Acessibilidade / Reportar erro

Sistemas de organização de assistência médica: critérios e padrões de avaliação

Medical care organization systems: criterions and standards of evaluation

Resumos

São definidas as recomendações da Organização Mundial da Saúde e pela Organização Panamericana da Saúde para a estrutura dos sistemas de organização de assistência médica. São analisados os dois grandes sistemas - o indireto e o direto, examinando as vantagens e desvantagens de cada um deles para a medicina geral e a especializada, a hospitalização, a assistência farmacêutica e odontológica e as atividades preventivas.

Assistência médica; Sistemas de organização; Avaliação


World Health Organization and Panamerican Health Organization recomendations for the structuration of medical assistance systems, were pointed out. So two large systems, direct and indirect ones, were analysed, with profits and disprofits of both of them, for general medicine, specialized medicine, hospitalization, odontological and drug assistance and preventive activities.

Medical care; Organization, systems; Evaluation


ATUALIZAÇÕES / CURRENT COMMENTS

Sistemas de organização de assistência médica: critérios e padrões de avaliação

Medical care organization systems: criterions and standards of evaluation

Ernesto Lima Gonçalves

Do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da USP – Av. Dr. Arnaldo, 455 – São Paulo, SP – Brasil

RESUMO

São definidas as recomendações da Organização Mundial da Saúde e pela Organização Panamericana da Saúde para a estrutura dos sistemas de organização de assistência médica. São analisados os dois grandes sistemas – o indireto e o direto, examinando as vantagens e desvantagens de cada um deles para a medicina geral e a especializada, a hospitalização, a assistência farmacêutica e odontológica e as atividades preventivas.

Unitermos: Assistência médica*; Sistemas de organização*; Avaliação*.

SUMMARY

World Health Organization and Panamerican Health Organization recomendations for the structuration of medical assistance systems, were pointed out. So two large systems, direct and indirect ones, were analysed, with profits and disprofits of both of them, for general medicine, specialized medicine, hospitalization, odontological and drug assistance and preventive activities.

Uniterms: Medical care*; Organization, systems*; Evaluation*.

INTRODUÇÃO

De início, precisaríamos tentar definir critérios e esboçar metas a serem atingidas. Partindo de seu conceito de saúde, considerada como o estado de completo bem-estar físico, psíquico e social do homem, a Organização Mundial da Saúde 2 define assistência médica como "um programa de serviços que devem ser postos à disposição das pessoas e conseqüentemente da comunidade, englobando todos os recursos da ciência médica e de outras correlatas, necessários à manutenção de saúde da mente e do corpo. Esse programa deve levar em conta o ambiente físico, social e familiar, com vistas à prevenção da doença, à restauração da saúde e à redução da incapacidade. A extensão de tais serviços variará de acordo com as condições locais".

Depois de ter estudado a situação dos serviços médicos nos países sul americanos, a Organização Panamericana da Saúde 3 definiu uma política continental de saúde, que deve ser orientada por planos nacionais com metas a curto, médio e longo prazo, tendo como conceitos orientadores "a cobertura universal e a integração das ações preventivas, curativas e sociais". Além do conceito unitário de saúde, como direito universal da pessoa humana, devem-se aliar, à programação das atividades gerais, normas de organização dos serviços de saúde, formação de pessoal e a investigação científica, a fim de poder aplicar oportunamente os melhores e mais recentes conhecimentos disponíveis.

Colocadas, assim, as metas longínquas que se deve procurar atingir, para chegar ao estado de completo bem-estar físico, mental e social, a Organização Panamericana da Saúde3 sugere que os Ministérios da Saúde, os órgãos que, pelo menos teoricamente, em cada país têm a seu cargo as tarefas ligadas à saúde da população, "têm que organizar serviços de proteção, fomento e recuperação da saúde, administrando-os com critério unitário, aplicando métodos de planejamento, dando a cada atividade a prioridade que deriva:

1. da participação que tal atividade tem na diminuição dos riscos de ficar doente ou morrer;

2. dos recursos disponíveis para levá-lo à ação;

3, do custo esperado que se apreciará em função do rendimento ponderado das ações planejadas;

4. do tipo de população atendida, levando em consideração os aspectos demográficos, econômicos, sociais e ecológicos".

