RESUMO
Este documento trata do processo de ajuste do banco internacional à dívida externa dos países menos desenvolvidos. Começa com uma visão geral da situação financeira dos bancos americanos durante os anos 80. Conclui que, após o default do Brasil em 1987, os bancos estão dispostos a fortalecer sua estrutura de capital, mas ainda têm riscos a enfrentar.
PALAVRAS-CHAVE:
Risco de crédito; dívida externa; crise da dívida
ABSTRACT
This paper deals with the international bank’s adjustment process to the external debt of the less developed countries. It starts with an overview of the American banks’ financial situation during the eighties. It concludes that, after Brazil’s default in 1987, banks are willing to strengthen their capital structure, but they still have risks to face.
KEYWORDS:
Credit risk; foreign debt; debt crisis
Do final da década de 60 ao início da década de 80, quando o excesso de liquidez no sistema financeiro internacional propiciava recursos abundantes e as taxas de juros eram baixas, os bancos emprestaram facilmente para os países subdesenvolvidos elevados volumes de recursos. A elevação abrupta das taxas de juros em 1979, provocada pela política monetária americana, bem como a crise do petróleo já antecipavam as dificuldades que iriam se agravar nos anos seguintes. A crise do México em 1982 explicitou de forma dramática a crise da dívida. Observando-se o fluxo de empréstimos para os países menos desenvolvidos, verificamos a redução desse fluxo a partir de 1982, vindo a tornar-se negativo em 1986.
No decorrer desse período, 1982/86, vimos assistindo ao embate entre países devedores e bancos credores. Os primeiros, ora tentando melhorar as condições de pagamento da dívida, ora realizando ajustes violentos a fim de cumprir religiosamente seus compromissos e voltar a ter acesso ao mercado voluntário de capitais. Já os bancos, enquanto reduziam seus empréstimos aos países subdesenvolvidos, procuravam contornar as dificuldades legais e contábeis de seus países através do artifício de continuar as renegociações emprestando dinheiro aos devedores para que eles pagassem de volta e, dessa forma, mantendo a ilusão contábil de que tudo ia bem.
Com o enfrentamento do Brasil, em fevereiro/87, decretando uma moratória parcial, os bancos viram-se obrigados a encarar a realidade de frente e, liderados pelo Citicorp, assumiram os prejuízos dos “maus empréstimos” e aumentaram as suas reservas. Como reflexo dessa atitude, os bancos amargaram prejuízos no ano de 1987.
No caso do Brasil, mais uma mudança no Ministério da Fazenda no final daquele ano ensejou a assinatura de novo acordo com os bancos e a retomada integral do pagamento do serviço da dívida. Como resultado, os bancos auferiram lucros estupendos em 1988 e o Brasil viu-se na iminência de decretar nova moratória em 1989, para evitar o esgotamento das reservas. A renegociação a nível internacional, por parte dos devedores, procurou tomar como parâmetro o caso do México, enquanto os bancos apontavam para a situação específica mexicana, com sua fronteira com os Estados Unidos.
O desenrolar dos acontecimentos envolvendo os bancos credores e os países devedores, especialmente a partir de 1987, constitui o âmbito deste trabalho. Apesar de já existirem diversos textos tratando da questão da dívida, neste procura-se adotar um enfoque pouco estudado, analisando-se a reação dos bancos a atitudes mais duras por parte dos devedores e o impacto dessas medidas sobre sua lucratividade. Não tratamos aqui de esquemas de renegociação, como o Plano Brady, adotado pelo México, Filipinas e Costa Rica, nem das vantagens e desvantagens das reivindicações dos bancos como conversão da dívida, ‘’relending’’ e outros pleitos. Procura-se ver aqui o problema da dívida do ângulo dos credores, mas considerando-se sempre o interesse nacional. Este texto dá prosseguimento a estudos realizados sobre a dívida externa, como o que foi realizado sobre as renegociações do Brasil desde o final do século passado.1 1 Para o histórico dessas renegociações, vide’’ A dívida externa e o desenvolvimento econômico brasileiro”, do autor, no Informativo Regional, vol. 19, n. 12, dez./85, Banco Central, São Paulo.
