Open-access Bibliotecas Emergenciais por um acervo acessível nos tempos de pandemia

RESUMO

Introdução:  A pandemia do novo coronavírus atingiu as instituições de memória nos anos de 2020 e 2021, promovendo a suspensão parcial das atividades nas bibliotecas. As escolas e universidades, após a adoção do Ensino Remoto Emergencial, foram privadas do acesso a acervos vitais para suas atividades.

Objetivo:  Este trabalho colabora para o estabelecimento do conceito de Bibliotecas Emergenciais, consonantes com o esforço de enfrentamento da pandemia, no sentido de viabilizar o acesso a um acervo em tempos de exceção.

Metodologia:  Trata-se de uma pesquisa-ação em que após a síntese de conceitos relacionados por revisão na literatura, procuramos evidenciar e generalizar as possibilidades, exigências e dificuldades de ações que poderiam caracterizar a implementação de uma Biblioteca Emergencial, buscando subsídios nos resultados empíricos de projetos promovidos na Universidade Estadual de Londrina, durante a pandemia.

Resultados:  Os experimentos sugerem as seguintes recomendações para a implementação de uma Biblioteca Emergencial: a adoção da materialidade digital e sua reprodutibilidade técnica como padrão de implementação; o uso de licenças abertas e obras em domínio público como prioridade na constituição dos acervos; o cuidado com a dependência às plataformas digitais hegemônicas e a busca por um mecanismo jurídico objetivo, que permita a digitalização, armazenamento e distribuição de conteúdo legado sob direitos autorais restritivos.

Conclusão:  O regime de exceção, que fechou as bibliotecas no período de pandemia, pode também abrir possibilidades de circulação de seus acervos, ensejando e potencializando sua própria razão de ser. As Bibliotecas Emergenciais podem oferecer uma resposta afirmativa alternativa às restrições e à escassez, que caracterizaram o enfrentamento à pandemia.

PALAVRAS-CHAVE: Bibliotecas emergenciais; Pandemia COVID-19; Lei de direitos autorais; Licenças abertas

ABSTRACT

Introduction:  The new coronavirus pandemic hit institutions of memory in 2020 and 2021, promoting the partial suspension of activities in libraries. Schools and universities, after adopting Emergency Remote Teaching, were deprived of access to vital collections for their activities.

Objective:  This work contributes to the establishment of the concept of Emergency Libraries, in line with the effort to fight the pandemic, in the sense of enabling access to a collection in times of exception.

Methodology:  This is an action research in which, after the synthesis of related concepts through a review in the literature, we seek to highlight and generalize the possibilities, requirements and difficulties of actions that could characterize the implementation of an Emergency Library, seeking support in the empirical results of projects promoted at the State University of Londrina, during the pandemic.

Results:  The experiments suggest the following recommendations for the implementation of an Emergency Library: the adoption of digital materiality and its technical reproducibility as an implementation standard; the use of open licenses and works in the public domain as a priority in the constitution of collections; the care with the dependence on hegemonic digital platforms and the search for an objective legal mechanism that allows the digitization, storage and distribution of legacy content under restrictive copyrights.

Conclusion:  The exception regime, which closed libraries during the pandemic period, may also open possibilities for the circulation of their collections, giving rise to and enhancing their own reason for being. Emergency Libraries can offer an alternative affirmative response to the restrictions and scarcity that characterized the fight against the pandemic.

KEYWORDS: Emergency libraries; COVID-19 pandemic; Copyright law; Open licenses

1 INTRODUÇÃO

A pandemia de COVID-19 (Sars-CoV-2), que fez sentir seus efeitos globais nos anos de 2020 e 2021, data em que escrevemos este artigo, e resultou em um total de mais de 4 milhões e quinhentos mil vítimas, até o momento1, foi um marco nos eventos pandêmicos mundiais. De uma forma geral, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica a disseminação de uma doença conforme sua incidência e capacidade de disseminação, sendo que as pandemias ocorrem em múltiplas regiões e territórios, com alta capacidade de contágio, enquanto as pandemias permanecem territorialmente restritas2.

Diversas pandemias marcaram o último século, como a gripe espanhola (1918-1919, com mais de 50 milhões de vítimas fatais), a gripe asiática (1957-1958, com 1,1 milhão de vítimas fatais), a gripe de Hong Kong (1968-1970, com 1 milhão de mortos). Outras incidências localizadas, portanto epidêmicas, também merecem destaque: a SARS (2002- 2003, com 774 mortos), a gripe aviária (2003-2004, com 460 mortos), a H1N1 (2009-2010, com 500 mil mortos), o Ebola (2013-2016, com 11.300 mortos) e o HIV, considerado uma epidemia global (1981 até o presente, com mais de 34 milhões de mortes)3.

Dadas as condições de tecnologia e comunicação da segunda década do século XXI, no entanto, nenhuma outra pandemia teve um alcance midiático global, nem promoveu uma adoção tecnológica maciça, como a pandemia do novo coronavírus, até o momento. Autores, como Schwarcz4, destacam que a própria noção histórica da compreensão do século XXI tenha início com a pandemia de COVID-19.

Esse destaque pode ser compreendido no sentido da efetivação de intuições e alertas de diversos autores, desde a segunda metade do século XX, como os avisos de transição dos modelos de organização, produção e controle, presentes nos conceitos de sociedade pós- industrial, conforme Bell (1999), a terceira onda (TOFFLER, 1995), sociedade do conhecimento (BÖHME; STEHR, 1986), sociedade informática (SCHAFF, 1995), sociedade de controle (DELEUZE, 1992), Sociedade do cansaço (HAN, 2015), economia do compartilhamento (RIFKIN, 2014), Indústria 4.0 (SCHWAB, 2016), capitalismo de plataforma (SRNICEK; DE SUTTER, 2017), sociedade de vigilância (ZUBOFF, 2018) e muitos outros.

Todos esses conceitos de formas variadas sugerem mudanças paradigmáticas que podem ser sintetizadas, com Caetano (2016), no escopo resumido deste trabalho, como uma efetivação da aplicação do conhecimento, tecnologia e comunicação, como fatores preponderantes nas relações de produção: a descentralização e globalização das cadeias de valor, o uso intensivo de tecnologias como diferencial competitivo das empresas, a intensificação do capital transnacional na diluição da soberania do Estado-nação, o fim dos empregos formais, a precarização nas relações de trabalho, o advento da vigilância sobre um sujeito aparentemente em liberdade, mas submetido às plataformas hegemônicas de consolidação, mineração e venda de seus ativos informacionais no mundo corporativo, além da exclusão da população sem letramento tecnológico das relações de produção.

O ponto que precisamos destacar, em nossa breve discussão, é que toda uma sorte de práticas, visões e conceitos, burilados experimentalmente nas universidades e nas discussões técnicas das indústrias tecnológicas, parecem, após a pandemia de COVID-19, terem se efetivado em uma realidade globalizada, impingindo efeitos práticos bastante objetivos às instituições em suas aparições modernas: nas empresas, como o trabalho remoto; nas escolas, com o ensino emergencial e nas instituições de memória, como as bibliotecas, arquivos e museus, em seus esforços de reinvenção e participação no combate à pandemia.

Na encruzilhada em que se apresenta esse trabalho e o papel do ensino superior no Brasil, escolhemos colaborar na elaboração dos conceitos necessários à resposta no esforço de combate à pandemia do novo coronavírus com uma biblioteca. Nossa aposta é a de que não adotar medidas que possam remediar a limitação de acesso aos acervos compromete o ensino universitário mais do que podemos mensurar neste momento. As bibliotecas universitárias, enquanto instituições vitais para o trabalho científico, são convidadas a oferecer novos serviços que implicam num engajamento institucional mais amplo em tempos de exceção, envolvendo professores, estudantes e departamentos. Consoante à ideia inicial e fundamental, pretendemos, neste trabalho, abordar o conceito de “Biblioteca Emergencial”.

O quadro de interferência nessa situação emergencial pandêmica caracteriza esse trabalho como uma pesquisa-ação, em que a produção de conhecimento articula-se a uma intencionalidade de alteração e aperfeiçoamento de um processo em seu contexto (SEVERINO, 2000 p.120). Autores como Tripp (2005) sugerem quatro fases no ciclo de uma pesquisa-ação, intercalando continuamente polos de investigação e ação: planejar uma melhora da prática, agir para implantar a melhora planejada, monitorar e descrever os efeitos da ação e avaliar os resultados da ação. Essas fases foram aplicadas continuamente na execução de dois projetos na Universidade Estadual de Londrina, o projeto Biblioteca Comum (BC), projeto de extensão realizado no Departamento de Ciência da Informação (DCI) desde 2013, e a Biblioteca Emergencial de História (BEH), realizada no Departamento de História (DH), como iniciativa respondente ao período da pandemia, no ano letivo de 2020.

A implementação desses projetos evocou a compreensão da relação entre atores, contextos políticos, cenários tecnológicos e práticas institucionais, que, após serem descritos, analisados e implementados, sintetizaram o cômputo de recomendações generalizadas, que concluem esse trabalho, visando colaborar em iniciativas semelhantes, em outros campos do saber, em resposta a essa e futuras emergências.

Nas próximas seções, sintetizaremos um quadro explicativo no sentido de contextualizar as questões abordadas para, em seguida, apresentar os resultados dos projetos e concluir as recomendações para a implementação de Bibliotecas Emergenciais.

