Resumo:
O objetivo deste artigo é oferecer uma chave interpretativa ainda pouco utilizada para o entendimento do conservadorismo que circula entre mulheres evangélicas. Parte-se da observação e da análise de cultos e congressos organizados pela pastora Ana Paula Valadão, entre 2011 e 2016, e que tratavam sobretudo de corpo, sexualidade e família. Os eventos estimulavam as mulheres a um constante automonitoramento, a um “sacrifício de si”, e fortaleciam a figura masculina tradicional. Embora a relação entre religião evangélica e gênero seja escrutinada pela literatura socioantropológica ao menos desde o final da década de 1990, propõe-se que um diálogo com a teoria de Angela McRobbie possa avançar a compreensão da reprodução e da exacerbação do “dispositivo da perfeição”, que, no caso das religiosas, neutraliza, naturaliza e reveste de justificativa espiritual as desigualdades sexuais e de gênero.
Palavras-chave: evangélicos, mulheres; Ana Paula Valadão; pós-feminismo; Angela McRobbie
Abstract:
This article aims to offer an interpretative key still little used to understand the conservatism that circulates among evangelical women. It starts from the observation and analysis of services and congresses organized by pastor Ana Paula Valadão, between 2011 and 2016, and which were mainly about the body, sexuality and family. The events stimulated women to constant self-monitoring, to a “sacrifice of the self”, and strengthened the traditional male figure. Although the relationship between evangelical religion and gender has been scrutinized by socio-anthropological literature at least since the late 1990s, it is proposed that a dialogue with Angela McRobbie’s theory can advance the understanding of reproduction and the exacerbation of the “perfection dispositif”, which, in the case of religious women, neutralizes, naturalizes and gives spiritual justification to sexual and gender inequalities.
Keywords: Evangelicals; Women; Ana Paula Valadão; Post-feminism; Angela McRobbie
Resumen:
Este artículo ofrece una clave interpretativa aún poco utilizada para comprender el conservadurismo que circula entre mujeres evangélicas. Parte de la observación y análisis de cultos y congresos organizados por la pastora Ana Paula Valadão, entre 2011 y 2016, y que versaron principalmente sobre el cuerpo, la sexualidad y la familia. Los eventos estimularon a las mujeres a un constante autocontrol, a un “sacrificio de sí”, y fortalecieron la figura masculina tradicional. Si bien la relación entre religión evangélica y género ha sido escrutada por la literatura socioantropológica al menos desde fines de la década de 1990, se propone que un diálogo con la teoría de Angela McRobbie puede avanzar en la comprensión de la reproducción y la exacerbación del “dispositivo de perfección”, que, en el caso de las religiosas, neutraliza, naturaliza y justifica espiritualmente las desigualdades sexuales y de género.
Palabras clave: evangélicos; mujeres; Ana Paula Valadão; posfeminismo; Angela McRobbie
Introdução
Os evangélicos estão no Brasil desde o século XIX, mas foi apenas dos anos 1960 em diante que se observou um crescimento mais expressivo desse grupo em termos percentuais (Leonildo CAMPOS, 2008). A década de 1990, em particular, foi marcada por uma explosão de crentes (neo)pentecostais, isto é, aqueles cujas crenças e práticas envolvem a performance contemporânea de uma relação com o Espírito Santo, incluindo a possibilidade de falar em línguas estranhas (glossolalia) e expulsar demônios (Ricardo MARIANO, 2005). Evangélicos compõem o grupo religioso que mais cresce no Brasil e já somam quase 30% da população. São, em sua maioria, pardos e pretos, sendo 48% com renda de até dois salários mínimos. 58% são mulheres (G1, 2020), e é comum que elas se convertam antes de seus maridos e filhos (Maria das Dores MACHADO, 1995) ou até que a família não as acompanhe. De acordo com o que mostra a literatura socioantropológica, o impacto dessa fé para as relações de gênero é quase sempre de caráter ambivalente, isto é, de um lado, há ‘benefícios’ para as mulheres; de outro, há também reposição da hierarquia masculina e reforço da assimetria entre elas e os homens (Verónique BOYER-ARAÚJO, 1995; Márcia COUTO, 2002a; MACHADO, 1996; Cecília MARIZ, 1994).
Um sobrevoo por trabalhos emblemáticos a tratar disso mostra, por exemplo, que a conversão dos esposos ao pentecostalismo beneficiaria as mulheres, mesmo que de maneira indireta, por significar, para os homens, o abandono do hábito de beber, a obtenção de trabalho, a economia dos gastos com a bebida e mudanças no estilo de vida. Produziria também uma moralidade, como a do comportamento pudico, que teria função protetora e poderia ser instrumentalizada no fortalecimento da autoestima e na distinção de alguns pobres (MARIZ, 1994). Proporcionaria, ainda, ao condenar o cigarro, o álcool e o adultério, alívio quanto à obrigação da performance da masculinidade hegemônica, aproximando os homens do lar e da família. Às mulheres caberiam as consequências do desenvolvimento de um comportamento de resignação com os desfechos da vida, de desapropriação de si e de dependência dos homens (BOYER-ARAÚJO, 1995). Apesar de o pentecostalismo reforçar a autoridade masculina, afirmou-se que o cuidado espiritual e a construção de uma moralidade na família acabavam sendo, na prática, muitas vezes protagonizados pelas mulheres que, estrategicamente, não assumiriam possíveis ônus das tomadas de decisão (MACHADO, 1996). Por outro lado, a adesão a essa religião teria trazido maior diálogo, inclusive no âmbito congregacional, sobre o comportamento sexual feminino, a reprodução do casal e a educação sexual dos filhos, o que também figuraria na lista das ‘vantagens’ proporcionadas (MACHADO, 1995; 1999).
Esse, portanto, seria o paradoxo pentecostal - rejeitar o machismo ibero-americano, absorvendo, seletivamente, temas e posições da cultura feminista. Os sacrifícios das mulheres para a obtenção de ternura e docilidade, assim como a família heteronormativa, figuram como centrais nos arranjos afetivos, mas, em certos casos, a prosperidade desse núcleo dependeu de abrir espaço inclusive para práticas rechaçadas por muitos evangélicos, como o aborto (Jacqueline TEIXEIRA, 2016). Na trilha dessa parcial flexibilidade, percebeu-se maior aceitação, por parte de algumas agremiações pentecostais, da participação de mulheres no sacerdócio, ainda que, por vezes, a legitimidade dessa liderança estivesse condicionada à compreensão de se tratar de um ministério do casal (MACHADO, 2005).
As relações entre casamento, família e igreja seriam, assim, capazes de empoderar certas mulheres, ao permitirem, embora não sem gerar conflitos, a proximidade com Deus, a abertura de “buracos no poder” e oportunidades de vida que não estariam acessíveis a elas na sociedade mais ampla (Claudirene BANDINI, 2014). O pentecostalismo concentraria valores menos machistas que os dominantes na sociedade brasileira ao promover as mulheres a mediadoras do sagrado, intercessoras da família, aumentando a autoestima feminina e incitando certa autonomia nas relações afetivo-familiares (Patrícia BIRMAN, 1996; Roberta CAMPOS; Alana SOUZA, 2017; COUTO, 2002b).