O trabalho se inicia com uma retrospectiva dos bancos americanos até o início de 1987, quando o Brasil decreta a sua moratória. A seguir, verifica-se a reação dos bancos aos problemas que eles já vinham enfrentando e seus efeitos sobre seus lucros, bem como as mudanças nas políticas de renegociação entre 1987 e 1989. Na conclusão, observamos que os bancos têm se fortalecido para enfrentar a questão da dívida, mas ainda não podem descartar por completo o seu relacionamento com os países devedores. Finalmente, no apêndice, resumimos a regulação que trata dos riscos dos empréstimos externos em alguns países.
I. A SITUAÇÃO DOS BANCOS
Os bancos americanos, depois de passarem por um período de grandes dificuldades, melhoraram substancialmente sua situação. Até 1987, problemas com empréstimos a nível doméstico2 2 Dois terços dos bancos comerciais que faliram em 1986 tinham sede em Kansas City ou Dallas Federal Reserve Districts. Federal Reserve Bulletin, jul./87. - nos setores de energia, agricultura e habitação, principalmente - têm levado vários bancos à falência. Em 1986, 136 bancos faliram ou tiveram que receber ajuda para se incorporarem a outros bancos. Este foi o maior número de falências desde 1936. Em 1987, o FDIC fechou 187 bancos.3 3 International Business Week, 4.4.88. Além disso, outros 1.484 bancos, em 1986, estavam oficialmente com problemas no final do ano.4 4 The Economist, 21.3.87. ·
A relação entre os empréstimos em atraso e o total dos ativos para 35 bancos americanos tem se elevado nos últimos anos, de 0,8% em 1980 para 1,6% em 1982 e 2,2% em 1986.5 5 Idem. Apesar da percentagem relativamente baixa desse índice, deve-se assinalar que os indicadores para as instituições financeiras normalmente enfatizam outros itens como, por exemplo, o seu capital em relação ao ativo total ou o montante representado pelas ações no capital.
As instituições reguladoras tendem a estabelecer percentagem mínima para a relação capital primário/ativos. O capital primário, para os bancos americanos, é composto de ações comuns, ações preferenciais perpétuas, “surplus”, lucros retidos, dívidas conversíveis em ações, reservas para perdas com empréstimos e outras reservas de capital. Nos Estados Unidos essa relação foi aumentada de 5% para 5,5% no final de 1984 para os grandes bancos. Para os nove maiores bancos americanos esse indicador evoluiu da seguinte forma: 4,2% em 1981, 6,8% em 1985 e 7,2% em 1986, portanto pouco acima do mínimo exigido.
Comparando-se a dívida dos países não-produtores de petróleo mais os países do Leste Europeu com o capital dos nove maiores bancos americanos, verifica-se que a dívida chegou a representar mais do dobro do capital entre 1979 e 1982.6 6 Cline, W. International Debt and the Stability of the World Economy. Washington: Institute for International Economics, 1983.
Com o agravamento do problema da dívida, parte do pagamento do seu serviço passou a sofrer atrasos indo engrossar os “non-performing loans’’ (ou seja, empréstimos com pagamentos em atraso de cerca de 90 dias ou mais). Justamente como proteção para essa eventualidade é que são constituídas as provisões para perdas. Apesar da crise da dívida entre 1982 e 1986 as reservas em comparação com os ativos “non-performing’’ para cinco dos maiores bancos americanos aumentou no período (Tabela 2). Contudo, deve-se tomar cuidado ao examinar essa tabela: os ativos “non-performing” não se referem apenas às dívidas dos países menos desenvolvidos; além disso durante todo esse período os bancos fizeram o possível para manter as negociações evitando a desclassificação dos empréstimos. Essa estratégia foi possível enquanto os países devedores acreditaram que os empréstimos voluntários voltariam aos níveis anteriores a 1979 e se submeteram a programas de ajustes patrocinados pelo FMI. No entanto, com a impossibilidade constatada pelos devedores da manutenção do pagamento do serviço da dívida e do cumprimento de programas recessivos, passou a haver atraso nesses pagamentos, culminando com a moratória parcial decretada pelo Brasil em fevereiro/87.