2 SOBERANIA E EMERGÊNCIA

O conceito de soberania se estabelece conforme a constituição do próprio Estado moderno e concerne sobre um poder unitário, conciso e final, que é estabelecido formalmente, como sintetiza Liziero (2017), ganhando autonomia e controle sobre um território, uma população e uma burocracia reconhecível. Conforme os processos de globalização, racionalização e formalização das relações internacionais se destacaram no século XX, o próprio conceito de soberania perdeu parte de sua autonomia ao impingir regras forjadas em outras burocracias a um Estado-nação que, caso não sejam cotejadas, impedem a nação de participar de circuitos internacionais de produção de valor. Essa diluição da autonomia do poder do Estado-nação, em benefício de organizações transnacionais, tornam a soberania contemporânea um exercício global de correlação de forças.

Ao observarmos Agamben (2004), entendemos a soberania como a própria condição de estabelecer um regime de exceção sobre um território, ou seja, suspender legalmente os direitos e liberdades individuais, visando a própria manutenção do poder soberano em nome da ordem social. Recorrendo às suas palavras, a exceção seria “o dispositivo original graças ao qual o direito refere-se à vida e a inclui em si por meio de sua própria suspensão” (AGAMBEN, 2009, p. 12). Na Constituição brasileira, estes mecanismos jurídicos seriam formalizados constitucionalmente nos seguintes dispositivos: estado de sítio, estado de defesa, calamidade pública e estado de emergência5. Durante a pandemia de COVID-19, o estado de calamidade pública foi evocado pelo governo federal por decisão monocrática do Superior Tribunal Federal (STF), dispondo do artigo 167 da Constituição Federal, que libera empréstimos compulsórios, abrindo a possibilidade de alterar o limite do teto dos gastos públicos6. As medidas restritivas quanto às prerrogativas de isolamento, quarentena, interdição de locomoção, de serviços públicos e atividades essenciais, vieram a partir de decretos estaduais e municipais7, conforme decisão do STF referente à autonomia e competências concorrentes8.

Como é frequente na História, a guerra, a peste e as catástrofes naturais tornaram-se os motivos para deflagração da supressão das garantias individuais. A pandemia do novo coronavírus torna-se o exemplo mais atual, emblemático e visível para a atual geração do exercício do poder soberano para subtrair os direitos individuais, justificados por narrativas científicas, dadas por organizações globais, mesmo sem consenso da comunidade acadêmica, ainda concordando com Agamben (2020). O conceito de “emergência”, portanto, conforme aqui entendido, caracteriza-se pela prática própria do regime de exceção, momento em que o poder soberano mostra seu princípio capaz de alterar as garantias individuais e mudar os circuitos de um território.

O conceito de emergência incide sobre os atores sociais, as escolas, as empresas, as Igrejas e também as bibliotecas. Os atores sociais responderam aos efeitos do estado de exceção de diversas formas. As escolas e universidades, por exemplo, iniciaram programas de Ensino Remoto Emergencial em que há uma adaptação dos cursos presenciais já implementados incrementados às tecnologias digitais da informação e comunicação (TDICs), diferentemente do Ensino a Distância (EAD) em que há um preparo institucional e uma mudança na escala de ensino, metodologia e logística (APPENZELLER et al., 2020). Os efeitos positivos e negativos, os erros e acertos, dessa adaptação serão discutidos, provavelmente, pelas comunidades acadêmicas nas próximas décadas.

As bibliotecas, por seu turno, intimamente ligadas à vida escolar e universitária, apresentaram ações muito mais conservadoras, limitando-se a integrar as mídias sociais às atividades rotineiras, implementar repositórios digitais de teses e dissertações e assimilar sistemas de mensagens ao teor de seu atendimento. De uma forma geral, infelizmente, fecharam suas portas impedindo a circulação de seu público e o acesso ao acervo (TANUS; SÁNCHEZ-TARRAGO, 2020). O acesso ao acervo continua sendo um dos atributos fundamentais da biblioteca, lembremos, com Targino (2010), a atualidade das cinco leis de Ranganathan9, evocadas continuamente para destacar a tradição da instituição, enquanto um ator dinâmico na sociedade, promovendo inclusão, acesso universal e justiça social.

Nas próximas seções, colocaremos nossa atenção na evidenciação dos dilemas explícitos ou implícitos, encontrados nas bibliotecas, que mitigaram suas respostas à sociedade em tempos de pandemia. O conceito de Biblioteca Emergencial, evocado em seguida, pretende colaborar no enfrentamento dessas questões, sugerindo um campo para o estabelecimento desse embate.

3 A BIBLIOTECA COMO UM DISPOSITIVO EM TRANSIÇÃO

Um dos conceitos fundamentais do vocabulário foucaultiano é o conceito de dispositivo. Nele, seguindo a trilha de Agamben (2009), estão localizadas as preocupações ligadas ao relacionamento entre coisas heterogêneas, que esquematizam e subjetivizam os viventes em torno de forças históricas e locais de exercício de poder. Foucault, a partir desse conceito, pergunta sobre como os arranjos entre os atores que exercem o poder sobre o vivente tornam visíveis, ou não, objetos em seu contexto. O ponto a ser destacado, neste trabalho, é que os dispositivos incidem historicamente sobre os corpos, disciplinando-os e organizando previamente suas ações possíveis, em esquemas nem sempre formais de ação e modos de vida. Os dispositivos agregariam a participação de atores, tecnologias, formas jurídicas e modos de subjetivação, na consecução de funções e estabelecimento de regimes de informação, conceito operado por Frohmann (2006), que investiga essas relações, tanto em termos organizacionais quanto nos corpos viventes.

Seguindo a trilha foucaultiana com Frohmann (2006), as instituições de memória seriam um local privilegiado para a compreensão de tais regimes de informação, pois trariam à baila os ingredientes conceituais fundamentais do vocabulário foucaultiano: o exercício do poder, a disciplina, as formas de subjetivação, os ordenamentos, classificações, a memória etc. (FOUCAULT; MUCHAIL, 2007).

A biblioteca, dada sua presença constante na história da civilização escrita, mesmo que agregando diferentes funcionalidades, modos de operação e relações entre atores, pode - ainda que surpreendentemente - ser identificada no decorrer da passagem do tempo documentado (BATTLES, 2015). Esse retorno incrível da biblioteca instiga a investigação das condições conceituais dessa repetição, sua mesmidade. Afinal, o que retornaria: a diferença ou a repetição, como Deleuze perguntaria; ou como Freud, esperando a insistência do que havia sido reprimido; ou o retorno nietzschiano, eterno, trágico e implacável, enquanto um destino amado e aceito? Formas diferentes de se pensar a repetição, convites para pesquisas além do escopo deste trabalho

Com Foucault, responderemos provisoriamente: o dispositivo retorna, no sentido de esperar um reaparecimento de um rearranjo, daquilo que chamamos contemporaneamente de agregado sistêmico - entre atores, tecnologias, formas jurídicas e sujeitos dóceis, disciplinados, prontos para o trabalho. Mesmo que em diferentes momentos históricos, em diferentes materialidades, com diferentes relações entre as partes, retorna a mesma adesão imbricada à civilização da escrita, ao povo do livro, como os mulçumanos chamavam os cristãos, dependentes da ausência e da atemporalidade de seu deus dinâmico, invocado pelos mecanismos classificatórios da memória (MILES, 1996).

O advento da máquina contemporânea, como operador hegemônico da sociedade atual, para além de um avanço técnico solitário, implica o estabelecimento de um dispositivo ubíquo baseado em conceitos universais, forjados no mundo ocidental: a energia, a eletricidade, a informação, a computação universal (LÉVY, 1995). O estilo do ocidente, sua universalização, abstração e estruturalidade de sua técnica, mesmo que profundamente criticado no interior de sua própria vida intelectual, pedindo por explicações sobre os próprios universais, como feito pelos pós-estruturalistas (WILLIAMS, 2005), ganhou uma evidência difícil de ser contestada ao perceber, no início da pós-pandemia, um mundo globalizado e unificado por uma metaplataforma digital, conectada e senhora da vida social, subordinando os afazeres humanos como nenhuma outra antes (DESAI, 2020).

A hegemonia da materialidade digital, ou seja, a própria sujeição dos objetos, processos e representações a um mesmo dispositivo globalizante, implica unificação das diferenças humanas, semânticas, culturais e biológicas a um mesmo conjunto de operações estruturais técnicas, translações e relacionamentos jurídicos, enquanto os diversos atores encontram um protocolo comum de operação, pensado por Braman (2004) como um regime global de informação.

A materialidade hegemônica atual, que evidencia as propriedades de reprodutibilidade técnica dos objetos digitais, sua indiferença ontológica entre o original e a cópia, sua replicabilidade infinita, que unifica as diferenças em um mesmo alfabeto que pensa, utilizando o termo de Lanham (2006), altera os circuitos econômicos costumeiros em outras materialidades. Se a economia se fundamenta em uma translação da escassez de objetos (ROBBINS, 1932), no mundo digital esta não há, pois, os objetos não se escasseiam, mas replicam-se, infinitas vezes, sem marcar nenhuma diferença no processo. A escassez, dessa forma, para manter a viabilidade dos circuitos econômicos, deve ser produzida em outras instâncias (FRANKLIN, 2020).

