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Competências interculturais: interlocuções conceituais e uma proposta de releitura para a educação superior

Resumo

Competências interculturais na educação superior, em especial brasileira, constitui um tema incipiente apesar de sua importância longínqua e de ser um espaço indiscutivelmente composto de um rico arcabouço cultural. Ambiente com a predominância da perspectiva funcional da interculturalidade (CANDAU, 2012; WALSH, 2009), ainda carece de reflexões acerca do desenvolvimento de saberes sobre as temáticas que a permeiam. Este artigo buscou uma interlocução conceitual acerca de competências interculturais na educação superior, a partir de uma pesquisa bibliográfica do tipo qualitativa e exploratória, apropriando-se das principais publicações nacionais e internacionais a respeito do tema. A reflexão conceitual partiu de discussões acerca de competências e interculturalidade , bem como a junção dos dois construtos (competências interculturais) na educação superior. Portanto, foi possível realizar uma releitura com base nos conceitos de competências na ótica de inputs (corrente predominante norte-americana com ênfase no conjunto de características do sujeito) e outputs (corrente predominante europeia com foco nos resultados) e da interculturalidade (interação entre culturas) com concepção de classificação como relacional, funcional e crítica de Walsh (2009). Entende-se que a partir desta pesquisa sejam incitadas novas discussões e olhares acerca do tema, bem como estudos empíricos que venham agregar os resultados aqui apresentados, além de incentivar a busca por didáticas a serem implementadas que visam ao desenvolvimento de competências interculturais na Educação Superior.

Competências interculturais; Competências; Interculturalidade; Educação superior

Abstract

Intercultural competences in higher education, especially in Brazil, is an incipient theme despite its long-lasting importance and its indisputably rich cultural framework. An environment with a predominance of the functional perspective of interculturality (CANDAU, 2012; WALSH, 2009) still lacks reflections on the development of knowledge about the themes that permeate it. This article sought out a conceptual dialogue about intercultural competences in higher education, based on qualitative and exploratory bibliographic research, incorporating the main national and international publications about the subject. Conceptual reflection stemmed from discussions about skills and interculturality, as well as the combination of the two concepts (intercultural skills) in higher education. Therefore, it was possible to perform a reinterpretation based on competences concepts from the perspective of inputs (predominant North American trend with focus on the set of characteristics of the subject) and outputs (predominant European trend with focus on results) and interculturality (interaction between cultures) with classification concepts as relational, functional and critical described by Walsh (2009). From this research, new discussions and perspectives on the subject have been presented, as well as empirical studies that will aggregate the results presented here, in addition to the search for didactics aimed to develop intercultural competences that can be implemented in Higher Education.

Intercultural competences; Competences; Interculturality; Higher education

Introdução

Em um contexto repleto de línguas, artefatos, raças, religiões, dialetos, costumes, crenças distintas, o mundo está cada vez mais global e não se pode negar a existência da heterogeneidade cultural. O Brasil, por si só, já traz um arcabouço cultural em sua essência se tornando um espaço de experiências ímpares trazidas em seu extenso campo geográfico. Essa complexidade vem acompanhada de questões que brotam cotidianamente nesse contexto. Dentro dessa visão, trabalha-se com a interculturalidade, sendo essa a interação (considerada de diferentes formas) entre as culturas.

Vários questionamentos trazem à tona interpretações e entendimentos de estudos que se desenvolvem a fim de transportar algumas respostas às questões que nascem no olhar sobre a temática intercultural. As instituições educacionais, dentre elas, as universidades, são espaços constituídos de finalidades cujo foco é a formação das pessoas. Essas finalidades constituem-se em competências que podem ser desenvolvidas a partir de um emaranhado conceitual e prático que traz em seu enredo aspectos interculturais, principalmente no contexto educacional que é uma de suas fontes de desenvolvimento. “A educação não só é um direito humano senão também um direito dos povos” ( CRES, 2018CRES. Conferência Regional de Educação Superior, 3., 2018, Córdoba. Declaração da.... Córdoba: CRES, 2018. Disponível em: < http://www.cres2018.org> . Acesso em: 12 nov. 2018.
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, p. 8).

Diante disso, a pesquisa visou a propor uma interlocução conceitual sobre competências interculturais (CI) na educação superior (ES), a partir da revisão da literatura. Para atender esse objetivo: a) analisamos os conceitos de competências; b) discutimos os conceitos de interculturalidade e; c) realizamos uma reflexão acerca da interlocução entre os conceitos na perspectiva da educação superior, apresentando uma releitura do construto competências interculturais.

Pode-se considerar que a temática CI na educação superior é um aspecto pontual quando se trata de delimitação de um tema, sendo esse cada vez mais importante a partir das mutações inegáveis que vêm ocorrendo no contexto da ES brasileira, tais como: expansões pelo processo de interiorização; diversificação institucional; globalização; internacionalização; novos atores, entre outros ( MOROSINI, 2014MOROSINI, Marília Costa. Qualidade da educação superior e contextos emergentes. Avaliação, Campinas, v. 19, n. 2, p. 385-405, jul. 2014. ).

Estudar o tema já não é predileção para instituições inseridas nesse âmbito. Como afirma Deardorff (2006)DEARDORFF, Darla K. Identification and assessment of intercultural competence as a student outcome of internationalization. Journal of Studies in Intercultural Education, Thousand Oaks, n. 10, p. 241-266, 2006. , não se trata de um processo que se desenvolve naturalmente, razão pela qual requer ações intencionais dentro das instituições de educação superior (IES) que possam efetivar o processo. Assim, a autora defende que é necessário que haja cada vez mais uma evolução no conceito e um esforço para que a pesquisa e a prática se mantenham atualizadas com estudos e processos que venham embasar esse construto.

Caminho metodológico

O estudo foi do tipo básico, qualitativo, exploratório, com apropriação de pesquisa bibliográfica para construção da análise que permitiu a proposição de uma releitura sobre CI na educação superior. A pesquisa básica ( GIL, 1999GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999. ) tem como objetivo discutir teorias, desenvolver novos saberes a partir de uma reflexão teórica. O estudo qualitativo, agregado a esse processo, buscou trazer reflexões que não tiveram como objetivo quantificar dados e significações.

A pesquisa do tipo bibliográfica permitiu, por meio das análises das publicações (teóricos basilares, artigos sobre a temática), um olhar para a elaboração de proposições a partir das teorias e contribuições publicadas. Para Gil (1999)GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999. , os documentos constituem a análise da pesquisa. Pizzani et al. (2012)PIZZANI, Luciana et al. A arte da pesquisa bibliográfica na busca do conhecimento. Revista Digital de Bibliotecnia e Ciência da Informação, Campinas, v. 10, n. 1, p. 53-66, 2012. ressaltam que a pesquisa bibliográfica é uma técnica importante que busca discutir as principais correntes teóricas que norteiam uma área. Os passos fundamentaram-se em Lima e Mioto (2007)LIMA, Telma Cristiane Sasso; MIOTO, Regina Célia Tamaso. Procedimentos metodológicos na construção do conhecimento científico: a pesquisa bibliográfica. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 10, n. esp, p. 37-45, 2007. , a partir dos parâmetros definidos pelos autores.

A respeito do tema competências, apoiamo-nos nas duas correntes principais de perspectivas do conceito: input e output , baseando-nos em trabalhos de Parry (1996)PARRY, Scott B. The quest for competencies. Training, New York, v. 33, n. 7, p. 48-56, jul. 1996. e Fleury, M.; Fleury, A. (2001)FLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso Carlos Correa. Construindo o conceito de competência. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 5, p. 183-196, 2001. que discutem essa classificação, a partir de uma literatura considerada predominante na Europa ( output ) e nos Estados Unidos ( input ).