II. REAÇÃO DOS BANCOS
Em consequência dos diversos problemas internos e da constatação de que não seria mais possível aos países devedores continuarem saldando seus compromissos sem alterações das condições originais, os bancos foram obrigados a reconhecer a necessidade de uma mudança no âmbito das renegociações. Só que, ao invés de procurarem uma solução duradoura através de um acordo factível com os devedores, resolveram endurecer suas posições, aumentando suas reservas e considerando seus empréstimos aos países menos desenvolvidos como passíveis de não pagamento.
Essa atitude foi iniciada pelo Citicorp com a elevação em US$ 3 bilhões das suas provisões contra empréstimos “non-performing” em 19/5/87. Com isso estimou-se uma perda de US$ 2,5 bilhões no trimestre nas suas receitas, perda esta que se esperava ser reduzida para US$ 1 bilhão para todo o ano de 1987, com o aproveitamento das vantagens tributárias decorrentes do aumento das provisões. Enquanto se preparava para não ceder aos devedores, o Citicorp também se aproveitava para colocar os seus concorrentes em situação delicada já que teriam de também elevar suas reservas e nem todos tinham condições de arcar com os custos desta medida.
O que se viu, então, foi a elevação das reservas por parte dos outros bancos, implicando redução dos seus lucros e a necessidade de se desfazerem de parte dos seus ativos e/ou recorrerem ao mercado de capitais para colocação de ações.
Dessas consequências nem o próprio Citicorp, iniciador do processo, escapou. Assim, no segundo semestre de 1987, viu-se obrigado a vender parte da sua sede e a tomar a iniciativa de captar recursos através da emissão de ações no valor de US$ 1,1 bilhão.
Os demais bancos incorreram em medidas semelhantes. O Bank of America vendeu ações para instituições japonesas. O Midland (britânico) colocou à venda agências na Escócia e Irlanda do Norte. O M.Hanover emitiu 6 milhões de novas ações tentando obter US$ 245 milhões, vendeu ativos - um avião e participação em um banco em Portugal - e despediu 2.500 empregados. O Chemical também demitiu 2.000 empregados e anunciou a venda de algumas subsidiárias. O Chase vendeu uma subsidiária que trabalhava com informações financeiras, um edifício de escritórios em Paris e propriedades imobiliárias no Japão.
No final de 87, dos seis bancos americanos que estamos acompanhando, cinco tiveram prejuízos e o único que teve lucro (o Morgan), teve um resultado bastante inferior a 1986. Apesar desses resultados quase sempre estarem relacionados ao problema do não pagamento da dívida por parte dos países devedores, boa parte dos empréstimos problemáticos foram concedidos a setores da economia americana que passaram por crises nos anos recentes - casos da agricultura, imóveis e petróleo.7 7 Número de bancos agrícolas que fecharam: 1982: 10; 1983: 7; 1984: 31; 1985: 69; 1986: 59; Fonte: “Como os americanos enfrentam a crise”, Rolf Kuntz, Guia Rural Abril, abril/87.
O segundo semestre de 87, em termos da questão da dívida, foi marcado por alterações no comportamento do Brasil com relação às suas propostas para renegociação da dívida. Inicialmente, em fevereiro, o Brasil tinha interrompido o pagamento dos juros devidos nos empréstimos de médio e longo prazos, buscando conseguir melhores condições de pagamento. Como essa moratória não foi devidamente sustentada pelo governo brasileiro, os credores sentiram-se fortalecidos o suficiente para não cederem.
A orientação fixada pelo novo ministro, Bresser-Pereira, apresentou como novidades a busca do “spread” zero e a tentativa de “securitização” da dívida e da absorção, pelo governo, dos ganhos decorrentes do deságio existente nas negociações de títulos da dívida brasileira no mercado secundário desses papéis. Procurou-se vincular a conversão da dívida à aquisição por parte dos credores de títulos de longo prazo do governo brasileiro. Além disso, tentou-se incluir salvaguardas contra a elevação das taxas de juros e a piora das relações de trocas.