Essa característica fundamental dos objetos digitais, sua materialidade e o dispositivo que o produz no entorno, evidencia um primeiro atributo sugerido à Biblioteca Emergencial: ser digital, ou seja, replicar infinitamente seus objetos, sem alterar sua identidade, nem produzir escassez. Essa característica fundamental da materialidade digital, no entanto, não tarda em colapsar os circuitos econômicos baseados nas materialidades - digamos - tradicionais, em que a escassez, ou seja, a degradação entre original e cópia e a diferença de identidade entre os pares, é um componente ontológico fundamental no circuito econômico dos objetos. Ao explorar as características reprográficas dos objetos digitais como atributo de uma Biblioteca Emergencial, colidiremos, imediatamente, com enormes obstáculos. Nas próximas seções, evocaremos sucintamente esses obstáculos e incitaremos ações para sua superação, conforme os resultados experimentais sugerem

4 DA MÁQUINA UNIVERSAL AO CAPITALISMO DE PLATAFORMA

O primeiro obstáculo à reprodução infinita dos objetos digitais é o acesso aos dispositivos de sua circulação. Em um país com extrema desigualdade social, como o Brasil, não é novidade que nem todos têm acesso a um computador pessoal, ou notebook, ou tablet. Essa realidade, no entanto, não se confirma no acesso a celulares, que já se estende a mais de 99% da população (IBGE, 2020). Além disso, os dispositivos portáteis de memória flash, os populares pen drives, têm experimentado uma queda vertiginosa de preços, além do aumento exponencial de sua capacidade de armazenamento (COUGHLIN, 2020). Devemos destacar que a possibilidade computacional pessoal não se resume ao poder de processamento dos computadores pessoais, sua velocidade, ou o acesso a grandes estruturas de comunicação, como as operadoras de telefonia celular, mas também à capacidade de armazenamento de dados, que são fatores de inclusão e devem ser considerados.

Se o acesso à internet está longe de ser universalizado atualmente, o acesso a objetos digitais está mais viável, uma vez que sua materialidade é hegemônica, o que nos leva à seguinte situação paradoxal: a participação na grande rede, que viabiliza a distribuição massiva de objetos digitais, depende da mediação de grandes estruturas intensivas em conhecimento técnico e capital, o que torna as bibliotecas e demais instituições de memória dependentes destes atores, as Big Techs, as quais, dada suas características de grande escala logística, tendem a monopolizar seus mercados de atuação, aumentando seu poder de vigilância e controle sobre a ação de seus usuários10.

As plataformas são integradoras dos relacionamentos entre atores de uma atividade de domínio específico. Srnicek e De Sutter (2017) chamam de capitalismo de plataforma o atual cenário em que o principal mecanismo de produção de valor ocorre no processo de captura, armazenamento, análise e venda das informações de uma comunidade de usuários, suas atividades, relacionamento e agenciamentos de produção. O monopólio das Big Techs, que caracteriza a vida nas redes sociais, na distribuição de mídia e nos ambientes digitais em nuvem, certamente tem um grande apelo na diminuição dos custos de acesso às tecnologias, sua operação e acessibilidade. No entanto, cobra um alto preço na perda de autonomia de dados das instituições, no sentido de colocar dados sensíveis expostos à possibilidade do regime de exceção de outras soberanias. Não somente por nós, cidadãos comuns, estarmos expostos à capacidade de vigilância das Big Techs (ZUBOFF, 2018), já esperada ao concordar com os termos de uso de seus produtos e serviços gratuitos, mas também estar vulnerável à quebra contratual entre as partes, em caso de regime de exceção, como o soberano é suposto de poder.

É importante ressaltar, então, que o controle privilegiado que as plataformas exercem sobre seus usuários buscando vantagens comerciais é superado, em muito, pelo poder soberano que, em estado de exceção, pode quebrar o contrato entre as Big Techs e seus usuários, integrando os dados obtidos em diferentes plataformas particulares, promovendo um agregado consolidado de informações sensíveis, que podem ser usadas em caso de investigação criminal, terrorismo e emergência sanitária: uma capacidade de vigilância e supressão das liberdades individuais inéditas na história humana, revitalizando o cuidado com as distopias totalitárias do século XX (PESSOA, 2020)

Esse estado de vigilância permanente e vulnerabilidade ao estado de exceção de um poder soberano global, que tende a se universalizar, conforme os grandes atores tecnológicos mundiais promovam, durante os próximos anos, acesso planetário pleno à internet11, é o exato oposto da liberdade sempre pleiteada pelas instituições de memória, como as bibliotecas, arquivos e museus. Isso nos leva ao segundo apontamento quanto às Bibliotecas Emergenciais: a preocupação com as plataformas proprietárias, pois podem controlar a circulação de conteúdo a partir dos processos analíticos de mineração de dados sobre o teor semântico do fluxo de informação, como o sentido ideológico das comunicações12,13 (WANG, 2018). Dessa forma, as Bibliotecas Emergenciais deveriam, tanto quanto possível, permanecer agnósticas quanto à plataforma14.

4.1 Plataformas e direitos de propriedade

Como vimos, o controle do fluxo de objetos, em termos da presença fundamental da escassez, viabiliza os circuitos econômicos que permitem o estabelecimento dos dispositivos de memória, dos quais destacamos a Biblioteca, promovendo os relacionamentos entre os atores, os esquemas jurídicos e aparatos técnicos. A materialidade digital hegemônica da vida contemporânea desafia temporariamente o dispositivo moderno da biblioteca, ao tornar seus objetos de maior apreço - os livros - infinitamente replicáveis, baratos e transmissíveis, introduzindo um elemento estranho, estrangeiro e francamente incômodo de reprodutibilidade técnica: um curto-circuito no fluxo do dispositivo (FRANKLIN, 2020).

Essas questões existenciais, por assim dizer, ontológicas, sobre a reprodutibilidade técnica dos objetos, persistem na historicidade dos dispositivos de memória e plasmaram-se à vida da biblioteca moderna a partir da efusão de alguns conceitos fundamentais, como: autor, autoria e direitos reprográficos das obras. Essas questões modernas, estabeleceram o entorno do dispositivo atual da biblioteca, relacionando entes como editoras, obras, formas de licenciamentos, direitos morais, direitos patrimoniais, processos de aquisição, empréstimos, devolução, usuários - enquanto uma extensão do cidadão moderno, entre outros (CHARTIER, 1994).

Todos esses elementos foram sistematicamente relacionados e formalmente descritos por um conjunto de leis de direitos autorais, que contavam com a burocracia do Estado moderno para regular a circulação dos objetos e garantir os direitos de propriedade. As leis de direitos autorais, cuja explicação detalhada excede o escopo deste trabalho, deve ser entendida aqui como um operador jurídico compatível com a reprodutibilidade técnica dos objetos materiais por ela regulados. O conceito de inspiração foucaultiana de regime de informação compatibiliza o aspecto jurídico da lei de direitos autorais, o conceito de propriedade e reprodução técnica, com o próprio dispositivo biblioteca (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2019).

Desses conceitos, leis e objetos técnicos, que compõem o dispositivo da biblioteca moderna, talvez o mais atingido pela transformação digital15 seja o direito reprográfico. Assim, enquanto um dos atributos dos direitos patrimoniais da Lei de Direitos Autorais (CAETANO, 2016), este sofre com a própria mudança ontológica de seu objeto de controle preferencial, passando a ter outros atributos de reprodutibilidade técnica, como sua extrema vulgarização, barateamento, precisão e fidelidade.

Na forma moderna, a exclusividade de impressão é outorgada pelo poder soberano, de forma compatível com a raridade dos seus meios de replicação, tornando seu pequeno número possível de vigilância por um poder central. O dispositivo biblioteca, dessa forma, ganhou, na modernidade, consistência interna, articulando sua dinâmica para gerar estabilidade entre os atores envolvidos. Produção, circulação, controle e consumo encontraram-se, na modernidade, em um fluxo harmônico de manutenção, sendo que o papel da biblioteca de mediar o saber ao cidadão comum seguiu estável.

Sabemos, no entanto, que a história da biblioteca é turbulenta e que sua persistência no interior da civilização é surpreendente e admirável (BATTLES, 2015). A materialidade digital hegemônica contemporânea também incide, fortemente, sobre o dispositivo biblioteca, alterando sua estabilidade moderna, pois desarmoniza a capacidade restrita de replicação material de seus objetos, com a viabilidade do controle centralizado do poder soberano. A produção de cópias digitais incontroláveis, por assim dizer, curto-circuita o dispositivo biblioteca moderno.

A crescente capacidade de duplicação dos objetos técnicos, em particular os livros, desde o início do século XX com os mimeógrafos16, passando pelas fotocopiadoras, após os anos de 1960, até as replicações desdiferenciadas dos objetos digitais atuais, é operada sob o mesmo dispositivo jurídico: pelos direitos reprográficos garantidos pela lei 9.610 (BRASIL, 1998). A referida lei, entretanto, não tem uma resposta positiva para a percentagem de uma obra que pode ou não ser copiada sem que os direitos de propriedade sejam infringidos, nem uma visão clara do que seria o uso justo de cópias digitais17, restando apenas a segurança jurídica do domínio público - as obras que os direitos patrimoniais deixam de incidir 70 anos após a morte do autor, tornando sua circulação livre (BUAINAIN et al., 2011).

Se a biblioteca gozou de certa estabilidade em seu dispositivo durante o século XX, a nascente indústria de informática, em sua segunda metade, foi a primeira a perceber o potencial dos objetos digitais, enquanto fator para a realização de novos circuitos econômicos e novos modelos de negócios. Enquanto parte significativa dos empreendedores de informática trilharam o caminho da propriedade intelectual como pedra fundamental para a produção de circuitos econômicos, tornando os sistemas de software produtos escassos licenciados por transações comerciais, outros idealizadores compreenderam a reprodutibilidade técnica irrestrita dos objetos digitais como motor de um sistema aberto de distribuição, em que a escassez necessária para a implementação de um modelo de negócios recairia na forma de serviços de manutenção e consultoria (ANDERSON, 2009).

Licenças abertas, como a Licença Pública Geral GNU (GPL)18, aquelas que permitem a cópia, execução, alteração e distribuição dos produtos, se tornaram, desta forma, um aparato fundamental de segurança jurídica dessa indústria.

