí mais l,5% do PIB como seignorage, de modo que a existência de um déficit da ordem de 3,5% do PIB não parece representar nenhuma dificuldade pelo menos no tocante ao financiamento.

Assim sendo, o déficit público no Brasil não parece grande o suficiente para que se possa tomá-lo como a causa principal da inflação brasileira dos últimos anos, pelo menos sem alguma elaboração teórica mais explícita. Isto não significa, no entanto, que o tamanho do déficit seja irrelevante em um programa de estabilização. Como será discutido em detalhe a seguir, as políticas de manejo da demanda agregada têm um papel na estabilização mesmo pela via “heterodoxa”, podendo, no entanto, funcionar no sentido expansionista ou contracionista, dependendo de outros elementos do programa, como por exemplo as políticas salarial e cambial. A conclusão, por ora, é a de que o projeto de modernização do setor público - que aliás um dia este país terá de enfrentar - não está necessariamente associado à problemática da estabilização.

SOBRE A NECESSIDADE DE MEDIDAS “ORTODOXAS”

A defesa de medidas “ortodoxas” como parte de uma estabilização “heterodoxa” geralmente apela ao pragmatismo tão característico do economista. Dado que sempre se podem tomar modelos ou teorias opostas como casos especiais de um modelo “mais geral”, e que a verdade é sempre uma combinação linear dos extremos, argumenta-se que a inflação brasileira é inercial mas também monetário-fiscal, e que por conseguinte o “choque heterodoxo” tem de ser complementado por um “choque ortodoxo”.17 17 O professor Simonsen tem argumentado com frequência que as teorias de inflação inercial e monetarista são complementares e não mutuamente excludentes. Veja-se “A Inflação Brasileira: lições e perspectivas”, Revista de Economia Política, out. 1985, e também “Experiências Anti-inflacionárias: Lições da História”, em J. M. Rego (org.), “Inflação Inercial...”, op. cit. Mas a despeito do apelo ao senso comum, a evidência para a relevância da origem monetário-fiscal da inflação brasileira não é convincente.18 18 A julgar pela relevância empírica do chamado “hiato do produto” nos vários estudos sobre a Curva de Phillips para o Brasil. Veja-se especialmente E. Modiano, “A Dinâmica de Salários e Preços na Economia Brasileira 1966-81.”, Pesquisa e Planejamento Econômico, 13, abril 1983, e também Rubens P. Cysne, “A Relação de Phillips ... “, op. cit .. Dessa forma fica difícil justificar por aí a necessidade de políticas contracionistas no âmbito do programa “heterodoxo”. Nesse sentido, um ponto importante a ser ressaltado é o de que a necessidade de medidas “ortodoxas” constitui, na verdade, um problema de demand management que varia muito de caso para caso, e que se coloca após o “choque heterodoxo” ter solucionado a parte realmente importante do problema, que é trazer a curva de Phillips para perto do “chão”. O gráfico procura ilustrar esses pontos com detalhe.

Gráfico
Taxa de desemprego

A política de estabilização “ortodoxa” pura (sem “política de rendas”) consiste em promover uma recessão que leve a economia do ponto A para o ponto B: um caminho que pode ser muito penoso se a inflação inicial for muito elevada. A política “heterodoxa” pura (sem manejo de demanda agregada) concentra-se em deslocar o trade-off para baixo, trazendo a economia instantaneamente para o ponto D. Note-se que, na transição da inflação para a estabilidade de preços, é provável que algumas influências expansionistas se façam presentes. Desaparece, por exemplo, o “imposto inflacionário”, que no nosso caso era responsável, tomando-se como base o ano de 1985, por cerca de 2,4% do PIB.19 19 Medido pelo valor do acréscimo à base monetária observado durante o ano de 1985, isto é, 32,3 trilhões de cruzeiros. Se isso não for compensado por outros impostos, por austeridade fiscal ou por colocação de títulos, gera-se um impulso expansionista que pode levar a economia a um ponto como C, onde há “superaquecimento”. Este também seria o caso de, por exemplo, na transição de A para D, ter-se promovido uma transferência de renda para grupos com maior propensão a gastar.20 20 Tomando como hipótese que a propensão média a consumir da economia era de 0,84 antes do Plano Cruzado e que a propensão a consumir para assalariados é igual a 1, então segue-se que um aumento da folha salarial da ordem de 23,8% reais após o plano (cálculos do DIEESE para fevereiro-outubro), mantendo-se constante a folha de lucros (compressão de margens mas expansão de vendas), teria provocado um aumento de 3,2% na propensão média a consumir da economia.