Não houve acordo com os bancos. O “spread” zero significava uma continuidade na redução desse ônus que, alegava-se, poderia ser pleiteada pelos demais devedores. Quanto à ‘’securitização’’ da dívida, embora já viesse ocorrendo voluntariamente no sistema financeiro internacional, os bancos temiam que a sua oficialização na forma proposta pudesse “contaminar” os seus ativos, desvalorizando os seus créditos.
Com a retomada do pagamento dos juros por parte do Brasil no final de 1987, os benefícios fiscais derivados do aumento das provisões e o resultado dos seus ajustes (como venda de ativos etc.), os bancos voltaram a apresentar lucros no ano de 1988.
Segundo o presidente do FDIC, William Seidman, 1988 foi o ano mais lucrativo na história dos bancos americanos. Os lucros no último trimestre do ano foram recordes, US$ 6,7 bilhões, sucedendo ao recorde do trimestre anterior de US$ 5,9 bilhões. Essa foi a primeira vez que houve dois trimestres consecutivos quebrando recordes de lucros. Neste ano, a taxa de retorno sobre os ativos foi a mais alta desde 1973: 0,84%. Além do Brasil, México e Venezuela pagaram o serviço de sua dívida regularmente, o que teria contribuído para a lucratividade dos bancos.8 8 Folha de S. Paulo, 14.3.89.
Em 1989, os bancos voltaram a ter problemas. Dos seis que estamos acompanhando, quatro tiveram prejuízos. Somente o Citicorp e o Bank of America apresentaram lucros, sendo que o do Citicorp foi 73,2% inferior ao de 1988. No 1º. Semestre de 1989, os bancos americanos ainda tiveram lucros recordes, que foram seguidos pelos dois piores trimestres da década, segundo o FDIC. As causas atribuídas a esses maus resultados foram os aumentos de provisões para os empréstimos aos países do Terceiro Mundo e para os empréstimos internos.9 9 Gazeta Mercantil, 9.3.90.
III. CONCLUSÃO
Nos últimos anos, os bancos americanos melhoraram sua posição com relação aos empréstimos aos países do Terceiro Mundo. Aumentaram suas reservas como proteção para o não pagamento dessas dívidas, a partir da moratória brasileira em 1987, e elevaram sua relação capital/ativo. Essas medidas foram tomadas em boa parte como resposta às pressões das instituições supervisoras de seus países e dos seus acionistas.
E a relação capital/ativo que era de 5,4% em 1980, já passava dos 8% em 1988, como mostra a tabela 9 abaixo.
Com base nesses indicadores, poderíamos ser tentados a concluir que os bancos estariam em situação segura, podendo suportar o perdão de parte da dívida ou serem forçados, pelo seu governo, a assumirem perdas, referentes ao pagamento do serviço da dívida externa por parte dos países devedores.
No entanto, uma observação mais cuidadosa sobre o desenvolvimento de suas operações de crédito no período mais recente nos dá uma visão diferente deste processo. Na sua busca de alternativas aos empréstimos aos países em desenvolvimento, os bancos americanos se voltaram para outras operações internas que acabaram não se mostrando tão seguras e rentáveis como eles poderiam supor. Já nos referimos aos empréstimos nos setores de energia e agricultura, com seus problemas. Novas dificuldades surgiram com os empréstimos no ramo imobiliário comercial e nos financiamentos para aquisição de firmas. Com a economia americana em declínio, anunciando alguns a proximidade de recessão, essas operações, que inicialmente eram lucrativas, passaram a trazer problemas para os bancos.
Os empréstimos para aquisição de firmas (“leveraged buy out” - LBO) de 25 bancos americanos totalizavam, em 1989, US$ 43,6 bilhões, tendo havido acréscimo de US$ 25 bilhões em relação a 1988. O Citicorp e o M. Hanover estão entre os bancos com maiores’ ‘exposures’’ nesta área. O risco dessas operações teve uma demonstração com o colapso da United Airlines.10 10 The Economist, 21.10.89.