Com o sucesso da indústria de software abertos nas últimas décadas do século XX, a consolidação da reprodutibilidade técnica dos objetos digitais como uma força em modelos de negócios baseados em serviços de manutenção e consultoria, implicou a criação de novos aparatos de segurança jurídica.

O Creative Commons, dessa maneira, foi idealizado nos anos 2000, como um aparato jurídico para compatibilizar os direitos de autor com a transformação digital, em que liberdades referentes à cópia, alteração, distribuição e comercialização, são outorgadas, ou não, pelos criadores e diretamente enunciadas em seus artefatos, alertando aos usuários seus direitos de uso sem a necessidade de intermediários (BRANCO; BRITTO, 2013). Essa segurança jurídica promoveu o fortalecimento do movimento pelos Recursos Educacionais Abertos (REA), que promove o uso de conteúdos com intenções pedagógicas de livre circulação e distribuição (HENRIQUES, 2017). Se há duas décadas o movimento REA ainda era pouco conhecido, atualmente faz parte da maioria das políticas públicas educacionais e contempla várias iniciativas19.

Com o fortalecimento da estrutura da internet no início do século XXI, sua interiorização, aumento de velocidade e popularização, a ideia de um livre fluxo de conteúdo e interação, a partir da Web 2.0, ganhou força e se desenvolveu, viabilizado pela eclosão dos serviços em nuvem, as plataformas. Não podemos esquecer, no entanto, que a tensão entre o dispositivo moderno e o contemporâneo permaneceu insolúvel, pois, se a hegemonia do regime informacional digital prevaleceu, enquanto forma contemporânea de circulação dos objetos, a questão de seus direitos de propriedade, destacando os direitos reprográficos, permaneceu a mesma - a moderna, regulada pela antiga lei de Direitos Autorais.

Os objetos digitalizados, que mudaram de um regime de informação moderno para um contemporâneo, agora infinitamente replicáveis, precisos e ubíquos, permanecem sob uma licença proprietária, que não baseia seu modelo de negócios no fluxo constante de seus objetos, controlados por plataformas globais e onipresentes, mas na fixidez da localização, não nos serviços e ondas de um usufruto de dívida permanente, mas na garantia dos direitos de propriedade. Isso significa que a imensa maioria dos livros, publicados no século XX, estão sob direitos autorais restritivos e não podem ser distribuídos livremente, se digitalizados.

A capacidade ampliada de digitalizar textos e mudar ontologicamente sua materialidade sem alterar o aparato jurídico que lhes dá norma reprográfica, originou, dessa forma, um acervo inerentemente ilegal de livros piratas digitalizados.

As bibliotecas digitais clandestinas - shadow libraries (KARAGANIS, 2018) - são acervos que têm se acumulado nas últimas décadas, a despeito das Leis de Direitos Autorais, e que se tornam públicos, ou não, em determinados contextos. A maior delas, a Library Genesis (LibGen)20, com mais de 1,2 milhão de títulos, é resultado do acúmulo de vários acervos piratas, armazenados, durante décadas, em locais não completamente determinados, descentralizados e sincronizados na Rússia, Amsterdã, EUA, etc.21 Várias tentativas de bloqueio de seus servidores partiram de soberanias nacionais, como Reino Unido, França e EUA, sem, contudo, conseguirem localizar a fonte de sua distribuição.

No Brasil, algumas iniciativas mais tímidas se destacam em língua portuguesa brasileira. O site Livro de Humanas foi o primeiro a disponibilizar seu acervo final de 2.322 livros na internet pública. Após seu fechamento, em 2012, depois de um processo movido pela Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ABDR)22, outras iniciativas se destacaram, mas sem afrontar o poder soberano, mantendo seus servidores longe da jurisdição nacional, como o site Le livros23 (MIZUKAMI; REIA, 2018), que aparentemente está em Portugal, outros permanecem habitando a invisibilidade da deep web, em grupos pequenos fechados em redes sociais móveis, ou mesmo em diretórios na dark web (rede criptografada e anônima). A Biblioteca Anônima, por exemplo, é um acervo de humanidades com mais de 25.000 títulos que encontra-se inacessível à web pública, sendo mantida pela curadoria de comunidades temáticas privadas em grupos particulares nas redes sociais, mas armazenando e indexando seus livros digitalizados usando a rede TOR24 (FRANKLIN, 2019). Conforme notamos na Figura 1, o crescente uso das redes sociais, assim como o aumento do uso da banda larga nas metrópoles, a partir de 2012, incrementou a troca de livros piratas em comunidades discursivas particulares, destacando que em 2020, ano da pandemia em que as bibliotecas físicas foram fechadas, esses números cresceram ainda mais (FRANKLIN, 2020).

Figura 1
Quantidade de textos por ano na Biblioteca Anônima.

Se a biblioteca, enquanto um dispositivo, encontra-se em um período de transição histórica, como muitas vezes antes, e tem atualmente pontos excruciantes a serem resolvidos, dentre eles, a reprodutibilidade técnica de seus objetos preferenciais - os livros -, assim como seus direitos reprográficos, viabilizados pela onipresença de plataformas globais de controle, então, nossa pergunta sobre seu estado de emergência deve incluir esses elementos integrados: (a) os objetos digitais em sua reprodutibilidade técnica; (b) a lei de direitos autorais, destacando a questão dos direitos reprográficos e os livros em domínio público, (c) as licenças abertas que viabilizam modelos livres de distribuição e (d) as plataformas globais que podem controlar autoritariamente o fluxo de objetos digitais na internet.

Nas próximas seções, descreveremos as duas iniciativas experimentais, implementadas na Universidade Estadual de Londrina, cujos resultados indicam algumas possibilidades, dificuldades e desafios ao estabelecimento de Bibliotecas Emergenciais.

5 O PROJETO BIBLIOTECA COMUM25

A Biblioteca Comum (BC) é um projeto de extensão, realizado na Universidade Estadual de Londrina (UEL), que tem como objetivo incrementar o acervo digital das bibliotecas escolares em busca da universalização de seu acesso, em consonância com os esforços promulgados pela lei Nº 12.244 de 24 de maio de 2010 e a lei Castilho, n.º 13.696, de 12 de julho de 2018, que propõe um marco legal para a promoção do livro, da leitura e da biblioteca no Brasil.

Para isso, buscamos Recursos Educacionais Abertos (obras em domínio público ou sob a licença Creative Commons) e as integramos a um sistema aberto de gestão de bibliotecas. As obras ficam no computador local, assim não é preciso ter acesso à internet para usar a biblioteca, que pode ser acessada inclusive pelos celulares e tablets dos alunos, em sua rede interna sem fio, evitando o controle das plataformas dominantes.

O projeto é constituído de quatro tarefas contínuas: Coleta, em que buscamos, programaticamente, materiais digitais com licenças abertas ou em domínio público e os armazenamos em nosso diretório; Curadoria, em que selecionamos parte do material coletado, extraímos deles informações relevantes e os disponibilizamos em pen drives populares, integrados a um sistema de recuperação de informação - os buscadores; Catalogação, em que profissionais da informação catalogam os recursos de todos os buscadores, gerando um único banco de dados integrado a um sistema de gestão de bibliotecas - o BibLivre; e a Distribuição, em que propomos o uso prático dessa tecnologia como ferramenta pedagógica em disciplinas no departamento de Ciência da Informação da UEL.

6 RESULTADOS PRELIMINARES

Coleta: O diretório completo do projeto conta, atualmente, com mais de 190.000 objetos digitais abertos em 4,42 TB de dados, contendo aproximadamente: 55.000 textos (125 GB), 33.600 vídeos (4,7 TB), 3.500 áudios (24 GB) e 98.600 imagens (102 GB).

Curadoria: A segunda tarefa do projeto prevê a extração de metadados e categorias dos objetos digitais, para sua eventual classificação, indexação e recuperação. A partir de técnicas programáticas de extração de entidades nomeadas e classificação colaborativa de documentos, produzimos os buscadores. Os buscadores são sistemas de recuperação de arquivos selecionados, conjugando um critério de relevância e a ocupação de espaço no dispositivo, buscando ofertar o maior número de arquivos importantes, em um menor espaço possível.

Estes sistemas foram pensados para que sejam o mais fácil de difundir, copiar e utilizar, sem que seja necessária a instalação de nenhum programa de computador, além do navegador, normalmente já disponível nos diferentes sistemas operacionais26. Nem banco de dados, ou servidor de Web, nem um gerenciador de arquivos, ou gestor de conteúdo, dado que precisam ser muito baratos e ter um baixíssimo custo de manutenção, para evitar a dependência das atuais plataformas dominantes. Seguem os buscadores compilados até o momento:

BC-TEXTO: Dos textos baixados durante a fase de coleta, selecionamos alguns para compor um acervo inicial (clássicos e científicos), atentando para que caibam em um pen drive de 8 GB27. BC-CLIPART: O buscador de cliparts disponibiliza quase 15.000 desenhos, para ilustração de trabalhos escolares, apresentações e publicações, para agilizar as tarefas de professores e alunos28. BC-VIDMIN: O buscador de vídeos da Biblioteca Comum reúne mais de 500 vídeos educacionais abertos, ocupando um espaço de menos de 8 GB29. BC-CORDEL: Foram compilados folhetos de cordel disponibilizados em domínio público30. BC-ÁUDIO: é uma compilação de 700 arquivos de áudio categorizados, que cabem em um pen drive de 8 GB31.

Os buscadores foram distribuídos a mais de 220 professores da rede pública, no entorno da UEL, como parte das atividades relacionadas às práticas pedagógicas do curso de Ciência da Informação32. Os resultados obtidos evidenciam que é possível distribuir conteúdo digital, mesmo para ambientes sem acesso à internet, de forma relativamente barata, independente das plataformas hegemônicas, a partir do uso de conteúdo digital com licenças abertas e domínio público.