Apesar disso, essas evangélicas estariam presas a determinadas condições de dominação inescapáveis, como de raça, gênero e classe social, dado que tais opressões são estruturais e requerem um esforço político coletivo e articulado que não se apresenta nas trajetórias individuais das religiosas (BANDINI, 2014). Isto é, embora muitas delas encontrem um lugar de autoridade e autonomia, é comum que tal ganho não se traduza em mudanças na organização da igreja nem em acesso à cidadania e a conquistas no âmbito jurídico-político.1
O que cumpre enfatizar, então, é que muitas mulheres, mesmo a partir dessa identidade de gênero, ao ocuparem posições de destaque em suas igrejas, não são menos resistentes do que os homens a outras conjugalidades que não a dos moldes da família heteronormativa, a expressões de gênero não binárias e a temáticas da luta feminista, como o direito reprodutivo e a cidadania feminina. Não é raro encontrar agremiações nas quais mulheres defendem a submissão da mulher, a virgindade pré-marital, a fidelidade e indissociabilidade do matrimônio e a abominação ao homoerotismo (Nina ROSAS, 2018). Ou seja, o fato de ascenderem a cargos de liderança não impede (talvez até incite) as mulheres a alimentarem um conservadorismo moral e certas dimensões das desigualdades de gênero ao doutrinarem outras mulheres (e homens) em valores tradicionais. E é isso que será tomado como objeto deste artigo.
Parte-se dos ensinamentos transmitidos nos eventos organizados pela pastora carismática Ana Paula Valadão - celebridade religiosa que influencia, há décadas, mulheres e homens, de diversas idades, assim como fãs LGBT que, por vezes, em conflito com sua sexualidade e identidade, permanecem ansiando viver a fé cristã em uma igreja tradicional. Volta-se o olhar, sobretudo, aos cultos mensais e congressos anuais, promovidos para mulheres evangélicas, entre 2011 e 2016.2 Foram 36 eventos registrados (aproximadamente 170 horas), sendo que quatro deles foram acompanhados por streaming e, nos demais, foi desenvolvida observação participante diretamente na Igreja Batista da Lagoinha (IBL)3 (ou em espaço alugado pela instituição), na cidade de Belo Horizonte. O caderno de campo foi composto por anotações dos ensinamentos, transcrições de falas importantes,4 comentários de conversas com mulheres que frequentavam o local, bem como impressões pessoais. A análise desse material foi feita tematicamente (Mohammed ALHOJAILAN, 2012). Pesquisa de doutorado própria também compõe o repertório trazido como pano de fundo (ROSAS, 2015).
Na maioria dos cultos e congressos, Valadão convidava outras líderes de destaque, vinculadas ou não à sua igreja, para participar cantando, compondo o grupo de bate-papo ou conduzindo orações ou pregações. Neste texto, estão registrados trechos de fala de cinco dessas mulheres. No entanto, os ensinamentos transmitidos podem ser considerados centrados na figura de Valadão, a quem se deve atribuir, além de citações diretas, muitas das menções indiretas extraídas do caderno de campo. Valadão tinha notória autoridade local e projeção por meio de músicas, sermões e mídias, além da criação, propriedade e performance de tudo o que leva o nome de sua banda musical - o “Diante do Trono” (Carly MACHADO, 2013), incluindo os eventos voltados a mulheres, que também atendiam por esse nome (“Mulheres Diante do Trono”).
O que se apresenta de novo ao tomar como base essa amostra do campo religioso brasileiro é a oferta de uma chave analítica ainda pouco utilizada para a compreensão do conservadorismo evangélico, a saber, os estudos da britânica Angela McRobbie,5 professora de Comunicação e dedicada sobretudo à análise de mídia, cultura popular e feminismo (McROBBIE, 2004; 2009; 2015). Assume-se, tendo-a como referência, uma leitura feminista dos ensinamentos religiosos, mas não com vistas a descredenciá-los ou considerá-los uma “etapa intermediária de um devir social” de igualdade entre homens e mulheres (Clara MAFRA, 1998, p. 226). Busca-se elucidar como as evangélicas podem ser vistas reproduzindo um dispositivo social mais amplo de automonitoramento, autocobrança e autodisciplina, que caracteriza a feminilidade dos dias de hoje, evidenciando parte do movimento pós-feminista.
Para desenvolver esse argumento, o texto está dividido em mais quatro partes. Na primeira, Valadão é apresentada como exemplar de mulher branca, de classe média e evangélica, que poderia ser comparada típico-idealmente às mulheres que incitaram a reflexão de McRobbie. Outras duas seções são destinadas a apresentar os dados de campo. Na terceira parte, a teorização de McRobbie é oferecida como a pedra de toque da análise e, por fim, encerra-se com a conclusão.
Ana Paula Valadão e Bridget Jones
Com uma infância e uma adolescência marcadas por experiências espirituais e pela participação em coral e em grupos de canto e dança religiosos, aos 16 anos, Valadão se tornou formalmente a líder dos músicos da IBL. Pouco depois, após abandonar o curso de Direito, morou nos Estados Unidos, vinculando-se a uma escola voltada a práticas musicais e missões. De volta ao Brasil um ano depois, deu início a gravações de álbuns que alcançaram vendagem impressionante por anos, levando-a a realizar shows que reuniam milhões de pessoas por todo o país (Ana Paula BESSA, 2002; MACHADO, 2013). Valadão assinou contrato com a gravadora Som Livre, o que rendeu a ela participações em programas televisivos de grande destaque, como o Domingão do Faustão, suscitando incômodo e ataques inclusive de evangélicos, como Edir Macedo (ROSAS, 2013). Em 2009, a cantora, que também foi ficando aos poucos conhecida como pastora, voltou a morar nos Estados Unidos por cerca de dois anos. Inspirada pelos trabalhos das religiosas de lá, quando regressou ao Brasil, começou a promover eventos cujo público-alvo eram mulheres.
Valadão é branca e ocupa um estrato social de considerável privilégio. Nos cultos “Mulheres Diante do Trono” e nos congressos que levavam o mesmo nome,6 ela reunia aproximadamente seis mil mulheres em cada evento. A audiência era composta sobretudo por pertencentes à classe média, mas havia algumas ainda mais favorecidas, assim como circulavam mulheres de estratos baixos. Havia tanto brancas quanto pretas e pardas. Os assuntos tratados iam de maquiagem e desfile de moda a orientações afetivo-sexuais. Experiências catárticas e apelos por cura interior abundavam; pregava-se que o objetivo daqueles encontros era levantar o padrão moral da sociedade, no sentido de promover mais retidão, pureza, honra e respeito (ROSAS; CASTRO, 2014; ROSAS, 2020).
Enquanto Valadão ascendia como celebridade cristã (organizando congressos e cultos, caravanas a Israel e região, projetos com crianças, escola para músicos e missionários, e escrevendo livros), a década de 2000 ia sendo marcada, logo no início, pela história da anti-heroína cinematográfica Bridget Jones. Tal personagem, na casa dos 30 anos, decidiu contar, por meio de um diário, suas preocupações com peso, bebidas, cigarros e homens. Distraída, Jones apresentava erros adolescentes em sua conduta profissional, mas, mesmo assim, conservava o bom humor. Tinha um apelo vulnerável combinando maturidade e meninice em seu desejo por romance, marido e filhos. Ela representava as mulheres do novo século, na busca pelo “homem correto”, aquelas que conseguem sustentar a própria vida e, mesmo que sofram críticas humilhantes, não se tornam pessoas ácidas nem sentem raiva dos homens. Não negociam sua feminilidade, tampouco o desejo por amor e maternidade (McROBBIE, 2009).