Em consequência desses problemas, o Citicorp teve rebaixamento na classificação de alguns de seus títulos e o Chase anunciou duras medidas de ajustes, incluindo a demissão de cinco mil funcionários.
Quanto à relação capital/ativo, a Tabela 9 se refere a todos os bancos americanos. Esta relação, para os grandes bancos, é bem menor. Para o Bank of America era de 4,68% e para o Citicorp, de 3,6%, no final de 1989 e começo de 1990, respectivamente. Portanto, bem abaixo dos 8% que deverão ter em 1992, conforme recomendações do BIS.
Podemos concluir, então, que apesar das medidas adotadas ao longo desses anos para fortalecer a sua posição, ainda não estão suficientemente fortes para desprezarem por completo os seus empréstimos ao Terceiro Mundo. O Manufacturers Hanover, por exemplo, tem um patrimônio líquido que corresponde apenas a 37% dos seus empréstimos a esses países. Segundo a The Economist, se a América Latina entrar em “default” esse banco irá falir.11 11 The Economist, 29.7.89. Dos lucros obtidos pelo Citicorp no 1º. Trimestre de 1989, US$ 529 milhões, boa parte (US$ 66 milhões) proveio do pagamento dos juros do Brasil.12 12 Gazeta Mercantil, 19.4.89.
As oscilações nas políticas dos países devedores acabam por favorecer o ajuste dos bancos. Quando o Brasil decretou a moratória em fevereiro de 1987, estes tiveram que encarar a situação e concluíram rapidamente acordos que vinham se arrastando com outros países, aumentaram reservas e assumiram prejuízos numa reação que foi encarada como normal pelos seus acionistas. A continuidade dessa situação poderia ter acarretado mudanças no âmbito das negociações. Porém, a moratória foi logo esvaziada, adotou-se o enfoque tradicional, realizaram-se pagamentos e os bancos auferiram grandes lucros, o que serviu para reforçar a ideia de que eles estavam certos. O primeiro “round” de enfrentamento foi ganho pelos bancos. No entanto, a continuidade das dificuldades para se manter o pagamento da dívida da forma desejada pelos credores como no acordo realizado pelo ministro Maílson da Nóbrega, mostrou de forma clara que é impossível a manutenção dos pagamentos naquelas condições. Ao mesmo tempo, as alternativas buscadas pelos bancos para fugirem aos empréstimos aos países em desenvolvimento esbarraram em novas dificuldades.
Tudo isso serve para mostrar que existe espaço para conseguir condições mais favoráveis num novo acordo. Acreditamos que não interessa a ninguém uma ruptura no relacionamento. Resta, portanto, que tanto credores como devedores busquem um consenso, no qual seja respeitada a capacidade de pagamento do país, sem o comprometimento de seus objetivos básicos como nação soberana. Para se atender aos credores, há que se buscar novas opções (conversão da dívida, “buy back”, pagamento em cruzeiro etc.) que atendam às suas necessidades, mas sem comprometer o país.
O ponto crucial é levar em conta sempre o interesse do país, procurar reduzir as desigualdades sociais, setoriais e regionais, promover o crescimento necessário para absorver a mão-de-obra desempregada, de preferência sem entrar em choque com o sistema financeiro internacional. Para que isso ocorra é preciso que as suas obrigações sejam compatíveis com a sua capacidade de pagamento e esta não pode ser um elemento instabilizador da economia. Essas são as considerações que acreditamos devem nortear as negociações da dívida.
-
1
Para o histórico dessas renegociações, vide’’ A dívida externa e o desenvolvimento econômico brasileiro”, do autor, no Informativo Regional, vol. 19, n. 12, dez./85, Banco Central, São Paulo.
-
2
Dois terços dos bancos comerciais que faliram em 1986 tinham sede em Kansas City ou Dallas Federal Reserve Districts. Federal Reserve Bulletin, jul./87.
-
3
International Business Week, 4.4.88.
-
4
The Economist, 21.3.87.
