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Lentas mudanças: o voto e a política tradicional

Slow changes: vote and traditional politics

Resumos

Tomando como referência os estudos que relacionam geografía política, desenvolvimento e poder político, analisam-se as principais áreas de influência das forças partidárias no Brasil, com ênfase no grau de desenvolvimento das regiões e localidades de onde os partidos políticos retiram a sua maior força eleitoral. O estudo lança luz tanto sobre a emergência de novas forças políticas quanto, sobretudo, sobre a persistência das formas tradicionais de exercício da política.

Brasil; Brasil


Taking as reference the studies which put together political geography, development, and political power, the main areas of influence of the political parties in Brazil are examined, with emphasis on the degree of development of the regions and localities from where the political parties obtain their chief electoral force. The study throws light both on the emergency of new political forces and on the persistence of traditional forms of doing politics.

Brazil; Brazil


AMÉRICA LATINA

Lentas mudanças: o voto e a política tradicional* * Este trabalho contou com a colaboração de Gisela de Avellar, da Empresa Brasileira de Pesquisa em Agricultura - Embrapa, no que tange à organização das tabelas. Somos gratos aos professores Antônio Octavio Cintra e Fábio Wanderley Reis pela leitura e comentários ao texto. Agradecemos, também, ao parecerista desta revista pela leitura cuidadosa e importantes sugestões. Outra versão do texto foi publicada pela Revista Brasiliense de Política Comparada, vol. III, número 1, julho de 1999.

Slow changes: vote and traditional politics

Lúcia AvelarI; Fernão Dias de LimaII

IProfessora titular do Departamento de Ciência Política da Universidade de Brasília

IIAnalista de sistemas da Faculdade de Saúde Pública de Universidade de São Paulo

RESUMO

Tomando como referência os estudos que relacionam geografía política, desenvolvimento e poder político, analisam-se as principais áreas de influência das forças partidárias no Brasil, com ênfase no grau de desenvolvimento das regiões e localidades de onde os partidos políticos retiram a sua maior força eleitoral. O estudo lança luz tanto sobre a emergência de novas forças políticas quanto, sobretudo, sobre a persistência das formas tradicionais de exercício da política.

Palavras-chave: Brasil, partidos e eleições; Brasil, política tradicional.

ABSTRACT

Taking as reference the studies which put together political geography, development, and political power, the main areas of influence of the political parties in Brazil are examined, with emphasis on the degree of development of the regions and localities from where the political parties obtain their chief electoral force. The study throws light both on the emergency of new political forces and on the persistence of traditional forms of doing politics.

Keywords: Brazil, parties and elections; Brazil, traditional politics.

Nos estudos das relações centro-periferia, em quase todos os países de fortes desigualdades regionais, tem sido reiteradamente observada uma forte correlação entre o grau de desenvolvimento de regiões e municípios e a força eleitoral dos partidos políticos (Avelar e Lima, 1999). 0 tema, que tem fascinado inúmeros estudiosos interessados em estudar os problemas políticos e os mecanismos de funcionamento relacionados com um centro hegemônico e a periferia por ele criada, apresenta-se particularmente atraente em um país com as dimensões territoriais do Brasil, de organização político-federativa e com diferenças inter e intra-regionais profundas.