É importante observar, contudo, que essas influências expansionistas não necessariamente se materializam, isto é, não são consequências inevitáveis da desinflação súbita, nem tampouco imperativos da orientação “heterodoxa” do programa. A estabilidade de preços pode determinar uma recuperação “automática” da receita fiscal, o chamado “efeito Tanzi”,21 21 Veja-se Vito Tanzi, “Inflation, Real Tax Revenues, and the Case for Inflationary Finance: Theory with an Application to Argentina” IMF Staff Papers 25 (setembro de 1978). que pode mais do que compensar, do ponto de vista da demanda agregada, a perda do “imposto inflacionário”. Além disso, a transferência de renda para os assalariados não necessariamente faz parte de um programa do tipo “choque heterodoxo”: um processo de conversão salarial pelas médias, tal como o nosso, pode muito bem ser neutro, como era proposto inicialmente, ou conduzido de modo a provocar perdas salariais.

Mas de um modo ou de outro, uma vez definido que existem influências expansionistas, nada nos indica a priori que seja preferível permanecer em D com inflação zero, ou em C com taxas da ordem de 30%, 40% ou 50% ao ano. Não há nada de intrinsecamente insustentável em geral com a ideia de se manter a economia em pontos como C, senão talvez pela restrição externa. No nosso caso, contudo, havia um impedimento muito claro definido pela permanência do congelamento de preços. Na verdade, o único ponto no gráfico sustentável a médio prazo na vigência do congelamento é o ponto D. À esquerda deste, as pressões de demanda se refletem em maiores salários e também em profit squeeze, em produção para estocagem especulativa ou para colocação nos mercados negros (as vendas com ágio), ou simplesmente em não (expansão da) produção. Prevalecendo o congelamento, essa coleção de distorções amplia-se, formando a “nuvem” mostrada no gráfico entre os pontos C e D.

A solução mais simples para essas distorções é reverter o processo que as gerou, isto é, desaquecer a economia, voltando ao ponto D. Contudo, os condutores do Plano Cruzado partiram de um diagnóstico distinto ao patrocinar os ajustes contemplados pelo chamado “Cruzado II” e pelo processo de realinhamento de preços que se seguiu. Aparentemente entendeu-se que as compressões de margens de lucro observadas na altura de novembro se deviam menos ao superaquecimento que a preços relativos desalinhados. Não se nega a existência de preços “errados” em vigor, alguns desde o início do plano, e os exemplos aí são notórios: tarifas públicas, aço, automóveis, leite etc. Sabe-se também que, com o tempo, algumas outras importantes alterações de preços relativos vieram a se somar a estas, talvez a principal, o notável crescimento do salário real.22 22 Note-se a esse respeito que o salário real em meados de 1986 está ligeiramente acima dos valores produzidos por uma regressão dos valores dos últimos 12 anos sobre uma variável de tendência (números da FIESP retirados da Conjuntura Econômica), para o ano de, por exemplo, 1980. Dessa forma, a sugestão seria a de que o salário real não estaria “alto demais”. No entanto, em 1980 o déficit em conta corrente era da ordem de 5,1% do PIB, e em 1986, em função das entradas de capital previstas e dos pagamentos programados, o déficit em conta corrente deveria ser nulo. Poderia ser argumentado, portanto, que dado o volume de recursos a ser transferido ao exterior o salário real estaria efetivamente “muito alto”. Há modificações resultantes de comportamentos do tipo free rider, tal como descrito na seção 4 (tipicamente vestuário, prestação de serviços e outros setores “fora” do congelamento), resultantes da mudança do padrão de demanda agregada operada pela redistribuição de renda a favor dos assalariados, resultantes dos ciclos de preços de produtos agrícolas e resultantes do fato de que o impacto dos aumentos salariais sobre a estrutura de custos varia conforme o setor. Embora seja difícil avaliar a real extensão dessas mudanças, fica a impressão de que uma parte muito significativa delas, aí incluindo-se os próprios ganhos salariais, é derivada do superaquecimento da economia, e, portanto, perderia importância em um quadro de desaquecimento. Nesse sentido, é bastante revelador o pleito das confederações industriais no âmbito das conversações em torno do chamado “pacto social” ou “trégua”, isto é, um aumento de preços geral e uniforme da ordem de 25%.