-
5
Idem.
-
6
Cline, W. International Debt and the Stability of the World Economy. Washington: Institute for International Economics, 1983.
-
7
Número de bancos agrícolas que fecharam: 1982: 10; 1983: 7; 1984: 31; 1985: 69; 1986: 59; Fonte: “Como os americanos enfrentam a crise”, Rolf Kuntz, Guia Rural Abril, abril/87.
-
8
Folha de S. Paulo, 14.3.89.
-
9
Gazeta Mercantil, 9.3.90.
-
10
The Economist, 21.10.89.
-
11
The Economist, 29.7.89.
-
12
Gazeta Mercantil, 19.4.89.
-
13
Malcolm C. Alfriend, “International Risk-Based Capital Standard: History and Explanation”, Federal Reserve Bank of Richmond, nov./dez. 1988, p. 29.
-
14
Idem, p. 30.
-
15
Paul A. Meyer, Monetary Economics and Financial Markets, Richard D. Irwin, 1982.
-
16
The Economist, 21.3.87 e “Serninar on Central Banking”, IMF, julho/85, Washington.
-
17
The Economist, 5.9.87.
-
18
Shafiqul lslam, ‘’Rompendo o impasse da dívida internacional’’, in Divida Externa: crise e soluções, L. B. Pereira (org.), Brasiliense, 1989, p. 109.
-
19
Gazeta Mercantil, 3.8.89.
-
20
Sistema Econômico Latino-Americano - SELA, A Política Econômica dos Estados Unidos e seu Impacto na América Latina, Paz e Terra, 1985, p. 9.
-
21
Folha de S. Paulo, 18.12.88.
-
22
Gazeta Mercantil, 20.1.89.
-
23
The Economist, 21.3.87 e 11.7 .87; Financial Times, 25.6.87.
-
24
Gazeta Mercantil, 30.12.88.
-
25
Federal Reserve Bulletin, jun. 87.
-
26
Gazeta Mercantil, 14.7.88.
-
27
JEL Classification: G21; H63.
APÊNDICE
Regulação Estados Unidos
Nos Estados Unidos, existem três instituições federais regulatórias que têm responsabilidades sobre os bancos comerciais: O Federal Reserve System (FED), o Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC) e o Office of the Comptroller of the Currency (OCC). Essas três agências, em anos anteriores, tinham divergências sobre o que deveria ser considerado capital para os bancos. Mas, em dezembro de 1981, chegaram a um acordo, estabelecendo uma definição que considerava o capital como sendo constituído de duas partes: o capital primário e o capital secundário.
O capital primário seria composto de ações comuns, ações preferenciais perpétuas, “surplus”, lucros retidos, dívidas conversíveis em ações, reservas para perdas com empréstimos e outras reservas de capital. Esses itens foram considerados como formas permanentes de capital por não estarem sujeitos a resgates.
O capital secundário se constituiria de formas não permanentes de ações, como ações preferenciais resgatáveis e dívidas.13 13 Malcolm C. Alfriend, “International Risk-Based Capital Standard: History and Explanation”, Federal Reserve Bank of Richmond, nov./dez. 1988, p. 29.
O FED e o OCC estabeleceram percentagem mínima de 5% e 6% para o capital primário em relação ao total dos ativos para os bancos’ ‘regional’’ (ativos entre 1 e 15 bilhões) e “community” (ativos inferiores a US$ 1 bilhão), respectivamente. Essa exigência só passou a se aplicar aos bancos’ ‘multinational” (ativos superiores a US$ 15 bilhões) em 1983, com a taxa de 5%. Nesse mesmo ano, ampliou-se a definição de capital secundário para incluir dívidas de longo prazo de companhias holdings e suas subsidiárias não bancárias.
Em 1985 foi estabelecida uma taxa uniforme de 5,5% para o capital primário mínimo e de 6% para o capital total em relação ao total dos ativos.14 14 Idem, p. 30.