Jones é um dos exemplos emblemáticos utilizados nos trabalhos de McRobbie (2004; 2009; 2015),7 que estabelece um prolongado diálogo, em especial, com Judith Butler, Michel Foucault, Pierre Bourdieu e Stuart Hall, para tratar do pós-feminismo. Segundo as concepções da autora, esse é um processo no qual os ganhos do movimento feminista das décadas de 1970-80 estão sendo corroídos. Tal ruína seria detectável e realizada por meio dos elementos da cultura popular contemporânea, que seriam aparentemente bem informados e bem intencionados quanto ao feminismo. Para McRobbie, o pós-feminismo pode ser compreendido a partir de um duplo entrelaçamento. A existência concomitante de, de um lado, valores neoconservadores em relação a gênero, sexualidade e família - exatamente como se verá nos discursos sustentados por Valadão e as demais líderes citadas - e, de outro, um processo de liberalização de escolha e diversidade das relações domésticas, sexuais e afetivas (como a adoção de crianças por casais gays).
Em boa parte de sua crítica, a autora toma como base a mídia inglesa contemporânea, construtora de um padrão feminino de classe média branco. Ela analisou diversos programas, como a série Girls, da HBO, e os makeover televisivos da BBC - What Not to Wear e Would Like to Meet, nos quais as participantes eram escrutinadas no modo de vestir, quanto a seus maneirismos, expressões faciais e tom de voz. Segundo McRobbie, há um mecanismo, presente nas noções contemporâneas de feminilidade, propagadas amplamente pela mídia popular e a cultura política das sociedades, a qual ela denomina de “dispositivo da perfeição” (McROBBIE, 2015).
Trata-se da regulação da vida das mulheres, feita por elas mesmas, e baseada no desejo de uma ‘boa vida’, de ‘ter tudo’. As noções de trabalho e tarefas domésticas estariam sendo substituídas por uma forma diária de automensuração, autodisciplina, que passa a sensação de que a mulher está no controle de sua vida por meio de cálculos constantes que ela imputada a si. Haveria, assim, um monitoramento quanto à dedicação a cada função das múltiplas acumuladas e, desse modo, a figura masculina - antes, representação da autoridade patriarcal - já nem precisaria estar presente para dominar; seria a mulher mesmo a fazer o trabalho. A perspectiva teórica de McRobbie incita pensar como os ensinamentos das mulheres evangélicas se relacionam com o “dispositivo da perfeição”, caso seja possível compreender esse mecanismo como extensível às mulheres brasileiras.
O que se sugere nas páginas seguintes é que os discursos que circulam entre as religiosas não apenas reproduzem esse mecanismo, mas o naturalizam, o essencializam como sendo a vontade de Deus e, ainda, o associam à noção de sacrifício (sacrifício de si). O acionamento do “dispositivo da perfeição” se revela no forte desejo de constituir uma família tradicional (que implica satisfação sexual, marido e filhos), viver uma vida doméstica, e cuidar e embelezar o corpo. Tal busca se pauta na ideia de que é possível obter “tudo”, ainda que se perceba, entre essas religiosas, considerável consciência de que, mesmo assim, elas não alcançarão a plena felicidade. Mas enquanto a análise de McRobbie aponta para um esvaziamento do lugar do homem como mantenedor do patriarcado, entre as mulheres pesquisadas, apesar das muitas exigências autoinfligidas, a autoridade masculina é afirmada, levando, assim, a uma dupla opressão.
Corpo e beleza
Cada encontro destinado à instrução das mulheres começava com cumprimentos da pastora, uma oração geral e/ou uma homenagem a uma religiosa exemplar entre as presentes. Isso era seguido do período de louvor (músicas) e, antes das pregações, era comum que houvesse um bate-papo; mas esse era um momento bem estruturado, embora mais informal. A audiência era composta por expressivo número de mulheres de cabelos pintados de loiro e escovados. Várias eram as que apresentavam as unhas esmaltadas e estavam maquiadas com sombra nos olhos, blush e batom. Muitas vestiam roupas estampadas em tecidos leves; outras trajavam camisas temáticas de suas caravanas (grupos organizados regionalmente). Não era raro aquelas que buscavam a estética da cantora/pastora. O timbre de voz e os trejeitos também se assemelhavam aos dela.
Valadão é vaidosa e acredita que o cuidado de si é algo inerente, inato ao ser mulher. Em um dos cultos, ela contou às fiéis que já se autodepreciara. Disse que, durante anos, mordeu internamente suas bochechas e roeu as unhas para se maltratar, aceitando e reproduzindo as críticas que sofria. Apenas quando passou pelo processo de cura espiritual foi que rompeu com tais comportamentos e entendeu que umas das exteriorizações dessa cura era passar a se cuidar, isto é, aprender a se vestir bem, se maquiar e arrumar o próprio cabelo. Assim, conclamava às fiéis: “A mulher deve estar sempre arrumada em casa, seja para atender quem bate à porta, seja para estimular o marido ou, no mínimo, conservar a autoestima elevada” (Valadão, 2012).
Como expressão disso, a pastora criou uma grife de roupas e semijoias - a DTWear, para que, por meio dos trajes e acessórios, as mulheres pudessem se vestir de forma pudica, mas elegante. Afinal, segundo ela, a principal arma feminina é a docilidade e não a sensualidade. As peças da marca eram usadas por Valadão, serviam como presentes especiais para as palestrantes e ornavam os desfiles de moda que aconteciam durante os congressos. Em 2015, mulheres comuns, ao invés de modelos, desfilavam a fim de demonstrar que as peças seriam adequadas para trabalhar as proporções corporais, favorecendo o que as mulheres ‘têm de bom’ e disfarçando suas ‘vantagens’ [partes do corpo mais avantajadas]. Naquela ocasião, foram apresentadas: calça flare, conjunto de calça e blusa com a mesma estampa, calça com babado na barra, blusa de musseline com jabour nas mangas. Uma das estampas das roupas era baseada nos ‘frutos’ do Espírito Santo (amor, bondade, alegria, mansidão etc.). As joias também eram compreendidas como formas de se profetizar, isto é, afirmar as promessas de Deus e ver o mundo espiritual se mover em direção a fazer com que elas se cumprissem.
Em um dos sermões, Helena Tannure, membro da Lagoinha, palestrante e parceira de Valadão, ressaltou a importância de um modo ‘correto’ de vestir. Em suas palavras:
As mulheres querem ser respeitadas, elas dizem que têm direito ao próprio corpo, mas elas querem ser respeitadas. Aí, elas vão pra rua, numa marcha que chama Marcha das Vadias, e ficam nuas. Não é esse respeito que eu quero. (...) Se você vai em um ambiente corporativo e uma mulher quer ser levada a sério profissionalmente, se ela quer ser respeitada, ter suas ideias ouvidas e acatadas, ela tem que se vestir adequadamente. Ela não pode se vestir como uma mulher que tá dizendo: ‘Vamo pra cama comigo?’. Tem um código no vestir que comunica quem você é, qual é a sua mensagem. Não é questão só de ser puritana. Porque tem mulher que está vestida até aqui [no pescoço], mas com sensualidade à flor da pele (Helena Tannure, 2015).