Assim, o realinhamento de preços deflagrado pelo Cruzado II sobrepôs a um quadro de superaquecimento um violento choque de preços relativos, além do que se mantiveram os controles sobre os preços. Com isso, deslocou-se para cima a “nuvem” mostrada no gráfico, da mesma forma como no passado maxidesvalorizações e mudanças de periodicidade na política salarial provocaram variações de preços relativos elevando o patamar da inflação. A economia retorna, portanto, a um elevado patamar de inflação, na verdade ainda não especificado em função das indefinições em torno da política salarial, mas preservando em grande medida, e talvez de forma ampliada, o rosário de distorções gerado pela longa vigência do congelamento. Um desfecho infeliz, quando não trágico, para uma promissora experiência de estabilização.

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    Versão revisada de trabalho apresentado no painel “Aspectos Teóricos dos Planos Cruzado, Austral e de Israel”, realizado durante o XIV Encontro da ANPEC em Brasília, 10.12.1986. Originalmente este ensaio foi concebido como um comentário ao trabalho apresentado pelo professor Simonsen neste mesmo painel: M. H. Simonsen, “Rational Expectations, Incomes Policies and Game Theory”, Ensaios Econômicos EPGE, n. 90, out. 1986, ou Revista de Econometria, 6, nov. 1985, ou Anais de XIV Encontro Nacional de Economia, ANPEC. O autor agradece os comentários de Marco A. Guarita, Edmar L. Bacha e José Márcio Camargo. (versão revista com dados até março de 1987.)
  • 1
    O mais conspícuo dentre estes heróis, geralmente presidentes de bancos centrais, é o alemão Schacht, que ao resistir às demandas “inflacionistas” do governo teria assegurado o fim da hiperinflação em 1923. Veja-se Thomas Sargent, “Os Finais de Quatro Hiperinflações”, em J. M. Rego (org.) Inflação Inercial, Teorias sobre Inflação e o Plano Cruzado, Rio de Janeiro, 1986.
  • 2
    M. H. Simonsen, “Rational Expectations ... “, op. cit.
  • 3
    Veja-se Thomas Sargent, “Os Finais de ... “, op. cit.
  • 4
    Veja-se Rubens P. Cysne, “A Relação de Phillips no Brasil: 1964-66 x 1980-84”, Revista Brasileira de Economia, 39 out.-dez. 1985. Considerando-se que o coeficiente da variável hiato do produto é 0,4, tomando-se um hiato de 0,2, a contribuição anual sobre a inflação seria de -8%, cf. p. 417.
  • 5
    Veja-se Alejandro Foxley, Latin American Experiments in Neoconservative Economics, Berkeley, 1983, e André Lara-Rezende, ‘’ A Política Brasileira de Estabilização: 1963-68’’, Pesquisa e Planejamento Econômico, 12, dez. 1982.
  • 6
    A ideia de que a América Latina é “diferente” é muito frequentemente ironizada. Reza, por exemplo, a 6ª.lei de Kafka que “a lógica inventada pelos gregos do hemisfério norte não tem aplicação ao sul do equador”. Cf. R. Campos, A Técnica e o Riso, Rio de Janeiro, 1976, p. 34.
  • 7
    Veja-se Edmar L. Bacha, “A Inércia e o Conflito: o Plano Cruzado e seus Desafios”, Departamento de Economia da PUC-RJ, Textos para Discussão, n, 131, jul. 1986.
  • 8
    Note-se que diferenças de estatura prevalecem mesmo quando todos estão sentados. Embora essas diferenças possam gerar tensões “distributivas” sérias, o ponto é que é melhor, ou pelo menos mais cômodo, discuti-las com todos sentados que com todos em pé.
  • 9
    M. H. Simonsen, “Rational Expectations ... “, op. cit.
  • 10
    Uma listagem parcial pode ser encontrada em meu próprio trabalho “Inertia, Coordination and Corporatism”, Departamento de Economia da PUC-RJ, Textos para Discussão, n? 141, out. 1986.
  • 11
    A contribuição pioneira nessa área é o livro de Mancur Olson “The Logic of Colective Action “, Cambridge, 1965.
  • 12