Com relação à análise dos riscos de empréstimos a países, foi adotado, em 1978, um procedimento padrão para as três agências (FED, FDIC e OCC) realizarem essa avaliação. A administração desse sistema se dá no âmbito da Interagency Country Exposure Review Committee (ICERC, composta por nove membros das três agências) que se reúne três vezes ao ano e classifica os países em fortes, moderadamente fortes ou fracos. São analisados cinco indicadores, referentes ao setor externo da economia, mais trabalhos do Federal Reserve para os países e estudos do Departamento do Tesouro e de banqueiros internacionais. De acordo com essa classificação, são estabelecidos os limites para empréstimos em relação ao capital, respectivamente, 25%, 10% e 5%. Os países que não atingem essa classificação por terem problemas com o pagamento do serviço da dívida são classificados por sua vez em abaixo do padrão, duvidoso e perdas. Essa classificação é comumente adotada no exame dos empréstimos e uma regra prática para sua identificação é de que os empréstimos bons serão totalmente pagos. Perdas de até 20% indicam um empréstimo “abaixo do padrão”; perdas de 50% os classificariam em “duvidosos” e “perdas” indicaria nenhum pagamento15 15 Paul A. Meyer, Monetary Economics and Financial Markets, Richard D. Irwin, 1982. . Essa designação determina a percentagem de “exposure” do capital a que eles estarão sujeitos. Para alguns países, como a Polônia, a Nicarágua, o Zaire, a Bolívia, o Sudão e o Peru, exigem-se maiores provisões para perdas.16 16 The Economist, 21.3.87 e “Serninar on Central Banking”, IMF, julho/85, Washington. Em junho de 1990, o Brasil foi desclassificado pelo ICERC, obrigando os bancos a fazerem novas provisões.
Se os empréstimos forem declarados como de recuperação duvidosa (‘’value impaired’’), então os bancos devem colocá-los como crédito em liquidação (‘’write-off’’) na proporção de 10% no primeiro ano e 15% no segundo17 17 The Economist, 5.9.87. . Essa é uma forma de estender(‘’stretch-out”) os prejuízos para os bancos sob o sistema ATRR (“Allocated Transfer Reserve Risk”).18 18 Shafiqul lslam, ‘’Rompendo o impasse da dívida internacional’’, in Divida Externa: crise e soluções, L. B. Pereira (org.), Brasiliense, 1989, p. 109. Os bancos podem não esperar a classificação do país como ‘’value impaired’’ e se utilizarem da FASB 15 (“financial accouNting standards board - Statement 15”), dessa forma se beneficiando da completa dedução de impostos sobre quaisquer perdas associadas com esse empréstimo. Mas, em compensação, ficariam obrigados a comunicar ao mercado toda a evolução do negócio - que pode durar vários anos - com esse país19 19 Gazeta Mercantil, 3.8.89. .
Em dezembro/82 os bancos foram obrigados, pela primeira vez, a informarem sobre empréstimos problemas20 20 Sistema Econômico Latino-Americano - SELA, A Política Econômica dos Estados Unidos e seu Impacto na América Latina, Paz e Terra, 1985, p. 9. . Em 1983, o Congresso americano aprovou o “International Lending Supervision Act”, cujo objetivo era encorajar os governos e as autoridades reguladoras a manter, e, quando apropriado, fortalecer o capital das instituições envolvidas em empréstimos internacionais.
A partir de 31-12-90, por determinação do FED, os bancos americanos deverão separar do seu capital, 7,25% dos empréstimos de risco para constituir reservas. Um ano depois, essa percentagem deverá ir para 8%. As aplicações em bônus do Tesouro estarão isentas da necessidade de serem cobertas com reserva de capital.21 21 Folha de S. Paulo, 18.12.88.