Apesar disso, se, por um lado, os ensinamentos sobre o corpo legitimavam a vaidade, por outro, buscavam, ao mesmo tempo, a libertação dos padrões corporais ‘mundanos’ de magreza e beleza. Criticava-se os concursos de misses que, com o passar dos anos, estariam requerendo medidas ainda menores em mulheres de maior altura. Valadão, em mais de uma ocasião, usou como referência negativa bonecas como a Barbie, ao dizer que seus corpos reforçariam o estereótipo da mulher magra, de cabelos tratados, seios empinados, bumbum levantado, coxas torneadas e pernas longas. Para alcançar esse padrão, as mulheres teriam que ficar horas nas academias de ginástica e recorrer a tratamentos estéticos dos mais diversos, criando uma obsessão capaz de trazer rejeição e autodestruição emocional (caderno de campo, 2014).
Mas se engana quem pensa que essas religiosas estariam exatamente a defender corpos não normatizados. O excerto abaixo, proferido pela líder das dançarinas que acompanhavam os congressos durante o período musical, mostra como essas evangélicas associam os cuidados com o corpo a uma (suposta) liberdade de escolha:
Mulher, preste atenção no que eu vou falar. Durante a história da igreja, o corpo foi massacrado. Mas o corpo é o lugar onde a arte se expressa. E o diabo ele é tão sujo, que ele deturpou a visão do corpo da mulher, a visão do corpo do homem, mas você é livre. Você é livre para andar bem-vestida, você é livre para cuidar do seu corpo, porque quando você faz isso, você adora ao Senhor também. Então, se você aí fica aprisionada na sua mente em relação ao seu corpo: ‘Ah, mas eu sou gordinha, eu sou magrinha, eu sou alta, eu sou baixa’, Deus te fez desse jeito com um propósito. Aquilo que a gente pode melhorar e correr atrás a gente faz, mas você foi criada desse jeitinho com um propósito. Então, ame o seu corpo, adore ao Senhor com ele, levante as suas mãos, tire os pés do chão, porque isso é mandamento do Senhor. E quando você faz, Deus flui através de você, e quando você fizer isso, Deus vai trazer libertação pra você em relação à inferioridade no seu corpo, no nome de Jesus (Isa Coimbra, 2015).
Outra dimensão da beleza e da feminilidade foi associada às ‘boas maneiras’. Elegância era cobrada das fiéis como consequência de uma vida espiritual:
A gente tá se tornando melhor que os homens sim, no que existe de pior. A elegância não é roupa, gente. A elegância é atitude. (...) A gente se adorna por fora, mas estamos grosseiras, ríspidas, rixosas. (...) Não apenas a gente deve ser sensual pro nosso marido, mas sermos também mansas, confiáveis, afáveis, carinhosas, encorajadoras, bonitas por fora, mas primeiro, bonitas por dentro (Helena Tannure, 2015).
Regras de etiqueta foram ensinadas às fiéis em diversos dos cultos e congressos, a partir da justificativa de que cortesia e educação precisam ser ‘vestidas no caráter’. As dicas eram dadas em pormenores. Falava-se de como se comportar em espaços com elevado número de pessoas, como sair das cadeiras ou dos bancos cheios (como aqueles que compõem as igrejas), de quem é a prioridade na circulação próxima às portas e como se posicionar nos elevadores. Instrução era dada, ainda, sobre os modos de se portar em filas, em locais fechados, em banheiros públicos, em salas de espera de consultórios médicos, em ônibus, em carros e ao usar escadas rolantes.
Ensinava-se que, em restaurantes, as mulheres sempre deveriam deixar que os homens as conduzissem, escolhessem a mesa, solicitassem o cardápio, fizessem o pedido e chamassem o garçom. Depois de já estar assentada em um restaurante ou festa, a mulher nunca deveria se levantar para cumprimentar quem chegasse, salvo fosse um idoso. A postura esperada da mulher seria a de saldar a todos com um sorriso e com o cumprimento de mãos, sem, contudo, balançá-las. Abraços só poderiam ser dados em conhecidos e, mesmo assim, de forma moderada e sem tapas nas costas. Na hora de se alimentar, a mulher nunca deveria usar o mesmo prato se quisesse repetir. Não poderia portar os cotovelos sobre a mesa, nem retocar a maquiagem ou atender ao celular no espaço destinado à alimentação. Entre as orientações, estava também a da posição correta da faca e a nunca cortar alface, massas, asas de frango e azeitonas. Era dito que a conta deveria ir direto para as mãos do homem, a quem a etiqueta atribui a responsabilidade pelo pagamento. Se a mulher ganhasse mais, ele deveria conhecer a senha do cartão dela e digitá-la sem dar a impressão de que não é ele quem de fato estava pagando (caderno de campo, 2012; 2013; 2014).
Observa-se, em resumo, um acentuado enquadramento e disciplinamento dos corpos femininos, tanto por meio de incentivos aos cuidados com cabelo, pele, alimentação, exercícios físicos (e, nos últimos anos registrados, até terapia), quanto por meio de regras de conduta e decoro. O corpo das evangélicas seria, então, forjado por meio de um treinamento que tem como referência um conjunto de códigos permitidos, adequados e esperados, e que compõem, assim, as regras do grupo (David LE BRETON, 2007). Algo semelhante foi registrado por Teixeira (2016), ao analisar o projeto Godllywood, destinado a treinar meninas da Igreja Universal desde a infância em um padrão de feminilidade conformado a uma razão pedagógica. A autora mostra que, apesar de pautada na noção de prosperidade, essa produção da feminilidade não prescinde da associação da mulher a algo terno, dócil e cujo objetivo é o casamento.
Segundo a antropóloga Mirian Goldenberg (2010), o corpo é um forte capital na cultura do Brasil, que experimentou a explosão da indústria da beleza nas últimas décadas, o que levou o país a se tornar campeão no consumo de produtos para unha, pele, cabelo e emagrecimento, e o segundo do mundo no ranking de cirurgias plásticas. Trata-se de um valor gerado por uma elite - pessoas brancas, heterossexuais, com nível universitário, renda alta e habitantes de bairros mais ricos - cujos ideais são reproduzidos por outros segmentos da população, de modo que tanto as camadas populares quanto as médias passam a ver no corpo uma riqueza das mais desejáveis, um capital a ser trabalhado, conservado e empregado (GOLDENBERG, 2010). Para a autora, isso retrata a ditadura da juventude, da beleza e da magreza, que projeta o corpo ideal como aquele que é cuidado, manipulado, enfeitado e produzido para que não tenha marcas de rugas, estrias, celulites ou manchas. Daí a busca desenfreada para que se invista tempo, dinheiro e esforço na construção do corpo ‘perfeito’. Goldenberg (2010) enfatiza que, no Brasil, o corpo não é somente um capital físico; é também capital econômico e simbólico, pois permite ascensão social e recurso diferenciado no mercado de trabalho e no afetivo-sexual.