    No contexto da discussão europeia o termo corporativismo (corporatism no original) é utilizado para descrever economias dotadas de algumas características específicas: um alto grau de sindicalização e de federalização sindical e patronal, relações estreitas entre o movimento sindical e o partido político correspondente (geralmente a social-democracia) e com isso, no contexto de regimes parlamentaristas, observase maior grau de participação nas decisões de política econômica. Há também o fato de que em países ditos mais “corporativistas” as negociações coletivas são conduzidas a nível nacional e não a nível de fábrica, e que os contratos coletivos não são referendados em assembleias. Embora possa haver parentesco, o sentido desse “corporativismo” não é o mesmo daquele associado ao termo, por exemplo, no contexto da discussão em torno do trabalhismo durante o primeiro governo Vargas.
  • 13
    Veja-se especialmente M. Bruno e J. Sachs, “Economics of Worldwide Stagflation’”, Cambridge, 1985, cap. 11, e C. Crouch, “Conditions for Trade Union Restraint”, em L. N. Lindberg e C. S. Maier (orgs.), “The Politics of lnflation and Economic Stagnation “, Washington, 1985.
  • 14
    Veja-se Francisco Lopes, O Choque Heterodoxo Rio de Janeiro, 1986, p. 165. Em termos do conceito operacional, esses números seriam menores. Para a Itália e o Canadá, por exemplo, estimativas para o déficit segundo o conceito operacional são da ordem de 4,90/o do PIB para ambos, considerando a média do período 1983-1985. Veja-se Eduardo Modiano, “Mitos e Fatos sobre o Setor Público Brasileiro”, Departamento de Economia da PUC-RJ, Textos para Discussão, n:’ 134, ago. 1986, p. 20.
  • 15
    Com aproximadamente 8% do PIB para 1985, segundo o conceito operacional. Veja-se F. Lopes, O Choque ... , op. cit., p. 160.
  • 16
    Entendido como a razão entre o estoque de títulos da dívida pública retido fora das autoridades monetárias (excluindo, portanto, as dívidas junto a bancos e fornecedores e créditos fiscais e de outras origens junto ao setor privado) e o PIB.
  • 17
    O professor Simonsen tem argumentado com frequência que as teorias de inflação inercial e monetarista são complementares e não mutuamente excludentes. Veja-se “A Inflação Brasileira: lições e perspectivas”, Revista de Economia Política, out. 1985, e também “Experiências Anti-inflacionárias: Lições da História”, em J. M. Rego (org.), “Inflação Inercial...”, op. cit.
  • 18
    A julgar pela relevância empírica do chamado “hiato do produto” nos vários estudos sobre a Curva de Phillips para o Brasil. Veja-se especialmente E. Modiano, “A Dinâmica de Salários e Preços na Economia Brasileira 1966-81.”, Pesquisa e Planejamento Econômico, 13, abril 1983, e também Rubens P. Cysne, “A Relação de Phillips ... “, op. cit ..
  • 19
    Medido pelo valor do acréscimo à base monetária observado durante o ano de 1985, isto é, 32,3 trilhões de cruzeiros.
  • 20
    Tomando como hipótese que a propensão média a consumir da economia era de 0,84 antes do Plano Cruzado e que a propensão a consumir para assalariados é igual a 1, então segue-se que um aumento da folha salarial da ordem de 23,8% reais após o plano (cálculos do DIEESE para fevereiro-outubro), mantendo-se constante a folha de lucros (compressão de margens mas expansão de vendas), teria provocado um aumento de 3,2% na propensão média a consumir da economia.
  • 21
    Veja-se Vito Tanzi, “Inflation, Real Tax Revenues, and the Case for Inflationary Finance: Theory with an Application to Argentina” IMF Staff Papers 25 (setembro de 1978).
  • 22
    Note-se a esse respeito que o salário real em meados de 1986 está ligeiramente acima dos valores produzidos por uma regressão dos valores dos últimos 12 anos sobre uma variável de tendência (números da FIESP retirados da Conjuntura Econômica), para o ano de, por exemplo, 1980. Dessa forma, a sugestão seria a de que o salário real não estaria “alto demais”. No entanto, em 1980 o déficit em conta corrente era da ordem de 5,1% do PIB, e em 1986, em função das entradas de capital previstas e dos pagamentos programados, o déficit em conta corrente deveria ser nulo. Poderia ser argumentado, portanto, que dado o volume de recursos a ser transferido ao exterior o salário real estaria efetivamente “muito alto”.
  • 24
    JEL Classification: E31; E52.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 1988
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