O critério unitário referido deve compreender todos os serviços de saúde que atuam, no território nacional: os sistemas governamentais (federal, estaual e municipal), cujas ações por vezes se superpõem, além do setor privado, desenvolvendo atividades de recuperação da saúde.

OS DIFERENTES MODELOS

Apresenta-se um resumo dos diferentes esquemas assistenciais em desenvolvimento em diversos países do mundo, qualquer que seja seu regime político. Trata-se de um conjunto de informações destinadas a permitir uma análise objetiva do que se pode desejar para o Brasil. Muitas informações a seguir apresentadas são calcadas em ROEMER 4.

Os sistemas de organização da assistência médica podem ser basicamente divididos em sistemas indiretos e diretos. Nos sistemas indiretos, o regime assistencial organiza-se principalmente mediante a prestação de serviços por profissionais e instituições já existentes, os quais podem exercer sua profissão livremente; o sistema prevê acordos e contratos e inclui mesmo países em que o pagamento dos serviços prestados pelo médico é feito pelo Estado, uma vez que, de toda maneira, o profissional exerce sua atividade independentemente. Nos sistemas diretos, os serviços são administrados diretamente, pelo esquema nacional de seguro social de cada país.

Os sistemas indiretos são adotados pelos países desenvolvidos, de tradição industrial mais antiga, onde existe uma estrutura de prática profissional de tipo privado; o sistema direto é adotado nos países em desenvolvimento, que dispõem de reduzidos recursos médicos básicos.

É importante definir aqui os esquemas básicos de remuneração dos serviços médicos. Assim, nos Sistemas Indiretos, distinguem-se:

1. Honorários por serviços – a remuneração é feita de acordo com uma tabela, reajustada periodicamente, prevendo-se diferentes modalidades de pagamento do profissional: pagamento total pelo seguro social; participação do cliente no custeio; reembolso do paciente pelo seguro social, das despesas pagas pessoalmente.

2. Método de capitação – o médico deve atender a certo número de pessoas permanentemente (2.000 a 3.000 por profissional), recebendo um salário fixo por mês e recebendo honorários especiais por certos serviços.

3. Método de salário – recebido independentemente do número de serviços ou de pessoas que o médico tenha a seu cargo; o salário é pago por instituição ou hospital, que recebe do seguro social pelo sistema de honorários ou de capitação.

Nos Sistemas Diretos, as instalações e o pessoal pertencem ao seguro social. A remuneração consiste, quase sempre, em um salário adequado a critério de capacidade, formação, experiência, anos de serviço, responsabilidade assumida. O estímulo é representado principalmente pela aprovação dos colegas e dos superiores, em vez de ser traduzido no número de doentes que acodem aos consultórios, como acontece nos sistemas indiretos. A qualidade dos serviços depende mais da estrutura e da organização do seguro social.

Os sistemas descritos aqui de maneira sucinta comportam certa flexibilidade, de acordo com os grupos de população, com as doenças, com as regiões geográficas.

Não existem dados abundantes e facilmente disponíveis sobre os esquemas assistenciais dos vários países; contudo, em termos de uma análise geral, podemos enumerar, entre os países de sistemas indiretos de organização de assistência médica, a Alemanha, a Bélgica, o Canadá, a Inglaterra, os Estados Unidos; entre os países de sistema direto de prestação de assistência médica incluem-se a Polônia, a Índia, a Tunísia, Israel e o Equador.