As religiosas pesquisadas não passam imunes a esse conjunto de referências, haja vista a vaidade legitimada como expressão de cura espiritual e vida de adoração a Deus. Apesar das reservas quanto ao modelo ‘mundano’ de forma e estética do corpo e ao uso exacerbado de tempo e dinheiro para trabalhar esses atributos, o aprisionamento às exigências autoimpostas permanece como efeito não intencional de tal posição (à la Robert Merton (1936)). Predomina a requisição de um corpo moldado (cabelo, rosto, trajes), a despeito de não ser no exato padrão popular, e uma personalidade domada (etiqueta e maneirismos), que podem ser interpretados de maneira ainda mais aprofundada, como se verá adiante, à luz do que McRobbie chamou de automonitoração/vigilância, que se reveste da falsa ideia de liberdade.
Família, submissão, sexo, filhos e vida doméstica
A formação de uma família é um valor muito caro ao discurso evangélico. Mesmo que haja, entre esses religiosos, aqueles enquadrados como ‘progressistas’, é muito comum a busca pela formação de um lar, pela concepção de filhos e pelo engajamento desse núcleo em uma igreja. Nancy Dusilek, por exemplo, que escreveu por anos na revista “Mulher Cristã Hoje” e foi vice-presidente da Convenção Batista Brasileira, frisa a responsabilidade da mulher com a casa e o papel de ajudadora e submissa ao esposo, mesmo para aquelas que sejam líderes nas comunidades de fé. Mas ela ainda afirma que é Deus quem é o verdadeiro marido das evangélicas, no sentido de ser quem, de fato, é capaz de suprir as necessidades femininas (REVISTA COMUNHÃO, 2016). Como se verá, essa posição de abnegação e renúncia é idêntica à pregada nos eventos de Valadão.
Embora o tema da família aparecesse por incontáveis vezes, o congresso de 2015 foi inteiramente dedicado à questão. Para esse encontro, Valadão compôs a música “Família Bendita”, que foi entoada entre prédicas e momentos de oração, e que diz assim:
Família bendita do senhor / De todas as bênçãos o amor / É o maior tesouro que temos / Deus é amor / Nossa família / Seja bendita / Abençoada pelas mãos / Do Salvador / Nossa herança / Nossa descendência / Possua a terra que nos prometeu o Senhor.
O trecho final da música ressaltava que a família das fiéis prevaleceria contra as perseguições e armas do inimigo, o diabo.
Para as líderes que participavam do encontro, além de certamente para uma considerável parcela das fiéis que ali estavam, o diabo teria o intuito de destruir a família por essa ser a base da sociedade e o plano de Deus para a humanidade desde a criação. Uma das preletoras frequentemente vista nos eventos, a pastora e psicanalista Ilma Cunha, afirmou em um de seus sermões:
Família representa o reino de Deus aqui na Terra; família é uma representação (...) de Cristo e a igreja. Pular [fora] da família, perder o propósito de Deus para a família, isso significa morte para a próxima geração; morte de sonhos, morte de objetivos, morte de uma descendência, morte de um legado (Ilma Cunha, 2015).
A defesa da família heteroafetiva, monogâmica e indissolúvel se dá em função da crença de que a mulher foi criada a partir da costela do homem, como ajudadora, para exercer, analogamente, o mesmo papel que o Espírito Santo teria na trindade, isto é, o de ajudar, auxiliar, colaborar. Segundo as palavras de Tannure, o que Deus decretou à mulher foi que ela fosse uma “ajudadora idônea”. “Ajudadora é aquela que presta socorro, aquela que auxilia. E idônea é [a que é] apta, capaz, competente e moralmente correta. (...) A moralidade de uma nação é responsabilidade das mulheres” (Helena Tannure, 2015).
Nesse sentido, as mulheres não teriam um propósito de vida específico, senão o de estar debaixo da missão de seus maridos (é assim que interpretam a palavra submissão, isto é, estar debaixo da missão de outro). E vai além. Defendem que a deferência e a obediência que devem apresentar não são apenas em relação a seus esposos, mas a todas as figuras masculinas que socialmente sobre elas incidem e que, assim, lhes são autoridade. Interpretam que a orientação bíblica é para que, em amor, todas as pessoas se submetam umas às outras (mas não há registros de como a submissão do homem deveria ser). A contrapartida para as mulheres viria do fato de que a maior submissão seria capaz de tornar o homem mais satisfeito e ele, consequentemente, buscaria agradar mais à mulher (ensinamento enfatizado sobretudo para a relação conjugal). A ressalva à submissão se daria quando a mulher se visse obrigada a mentir ou ter atitudes que contrariem os princípios bíblicos, como frequentar outro credo religioso ou ter comportamento sexual liberal/promíscuo (caderno de campo, 2012; 2014).
Apesar disso, não havia cegueira quanto às dificuldades de uma relação matrimonial, embora a maioria dos conflitos fosse considerada tratável e, com isso, ainda que não intencionalmente, as pregadoras fizessem recair, sobre as mulheres, uma grande responsabilidade pelas frustrações vivenciadas. Tannure disse certa vez: “A mulher briguenta é como uma goteira que não seca. A Bíblia fala que é melhor viver em um deserto do que com ela” (Helena Tannure, 2013).
Entre os temas diversos relativos à vivência conjugal, não faltava tratar de sexo. A pregadora estadunidense Devi Titus, em um dos bate-papos, argumentou que, nas igrejas, muito se fala sobre o que não se deve fazer em termos sexuais, mas pouco se aborda o ‘sexo saudável’. Encampando esse tema, ela dizia:
Nas últimas semanas, tivemos muitos casais que vieram a nós ou à nossa filha, que é uma conselheira, e que não estavam tendo sexo por dois, três ou cinco anos no casamento. E eu imagino que algumas de vocês estejam na mesma situação. E isso é um problema seríssimo nos dias de hoje. É muito importante para nós termos sexo saudável em nossos casamentos. (...) Não apenas ele [o marido] precisa de sexo, mas você precisa de sexo. Muitas vezes, as mulheres se vestem sensualmente para se sentir bonitas e desejáveis aos olhos de um homem. Então, a gente se veste assim quando saímos de casa, mas não nos preparamos dessa forma dentro de nossa casa. E é dentro de nossas casas que deveríamos ser mais sensuais, para os nossos maridos, mas isso também é para vocês. Deus criou o sexo saudável. Deus está me levantando para pregar mais sobre esse tema - a benção de um sexo saudável (Titus, 2015).
Valadão aproveitou a ocasião para falar que, quando tinha relações sexuais com seu esposo, seus ressentimentos desapareciam, porque o sexo a curava. Ela enfatizava que as mulheres têm direito ao prazer, ao orgasmo e à liberdade, desde que com seus parceiros e entre quatro paredes (caderno de campo, 2015).