Nas duas concepções, utilizamos bibliografias que debatem competências no contexto brasileiro, sendo as principais: Dutra (2004)DUTRA, Joel Souza. Competências: conceitos e instrumentos para a gestão de pessoas na empresa moderna. São Paulo: Atlas, 2004. ; Fleury, M.; Fleury, A. (2001FLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso Carlos Correa. Construindo o conceito de competência. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 5, p. 183-196, 2001. , 2004FLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso Carlos Correa. Alinhando estratégia e competências. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 44, n. 1, p. 44-57, jan/mar, 2004. , 2004aFLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso Carlos Correa. Estratégias empresariais e formação de competências: um quebra-cabeça caleidoscópico da indústria brasileira. São Paulo: Atlas, 2004a. p. 27-59. ); Fernandes; Fleury (2007)FERNANDES, Bruno Henrique Rocha; FLEURY, Maria Tereza Leme. Modelos de gestão por competência: evolução e teste de um Sistema. Análise, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 103-122, jul./dez. 2007. . Também foram analisadas as duas correntes predominantes com a bibliografia internacional que trazem em especial White (1959)WHITE, Leslie Alvin. The concept of culture. American Anthropologist, Virgínia, n. 6l, p. 227-251, 1959. ; McClelland (1973)McCLELLAND, David Clarence. Testing for competence rather than for “intelligence”. American Psychologist, Washington, DC, v. 28, n. 1, p. 1-14, Jan. 1973. ; Spencer; Spencer (1994); Le Boterf (2005)LE BOTERF, Guy. Construir as competências individuais e colectivas. Lisboa: ASA, 2005. ; Zarifian (2001)ZARIFIAN, Philippe. Objetivo competência: por uma nova lógica. São Paulo: Atlas, 2001. , Dolz e Ollagnier (2004)DOLZ, Joaquim; OLLAGNIER, Edmée. O enigma da competência. Porto Alegre: Artmed, 2004. , considerados autores clássicos das duas óticas discutidas. Os debates a respeito das competências permitiram a construção da figura 1 deste artigo, para melhor visualização das correntes epistemológicas que envolvem esse conceito, nas duas perspectivas aqui defendidas como norteadoras do trabalho. Citamos também alguns autores da área da educação trazidos por Morosini, Cabrera e Felicetti (2011)MOROSINI, Marília Costa. CABRERA, Alberto F.; FELICETTI, Vera Lucia, Competências do pedagogo: uma perspectiva docente. Educação, Porto Alegre, v. 34, n. 2, p. 230-240, maio/ago, 2011. .

Figura 1
– Conceito de competência pela perspectiva de input e output

Para discussões acerca da interculturalidade, como principais referências adotamos as bibliografias associadas ao contexto brasileiro, de Candau (2012CANDAU, Vera Maria Ferrão. Diferenças culturais, interculturalidade e educação em direitos humanos. Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 118, p. 235-250, jan./mar. 2012. , 2016CANDAU, Vera Maria Ferrão (Org). Interculturalizar, descolonizar, democratizar: uma educação “outra”? Rio de Janeiro: 7Letras, 2016. ); Candau; Koff (2006)CANDAU, Vera Maria Ferrão; KOFF, Adélia Maria Nehme Simão. Conversas com... sobre a didática e a perspectiva multi/intercultural. Educação & Sociedade, Campinas, v. 27, n. 95, p. 471-493, maio/ago. 2006. , Coppete, Fleuri e Stoltz (2012)COPPETE, Maria Conceição; FLEURI, Reinaldo Matias; STOLTZ, Tânia. Educação para a diversidade numa perspectiva intercultural. Revista Pedagógica Unochapecó, Chapecó, ano 15, v. 01, n. 28, p. 341-345, jan./jun, 2012. , com a referência conceitual na visão da América Latina de Walsh (2009WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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, 2009aWALSH, Catherine. Interculturalidad, estado, sociedad: luchas (de)coloniales de nuestra época. Quito: Universidad Andina Simón Bolivar; AbyaYala, 2009a. Disponível em < http://www.derecho.uach.cl/documentos/Interculturalidad-estado-ysociedad_Walsh.pdf> . Acesso em: 20 ago 2018.
http://www.derecho.uach.cl/documentos/In...
), complementando com a perspectiva de Mato (2008MATO, Daniel (Coord). Diversidad cultural e interculturalidad en educación superior: experiencias en América Latina. Caracas: Unesco-Iesalc, 2008. , 2016MATO, Daniel. Universidades e diversidade cultural e epistêmica na América Latina: experiências, conflitos e desafios. In: CANDAU, Vera Maria. Interculturalizar, descolonizar e democratizar: uma educação “outra”? Rio de Janeiro: 7Letras, 2016. p. 38-63. ). Walsh foi a referência chave para discussão das perspectivas defendidas aqui de interculturalidade, que trata dos três tipos: relacional, funcional e crítica, sendo um eixo de análise associado com as correntes de perspectivas de input e output , que originaram a figura 2 deste artigo.

Figura 2
– Releitura de competências interculturais na educação superior

Dada a escassa literatura brasileira sobre CI na educação superior, apoiamo-nos nas discussões de Deardorff (2004DEARDORFF, Darla K. The identification and assessment of intercultural competence as a student outcome of internationalization at institutions of higher education in the United States. 2004. 337 f. Tese (Doutorado em Educação) – North Carolina State University, Releigh, 2004. , 2006DEARDORFF, Darla K. Identification and assessment of intercultural competence as a student outcome of internationalization. Journal of Studies in Intercultural Education, Thousand Oaks, n. 10, p. 241-266, 2006. , 2009DEARDORFF, Darla K. (Ed). The Sage handbook of intercultural competence. Thousand Oaks: Sage, 2009. ); Freeman et al. (2009)FREEMAN, Mark et al. Embedding the development of intercultural competence in business education. Sydney: Australian Learning and Teaching Council, 2009. Disponível em: < http://www.olt.gov.au/project-embedding-development-intercultural-sydney-2006> . Acesso em: 23 maio 2019.
http://www.olt.gov.au/project-embedding-...
, Unesco (2002UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Declaração universal da Unesco sobre a diversidade cultural. Brasília, DF: Unesco, 2002. Disponível em: < http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160por.pdf> . Acesso em: 19 ago 2018.
http://unesdoc.unesco.org/images/0012/00...
, 2009UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Investir na diversidade cultural e no diálogo intercultural: direito humano à educação. Brasília, DF: Unesco, 2009. Disponível em: < http://www.dhescbrasil.org.br/index.php> . Acesso em: 20 ago 2018.
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), Dervin (2010)DERVIN, Fred. Assessing intercultural competence in language learning and teaching: a critical review of current eff orts. In: DERVIN; Fred; SUOMELA-SALMI, Eija (Ed.). New approaches to assessing language and (inter)cultural comptences in higher education. Bern: Peter Lang, 2010. p. 157-174. , Berardo; Deardorff (2012)BERARDO, Kate; DEARDORFF, Darla (Org.). Building cultural competence: innovative activities and models. Virginia: Stylus, 2012. , Huber; Reynolds (2014)HUBER, Josef; REYNOLDS, Christopher (Ed.). Developing intercultural competence through education. Strasbourg: Council of Europe, 2014. (Pestalozzi series; n. 3). . Essas obras foram escolhidas por trazerem análises atuais sobre o tema e discutem tanto a construção histórica do tema, aplicações e métodos, modelos, além de estudos voltados para educação e educação superior.