Grã-Bretanha
Na Grã-Bretanha, os bancos são estimulados a terem como capital livre (ações, dívida qualificada, provisão para perdas com empréstimos, interesses minoritários em outras companhias e outros itens) mais de 6% dos passivos públicos. Os bancos precisam comunicar ao Banco da Inglaterra se o empréstimo a um único tomador ultrapassa 10% do capital. Com relação à dívida externa, não há regras formais. O Banco da Inglaterra recomendava que os bancos mantivessem provisões para a dívida brasileira de 26% a 40%. Em 19.01.89, essa exigência foi reduzida para 16% a 25%. A provisão média dos maiores bancos britânicos, em jan./89, era de 30% a 35%.22 22 Gazeta Mercantil, 20.1.89. Recentemente, houve novas recomendações do Banco da Inglaterra para o aumento dessas provisões. Com relação às provisões, há diferenças entre as “gerais”, que contam como capital e são disponíveis para cobrir as perdas e as “específicas”, que cobrem um risco de crédito identificado e não contam como capital. As provisões ‘’específicas” são mais vantajosas em termos de deduções tributárias. Quando da elevação das reservas como provisão para perdas com empréstimos, o National Westminster colocou-as como item excepcional, que afeta o lucro por ação, enquanto o Midland, banco mais fraco, lançou-as como item extraordinário que não afeta o lucro por ação23 23 The Economist, 21.3.87 e 11.7 .87; Financial Times, 25.6.87. .
Japão
O Japão mudou suas normas em maio de 1986 para obrigar os bancos a terem capital (somente ações, embora os bancos queiram ampliar essa definição) igual a 4% dos ativos até 1991. Os grandes bancos (“city banks”) não podem emprestar mais de 40% do seu capital a um único tomador. Com relação aos empréstimos externos, o Ministério das Finanças estipulou uma taxa máxima de 5% contra “exposure” de 36 países, que é dedutível dos impostos. Com a queda do dólar, durante 1987 e 1988, é provável que tenham que elevar suas reservas, já que quase todos atingiram aquele limite. Daí pleitearam por uma elevação para 10%. Essa reivindicação foi atendida em março/88 e posteriormente, em dezembro do mesmo ano, foi elevada para 15%.24 24 Gazeta Mercantil, 30.12.88. Os bancos só podem elevar suas reservas com aprovação do governo.
Internacional
Com a crescente internacionalização dos bancos e a dificuldade em se estabelecer responsabilidades com relação à supervisão bancária, surgiu a necessidade de as autoridades em vários países se organizarem visando à padronização dos seus procedimentos. Nesse sentido foi criado, em 1974, um comitê (“Committee on Banking Regulations and Supervisory Practices”, constituído pelos bancos centrais do G-10- Bélgica, Canadá, França, Alemanha Ocidental, Itália, Japão, Holanda, Suécia, Grã-Bretanha e Estados Unidos - mais Suíça e Luxemburgo, chamado de Comitê Basiléia e depois Comitê Cooke) e anos depois os governos americano e britânico começaram a estudar uma proposta conjunta objetivando uniformizar os padrões de avaliação dos riscos bancários. Essa proposta baseava-se em três elementos fundamentais: 1) definição de capital; 2) medida de risco relacionando o capital com os ativos de risco e as operações “off-balance-sheet” (OBS) e 3) capital mínimo. A definição de capital primário deveria conter os elementos básicos da participação acionária e reservas contra perdas. Incluiria: ações preferenciais de longo prazo e perpétuas e “debt securities” sob certas condições, relacionadas com a capacidade de permanência e absorção de perdas; deveria ser estabelecida uma medida de riscos, criando-se cinco categorias, com os ativos de baixo risco requerendo menos capital; e o grau de supervisão deveria ser mínimo.25 25 Federal Reserve Bulletin, jun. 87.
Em julho/88, o conselho do BIS deu a aprovação final ao plano que estabelece um padrão mínimo de adequação de capital para os bancos. Estes deverão ter capital igual a 8% do total de seus ativos com riscos no fim de 1992. Metade dessa percentagem terá que vir do capital básico (capital acionário e as reservas anunciadas) e a outra metade do capital suplementar (reservas ocultas, dívidas de longo prazo e reservas para prejuízos com empréstimos). A aprovação desse relatório teve restrições da Alemanha Ocidental, que considerou a definição de capital excessivamente liberal.26 26 Gazeta Mercantil, 14.7.88.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
03 Nov 2023 -
Data do Fascículo
Apr-Jun 1991