Ao analisarmos o diretório de textos do projeto, distribuindo os 55 mil objetos digitais pelos respectivos grupos do ano de atualização de seus metadados, notamos a maciça presença dos arquivos em domínio público em picos nos anos de 2008 e 2017, dadas as iniciativas governamentais como o site Domínio Público33 e a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin34 (Figura 2). Se analisarmos, no entanto, essa mesma distribuição usando um filtro por licenças abertas, como o Creative Commons, encontraremos uma tendência incremental a partir do ano de 2017 (Figura 3), evidenciando que existe uma tendência orgânica de crescimento, independente das iniciativas governamentais. Isso implica a adoção das licenças abertas no modelo de negócios de editoras universitárias, como a Edusp35, a editora da UFSC36 e SciELO Livros37, entre muitas outras, até editoras comerciais, como a Editora FI38. Em um movimento muito similar à indústria de software nos anos 1980, a reprodutibilidade técnica dos objetos digitais passa a ser incluída nas cadeias globais de produção do valor, sugerindo à biblioteca um caminho parecido para se tornar uma prestadora de serviços, gestão e preservação de um fluxo informacional ininterrupto, ao invés da manutenção e guarda da propriedade dos livros. Se a indústria de software demorou quase quatro décadas para assimilar as licenças abertas como uma força hegemônica em sua dinâmica39, a transição da biblioteca para uma plataforma aberta de conteúdo deve ser parecida. A exigência de uma Biblioteca Emergencial deve, assim, incorporar objetivamente essas tendências, já em franca expansão.

Figura 2
Quantidade de textos por ano, na BC.

Figura 3
Quantidade de textos em Creative Commons por ano, na BC.

6.1 A Biblioteca Digital (Emergencial) de História

Se os resultados preliminares do projeto Biblioteca Comum sugerem que a combinação entre materialidade digital, licenças abertas e agnosticismo quanto à plataforma podem contribuir para incrementar o acervo de escolas e professores, promovendo o acesso a Recursos Educacionais Abertos, mesmo em áreas sem internet, a pandemia do novo coronavírus apresentou um desafio correlato: como garantir o acesso dos estudantes ao acervo das Bibliotecas Universitárias durante o período de quarentena, levando em conta as possíveis precariedades de condições?

O projeto Biblioteca Digital (Emergencial) de História procura responder a esses desafios, em um cenário distante do ideal, pandêmico e restritivo e que, para ser compreendido, precisa partir dos eventos que marcaram a preocupação com a incorporação da tecnologia às atividades desenvolvidas no Departamento de História da UEL. Passemos, então, os olhos sobre esta breve síntese.

Em 2013, o colegiado do curso de graduação em História/UEL promoveu uma mudança na grade curricular em atendimento às exigências do Ministério da Educação, pelas quais foram criadas as disciplinas de Tópicos de Ensino vinculadas às tradicionais disciplinas de Antiga e Medieval, Moderna e Contemporânea, Brasil e América. Mais do que ofertar as disciplinas conforme orientação ministerial, foi traçado um plano de execução das mesmas pelo qual um eixo comum em torno da temática da identidade e das práticas de ensino voltadas para a exploração das fontes historiográficas em sala de aula se realizasse. Nos anos seguintes, na disciplina de Tópicos de Ensino de História Moderna, foram desenvolvidas experiências docentes voltadas para o uso e o estudo de novas tecnologias de informação e comunicação, incluindo a sensibilização e conscientização para/sobre Recursos Educacionais Abertos já na formação inicial docente.

A partir de 2015, passamos da análise de recursos produzidos por outrem (DURAN; AMIEL; COSTA, 2018) à elaboração dos nossos próprios recursos (DURAN; MOLINA, 2016). Vale lembrar, entretanto, que em pesquisa de opinião realizada junto aos alunos da turma de 2015, via Google Forms, a maioria destacou a importância das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) para a profissão docente (56.3%) e a escassez de sua abordagem na graduação por eles cursada (64.6%) (DURAN, 2016).

A pressão pela inserção de novos dispositivos educacionais era, portanto, centrípeta e centrífuga. O estudo do perfil de ingressantes promovido pela Pró-Reitoria de Planejamento da Universidade Estadual de Londrina, em 2015, revelou que 73,42% dos ingressantes no curso de História tinham como objetivo a formação técnico-profissional. Essa formação técnica parecia também ser buscada na rede mundial de computadores, uma vez que 97,47% dos ingressantes recorriam à mesma para manterem-se informados e 72,22% a utilizavam em seu tempo livre (DURAN; RODRIGUES, 2020).

Assim, em 2018, com a configuração de uma nova grade curricular, impulsionada pela nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), inseriu-se no curso de graduação em História da Universidade Estadual de Londrina a margem para a oferta de até 20% da carga horária das disciplinas na modalidade de ensino a distância e/ou semipresencial. Em 2019, por meio do projeto de ensino TECHIS, cadastrado na universidade sob o número 762, o departamento de História buscou desenvolver um grupo de discussão sobre o uso de novas tecnologias dentro de um ambiente Moodle criado com apoio do Núcleo de Educação a Distância/UEL (NEAD/UEL). Malgrado esses esforços, poucos (menos de 5 professores envolvidos diretamente na formação, em um departamento de 30 docentes) eram os professores que ofereciam parte de seus cursos com algum uso de tecnologia no início de 2020.

Passado o primeiro mês de quarentena, professores e estudantes se dedicaram ao estudo das condições de retorno das atividades. Esses estudos incluíram uma série de levantamentos sobre a saúde da comunidade, além das condições e demandas tecnológicas para a retomada das aulas (DURAN; RODRIGUES, 2020). De um lado, havia a pressão institucional para o retorno. De outro, os estudantes assinalando que não tinham condições de retorno porque não possuíam nem equipamento, nem internet suficiente para as aulas - além de frisarem condições psíquicas abaladas.

Para a comissão que se dispôs ao desenvolvimento de um plano estratégico e emergencial para continuidade das atividades oferecidas pelo Departamento de História/UEL, cabia o desafio de criar ciberinfraestrutura, oferecer infraestrutura tecnológica e treinar para sua utilização, com custo zero - porque o orçamento era zero - e no menor prazo possível.

Concebeu-se, discutiu-se e apresentou-se um plano à comunidade acadêmica em 30 dias. Nos 45 dias seguintes, disponibilizamos uma curadoria digital para o cumprimento de atividades culturais-acadêmicas e, em 60 dias, reiniciamos as aulas, com ciber e infraestrutura homogêneas, isonômicas e estáveis já disponíveis para os estudantes. Isso implicou na revisão de 26 programas de disciplinas, na criação de 26 salas moodle; na curadoria de 250 horas de atividades culturais e educacionais na rede e oferta de amplo edital de monitoria para cumprimento das Atividades Curriculares Culturais (ACCs); na oferta de 60 horas em projeto de extensão próprio (para cumprimento da carga horária de estágio supervisionado); no desenvolvimento de um módulo de introdução à EAD e ao aprendizado remoto, conformada na Semana de Recepção 2.0, com 10 horas de “lives”; na criação e produção de 20 horas de aulas expositivas para rádio e no desenvolvimento da Biblioteca Emergencial de História, com 32 GB de conteúdo (textos, programas de rádio, planos de aula, módulo de introdução e livros em acesso aberto).

Nossa estratégia pedagógica foi alinhar todos os cursos a um mesmo procedimento metodológico: todas as disciplinas seriam ofertadas em apenas 20% da carga horária, mediante 4 fóruns moodle, com uma quantidade controlada de textos digitalizados. Esse alinhamento permitia que estudantes off e online fossem atendidos com a isonomia solicitada, em uma faixa de uso de pacote de dados sustentável para a maior parte dos estudantes, qual seja, o menor pacote de dados disponível no mercado para aparelhos celulares.

Obviamente, contamos com uma margem de 5 a 10% de erro: a área de Ensino encontrou severas dificuldades com a plataforma moodle; alguns estudantes perderam o prazo para solicitação dos tablets oferecidos pela universidade; a Biblioteca Emergencial de História demorou mais 20 dias para chegar às mãos de todos os estudantes offline e 6 dos 18 não responderam se receberam o material ou não; a curadoria das ACCs não foi aproveitada amplamente pelos estudantes e um dos programas de rádio entregues não pode ser aproveitado por limitações técnicas.

Como se pode notar, duas frentes foram desenvolvidas a fim de obedecer à demanda por uma maior flexibilidade nos horários da oferta das disciplinas. Essa demanda se justifica, por parte de nossos estudantes, tanto em função de abalos psicológicos como da nova realidade do mercado de trabalho brasileiro durante a pandemia. Quais foram as frentes? 1) Para manter o contato “oral” com os estudantes, garantindo baixo custo, flexibilidade nos horários e qualidade nos serviços, criamos o programa de rádio “A peroba” que, veiculado aos sábados na Rádio UEL, também foi convertido em mp3 para acesso offline em aparelhos celulares - levando em conta que nem todos os nossos estudantes possuem computadores e que a própria universidade fornecia tablets para os mesmos. 2) Para garantir que nenhum de nossos estudantes “offline”, ou seja, sem acesso à rede, ou “nonline”, ou seja, com acesso à rede menor do que o menor pacote mensal de dados, ficasse sem os materiais correspondentes às disciplinas, criamos a Biblioteca Emergencial de História.

O projeto da Biblioteca Emergencial de História foi, dessa maneira, criado no período da Pandemia COVID-19, diante do seguinte quadro: o Sistema de Bibliotecas da UEL reorganizou sua forma de funcionamento, prevendo empréstimos de livros mediante agendamento. Todavia, uma parte considerável dos estudantes de História atestavam, em levantamentos efetivados pela Pró-Reitoria de Planejamento (PROPLAN), Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) e DH, que não teriam acesso à biblioteca da UEL durante a pandemia porque residiam em cidades circunvizinhas e não poderiam utilizar transporte interurbano coletivo a fim de, muito prudentemente, se protegerem da COVID-19.