Buscamos, no entanto, a vigilância epistemológica, conforme defendem Lima; Mioto (2007LIMA, Telma Cristiane Sasso; MIOTO, Regina Célia Tamaso. Procedimentos metodológicos na construção do conhecimento científico: a pesquisa bibliográfica. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 10, n. esp, p. 37-45, 2007. , p. 37), para “realizar um movimento incansável de apreensão dos objetivos”. Também entendemos que a pesquisa não esgota um determinado conceito. Como limitação do método, entende-se ser necessário a realização de pesquisas empíricas que venham trabalhar a proposta aqui apresentada.

Resultados e discussões

Para apresentar a releitura e as reflexões conceituais, optou-se por fazer uma discussão do construto competências interculturais fragmentando-o. Assim como destaca Huber; Reynolds (2014)HUBER, Josef; REYNOLDS, Christopher (Ed.). Developing intercultural competence through education. Strasbourg: Council of Europe, 2014. (Pestalozzi series; n. 3). , para se entender CI é preciso entender os conceitos relacionados. O debate inicial foi do conceito de competências e depois de interculturalidade e, por fim, competências interculturais, trazendo assim uma reflexão conceitual com uma releitura para a educação superior.

Competências

O conceito de competência começou a ser elaborado de forma estruturada pela primeira vez por McClelland (1973)McCLELLAND, David Clarence. Testing for competence rather than for “intelligence”. American Psychologist, Washington, DC, v. 28, n. 1, p. 1-14, Jan. 1973. , na busca de uma aproximação mais concreta que os testes de inteligência usados nos métodos de seleção de pessoas para as organizações ( DUTRA, 2004DUTRA, Joel Souza. Competências: conceitos e instrumentos para a gestão de pessoas na empresa moderna. São Paulo: Atlas, 2004. ).

Basicamente, no nível individual, apesar de não consensual, a competência perpassa pelos três pilares básicos: conhecimento, habilidade e atitudes (CHA). Durand (2000)DURAND, Thomas. L’alchimie de la compétence. Revue Française de Gestion, Paris, n. 127, p. 84-102, jan./fev. 2000. ressalta que esses três vértices devem ser interligados, relacionados a um determinado propósito. Defende também que os valores e crenças compartilhados por uma equipe influenciam o comportamento do indivíduo. Essa abordagem conceitual é, aparentemente, a mais aceita no que se refere à análise do ambiente do trabalho ( BRANDÃO; GUIMARÃES, 2001BRANDÃO, Hugo Pena; GUIMARÃES, Tomás De Aquino. Gestão de competências e gestão de desempenho: tecnologias distintas ou instrumentos de um mesmo construto? Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 41, n. 1, p.8-15, 2001. ).

O debate francês acerca do tema competências surgiu na década de 1970, “justamente do questionamento do conceito de qualificação e do processo de formação profissional, principalmente técnica” (FLEURY, M.; FLEURY, A., 2001FLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso Carlos Correa. Construindo o conceito de competência. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 5, p. 183-196, 2001. , p. 186). Os franceses não satisfeitos com a necessidade do mercado e a formação desses, levaram o debate para o campo educacional. Um dos autores que buscou extrapolar o conceito, Zarifian (2001)ZARIFIAN, Philippe. Objetivo competência: por uma nova lógica. São Paulo: Atlas, 2001. , analisa a competência sob diversas óticas em nível organizacional, discutindo as competências técnicas, de serviços, sobre processos e sociais.

Sá e Paixão (2013)SÁ, Patrícia; PAIXÃO, Fátima. Contributos para a clarificação do conceito de competência numa perspectiva integrada e sistémica. Revista Portuguesa de Educação, Braga, v. 1, n. 26, p. 87-114, 2013. trazem uma discussão a respeito da polissemia do conceito a partir das abordagens behaviorista e integrada. Historicamente, White (1959)WHITE, Leslie Alvin. The concept of culture. American Anthropologist, Virgínia, n. 6l, p. 227-251, 1959. traz uma visão de competência como características pessoais e McClelland (1973)McCLELLAND, David Clarence. Testing for competence rather than for “intelligence”. American Psychologist, Washington, DC, v. 28, n. 1, p. 1-14, Jan. 1973. conceitua como uma característica subjacente ao sujeito, sendo esse último uma referência do construto como input (behaviorista). Na abordagem integrada (sistêmica e complexa), Le Boterf (2005)LE BOTERF, Guy. Construir as competências individuais e colectivas. Lisboa: ASA, 2005. apresenta o conceito em uma visão pluridimensional. Autores dessa corrente como Zarifian (2001)ZARIFIAN, Philippe. Objetivo competência: por uma nova lógica. São Paulo: Atlas, 2001. e Dolz; Ollagnier (2004)DOLZ, Joaquim; OLLAGNIER, Edmée. O enigma da competência. Porto Alegre: Artmed, 2004. também se inserem nessa abordagem ( FERNANDES, FLEURY, 2007FERNANDES, Bruno Henrique Rocha; FLEURY, Maria Tereza Leme. Modelos de gestão por competência: evolução e teste de um Sistema. Análise, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 103-122, jul./dez. 2007. , p. 106). Os autores da abordagem integrada também são considerados defensores da perspectiva conceitual de output.

Dutra (2004)DUTRA, Joel Souza. Competências: conceitos e instrumentos para a gestão de pessoas na empresa moderna. São Paulo: Atlas, 2004. e Fleury, M.; Fleury, A. (2001)FLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso Carlos Correa. Construindo o conceito de competência. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 5, p. 183-196, 2001. buscam equilibrar as duas visões. No Brasil, na década de 1980, o tema recebeu relevância nos estudos que discutiam competência do indivíduo e da organização. Pesquisas foram sendo elaboradas diferenciando vários ângulos conceituais sobre competências (individuais, profissionais, organizacionais, gerenciais), matrizes, gestão de e por competências. Esse cenário pauta-se inicialmente pensando competência como input ( FERNANDES; FLEURY, 2007FERNANDES, Bruno Henrique Rocha; FLEURY, Maria Tereza Leme. Modelos de gestão por competência: evolução e teste de um Sistema. Análise, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 103-122, jul./dez. 2007. ), tornando-se uma corrente predominante no Brasil. A competência, portanto, é um saber agir responsável e reconhecido, que implica “mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos e habilidades, que agreguem valor econômico à organização e valor social ao indivíduo” ( FLEURY, M.; FLEURY, A., 2001FLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso Carlos Correa. Construindo o conceito de competência. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 5, p. 183-196, 2001. , p. 188).

A literatura também pode ser avaliada por meio das correntes predominantes seja por abordagens, seja em um espaço territorial como a divisão dos debates em “americano e europeu”. Parry (1996)PARRY, Scott B. The quest for competencies. Training, New York, v. 33, n. 7, p. 48-56, jul. 1996. destaca que no primeiro, competência é considerada input , tratada como um conjunto de características que venham afetar as ações dos sujeitos, enquanto que, na Europa, competência é considerada output , ou seja, o indivíduo demonstra competência a partir do momento que consegue assimilar e superar os resultados de suas ações.

Essa classificação em sua essência conceitual ( input e output ) foi adotada aqui como referência para analisar o construto Competências Interculturais (CI). A figura 1 busca demonstrar o funcionamento das duas perspectivas ( input - entrada e output - saída).