O bate-papo foi interrompido com a imagem de um bebê projetada em um telão. Na véspera, Valadão havia lido o trecho de uma carta em que uma fiel que frequentara o congresso no ano anterior relatava sua mudança de pensamento quanto a não querer ter filhos, a cura física de doenças que a impediam de seguir com uma gestação e a conquista dessa. A maternidade (e, não obstante, a paternidade), e o poder (sucesso) da geração à qual se dá à luz, eram pregados como uma promessa de Deus. A contracepção medicamentosa feminina era permitida, principalmente na fase do início do casamento, mas, no longo prazo, só era aceitável não ter filhos por uma condição de saúde desfavorável, quanto à qual se buscaria tratamento e até mesmo cura espiritual. A própria Valadão narrava ter sido curada da infertilidade; esperou por anos por uma gestação bem-sucedida, após ter tido dois abortos espontâneos. E brincava que, mesmo passados anos do nascimento de seu filho mais novo, ainda pedia à mãe para substituir suas pílulas anticoncepcionais por remédios de farinha, para que, quem sabe, pudesse engravidar novamente.
Em uma pregação, naquele mesmo congresso, Titus falava do viver em uma sociedade que limita a existência de crianças. Ela contava a história de um casal cuja mulher dizia ainda não estar pronta para ter filhos, argumentando: “Eu tenho tantas oportunidades de carreira e, se eu tiver um filho, não vou conseguir fazer o trabalho que quero. Eu tenho um conflito com isso, porque um dia eu quero ter filhos” (narrativa de Titus, 2015). Titus registrava sua resposta a ela:
Deus criou um limite de idade [dizia a preletora que a moça tinha por volta de 32 anos] em uma mulher para ter filhos. E o seu tempo está acabando! Colocar a carreira no lugar. Sabe o que acontece com essa mulher de Deus? Ela tinha uma compreensão de que os filhos são intrusos nas nossas vidas (Titus, 2015).
Além da maternidade, compulsória no final das contas, cumpre destacar ainda a responsabilização das mulheres na criação dos filhos. Na edição desse mesmo congresso, outro bate-papo abordava a escolha de brinquedos e roupas por gênero, mas, principalmente, o modo como os papéis de pai e mãe, de homem e mulher, vão sendo construídos nas crianças por meio da influência dos progenitores sobre elas (era pressuposto que ambos estivessem ocupando a mesma casa em matrimônio).
Por fim, nos eventos, sempre havia menção aos livros de Titus, como o “A experiência da mesa: o segredo para criar relacionamentos profundos” (2013). A obra enfatizava a importância de as mulheres se dedicarem aos cuidados com a casa e, sobretudo, às refeições, pondo a mesa com suas melhores louças e chamando a todos para estar juntos no momento da alimentação. A crença era de que as refeições seriam oportunidades de cura e restauração para toda a família.
Em um dos sermões, no qual a preletora Helena Tannure pedia às mulheres que não criticassem os homens que se casam logo após se tornarem viúvos, viu-se mais um exemplo do ideal de mulher pregado:
A mulher fica viúva, a gente vê a mulher se recuperando, se reorganizando. Dependendo, se ela já era mais madura, muitas optam por não contrair novas núpcias; agora o homem, não. Quando ele perde a mulher, ele perde a pessoa que organiza a vida dele. Ele perde a amiga, a cúmplice, a confidente, a pessoa que cozinha, que aconselha, que faz sexo com ele; poxa, o cara fica realmente na pindaíba. (...) O homem sozinho, viúvo, ele fica no chão (Helena Tannure, 2015).
Um olhar feminista
A mulher evangélica, pressupõe-se, então, que dê conta, sozinha, de se recuperar de uma grande perda. Afinal, é organizada, autônoma nos cuidados da casa, responsável pelos filhos, segue regras de etiqueta, e cuida da aparência de forma pudica. É ‘perfeita’, por assim dizer. Ao menos perfeita no sentido tratado por McRobbie, que, embora estivesse focada em compreender a realidade de mulheres brancas, jovens, heterossexuais e anglo-saxãs, traz uma chave de leitura que ajuda a refletir sobre os preceitos defendidos para as brasileiras em questão (deve-se lembrar que os referenciais de Valadão são mulheres como as analisadas por McRobbie, ainda que a audiência dos eventos possa disso distar). Para tratar da individualização feminina, McRobbie (2015) faz uso das noções de monitoramento de si e da capacidade de sustentar um plano sobre a própria vida, segundo as concepções de Anthony Giddens e Ulrich Beck. No entanto, ela enfatiza como, sob o guarda-chuva da modernização reflexiva, as lutas feministas estiveram totalmente pulverizadas nas obras desses autores. E chama a atenção para um ponto crucial para sustentar a interpretação proposta neste artigo - o caráter coercitivo das escolhas dentro da cultura dos estilos de vida.
Ela diz: “o indivíduo é compelido a ser o tipo de sujeito que pode fazer as escolhas certas” (McROBBIE, 2015, p. 19). E vai além, ao afirmar que a escolha pessoal é uma forma de, novamente, regular as mulheres jovens. Segundo a autora, não se trata de uma posição contrária aos ideais pelos quais se lutou nos anos 1970 e 1980, mas de um novo tipo de sentimento que incorpora elementos do feminismo, porém, de forma personalizada e instrumentalizada. O pós-feminismo repousa e se pauta no feminismo para argumentar que a igualdade pela qual se lutava fora alcançada e não é mais necessária. A ênfase na individualização e nos ganhos que as mulheres podem e estão alcançando, exemplificada pelo uso de palavras como empoderamento e escolha, estaria criando a ilusão de que a mulher tem controle e opção, enquanto, na verdade, o que acontece é que ela é norteada por um ideal de perfeição que acaba por assegurar que um novo movimento feminista não emerja.
Segundo McRobbie, essa perspectiva quanto à perfeição aparece no trabalho de Joan Riviere, escrito em 1928, assim como no de Mary Ann Doane, de 1982, e, mais recentemente, nas obras de Judith Butler. Riviere defende que a feminilidade é um disfarce, e é exatamente o que sustenta McRobbie (2015) quando considera que as ‘novas regras’ da feminilidade contemporânea - estar sempre sorrindo e flertando, conservar a ‘meninice’, ter um corpo jovem, se inserir na cultura de consumo8 e, ao mesmo tempo, manter a vontade de possuir um marido, filhos e uma vida doméstica - são um disfarce acentuado do pós-feminismo, caracterizando um profundo conservadorismo e uma retração dos avanços feministas já conquistados. O senso comum feminino atual se caracterizaria, portanto, pela busca da ‘boa vida’, do ‘ter tudo’, isto é, da conquista de sucesso profissional, doméstico/familiar e sexual, algo idêntico ao que pode ser observado no discurso das religiosas analisadas.
A busca pela perfeição pode ser compreendida como um aumento da regulação por meio de cálculos constantes e objetivos que se estabelece para si. Esses podem ser observados quando as mulheres se fazem as seguintes perguntas:
Quão bem eu fui hoje? Consegui comer menos calorias? Comi de maneira mais saudável? Fui à academia? Consegui alcançar o que planejei atingir no trabalho? Cozinhei bem após o dia de trabalho? Cuidei das crianças com o tipo de atenção certa? Garanti que minha família retornasse do trabalho e da escola para uma casa bem equipada e bem regulada? Mantive minha boa aparência e meu corpo sexualmente atrativo e bem preparado? ( McROBBIE, 2015, p. 9, tradução livre).