Não obstante, os estudantes da UEL tinham à sua disposição apenas 6.000 volumes de livros digitais, ofertados pela Biblioteca Central/UEL. A maioria dessas obras refere-se a Trabalhos de Conclusão de Curso, não representando o conjunto de leituras necessárias para a manutenção da qualidade do ensino ministrado no curso de História. Por essa razão,

procuramos uma forma de suprir a demanda de leituras do curso ofertando em meio digital e físico (pen drives) uma biblioteca mais robusta, como necessitam estudantes universitários de História.

A ciberinfraestrutura, que delineamos no curso de História/UEL, foi inicialmente nomeada como “Benjamin Franklin”, patriarca da liberdade americana, criada para atender aos estudantes on e offline e está baseada em 2 modelos ou suportes: 1) Diretório de Recursos Educacionais Abertos - resultado do projeto Biblioteca Comum - e 2) Biblioteca Emergencial de História.

No primeiro modelo, o estudante encontra mais de 190.000 objetos digitais em 4,4 TB de dados do projeto Biblioteca Comum. No segundo modelo, a Biblioteca Emergencial de História (BEH), colocamos os guias e textos de cada disciplina, os programas de rádio que criamos para suprir a demanda por aulas expositivas e 4 materiais de instrução prática para os estudantes40, além de todos os programas das 26 disciplinas, então ministradas pelo Departamento de História41. Para efetivar essa sistematização, foi necessário: a) criar um drive comum para o Departamento de História, b) solicitar que todos os professores digitalizassem seus textos, criassem indexadores para cada um deles e postassem os textos no drive.

Na pasta “Instruções sobre o curso de História UEL”, o estudante acessa 4 informativos sobre a própria biblioteca digital, os programas de rádio, o cronograma de aulas e os meios de contactar o departamento em tempos de pandemia. Os programas de rádio, com um total de 12 horas de conteúdo, foram transmitidos pela Rádio UEL, todo sábado às 13 h, licenciados em Creative Commons “Atribuição-Compartilha Igual 4.0 Internacional” e estão disponíveis também no MixCloud: https://www.mixcloud.com/TECHIS/.

Nas demais pastas, encontra-se a BEH propriamente dita. Na pasta “obras”, os PDFs de textos e programas das disciplinas. Somente essa pasta contou com 340 arquivos ou unidades de texto. Para a seleção dos PDFs, foi necessário apresentar, mesmo que em linhas gerais, algumas das diretrizes nacionais e internacionais sobre direitos autorais aos professores, assinalando a diferença entre Copyright e Creative Commons. Os professores se comprometeram a postar somente materiais que não excedessem 30% das obras (tendo como referência os números de páginas das mesmas obras) ou que tivessem sido publicados com licença aberta. A apresentação das modalidades de licenças e da lógica de partição da BEH realizou-se durante reuniões departamentais virtuais e, no final de agosto de 2020, para aprimoramento da segunda versão da BEH, foi ministrada uma ampla oficina, já somente no âmbito do projeto 762 TECHIS.

Obviamente, foi necessária uma revisão acurada desses conteúdos, que resultou na descoberta de materiais fora das regras estabelecidas. A indicação da existência desses materiais gerou toda uma discussão departamental sobre a veracidade dos riscos e implicações da transferência de dados e materiais de pesquisa institucionais para as chamadas Big Techs. A dificuldade em desenvolver esse diálogo de maneira politizada e também tecnológica denuncia o despreparo da academia brasileira para a internacionalização de sua produção e interações.

Nas pastas “CSS”, “JS” e “SOBRE”, residem os instrumentos que permitem ao “buscador” a execução de sua demanda. No arquivo “index.html”, o estudante acessa a interface do nosso buscador, como demonstrado na Figura 4.

Figura 4
Interface do buscador BHD/Biblioteca Emergencial.

No nosso buscador (dentro do pen drive), para encontrar os metadados das disciplinas na biblioteca, o estudante pode buscar pelos nomes dos professores, nomes das disciplinas ou palavras-chave do texto (presentes nos programas das disciplinas). Assim, se o estudante estiver buscando os textos de “História Moderna” da disciplina ministrada pela professora Maria Renata, essas duas palavras-chave (História Moderna e Maria Renata) serão suficientes para que encontre o que procura.

A Biblioteca Emergencial de História foi disponibilizada de 2 maneiras para os 360 estudantes matriculados: a) na forma de um link de um drive compartilhado na rede (GDrive), b) na forma de um pen drive para os estudantes comprovadamente offline. Na primeira forma, o material rodou por apenas 30 dias. Dificuldades com o link - muitos estudantes não se deram conta de que o acesso ao GDrive estava condicionado ao uso do e-mail institucional - e a falta de um serviço de copydesk adequado - os mesmos 5 professores que se envolveram no projeto também se envolveram em inúmeras outras atividades, gerando uma incapacidade de atender toda a sobrecarga que as demandas discentes e institucionais exigiram nesse momento - levaram à suspensão dessa modalidade. Na segunda forma, o material serviu amplamente para que estudantes offline não apenas distribuíssem o material para colegas e utilizassem eles próprios, como também para que se comprovasse o cumprimento do compromisso de não “deixar nenhum estudante para trás”.

Embora a segunda forma de difusão da BEH seja limitada, distribuímos apenas 18 pen drives, essa ação foi extremamente custosa para os envolvidos. Ela representou primeiro o contato com todos os estudantes do curso por e-mail para verificação de seu acesso à rede. Depois, o contato telefônico, nem sempre bem-sucedido de início, com cerca de 40% dos estudantes. Ainda, o cadastramento de parte desses estudantes nos planos de fornecimento emergencial de equipamento oferecidos pela universidade e a confirmação de seus endereços para envio dos pen drives.

Paralelamente, uma campanha de arrecadação de pen drives foi efetivada pelos professores do departamento junto com os órgãos de atendimento social da universidade - destaque-se que a entrega dos tablets estava prevista para um momento posterior e os estudantes demandavam o atendimento isonômico de todos os matriculados. Por fim, os pen drives foram gravados manualmente e enviados via malote universitário. Todas essas atividades foram realizadas pelos professores do departamento, em um esforço hercúleo para incluir todos os estudantes no mesmo barco. O regozijo de atender a todos, entretanto, é recompensador.

Destarte, o que esse projeto ofereceu foi uma biblioteca customizada, de baixo custo e fácil trânsito e que foi pensada num momento em que não se tinham certezas nem sobre a duração da Pandemia, nem, muito menos, sobre a ciberinfraestrutura que estaria disponível para professores e estudantes on e offline durante esse período. Sendo assim, a justificativa para esse projeto é, durante a pandemia, a oferta de acesso à bibliografia necessária para o curso de maneira clara, customizada e de baixo custo/consumo de dados. Entendemos ainda que ela atenda tanto estudantes offline quanto estudantes online - uma vez que seu consumo de dados é infinitamente menor que o de reiteradas entradas no Moodle e pode ser estrategicamente descarregada em ponto público de internet, para uso offline - é importante que mais pessoas estejam envolvidas na sua disponibilização e atualização. Destacamos que com 1 mês disponível nessa modalidade (link para estudantes online) a biblioteca contou com 100 acessos. Fora da pandemia, o projeto ainda se sustenta, uma vez que a BC/UEL não possui agilidade suficiente para alimentar a bibliografia disponível com recursos mais atualizados - óbvio que entendemos ser um problema de financiamento nacional e não uma crítica à BC/UEL. Assim, essa poderá ser uma maneira de manter nossos estudantes com acesso controlado (evitando a ilegalidade das cópias) a um material aberto (a biblioteca foi ocupada, ainda, pelo acervo da BC) e de qualidade (com curadoria, coleta e indexação promovidas pelo próprio DH).

Em síntese, o princípio ativo da BEH era pensar uma oferta educacional que primasse pela manutenção aberta, pública e gratuita do conhecimento. Realizar um ensino mediado pela tecnologia sem entregar-nos à privatização silenciosa das Big Techs. Pressionar o poder público a despertar sobre seu papel no investimento da criação autônoma e soberana da ciberinfraestrutura para o conhecimento, a inovação e a ciência. Reconhecer, institucionalmente, o tempo de trabalho docente dedicado à valorização do saber “público” e ampliar o investimento institucional nesse tipo de iniciativa. Conscientizar os estudantes de que a privatização promovida pela EAD, conforme defendiam em assembleias estudantis, não reside pura e simplesmente na baixa da qualidade da oferta pela diminuição do contato com docentes e a infraestrutura universitária, mas deixar de garantir ciberinfraestrutura sustentável e soberana que garantisse não apenas a manutenção, mas o crescimento da qualidade dos serviços prestados pela universidade pública no Brasil.

Todavia, em outubro de 2020, foi proposta ao departamento de História uma atualização da BEH mediante o fornecimento dos textos, curadoria de ACCs, projeto de extensão e programas de rádio referentes à segunda etapa das disciplinas (60% dos cursos que restavam ministrar). Isso implicava na sistematização/consolidação da mesma em planilha para codificação dos metadados dos arquivos selecionados. Ainda que um estudante de pós- graduação em História tenha se envolvido de maneira séria no projeto, a ausência de uma coliderança docente, que aliviasse o peso de todo um trabalho de coordenação das ações pertinentes ao enfrentamento da COVID-19, e de uma conscientização da importância do projeto, para além de uma sensibilidade inicial em relação aos estudantes offline, que se dissipou no final do semestre entre as desistências e o absenteísmo que tomaram as universidades em 2020, foi um dos elementos-chave para a inércia em que o projeto se encontra no momento.