Na esfera educacional, percebem-se discussões acerca da temática trazendo principalmente a competência individual, seja ela com um olhar para o discente, docente ou ainda os gestores. Morosini, Cabrera e Felicetti (2011)MOROSINI, Marília Costa. CABRERA, Alberto F.; FELICETTI, Vera Lucia, Competências do pedagogo: uma perspectiva docente. Educação, Porto Alegre, v. 34, n. 2, p. 230-240, maio/ago, 2011. ressaltam alguns dos principais autores que discutem competência no contexto da educação: Delors (1996)DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez; 1996. Relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. , Sugumar (2009)SUGUMAR, V. Raji. Competency mapping of teachers in tertiary education. Chennai: Anna University, 2009. Disponível em: < http://www.eric.ed.gov/ERICWebPortal/custom/portlets/recordDetails/detailmini.jsp?_nfpb=true&_&ERICExtSearch_SearchValue_0=ED506207&ERICExtSearch_SearchType_0=no&accno=ED506207> . Acesso em: 15 jan. 2010.
http://www.eric.ed.gov/ERICWebPortal/cus...
, Rios (2001)RIOS, Terezinha Azerêdo. Compreender e ensinar: por uma docência de melhor qualidade. São Paulo: Cortez, 2001. , Braslavsky (1999)BRASLAVSKY, Cecilia. Bases, orientaciones y criterios para el diseño de programas de formación de profesores. Revista Iberoamericana de Educación, Madrid, n. 19, p. 13-50, 1999. , Perrenoud (1999)PERRENOUD, Philippe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999. , Goergen (2000)GOERGEN, Pedro L. Competências docentes na educação do futuro: anotações sobre a formação de professores. Nuances, Presidente Prudente, v. 6, n. 6, p. 1-9, out. 2000. que realizam discussões acerca de competências principalmente para a competência docente, ressaltando que tais abordagens incluem basicamente duas vertentes: “o desdobramento (planejamento) e a implementação (execução) do conhecimento profissional, bem como de ideias, e habilidades que o professor possui” ( MOROSINI; CABRERA; FELICETTI, 2011MOROSINI, Marília Costa. CABRERA, Alberto F.; FELICETTI, Vera Lucia, Competências do pedagogo: uma perspectiva docente. Educação, Porto Alegre, v. 34, n. 2, p. 230-240, maio/ago, 2011. , p. 232).

A próxima seção traz reflexões sobre cultura, multiculturalidade e interculturalidade, tendo como objetivo central as discussões de interculturalidade no contexto da educação. Entendemos que discussões sobre cultura, aqui trazidas em seu sentido mais amplo, reafirmam a complexidade do construto. Cumpre salientar que não nos detivemos intencionalmente às minúcias de discussões sobre esse tema, com objetivo de explanar sobre as principais configurações conceituais sobre ela, porque o foco central deste trabalho são as competências interculturais.

Cultura, multiculturalidade e interculturalidade

Estudos acerca de cultura já são abrangentes na literatura e cada vez mais ramificados. Hofstede (1980)HOFSTEDE, Geert. Culture’s consequences: international differences in work-related values. Beverly Hills: Sage, 1980. é um dos autores de grande destaque no estudo de culturas nacionais. Ele define cultura como um fenômeno coletivo que é aprendido e não herdado. Alguns autores concentram-se em estudos voltados para a cultura, seus conceitos, aspectos e diferenças que permeiam esse contexto ( CLIFFORD; MARCUS, 1986CLIFFORD, James; MARCUS, George Emanuel. Writing culture: the poetics and politics of ethnography. Berkeley: University of California Press, 1986. ; GEERTZ, 1973GEERTZ, Clifford. The Cerebral Savage: on the work of Claude LéviStrauss. In: GEERTZ, Clifford. The interpretation of cultures. New York: Basic Books, 1973. p. 345-359. ; KRAMSCH, 1998KRAMSCH, Claire. Language and culture. Oxford: Oxford University Press, 1998. ). Muito citado no Brasil, Hofestde (1980) diz que cultura é a programação coletiva dos espíritos que distinguem os membros de um grupo humano do outro. Outros trabalham a comunicação ( CRICHTON; SCARINO, 2007CRICHTON, Jonathan; SCARINO, Angela. How are we to understand the intercultural dimension? Australian Review of Applied Linguistics, Sidney, v. 30, n. 1, p. 04.1-04.21, 2007. ) e estudos linguísticos sobre a necessidade de uma compreensão compartilhada da linguagem e seu(s) significado(s) em uso ( KRAMSCH, 1998KRAMSCH, Claire. Language and culture. Oxford: Oxford University Press, 1998. ).

Sousa Santos e Nunes (2003SOUSA SANTOS, Boaventura de; NUNES, João Arriscado. Introdução: para ampliar o cânone do reconhecimento, da diferença e da igualdade. In: SOUSA SANTOS, Boaventura de (Org.). Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 13-59. , p. 3) destacam que o conceito de cultura pode ser visto a partir de duas perspectivas: da área das Humanidades, que trata o termo “em critérios de valor, estéticos, morais ou cognitivos, que definindo-se a si próprios como universais, elidem a diferença cultural ou a especificidade histórica dos objetos que classificam”. Na outra perspectiva, da área das Ciências Sociais, “reconhece a pluralidade de culturas, definindo-as como pluralidades complexas que se confundem com as sociedades”. ( SOUSA SANTOS; NUNES, 2003SOUSA SANTOS, Boaventura de; NUNES, João Arriscado. Introdução: para ampliar o cânone do reconhecimento, da diferença e da igualdade. In: SOUSA SANTOS, Boaventura de (Org.). Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 13-59. , p. 3).

Um autor considerado clássico, Tylor (1871)TYLOR, Edward Burnett. Primitive culture: researches into the development of mythology, philosophy, religion, art, and custom. London: John Murray; Albermale Street, 1871. , que foi um dos primeiros a trabalhar o conceito de cultura, destaca que cultura ou civilização, tomada em seu amplo sentido etnográfico, é um todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade. Esse conceito foi refutado por Franz Boas (antropólogo) ( MORGADO, 2014MORGADO, Ana Cristina. As múltiplas concepções da cultura. Múltiplos Olhares em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v. 4, n. 1, p. 1-8, mar. 2014. ). Boas (1922)BOAS, Franz. The mind of primitive man. New York: Bibliolife. 1922. ressaltou que em lugar de uma simples linha de evolução, aparece uma multiplicidade de linhas (convergentes e divergentes) difíceis de serem unidas em um sistema. Em vez de uniformidade, a característica notável parece ser a diversidade.

A cultura não é um poder, algo ao qual podem ser atribuídos casualmente os acontecimentos sociais, os comportamentos, as instituições ou os processos. Ela é um contexto, algo dentro do qual eles (os símbolos) podem ser descritos de forma inteligível – isto é, descritos com densidade. Compreender a cultura de um povo expõe a sua normalidade sem reduzir sua particularidade ( GEERTZ, 1973GEERTZ, Clifford. The Cerebral Savage: on the work of Claude LéviStrauss. In: GEERTZ, Clifford. The interpretation of cultures. New York: Basic Books, 1973. p. 345-359. ). Também vale destacar o conceito da Unesco (2002)UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Declaração universal da Unesco sobre a diversidade cultural. Brasília, DF: Unesco, 2002. Disponível em: < http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160por.pdf> . Acesso em: 19 ago 2018.
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, que considera cultura como o conjunto dos traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social.

Entende-se que a Cultura, a partir das várias perspectivas, apresenta uma complexidade indescritível e singular, permeada pelo contexto que a envolve. Isso inclui valores, crenças, conhecimento, símbolos que afloram um determinado espaço e que são reconhecidos pelos indivíduos ali inseridos. A polissemia conceitual é conduzida para as ideias de multiculturalidade e interculturalidade que também se encontram em um emaranhado de discussões e entendimentos diversos.