McRobbie resume dizendo que: “os aspectos mundanos e exaustivos das atividades domésticas e do cuidado com as crianças são, de alguma forma, substituídos pelos prazeres fantasiosos de uma cozinha brilhando e um jardim paisagístico” (McROBBIE, 2015, p. 9, tradução livre). Nada diferente do quadro que pintam as evangélicas pesquisadas, para as quais essas perguntas se encaixariam sem o menor esforço, tendo em vista os ensinamentos que se almeja inculcar na audiência. A perfeição, em suma, funcionaria como uma técnica para criar um self competitivo, mas cuja competição é consigo mesma, ainda que o antagonismo relativo a outras mulheres permaneça.
Para a autora, a consequência do acionamento do “dispositivo da perfeição” é o afinamento e o refinamento do patriarcado, cuja autoridade sobre as mulheres é transferida para um campo no qual não há a presença do masculino e, sim, a autorregulação, feita pelas próprias mulheres, por meio do uso do vocabulário da escolha. McRobbie (2009; 2015) argumenta que a dominação social permanece, afinal, as mulheres adentraram o mercado de trabalho enquanto houve certo relaxamento das tarefas domésticas masculinas (divisão do trabalho do lar e paternidade ativa). E, nesse cenário, elas continuaram se embelezando e dizendo que fazem isso para o próprio bem-estar. Assim, se se tornaram vítimas da indústria da beleza, complementa a autora, elas não têm a quem culpar a não ser a si próprias. Tal postura, por fim, acabaria levando-as a se remover dos espaços políticos e de tomada de decisão, permitindo a continuidade da condução do poder pelos homens. As hierarquias de gênero, consequentemente, permaneceriam intactas.
É preciso salientar que, de acordo com os discursos de Valadão e das outras líderes, as evangélicas ainda estariam se automonitorando/autorregulando em outro aspecto - elas abraçam a culpa pelos pecados e a necessidade de arrependimento. Não obstante, conservam a figura masculina - que já não estaria exercendo a mesma regulação de outrora - em um lugar hierárquico inquestionado. Se, de acordo com McRobbie, os homens se tornaram desnecessários enquanto agentes de controle e exploração, pois é a mulher quem se autorregula, no caso das evangélicas, a autoridade masculina não se esvazia. Ainda que as mulheres sejam as agentes de autorregulação e autocontrole, elas afirmam a superioridade dos homens, o que acaba por colocá-las em um papel ainda mais subjugado.
A justificativa das religiosas segue o seguinte raciocínio:
Quando uma mulher usurpa a autoridade de um homem, ela cumpre aquele alerta que Deus deu no Éden: ‘E porei inimizade entre ti e a mulher’. Ela faz amizade com quem deveria ser inimigo e, de braços dados com o inimigo, ela vai ter aquele poder que Satanás quer dar a toda mulher que usurpa a autoridade. Entenda isso, entenda isso. Quando uma mulher usurpa o poder, ela realiza o que Lúcifer quis fazer no céu, e que por isso foi expulso. Sua jurisdição de poder vem das trevas, da rebelião e da feitiçaria, e ela abre a porta para a amizade com o inimigo, removendo a barra que Deus estabeleceu, e ela se transforma em uma deidade feminina. (...) E ali inaugura uma descendência perversa. E eu creio que é a mesma ação maligna que iniciou o movimento feminino com esse discurso que já foi citado aqui hoje: ‘Nós não precisamos de homem’. Nos sustentamos e somos capazes de viver independentes e o dia que quisermos um filho é só escolher um espécime ou ir lá num banco de fertilização (Ilma Cunha, 2015).
Em todos os eventos, as mulheres eram conclamadas a se quebrantar, pedir perdão a Deus (inclusive pelos pecados de seus antepassados) e transformar suas atitudes. O arrependimento - não apenas de suas ações, mas das transgressões de seus predecessores, que estariam a atravessar gerações - era posto como a condição para a cura. Nos cultos, a contrição era manifesta por meio de choros, orações, mãos que se erguiam, palavras de pesar que eram repetidas durante os clamores. E, novamente, a responsabilidade recaía sobre as mulheres, que oravam assim: “Me perdoa, Senhor, porque eu abri mão das promessas, das vitórias dos filhos, da vitória no meu casamento, eu abri mão. Mas hoje, Senhor, eu me arrependo” (oração coletiva proferida pela pastora Ezenete Rodrigues, 2015).
Trata-se de uma espécie de sacrifício de si, sintetizado da seguinte maneira por Valadão: “Minhas irmãs, não é porque essa palavra está escrita aqui [Bíblia] que ela vai acontecer na sua vida sem oração, sem jejum, sem lágrimas, sem regar esse jardim que o próprio Senhor está fazendo na sua vida” (Ana Paula Valadão, 2015). Cunha também dizia: “Quantas estão sacrificando sua família e seus filhos no altar do seu egoísmo, da sua individualidade, dos seus desejos pessoais, da sua obsessiva busca de felicidade a qualquer preço?” (Ilma Cunha, 2015). As pregadoras faziam um chamado à autovigilância a partir de preceitos conservadores e que retraem as mulheres, fazendo-as desconhecer, abdicar e até mesmo maldizer os avanços e as conquistas feministas. Associa-se a isso o fato de que as mulheres eram ensinadas que suas necessidades não seriam supridas pelo marido ou os filhos. Mesmo que alcançassem uma vida conjugal e familiar, Jesus seria o único capaz de atender a todas as carências femininas. Assim como foi a mulher samaritana (referência bíblica), que teria tido cinco maridos e não alcançara a completude, seriam todas as outras mulheres (caderno de campo, 2012; 2014).
Seguindo a trilha de McRobbie, para quem o “dispositivo da perfeição” evita o feminismo radical (lido atualmente como uma postura antipática em relação aos homens), é possível afirmar que os ensinamentos das evangélicas em questão enquadram a mulher como a responsável por consertar as desigualdades que a afligem por meio da restauração de uma feminilidade tradicional e de um constante monitoramento de um plano de vida.
Valendo-se das perspectivas de McRobbie e Rosalind Gill, Monise Martinez afirma se tratar da “acomodação dos feminismos à agenda neoliberal” (MARTINEZ, 2018, p. 5). Martinez mostra, analisando o best-seller A mulher V: moderna, à moda antiga, de Cristiane Cardoso (2011), uma das líderes de maior destaque da Igreja Universal do Reino de Deus, que, embora haja atenção e contestação quanto ao conceito de beleza imposto pela indústria, deve-se manter o cuidado de si, algo que se opõe frontalmente à sexualização do corpo feminino (MARTINEZ, 2018). Análise muito semelhante é feita por Campos e Souza (2017), enfocando a glamourização da vida doméstica pregada por essa mesma religiosa. Mas esse discurso que visa combater a desvalorização do ser mulher - traduzida no abandono, na falta de amor-próprio, nas inimizades e traições (MARTINEZ, 2018) -, a despeito de um pouco mais informado, ao implicar a autovigilância e a autodisciplina revestidas do suposto poder de escolha, atende e reforça o individualismo e a autorresponsabilização, típicos da cultura econômica e política dos dias atuais.