Consoante, para a segunda rodada da BEH, que deveria se conformar em outubro de 2020, apenas 5 professores se dispuseram à oferta de materiais. Já em setembro, o desgaste da pandemia, a falta de empatia com a tecnologia e os confrontos pedagógicos presenciados durante as aulas sincrônicas, assim como o impacto da inversão da sala de aula promovida pelo modelo escrito e silencioso de guias para estudos liderado no âmbito do projeto 762 TECHIS - gerando uma responsabilização discente muito maior do que docentes e discentes estavam acostumados - levou a um distanciamento, por parte dos docentes e discentes, dos esforços que garantiriam a “abertura” do modelo desenhado e uma segunda rodada da BEH.

Acredita-se, entretanto, que de uma curta duração a pandemia aponta para uma média, senão longa duração, e essa tendência, assim como a hibridização do ensino superior, nos empurre para a retomada e o aperfeiçoamento do projeto em tela - que, embora tenha causado estranhamento, não gerou ojeriza. Não obstante, sua apresentação pública visa, entre outros, levantar entre os pares a validade, os desafios e o potencial de projetos que, como esse, se preocupam com o conhecimento para além das condições nem sempre animadoras de sua produção. Para mais, sem o reconhecimento interno da ampliação da carga horária de preparação das aulas - que, num cenário tecnológico, triplica -, revisando a Resolução nº 92/99, a qual regulamenta o Planejamento de Atividades Individuais Docentes (PLAID), será muito difícil manter ou desenvolver a BEH e quaisquer outros projetos correlatos.

No atual momento, essas atividades são reconhecidas como projetos paralelos de extensão, inovação ou ensino. Para enfrentar as realidades aqui expostas, atualmente, é necessário que o docente já tenha desenvolvido pesquisas na área. Discordamos desse caminho, porque entendemos que a atual situação promove o ingresso no universo tecnológico, mesmo sem reflexão. Garantir, a priori, esse tempo é imprescindível para que os docentes compreendam a necessidade imanente de repensar suas práticas educacionais, entendendo a geração de ciberinfraestrutura como uma condição sine qua non para sua profissão. Outra opção seria que as bibliotecas universitárias públicas brasileiras investissem mais em um acervo digital do que no material. Tratar-se-ia, pois, de um problema ainda mais estrutural, uma vez que pesquisas apontam o Brasil como um dos maiores consumidores da cultura digital, mas também um dos países que menos produz conteúdo original, educacional e científico nessa esfera (DURAN; RODRIGUES, 2020).

Para mais, a histórica resistência das universidades públicas brasileiras à tecnologia, justificada pela qualidade dos cursos oferecidos pelo setor privado - o líder nesse tipo de oferta - fez com que se concentrasse os investimentos educacionais em prédios e pessoas. As pessoas, como vimos, continuam precisando de formação e se dispondo a tal, porém, talvez, seja hora de investirmos em uma Babel virtual, onde não apenas tenhamos acesso ao saber, mas também apresentemos ao mundo a nossa inteligência.

Esse diálogo deverá incorporar ainda os estudantes. Os nativos digitais da matrix talvez não tenham se dado conta de que seus maiores medos - a privatização e a desqualificação do ensino superior - ocorra nas sombras desse ambiente e com seu apoio. Não raros foram aqueles que nos acusaram de seus medos e depois preferiram o uso das ferramentas das Big Techs. Mas o diabo sempre esteve nos detalhes, não é mesmo? E o crescimento das Fake News, sobretudo entre os jovens, nos mostra que a natividade não garante consciência (DURAN; RODRIGUES, 2020).

Nesses termos, enquanto nos sentíamos ameaçados pela tecnologia em nossas profissões, só vimos crescer nosso protagonismo e responsabilidades. Dividir as responsabilidades e investir numa ciberinfraestrutura que garanta um território livre para o conhecimento, cremos, é a demanda que mantemos depois de vivida essa primeira etapa de pandemia.

7 CONCLUSÃO E ALGUMAS PERGUNTAS FINAIS

Neste trabalho, intentamos apontar algumas características de uma Biblioteca Emergencial para colaborar no estabelecimento do seu conceito e delinear possibilidades, dilemas e dificuldades em sua implementação. Para isso, aproximamos o conceito de emergência ao de soberania e regime de exceção, no intuito de estabelecer um diálogo com a biblioteca contemporânea, que seria um dispositivo - no sentido foucaultiano - em transição para uma materialidade digital global, o que implicaria revisão dos seus mecanismos jurídicos reprográficos, que caracterizam sua aparição moderna. Buscamos subsídios para essas asserções em resultados de projetos realizados na Universidade Estadual de Londrina, destacando o projeto Biblioteca Comum e a Biblioteca Emergencial de História, em que aplicamos as propriedades reprográficas dos objetos digitais para responder às exigências de acesso ao acervo dos alunos, durante a pandemia do novo coronavírus.

Os resultados obtidos indicam algumas recomendações, tais como: a) adoção da materialidade digital como paradigma hegemônico; b) a adoção de licenças abertas e o domínio público como dispositivos jurídicos privilegiados; c) manter, tanto quanto possível, as ações agnósticas quanto às plataformas digitais e d) estabelecer um mecanismo objetivo de segurança jurídica, capaz de regularizar a cópia de livros digitalizados legados - inteiros ou trechos - que habitam clandestinamente a deep web.

Essa síntese nos leva a perguntas inevitáveis, tais como: se os objetos digitais em domínio público supririam a biblioteca emergencial de obras clássicas e as licenças abertas de obras futuras, então qual seria esse dispositivo jurídico, ainda misterioso, capaz de liberar as obras legadas submetidas à lei restritiva de direitos autorais, mas que foram digitalizadas e são vigiadas pelo aparato estatal, suposto de prover acesso ao cidadão moderno? Se as obras presentes na biblioteca são vigiadas pela lei de direitos autorais, que já prevê uma ambígua permissão de cópia para trechos curtos - seja lá o que isso signifique - nos dispositivos antigos, por meio das fotocopiadoras de uma saudosa modernidade, como poderão conter, ou integrar, a onda de livros piratas já circulantes na web obscura, senão pela adesão às plataformas hegemônicas das Big Techs?

Essa seria a condição atual da biblioteca: impedir justamente a eclosão tão esperada de sua versão contemporânea? Como admitiríamos se a evocação do estado de exceção, da calamidade pública, da emergência sanitária, pudesse apenas impedir a circulação de pessoas, fechar as bibliotecas e alterar o calendário das escolas e universidades? Não poderia a exceção, com o mesmo poder soberano constituído, liberar a circulação dos objetos digitais, em nome da pandemia, da lei e da ordem? Seria o estado de exceção apenas castrador e não liberador?

Reduzir a biblioteca ao atendimento de grupos em redes sociais durante a pandemia, enquanto seu acervo permanece inacessível, parece pouco, de fato é muito menos do que sua importância faz por merecer. A Biblioteca Emergencial é crível, exequível, e já está sendo construída objetivamente, nas capacidades reprográficas da materialidade dos objetos digitais, nas licenças abertas, no domínio público e no trânsito clandestino de livros piratas nas áreas obscuras da internet. Cabe à sociedade e suas leis trazerem esse dispositivo à luz da vida pública, com uma legislação objetiva e liberadora, ao custo de “ofender” a própria base da vida ocidental e sua tradição.