Multiculturalismo e interculturalidade podem ser considerados como conceitos distintos, mas também com características similares. Backes (2013BACKES, José Licínio. Os conceitos de multiculturalismo/interculturalidade e gênero e a ressignificação do currículo da educação básica. Quaestio, Sorocaba, v. 15, n. 1, p. 50-64, 2013. , p. 53) ressalta que:

[...] persistem dúvidas sobre se o conceito mais produtivo é o da interculturalidade ou multiculturalismo e o reconhecimento de que se trata de conceitos polissêmicos e de multiuso é acompanhado de um esforço para diminuir a polissemia, recorrendo-se a diferentes tipos de multiculturalismo.

Na literatura, portanto, muitos debates aproximam e diferenciam esses conceitos, conforme exposto por Candau; Koff (2006)CANDAU, Vera Maria Ferrão; KOFF, Adélia Maria Nehme Simão. Conversas com... sobre a didática e a perspectiva multi/intercultural. Educação & Sociedade, Campinas, v. 27, n. 95, p. 471-493, maio/ago. 2006. , que citam Jordan (1996)JORDAN, José Antonio. Propuesta de educación intercultural para profesores. Barcelona: CEAC, 1996. , McLaren (2000)McLAREN, Peter. Multiculturalismo crítico. 3. ed. São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire, 2000. , Banks (1999)BANKS, James Albert. An introduction to multicultural education. Boston: Ally & Bacon, 1999. , Forquin (2000)FORQUIN, Jean-Claude. O currículo entre o relativismo e o universalismo. Educação & Sociedade, Campinas, v. 21, n. 73, p. 79-83, dez. 2000. , entre outros.

Também há distintas visões sobre multiculturalismo, multiculturalidade, interculturalismo e interculturalidade. Na tentativa de um conceito mais generalizado, multiculturalismo pode ser entendido como um conjunto de culturas em uma determinada sociedade ( KREUTZ, 1999KREUTZ, Lúcio. Identidade étnica e processo escolar. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 107, p. 79-96, jul. 1999. ). Sousa Santos e Nunes (2003)SOUSA SANTOS, Boaventura de; NUNES, João Arriscado. Introdução: para ampliar o cânone do reconhecimento, da diferença e da igualdade. In: SOUSA SANTOS, Boaventura de (Org.). Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 13-59. também destacam que o termo, inicialmente, foi designado como coexistência de grupos caracterizados por culturas diferentes. Por ser um termo polissêmico, também pode ser interpretado com óticas diferentes, trazendo discussões sobre diversidade cultural, assimilação, até como as perspectivas consideradas como críticas, denominadas como multiculturalismo crítico, interculturalidade crítica ( McLAREN, 2000McLAREN, Peter. Multiculturalismo crítico. 3. ed. São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire, 2000. ). Multiculturalidade, portanto, pode ser entendida como uma expressão contemporânea da forma de pensar a multiplicidade cultural, sendo algo complexo que tem sido marcado pelas relações de poder ( ROJAS, 2008ROJAS, Axel. ¿Etnoeducación o educación intercultural? Estudio de caso sobre la licenciatura en etnoeducación de la Universidad del Cauca. In: MATO, Daniel (Coord.). Diversidad cultural e interculturalidad en educación superior: experiencias en América Latina. Caracas: Unesco-Iesalc, 2008. p. 233-242. ).

Apesar das várias correntes de discussões teóricas, entendemos que uma aproximação do conceito de interculturalismo foi trazida por Reyna (2007REYNA, Miriam Hernández. Sobre los sentidos de “multiculturalismo” e “interculturalismo”. Ra Ximhai, Sinaloa, v. 3, n. 2, p. 429-442, maio/ago. 2007. , p. 435). Para a autora, o interculturalismo pode ter dois significados, sendo um a “tematização teórica do fenômeno da interculturalidade, indicando um campo de estudos” e outro refere-se à “possibilidade de ser um projeto político de relações entre diferentes culturas”.

A interculturalidade, porém, além do conjunto de culturas, exige uma interação, inter-relação e diálogo entre elas. Traz consigo a concepção básica de interação entre culturas ou aspectos culturais, assim como enfatiza Kreutz (1999)KREUTZ, Lúcio. Identidade étnica e processo escolar. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 107, p. 79-96, jul. 1999. . Essa concepção foi a norteadora da discussão desta pesquisa, entendendo que interação pode ser compreendida de várias maneiras.

No contexto da educação, também denominada educação intercultural, que é uma temática que vem se expandindo no contexto latino americano, a partir de reflexões e estudos de alguns autores, entre eles Walsh (2009WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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, 2009aWALSH, Catherine. Interculturalidad, estado, sociedad: luchas (de)coloniales de nuestra época. Quito: Universidad Andina Simón Bolivar; AbyaYala, 2009a. Disponível em < http://www.derecho.uach.cl/documentos/Interculturalidad-estado-ysociedad_Walsh.pdf> . Acesso em: 20 ago 2018.
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), tem-se três concepções básicas: relacional, funcional e crítica. A relacional considera como natural os processos de sincretismo, mestiçagem e isso tende a encobrir os conflitos e a relação é limitada e individual. A visão funcional reconhece as diferenças culturais a fim de tentar a estabilidade social. Já a interculturalidade crítica problematiza a estrutura.

Walsh (2009WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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, p. 03) enfatiza que perspectiva crítica de interculturalidade é como uma ferramenta que “aponta e requer a transformação das estruturas, instituições e relações sociais, e a construção de condições de estar, ser, conhecer, aprender, sentir e viver distintas”. Para ser possível, precisa ser um projeto de sociedade. Para autora, quando falamos de contexto latino-americano, estamos a evoluir e para isso, de modo que não basta reconhecer o diferente. Essa é a corrente que assume a diversidade como eixo central, partindo do problema do poder, buscando uma discussão a partir do prisma decolonial.

Apropriamos dos conceitos discutidos e analisamos CI tanto na ótica de competências de input e output , assim como nas discussões de interculturalidade relacional, funcional e crítica. A seguir, apresentamos discussões acerca de CI e a nossa releitura acerca dos conceitos a partir das definições adotadas.

Competências interculturais

Dentro das diversas formas de se analisar competências ou de suas variações que incorporam óticas particulares como, por exemplo, a interculturalidade, entende-se que a noção de competências interculturais mescla os dois conceitos e que a literatura vem discutindo, desde a década de 1950 (EUA); e encaminhando para a incorporação de novas variáveis como a internacionalização.

Dentre as várias interpretações conceituais, o primeiro projeto para documentar o consenso entre especialistas em estudos sobre interculturalidade nos Estados Unidos (EUA), no que se refere à competência intercultural, buscou um processo interativo usado para obter consenso entre um painel de especialistas. Os aspectos beneplácitos foram categorizados e colocados em um modelo que se pauta na avaliação e no desenvolvimento de resultados de aprendizagem mensuráveis detalhados. Especificamente, este modelo foi baseado em desenvolvimento de atitudes, conhecimentos e aptidões específicos inerentes à aprendizagem de CI ( DEARDORFF, 2009DEARDORFF, Darla K. (Ed). The Sage handbook of intercultural competence. Thousand Oaks: Sage, 2009. ).