Considerações finais
Há pelo menos 30 anos, a literatura socioantropológica, representada neste texto pelos trabalhos de Birman (1996), Boyer-Araújo (1995), Couto (2002a; 2002b), Mafra (1998), Machado (1995; 1996; 1999; 2005) e Mariz (1994), demonstra que a adesão ao pentecostalismo promove certa remodelação do jeito de ser homem e mulher no Brasil, no sentido de rejeitar parcialmente o machismo prevalente (asserção extensível ao carismatismo evangélico). É possível dizer ainda que as mulheres conseguem reordenar suas vidas, (re)criando memórias e construindo sobretudo a história não oficial das igrejas (BANDINI, 2014). O presente texto se situa, portanto, como parte de um conjunto de obras que vêm sendo produzidas para elucidar as “razões pedagógicas” (TEIXEIRA, 2012; 2016), as “pedagogias do corpo” (ROSAS, 2018), a “performance corporal virtuosa” das mulheres (MARTINEZ, 2018), isto é, o conjunto de técnicas, crenças, disposições corporais, gostos e habilidades que as evangélicas vêm produzindo, introjetando e incutindo quando da aprendizagem e do ensino dos valores da fé (CASTRO; ROSAS, 2019; ROSAS, 2020).
Mas, se, de um lado, a religião consegue promover os ‘benefícios’ de colocar em xeque a masculinidade hegemônica, alterar o comportamento dos homens, conferir um espaço que não está facilmente acessível às mulheres na sociedade mais ampla, aumentar o diálogo sobre a sexualidade e legitimá-la, tratar de reprodução, aliviar as mulheres dos sofrimentos das tomadas de decisão e fortalecer sua autoestima, colocando-as como mediadoras do sagrado; de outro lado, nem tudo isso parece blindar as religiosas de certas opressões enfrentadas, ao menos pelo que se observa no estudo apresentado. Ao enfatizarem o manejo do corpo e da etiqueta, revestindo a obrigação do cuidado da ideia de liberdade, cura, adoração e escolha e, ao buscarem estabelecer uma família na qual as mulheres são responsáveis pelo lar e por cuidar dos filhos (que lhe são heranças mandatórias), as evangélicas estariam fazendo exigências para si, se autorresponsabilizando e monitorando a vida em busca de atingir o máximo de êxito em todas as esferas. Em um contexto pós-feminista, as orientações analisadas não apenas ajudam a incorporar o “dispositivo da perfeição” (identificado por Angela McRobbie no contexto inglês de classe média), mas o naturalizam e o exacerbam ao postular as desigualdades sexuais e de gênero de modo ainda mais perverso do que faz a mídia popular, repondo a autoridade masculina como sendo um reflexo da vontade de Deus, portanto, algo não passível de contestação.
Valadão e suas companheiras, tomadas aqui como emblemas da feminilidade evangélica, são personagens que operam na mesma lógica da influenciadora digital Flávia Calina, cuja desenvoltura, dedicação e sucesso no mercado de trabalho são vivenciados como sendo completamente compatíveis com a “mística feminina do lar” (Lígia LANA, 2017, p. 1366). Talvez, para essas mulheres de destaque, isso possa ser verdade, mas não será para a maior parte de suas seguidoras, cujos trabalhos não consistem na exposição, glamourização e monetização da vida doméstica, mas sim no acúmulo de duplas ou triplas (se considerarmos a dedicação à igreja) jornadas de trabalho. Calina, Valadão e as líderes carismáticas objeto deste texto, ao acreditarem que estão no controle de suas próprias vidas, se alinham ao ‘empoderamento’ e à autonomização que seriam próprios das mulheres do século XXI. Todavia, assim como muitas outras religiosas, prescindem dos projetos coletivos e políticos, encampados pelos diversos feminismos (BANDINI, 2014), retraduzindo pautas públicas em demandas pessoais. E, ao fazerem isso, influenciam gerações de mulheres (e de homens), em números que chegam a milhões
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- TITUS, Devi. A experiência da mesa: o segredo para criar relacionamentos profundos São Paulo: Mundo Cristão, 2015.
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O que poderia contrabalancear esse desfecho seria o ativismo político das igrejas na promoção de candidaturas de mulheres pentecostais a cargos de representação proporcional, mas, segundo Machado (2005), ainda são necessários estudos para afirmar se isso aumenta o escrutínio crítico das partidárias e se elas se desprendem, em algum momento, dos preceitos da religião.
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Destaque é dado no artigo ao congresso de 2015, em razão da síntese que ele apresentou em relação a diversos temas que já vinham sendo trabalhados nos demais encontros. Esse também foi o último ano de residência de Valadão no Brasil, que passou a morar nos Estados Unidos, embora continue voltando para participar de passeatas, reuniões de oração, gravações etc.
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Lagoinha, embora seja uma igreja de confissão batista, tem traços pentecostais. Desse modo, poderia ser classificada, segundo as várias ciências das religiões, como uma agremiação que expressa o carismatismo evangélico. Sua sede está situada em uma das principais avenidas da cidade, mas a igreja conta com filiais espalhadas por diversos bairros, além de em outras regiões do país e do exterior, estimando que suas mais de 500 unidades reúnam membresia que ultrapassa os 90 mil fiéis. É liderada pelo pai da pastora em questão - Márcio Valadão, que está à frente das iniciativas eclesiásticas da IBL há mais de 40 anos.
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Os eventos eram transmitidos ao vivo, pela televisão e internet, sendo possível, posteriormente, assistir às gravações.
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O trabalho de McRobbie foi sugerido como bibliografia obrigatória na revisão, feita em 2017, de um texto de coautoria entre Cristina Maria de Castro e Nina Rosas (2019). Quando da redação deste artigo, em 2019, Monise Martinez (2018), doutoranda em estudos feministas, foi encontrada como, até então, a única outra referência a usar o arcabouço de McRobbie.
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Dependendo da edição, os congressos eram chamados de “Homens e Mulheres Diante do Trono”, pois, em outra parte da igreja, seu esposo agregava o público masculino, que orbitava em torno de 600 participantes.
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Os esforços da autora, em termos epistemológicos, são uma crítica ao “feminismo afirmativo”, expresso na transversalização de gênero (de Sylvia Walby), na celebração da terceira onda do feminismo, nas políticas sexuais (como da filósofa Rosi Braidotti) e na educação acadêmica (pedagogia pós-colonial) (McROBBIE, 2009).
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Isso seria comprar roupas, bolsas, sapatos; fazer as unhas, usar joias etc.
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Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista:
ROSAS, Nina. “Mulheres evangélicas em busca da perfeição”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 31, n. 1, e82539, 2023
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Financiamento:
Não se aplica
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Consentimento de uso de imagem:
Não se aplica
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Aprovação de comitê de ética em pesquisa:
A coleta de dados primários foi realizada durante pesquisa de Doutorado da autora, cuja aprovação do Comitê de Ética da UFMG responde pelo registro CAAE 07130812.2.0000.5149, datado de 28 de novembro de 2012
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
01 Maio 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
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Recebido
30 Jun 2021 -
Revisado
07 Jun 2022 -
Aceito
20 Set 2022