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    » https://ieeexplore.ieee.org/document/8332753
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  • ZUBOFF, Shoshana. The age of surveillance capitalism: the fight for a human future at the new frontier of power. New York: PublicAffairs, 2018
  • 42
    JITA: IM. Open data.
  • RECONHECIMENTOS:
    Não é aplicável.
  • FINANCIAMENTO:
    Não é aplicável.
  • APROVAÇÃO ÉTICA:
    Não é aplicável.
  • DISPONIBILIDADE DE DADOS E MATERIAL:
    Não é aplicável.
  • 1
    Segundo a Organização Mundial da Saúde em: Coronavirus disease (COVID-19) - World Health Organization. Disponível em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019. Acesso em: 17 de outubro de 2021.
  • 2
    Mais detalhes em: Epidemic, Endemic, Pandemic: What are the Differences? | Columbia Public Health. Disponível em: <https://www.publichealth.columbia.edu/public-health-now/news/epidemic-endemic-pandemic-what-are-differences>. Acesso em: 17 out. 2021.
  • 3
    Mais detalhes em: Epidemias deste século foram menos mortais que as do século 20; saiba quais foram. Estado de Minas. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2020/04/11/interna_internacional,1137658/epidemias-deste-seculo-foram-menos-mortais-que-as-do-seculo-20-saiba.shtml. Acesso em: 20 fev. 2021.
  • 4
    Ver a entrevista: “O século 21 começa nesta pandemia”, diz Lilia Schwarcz. CNN Brasil. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/2020/07/05/o-seculo-21-comeca-nesta-pandemia-analisa-a-historiadora-lilia-schwarcz. Acesso em: 16 fev. 2021.
  • 5
    Ver detalhes em Estados de exceção e o covid-19: Estado de sítio, estado de defesa, ...- Migalhas. Disponível em: https://migalhas.uol.com.br/coluna/constituicao-na-escola/322829/estados-de-excecao-e-o-covid-19--estado-de-sitio--estado-de-defesa--calamidade-publica-e-estado-de-emergencia. Acesso em: 3 mar. 2021.
  • 6
    Ver detalhes em: STF, Jurisdição constitucional da exceção, democracia e coronavírus. Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-mar-30/stf-jurisdicao-constitucional-excecao-democracia-coronavirus. Acesso em: 3 mar. 2021.
  • 7
    Decretos proibindo que os habitantes de um Estado ou cidade saiam de casa atingiram mais de 20% da população brasileira. Veja detalhes em: Covid-19: quase 47 milhões de brasileiros estão sob toque de recolher. BBC News Brasil, Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56205089. Acesso em: 26 fev. 2021.
  • 8
    Ver detalhes em: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=441447&ori=1
  • 9
    As "Cinco leis da Biblioteconomia" foram estabelecidas, em 1928, pelo indiano Shiyali Ramamrita Ranganathan, e podem ser sintetizadas como: 1. Os livros são para usar; 2. A cada leitor seu livro; 3. A cada livro seu leitor; 4. Poupe o tempo do leitor; 5. A biblioteca é um organismo em crescimento.
  • 10
    Como ilustração da concentração de poder das grandes empresas de tecnologia durante a pandemia, vejam: Com lucro recorde em 2020, quarteto de big techs vale um terço do PIB dos EUA. CNN Brasil. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/business/2021/02/05/com-lucro-recorde-em-2020-quarteto-de-big-techs-vale-um-terco-do-pib-dos-eua. Acesso em: 5 fev. 2021.
  • 11
    Atualmente a conexão à internet por satélite já é servida por um número pequeno de empresas, principalmente para zonas rurais ou em áreas onde nem a banda larga, nem a telefonia celular, estão disponíveis. A partir de 2022, no entanto, outros atores, como a Starlink, o projeto Kuiper e a OneWeb, prometem entrar nesse mercado, ampliando a oferta global de acesso à internet, por meio de redes de satélites de baixa órbita, oferecendo conexões mais rápidas e baratas. Mais detalhes em: Musk e Bezos se atacam por projetos de internet via satélite. Disponível em: https://olhardigital.com.br/2021/01/27/noticias/elon-musk-e-jeff-bezos-se-atacam-por-projetos-de-internet-via-satelite/. Acesso em: 24 fev. 2021.
  • 12
    Veja um exemplo de retirada de conteúdo por motivos ideológicos em: Livro de acadêmico questionando movimento transgênero é banido da Amazon. Senso Incomum. Disponível em: https://sensoincomum.org/2021/02/25/livro-de-academico-questionando-movimento-transgenero-e-banido-da-amazon/. Acesso em: 27 fev. 2021.
  • 13
    Exemplos de interferências e quebras de contrato, por motivos ideológicos, têm acontecido no momento da escrita deste trabalho, tanto no setor privado, como na expulsão da rede social conservadora Parler (https://parler.com) da nuvem da AWS (https://aws.amazon.com/); quanto na esfera estatal, quando a China barra o uso da rede social ClubHouse. Mais detalhes em: Why Amazon’s Move to Drop Parler Is a Big Deal for the Future of the Internet. Time. Disponível em: https://time.com/5929888/amazon-parler-aws/. Acesso em: 24 fev. 2021; e China barra o uso do Clubhouse, aplicativo de áudio que é sensação no mundo. CNN Brasil. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/business/2021/02/08/china-barra-o-uso-do-clubhouse-aplicativo-de-audio-que-e-sensacao-no-mundo. Acesso em: 8 fev. 2021.
  • ,
    Agnóstico quanto à Plataforma, termo vindo do inglês Platform Agnostic que, segundo a tradução livre do Techopedia significa: um conceito que se refere aos atributos de design e filosofias de produtos de software. Um produto independente de plataforma funciona igualmente bem em mais de uma plataforma. Em: What is Platform Agnostic? - Definition from Techopedia. Techopedia.com. Disponível em: http://www.techopedia.com/definition/23666/platform-agnostic. Acesso em: 27 fev. 2021.
  • 15
    O termo “transformação digital” aqui é entendido com a síntese de Pacheco, Santos e Wahrhaftig (2020), como a série de mudanças tecnológicas, organizacionais e sociais que decorrem da adoção das tecnologias digitais como modo hegemônico de sociabilidade na vida contemporânea.
  • 16
    Detalhes em: Como o mimeógrafo influenciou movimentos culturais - Revista Galileu | Desenvolvimento. Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Caminhos-para-o-futuro/Desenvolvimento/noticia/2016/08/ ha-140-anos-thomas-edison-recebia-patente-do-mimeografo.html. Acesso em: 3 mar. 2021.
  • 17
    Mais detalhes em: A violação dos Direitos Autorais pela extração de cópias de livros - Migalhas. Disponível em: https://migalhas.uol.com.br/depeso/176850/a-violacao-dos-direitos-autorais-pela-extracao-de-copias-de-livros. Acesso em: 3 mar. 2021.
  • 18
    Veja detalhes da Licença Pública Geral GNU em: https://www.gnu.org/licenses/licenses.html#GPL
  • 19
    Para exemplificar o conjunto dessas iniciativas no Brasil, consulte o projeto de iniciativa de educação Aberta. Disponível em: https://aberta.org.br/. Acesso em: 3 mar. 2021.
  • 20
    Ver: http://libgen.is
  • 21
    Ver lista completa em: http://vertsluisants.fr/index.php?article4/where-scihub-libgen-server-down#sol4
  • 22
    Ver: http://www.abdr.org.br/site
  • 23
    Ver: https://lelivros.love
  • 24
    A tecnologia que, atualmente, exerce mais influência na implementação de um mecanismo de sigilo e anonimato é a rede Tor, derivada de um projeto chamado de The Onion Router, que tem como finalidade gerar uma rede anônima capaz de realizar as operações comuns na internet, preservando a identidade dos usuários (anonimato), o conteúdo de suas mensagens (sigilo) e a autonomia de suas operações, com serviços ocultos (obscurecimento). O projeto Tor é financiado por um conjunto de entidades civis e governamentais, mas contou com o apoio do laboratório de pesquisa naval americano, em seu início, nos anos de 1990, com a finalidade de proteger a comunicação da inteligência americana (DINGLEDINE MATHEWSON; SYVERSON 2004). A partir da desmilitarização de seu desenvolvimento, nos anos 2000, sua tecnologia passou a ser usada como uma proteção aos direitos civis, em países ditatoriais e por entidades não governamentais de apoio à transparência das instituições, como o Wikileaks, que preserva o anonimato de suas fontes utilizando a rede Tor.
  • 25
    Uma versão constantemente atualizada da descrição do projeto pode ser encontrada em seu site: http://bc.precog.com.br/
  • 26
    Os buscadores usam a tecnologia DataTables (https://datatables.net), uma biblioteca de código aberto em Javascript, capaz de dinamizar a busca em tabelas montadas em HTML às quais adicionamos os metadados dos arquivos a serem encontrados. A tecnologia Javascript é uma linguagem de programação interpretada em tempo real que faz parte dos padrões da World Wide Web, estando presente, portanto, na grande maioria dos navegadores.
  • 27
    Veja uma demonstração do bc-texto em: http://www.precog.com.br/bc-texto.
  • 28
    Veja uma demonstração do bc-clipart em: http://www.precog.com.br/bc-clipart.
  • 29
    Veja uma demonstração do bc-vidmin em: http://www.precog.com.br/bc-vidmin.
  • 30
    Exemplo em: http://www.precog.com.br/bc-cordel/.
  • 31
    Exemplo em: http://precog.com.br/bc-audio/.
  • 32
    Para maiores detalhes, consultar o site do projeto em: http://bc.precog.com.br/.
  • 33
    Ver detalhes em: http://www.dominiopublico.gov.br
  • 34
    Ver detalhes em: https://www.bbm.usp.br/pt-br
  • 35
    Ver detalhes do Portal de Livros Abertos da USP em: http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP
  • 36
    Ver detalhes sobre a iniciativa de acesso aberto da editora da UFSC em: https://editora.ufsc.br/estante-aberta
  • 37
    Ver detalhes sobre a SciELO Livros em: http://books.scielo.org
  • 38
    Ver detalhes sobre a Editora FI em: https://www.editorafi.org
  • 39
    Ver reportagem da CNBC: The Rise Of Open-Source Software. [s.l.: s.n.], 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=SpeDK1TPbew. Acesso em: 17 fev. 2021.
  • 40
    Utilizando uma ferramenta comum, o Fórum, que, como já se assinalou aqui, foi adotado porque, embora muitos professores já tenham um conhecimento sofisticado de tecnologia, a maioria nunca tinha entrado em ambiente moodle ou criado espaços de aprendizagem digital antes, preferiu-se equalizar a oferta a fim de não expor nenhum colega, nem deixar de atender à demanda pela isonomia dos estudantes.
  • 41
    Dada a demora dos estudantes em responderem aos questionários do Serviço de Bem Estar à Comunidade (SEBEC) e do DH sobre suas condições para continuação do curso, mesmo em julho de 2020 ainda não sabíamos exatamente o número e os nomes dos estudantes offline para melhor atendê-los com esse dispositivo. Sendo assim, combinamos entre os docentes do curso de História que iríamos nos restringir a uma média de 2 GB por disciplina, bem como que iríamos nos limitar à material textual, pois esse renderia muito mais aulas e implicaria em menos consumo de dados do que vídeos e correlatos. Nessas condições, montamos um material com todas as referências do curso, ocupando 32 GB, e orientamos a reutilização dos materiais pelos professores em suas atividades futuras. Destaque-se que alguns professores excederam o limite e outros não chegaram a ocupar metade disso, denotando a disparidade do domínio das ferramentas tecnológicas por parte do Departamento, uma das principais preocupações no desenho do projeto 762 TECHIS, cujo princípio da isonomia atendia estudantes, mas também se estendia aos professores.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    05 Ago 2021
  • Aceito
    08 Out 2021
  • Publicado
    19 Out 2021
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