Além desse modelo, existem outros que foram usados para enquadrar aspectos da aprendizagem intercultural: o Modelo de Desenvolvimento de Sensibilidade Intercultural, de Bennett (1993), o Modelo Maturidade Intercultural, de King e Baxter Magolda (2005), e o Continuum Transcultural, de Cross (1988). Todos esses descrevem etapas de crescimento ( BERARDO; DEARDORFF, 2012BERARDO, Kate; DEARDORFF, Darla (Org.). Building cultural competence: innovative activities and models. Virginia: Stylus, 2012. ).

Várias definições de CI foram dadas academicamente. Para Dervin (2010)DERVIN, Fred. Assessing intercultural competence in language learning and teaching: a critical review of current eff orts. In: DERVIN; Fred; SUOMELA-SALMI, Eija (Ed.). New approaches to assessing language and (inter)cultural comptences in higher education. Bern: Peter Lang, 2010. p. 157-174. , a mais abrangente foi apresentada por Byram (1997)BYRAM, Michael. Teaching and assessing intercultural communicative competence. Clevedon: Multilingual Matters, 1997. , que trouxe cinco componentes da CI e assim foi caracterizado por Dervin, por ter seus objetivos claros, mas, por outro lado, carrega a dificuldade de ser avaliado ( BYRAM, 1997BYRAM, Michael. Teaching and assessing intercultural communicative competence. Clevedon: Multilingual Matters, 1997. ; KRAMSCH, 1993KRAMSCH, Claire. Context and culture in language teaching. Oxford: Oxford University Press, 1993. ).

Para a Unesco (2009)UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Investir na diversidade cultural e no diálogo intercultural: direito humano à educação. Brasília, DF: Unesco, 2009. Disponível em: < http://www.dhescbrasil.org.br/index.php> . Acesso em: 20 ago 2018.
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, as CI’s são recursos postos em prática durante a interculturalidade no diálogo. Entende-se que a competência intercultural, em especial no processo ensino-aprendizagem na educação formal, pode ser vista como a capacidade de desenvolver suas tarefas ou funções de forma eficiente em contextos multiculturais ( ALVAREZ, 2005ALVAREZ, María Asunción Aneas. Competencia intercultural, concepto, efectos e implicaciones en el ejercicio de la ciudadanía. Revista Iberoamericana de Educación OEI, Madrid, n. 35, v. 5, p. 1-10, 2005. ). Isso remete-nos também a um contexto não somente profissional, mas um repensar para o bom exercício da cidadania. A aprendizagem intercultural é transformadora e requer experiências (muitas vezes além da sala de aula) que levem a essa transformação ( DEARDORFF, 2009DEARDORFF, Darla K. (Ed). The Sage handbook of intercultural competence. Thousand Oaks: Sage, 2009. ).

Autores que trabalham com modelos, como Spitzberg; Changnon (2009)SPITZBERG, Brian H.; CHANGNON, Gabrielle. Conceptualizing intercultural competence. In: DEARDORFF, Darla K. (Ed.). The Sage handbook of intercultural competence. Thousand Oaks: Sage, 2009. p. 2-52. , trazem 5 tipos de modelos e discutem a vertente de construção de conceito de CI. Pascarella (1985)PASCARELLA, Ernest T. College environmental influences on learning and cognitive development: a critical review and synthesis. In: SMART, John (Ed.). Higher education: handbook of theory and research. New York: Agathon, 1985. p. 1-64. trabalhou com modelo voltado para variáveis no processo de aprendizagem do estudante; Deardorff (2006)DEARDORFF, Darla K. Identification and assessment of intercultural competence as a student outcome of internationalization. Journal of Studies in Intercultural Education, Thousand Oaks, n. 10, p. 241-266, 2006. estuda componentes da CI; Fantini (2007)FANTINI, Alvino E. Assessment tools of intercultural communicative competence. Humphrey [s. n.], 2007. direciona esforços para desenvolver a Avaliação da Competência Intercultural (ACI) e Schnabel et al. (2015)SCHNABEL, Deborah et al. Konstruktion und validierung eines multimethodalen berufsbezogenen tests zur messung interkultureller kompetenz = Development and validation of a job-related multimethod test to measure intercultural competence. Diagnostica, Göttingen, v. 61, n. 1, p. 3-21, 2015. tenta se aproximar de um instrumento para medir CI.

Deardorff (2006)DEARDORFF, Darla K. Identification and assessment of intercultural competence as a student outcome of internationalization. Journal of Studies in Intercultural Education, Thousand Oaks, n. 10, p. 241-266, 2006. , em seu estudo com acadêmicos e especialistas, identificou 22 componentes da CI, concluindo que os entrevistados preferem um conceito mais geral e não definiram competência em relação a aspectos específicos. Huber e Reynolds (2014)HUBER, Josef; REYNOLDS, Christopher (Ed.). Developing intercultural competence through education. Strasbourg: Council of Europe, 2014. (Pestalozzi series; n. 3). também trouxeram um conjunto de itens, porém de uma forma já classificada em atitudes, conhecimento e compreensão, habilidades e ações.

As discussões da American Council On Intercultural Education (ACIE, 1996), que trata da competência global e ser competente globalmente, considera competência como habilidade, conhecimento ou uma atitude que pode ser demonstrada, observada ou medida. Nessa discussão, defende-se que a formação de competência é um continnum e deve ser desenvolvida em todas as fases da educação, não somente a educação superior. Nessa perspectiva, o indivíduo poderá realizar vários graus de cada fase e o progresso pode não ser linear.

O conhecimento dessas discussões direciona o desenvolvimento de pesquisas a fim de conhecer melhor o contexto acadêmico brasileiro, dentro da perspectiva do modus operandis da discussão de práticas que venham desenvolver CI na formação do discente.

Importante salientar que o aprender competências interculturais é um processo cíclico. Para ensinar sobre algo, é preciso conhecer e ter aprendido sobre isso. Contudo, a aprendizagem das CI se busca ao longo de sua existência ( DEARDORFF, 2009DEARDORFF, Darla K. (Ed). The Sage handbook of intercultural competence. Thousand Oaks: Sage, 2009. ; DERVIN, 2010DERVIN, Fred. Assessing intercultural competence in language learning and teaching: a critical review of current eff orts. In: DERVIN; Fred; SUOMELA-SALMI, Eija (Ed.). New approaches to assessing language and (inter)cultural comptences in higher education. Bern: Peter Lang, 2010. p. 157-174. ). Isso enfatiza a importância do aprender a viver juntos dentro da educação, não excludente, na educação superior. O desenvolvimento de CI na educação superior não pode se limitar a assegurar espaços para discentes e docentes, mas também reconhecer o valor dos saberes das diversas culturas ( MATO, 2008MATO, Daniel (Coord). Diversidad cultural e interculturalidad en educación superior: experiencias en América Latina. Caracas: Unesco-Iesalc, 2008. , 2016MATO, Daniel. Universidades e diversidade cultural e epistêmica na América Latina: experiências, conflitos e desafios. In: CANDAU, Vera Maria. Interculturalizar, descolonizar e democratizar: uma educação “outra”? Rio de Janeiro: 7Letras, 2016. p. 38-63. ).

A importância de se discutir esse tema na educação superior perpassa também pela necessidade de ampliação do olhar para o desenvolvimento de competências que permeia esse espaço. Os sujeitos precisam apropriar-se dos códigos ou aspectos uns dos outros, aprender a olhar de uma maneira diferente ( COPPETE; FLEURI; STOLTZ, 2012COPPETE, Maria Conceição; FLEURI, Reinaldo Matias; STOLTZ, Tânia. Educação para a diversidade numa perspectiva intercultural. Revista Pedagógica Unochapecó, Chapecó, ano 15, v. 01, n. 28, p. 341-345, jan./jun, 2012. ).