Nas páginas seguintes pretendemos fazer uma avaliação, ainda que sumária e certamente incompleta, dos sistemas indireto e direto, quanto a diferentes aspectos dos serviços de saúde: assistência médica geral, serviços de medicina especializada, hospitalização, assistência farmacêutica e odontológica, medicina preventiva. Em relação a cada tópico, tentaremos enumerar vantagens e desvantagens de cada sistema.

A. MEDICINA GERAL

As observações até aqui apresentadas referem-se essencialmente à assistência médica desenvolvida predominantemente na zona urbana; em relação à região rural, cabem também aqui algumas referências. Em primeiro lugar deve-se dizer que, nos países industrializados, é possível proteger as minorias rurais mediante regimes complementares especiais; nos países em desenvolvimento, o seguro social tem se dedicado mais às minorias urbanas.

Em que pese essa distinção inicial, é inegável que, em todos os países, a assistência médica na zona rural é inferior à urbana; o grau de utilização dos serviços de saúde rurais aumenta com o progresso econômico de cada nação, mas muito lentamente. Acontece, porém, que o meio rural é menos politizado, mais conformista e menos reinvidicador do que o urbano, donde menor pressão política para a solução de seus problemas.

Uma dificuldade a mais, a somar-se aos problemas já existentes, é que a assistência rural é, em geral, desenvolvida pelos Ministérios da Saúde, ao passo que a urbana está fundamentalmente a cargo do sistema de seguro social. Como a única possibilidade de melhorar o nível de saúde coletiva é desenvolver cuidadoso trabalho de planificação nacional, com desvio para a zona rural de recursos provenientes da área urbana, a tarefa ficará facilitada nos países de sistemas direto, onde a indispensável integração de estruturas ligadas à assistência à saúde é mais fácil, por serem de natureza primordialmente estatal.

Como se pode observar, os dados até aqui oferecidos permitem concluir que há problemas gerais no oferecimento e na garantia de assistência médica à população, ao lado de problemas específicos, que dependem de peculiaridades nacionais, do desenvolvimento sócio-econômico do país, do nível de aperfeiçoamento de sua rede médico hospitalar, do grau de distribuição de pessoal e de equipamento entre as regiões urbana e rural e entre suas diversas áreas geográficas. Como pano de fundo para tudo isso, permanece o custo muito elevado da assistência médica moderna.

O caminho para o Brasil não parece, então, ser a importação de soluções; o que pode e deve importar são experiências, para adaptá-las a nossas realidades, evitando repetir erros já condenados em outros países. O Brasil tem condições altamente específicas, que precisam ser respeitadas, a fim de minimizar riscos; um exemplo, apenas: embora lutando por arrancar-se do subdesenvolvimento, em termos de assistência médica, o Brasil tem uma composição de rede hospitalar que corresponde exatamente à dos países desenvolvidos. Basta lembrar aqui que cerca de 85% dos hospitais brasileiros são particulares, contra 15% de hospitais estatais; esta proporção é exatamente inversa nos países subdesenvolvidos. A conseqüência é que não se pode imaginar para o Brasil uma solução que marginalise a iniciativa particular no campo de assistência hospitalar, porque ela seria irracional.

2. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE apud BASTOS 1.

Recebido para publicação em 7-6-1974

Aprovado para publicação em 9-8-1974

  • 1. BASTOS, M. V. Organização da assistência médica. Uma contribuição para o estudo do problema, s.n.t. [Ed. particular]
  • 3. ORGANIZACION PANAMERICANA DE LA SALUD Administracion de servicios de atencion medica. Washington, DC, 1966. (Publ. cient., 129).
  • 4. ROEMER, M. Organizacion de la assistência medica en los regimes de seguridad social. Genebra, OIT, 1969.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Ago 2006
  • Data do Fascículo
    Set 1974

Histórico

  • Aceito
    09 Ago 1974
  • Recebido
    07 Jun 1974
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo Avenida Dr. Arnaldo, 715, 01246-904 São Paulo SP Brazil, Tel./Fax: +55 11 3061-7985 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@usp.br