Portanto, apresentamos uma releitura conceitual sobre CI e iniciou-se o processo com as discussões sobre os principais conceitos de competências, interculturalidade e competências interculturais adotados pela literatura pesquisada. Há uma série de conceitos que são discutidos sobre ambos construtos e alguns parâmetros são recorrentes entre as várias ideias. O primeiro, quanto ao conceito de competências, parece haver um discurso que converge para associação de conhecimentos, habilidade e atitudes, sendo sua junção a formação central do conceito de competências. Aliado a isso, esse conceito transpõe-se para o construto CI que se apropria desses três itens, muitas vezes sem associá-los ou de forma a distinguir CI de competências comunicativas interculturais (CCI).

Assim como explicam Huber; Reynolds (2014)HUBER, Josef; REYNOLDS, Christopher (Ed.). Developing intercultural competence through education. Strasbourg: Council of Europe, 2014. (Pestalozzi series; n. 3). , a linguagem é um sistema simbólico que permite aos membros do grupo compartilhar suas óticas culturais, sendo um componente importante da CI, mas não o único. As discussões acerca da interculturalidade perpassam, dentre outros, aspectos que contemplam crenças, valores, identidade, costumes de um determinado conjunto de indivíduos e sua interação. Isso pressupõe uma discussão sobre cultura, que se caracteriza por um conjunto de artefatos, aspectos de uma determinada sociedade e, sem a interação, não se fala em interculturalidade.

Por fim, quanto às competências interculturais na educação, em especial na educação superior, entende-se que as universidades latino-americanas carregam formatos monoculturais arcaicos nesse mundo de globalização e ainda reproduzem diversas formas de racismo oculto (cultural, social, econômico, ambiental, epistemológico) (MATO, 2016), o que gera um desafio ainda maior para a discussão da temática no contexto brasileiro. É preciso, pois, um repensar sobre a educação a partir de discussões sobre aspectos que emergem do contexto. “Tudo parece concorrer para afirmar a homogeneização e padronização. Acreditamos que somente avançaremos na construção de uma qualidade adequada aos tempos atuais se questionarmos essa lógica” ( CANDAU, 2016CANDAU, Vera Maria Ferrão (Org). Interculturalizar, descolonizar, democratizar: uma educação “outra”? Rio de Janeiro: 7Letras, 2016. , p. 807). Diante disso, a figura 2 traz uma releitura sobre CI na educação superior. Buscamos trazer uma visão que tem como intuito incitar debates acerca do tema.

A proposta na figura 2 é a releitura que apresentamos quanto à perspectiva conceitual de CI. As discussões individuais no referencial teórico buscaram trazer um olhar sobre os principais conceitos de competências e interculturalidade, avançando assim para visualização da releitura sobre CI. Entende-se que foi possível desenvolver uma análise trazendo os principais pontos de interlocução dos construtos competência, interculturalidade e competências interculturais.

Partindo de uma premissa sobre competências segundo a qual ela possa ter uma perspectiva tanto de input quanto de output e que essas são as visões que permeiam as principais discussões teóricas da atualidade, entende-se que esse olhar pode ser associado às perspectivas de interculturalidade a partir da divisão conceitual entre funcional, crítica e relacional. Essas duas escolhas teóricas pautaram-se em sua abrangência, entendendo que essas são as fundamentações que estão em consonância com as discussões desta pesquisa e mais abrangentes na literatura, principalmente aplicada à América Latina e ao Brasil.

O quadro foi construído unindo as perspectivas de competências ( input e output ) com cada um dos conceitos da interculturalidade (relacional, funcional e crítica), formando-se o conjunto: 1) Competências interculturais (CI) input relacional, 2) CI input funcional; 3) CI input crítica; 4) CI output relacional; 5) CI output funcional; 6) CI output crítica, cada uma delas descritas a seguir:

No item CI input relacional, considera-se que o indivíduo possa extrair aspectos interculturais para desenvolvimento de sua competência ignorando os conflitos e as diversificações do contexto. O sujeito age de forma a desenvolver sua competência individual como foco central do processo de desenvolvimento. Na visão de competências input , significa desenvolver aspectos individuais (CHA) com o objetivo de dar um enfoque às características do sujeito, juntamente com a perspectiva da interculturalidade se limitando ao contato e relacionamento, muitas vezes ao nível individual que, para Walsh (2009)WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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, irá ocultar ou ignorar as estruturas da sociedade que visam posicionar a diferença cultural.

A CI input funcional pauta-se também nas características do indivíduo de forma a extrair aspectos interculturais para desenvolvimento de sua competência na tentativa de manter a coesão do espaço e reduzir os conflitos. O sujeito age com a intenção, apropriando-se de tais aspectos a fim de se desenvolver e evitar problematizar o contexto, sem transcender. A perspectiva de competências como input permanece como o conceito anterior, porém a interculturalidade é a funcional, na qual se reconhecem a diversidade e as diferenças culturais do espaço, buscando o controle do conflito. Walsh (2009)WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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ressalta que é um tipo de perspectiva em que se tem uma falsa noção de equidade e igualdade, transformando-se em uma nova estratégia de dominação.

CI input crítica trata-se dos aspectos individuais, (exemplo, conhecimentos, habilidades e atitudes), como nos dois conceitos anteriores, porém utilizados como forma do indivíduo analisar e problematizar o contexto em que se insere, analisando os aspectos interculturais para desenvolvimento de sua competência na tentativa de agregar algo ao ambiente. O sujeito age com a intenção ou não, apropriando-se dos aspectos citados a fim de se desenvolver e problematizar o contexto, transcendendo as diferenças culturais.

Explanou-se, até aqui, os três tipos de CI na ótica de input . Nesses, a perspectiva de competências estabelece-se a partir do conjunto de características que levam um indivíduo a um resultado (foco nos aspectos individuais). O que diferem os três tipos apresentados é a interlocução com cada perspectiva conceitual de interculturalidade a partir de Walsh (2009)WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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na junção com o conceito de competências.

Trazendo as três outras visões, voltadas para competências output , todas remetem ao conceito de competências a partir dos resultados. Parry (1996)PARRY, Scott B. The quest for competencies. Training, New York, v. 33, n. 7, p. 48-56, jul. 1996. destaca que a competência é analisada a partir do momento que o indivíduo consegue assimilar e superar os resultados de suas ações, sem enfatizar o conjunto de aspectos individuais. O que mudam nas três visões também são as perspectivas de interculturalidade, aqui, baseadas em Walsh (2009)WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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.

Para CI output relacional, os resultados das ações dos sujeitos são analisados para entender a eficácia dos resultados. Nesse processo, os aspectos interculturais fazem parte do ambiente e o foco é o resultado da ação individual. As características do indivíduo alimentam as ações, porém os resultados são o foco e a tendência nesse processo é que os resultados sejam uniformes, mais coesos, ignorando as diferenças a partir da visão de interculturalidade.

Quanto a CI output funcional, os resultados das ações dos sujeitos são analisados para entender a eficácia no ambiente, incorporando as diversidades culturais do ambiente. Há o reconhecimento das diferenças, mas há uma busca pela estabilidade do contexto. Nesse processo, os aspectos interculturais estão presentes e há diferenças que devem ser minimizadas. A tendência nesse processo é que os resultados das ações sejam em busca da uniformidade, reconhecendo que existem diferenças, mas que não se busca transcender.

Na perspectiva de CI output crítica, os resultados das ações dos sujeitos são considerados para entender a eficácia dos resultados, analisando e problematizando as diversificações do ambiente. Nesse processo, os aspectos interculturais estão presentes e não podem ser ignorados. A tendência nesse processo é que as ações diversas, com aceitação de perspectivas diferentes para um mesmo resultado, transcendam as diferenças, com um repensar, de acordo com Walsh (2009WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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, p. 4) de “reconceituar e re-encontrar estruturas sociais, epistêmicas que busquem relações eqüitativas lógicas, práticas e diversas formas culturais de pensar, agir e viver”.

Trabalhar CI inclui, necessariamente, um olhar para o sujeito e sua interação, seja com outro sujeito, com o espaço, artefatos, entre outros. A troca ou a interação é essencial no campo da interculturalidade. Se não há interação, entende-se aqui que não se trata de interculturalidade, podendo ser, por exemplo, multiculturalidade. A partir disso, o quadro teve como objetivo permitir parâmetros para que as pesquisas empíricas busquem a materialização dos aspectos conceituais estudados.

Essa natureza do quadro teórico apresentado corrobora com a configuração de competência global trazida pela American Council On Intercultural Education ( ACIE, 1996ACIE. American Council on Intercultural Education. Educating for the global community: a framework for community colleges. Des Plaines: ACIE, 1996. ) e Deardorff (2006DEARDORFF, Darla K. Identification and assessment of intercultural competence as a student outcome of internationalization. Journal of Studies in Intercultural Education, Thousand Oaks, n. 10, p. 241-266, 2006. , 2009DEARDORFF, Darla K. (Ed). The Sage handbook of intercultural competence. Thousand Oaks: Sage, 2009. ) de que existem estágios dentro do processo de formação de competências, sendo esses um continumm e deve ser desenvolvido em todas as fases da educação. O indivíduo poderá realizar vários graus de cada fase e o progresso pode não ser linear. Apesar de não se tratar de etapas assim como as discussões citadas, entende-se que a construção do processo se baseia nessas premissas.

Entende-se que não foi necessário criar um conceito, que, assim como Freeman et al. (2009)FREEMAN, Mark et al. Embedding the development of intercultural competence in business education. Sydney: Australian Learning and Teaching Council, 2009. Disponível em: < http://www.olt.gov.au/project-embedding-development-intercultural-sydney-2006> . Acesso em: 23 maio 2019.
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advertem, poderia ter vários problemas como: primeiramente, que não se pode ignorar tudo que já existe de discussões sobre o construto. Vários pesquisadores, de diversas áreas, vêm trabalhando em várias perspectivas para o desenvolvimento do conceito. Segundo, porque as várias perspectivas (área da comunicação, da cultura, da linguística, administração, entre outros) dão a possibilidade de apropriação conceitual a cada sujeito participante do projeto.

Considerações finais

Ao realizar a pesquisa, observou-se a necessidade latente de discussões e a busca de releituras e olhares sobre competências interculturais na Educação Superior, principalmente com olhares para o global Sul. O objetivo geral desta pesquisa foi alcançado: a proposição de uma releitura sobre CI que se pautou em duas perspectivas de competências ( input e output ) e de três vertentes da interculturalidade na educação (relacional, funcional e crítica).

Essa releitura parte da premissa segundo a qual o sujeito se baseie em ações que visam a questionar todo o tempo os parâmetros latentes e o caminho a ser seguido. O indivíduo não estará todo o tempo desenvolvendo competências interculturais ( input relacional, por exemplo) ou ainda todo o tempo ( output crítica), e assim sucessivamente, sendo um continumm . O ser humano, com sua complexidade aliada aos diferentes contextos e situações, irá incutir o desenvolvimento das CI a partir de diversas variáveis. Aqui, não se teve a pretensão de definir as variáveis e espera-se que pesquisas futuras busquem essas respostas.

Também é importante ressaltar que, de acordo com a literatura, a perspectiva crítica deveria ser a mais presente no contexto da educação. Para isso, a busca de se desenvolver CI (seja input crítica ou output crítica) seria o foco das ações dentro do ambiente da educação superior. Walsh (2009WALSH, Catherine. Interculturalidad crítica y educación intercultural. In: SEMINÁRIO INTERCULTURALIDAD Y EDUCACIÓN INTERCULTURAL, 2009, La Paz. Seminário… La Paz: Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, 2009. Disponível em: < http://docplayer.es/13551165-Interculturalidad-critica-y-educacion-intercultural.html> . Acesso em: 20 ago 2018. Este artículo es una ampliación de la ponencia presentada en el Seminario “Interculturalidad y Educación Intercultural”, organizado por el Instituto Internacional de Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 9-11 de marzo de 2009.
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, p. 4) destaca que ainda é um tipo de interculturalidade a se construir, sendo importante a sua compreensão para “construção e posicionamento como um projeto político, social, ético e epistêmico de conhecimento”, que demanda mudanças estruturais, acima de tudo de estruturas de poder.

Essa contribuição da releitura apresentada também se confirma na necessidade constante de revisão de conceitos, de aspectos ou de atributos que compõem CI. Deardorff (2006DEARDORFF, Darla K. Identification and assessment of intercultural competence as a student outcome of internationalization. Journal of Studies in Intercultural Education, Thousand Oaks, n. 10, p. 241-266, 2006. , p. 258) defende que “definições e os métodos de avaliação precisam ser reavaliados continuamente [...]. É importante que a pesquisa e a prática permaneçam atualizadas com a pesquisa e os processos de pensamento sobre esta construção”.

Seria uma pretensão esgotar a discussão trazendo um quadro que conseguisse demonstrar toda a universalidade e complexidade do tema e esse não foi o objetivo. A apresentação dessa proposta é uma tentativa de aglutinar a perspectiva dos autores sobre as várias discussões, iniciando, assim, algo que venha a ser a derivação para novos olhares e novos modelos teóricos que venham abarcar a temática.

Também é possível explanar que este artigo busca ampliar as discussões sobre CI e a necessidade de se desenvolver ações empíricas de confirmação e confrontação das ideias aqui defendidas a partir da pesquisa bibliográfica. Tem-se como princípio de que as competências interculturais podem ser desenvolvidas por meio de várias experiências interculturais, como preconizam Huber e Reynolds (2014)HUBER, Josef; REYNOLDS, Christopher (Ed.). Developing intercultural competence through education. Strasbourg: Council of Europe, 2014. (Pestalozzi series; n. 3). .

O quadro conceitual apresentado considera que as competências interculturais fazem parte de um processo de interação. Seguindo essa visão, ela é tratada aqui ora como output , ora como input . A ação e os resultados são partes desse todo que consiste em um processo cíclico.

Várias perguntas surgiram durante a realização do trabalho. Assim, poderíamos então desenvolver CI que venham atender aos fins da educação superior brasileira e como efetivamente aprender e ensinar tais competências? Como é o contexto real das instituições de educação superior brasileira para o desenvolvimento dessas competências? Os profissionais de educação estão preparados para assumir esse papel? Quais as melhores ferramentas para desenvolver tais competências? Qual a importância das competências interculturais para o egresso da educação superior? Como os docentes percebem tais competências e contextos para se desenvolver a temática?

Dentre várias questões, esta pesquisa tentou trazer um quadro referencial para que respostas sejam alvo de buscas de pesquisas futuras. A busca incessante para essas respostas são temas de debates da atualidade a respeito dos construtos e traz sua relevância a cada dia que presenciamos a heterogeneidade institucional e dos processos de ensino-aprendizagem da educação formal.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    07 Nov 2018
  • Revisado
    21 Maio 2019
  • Aceito
    04 Jun 2019
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