Para tratar da problemática acima, um tema que acaba por indagar sobre a sobrevivência da política tradicional no Brasil a partir do controle do poder municipal, o presente artigo apresenta dados e notas sobre eleições municipais de 1988 e 1996, enunciando algumas expectativas referentes às eleições municipais de 2000. Lançando mão de indicadores de natureza sócioeconômica sobre as condições de vida dos municípios em várias regiões do país, associando-os com resultados eleitorais de pleitos municipais, o objetivo é oferecer um quadro das estruturas do poder político local através da influência exercida pelos partidos nestas regiões, classificadas conforme níveis de desenvolvimento A questão subjacente é até que ponto o desenvolvimento econômico e social de décadas anteriores afetou a estrutura do poder local e regional, minando os fundamentos da dominação política tradicional1 1 Esta é uma questão reiteradamente tratada na literatura da ciência política no Brasil. Tal como veremos nas indicações bibliográficas seguintes, um dos maiores desafios à análise política é a identificação da variedade dos arranjos políticos no país de correntes da história de um poder local que se estruturou a partir da propriedade da terra. Para uma indicação inicial, ver Cintra, 1971 e 1974. No trabalho de 1974 o autor oferece importante literatura sobre estudos de poder local. Ver, também, o trabalho de Carone, 1972, sobre "Oligarquias: definição e bibliografia". O trabalho de Robert Putnam ( 1993) sobre a Itália, tornou-se importante referência. Os temas do poder tradicional, do clientelismo político e das análises ecológico-estruturais são o fulcro das indicações bibliográficas. . Utilizando-nos dos avanços obtidos no conhecimento da vida econômica e social dos municípios brasileiros, possibilitados pelo acesso às informações individualizadas dos censos nacionais por meio de convênios das instituições de pesquisa com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, estudamos os focos de poder municipal dos principais partidos políticos brasileiros. Nosso esforço concentra-se em conhecer, em termos estruturais, a composição das elites nas suas configurações locais e regionais. O caminho analítico retoma, também, as antigas teses sobre desenvolvimento e poder político no Brasil.

Os dados eleitorais que fundamentam o trabalho são os das eleições municipais de 1998 e, sobretudo, das de 1996, analisando-os sob a perspectiva da força dos partidos nas localidades e contextos em distintas condições de porte e desenvolvimento. O enfoque toma como referência os estudos que relacionam geografia política, desenvolvimento e poder político.

Outro aspecto fascinante, que nos conduziu ao presente estudo, é o da persistência das oligarquias no cenário político da atualidade, retomando a tese de que o poder tradicional não desaparece como força política mesmo em regiões desenvolvidas. Tal como presenciamos em outros países, a modernização econômica não leva, necessariamente, à mudança política, havendo um lag para que ocorram mudanças no perfil das elites dominantes2 2 Os trabalhos sobre a aristocracia prussiana, que sobreviveu a enormes crises e reformas da terra, ou sobre os Junker, tal como nos mostra Gerschenkron (1962) atestam sobre a sua capacidade de sobrevivência. Assim, também, os estudos de Moore (1966), sobre a aristocracia rural nos Estados Unidos. Linz (1975) discutindo regimes autoritários ( 1975), mostra como também a política tradicional é desmobilizadora e não-ideológica. . No caso brasileiro este tema assume relevância maior, quando se tem um desenvolvimento diferencial que se concentrou fortemente em algumas regiões do país.

Os termos "poder tradicional", "política tradicional", "política oligárquica" serão tomados indistintamente no decorrer do trabalho. Concordamos com o argumento defendido por Hagopian (1996) de que as elites políticas tradicionais perpetuam a "política tradicional", um estilo de fazer política em que o poder é altamente concentrado, o acesso às arenas de decisão política é restrito, os canais de representação política são hierárquicamente organizados e os níveis de competição política são estritamente regulados. Os partidos políticos são, então, veículos de controle oligárquico. A elite tradicional pode ser definida como uma classe política cujo poder é transmitido pela linhagem familiar e os recursos de poder vêm da terra e do Estado. A continuidade do poder é assegurada pela intermediação de interesses e relações de tipo clientelístico.

Os estudos que tratam da continuidade do poder tradicional no Brasil são numerosos3 3 Os estudos que se tomaram referências obrigatórias são os de Nunes Leal (1949) e Faoro (1958). Uma pesquisa na literatura nos leva também a Prado (1967), Duarte (1966), Costa Pinto (1949), Brandão Lopes (1967), Oliveira Vianna (1955), Pereira de Queiroz (1956), Soares, 1974, Schwartzman (1988), Carvalho (1968), Carvalho Franco (1998). Sobre as rivalidades intra-elites, um enfoque importante quando se quer estudar a proliferação de partidos de direita, o estudo inicial é o de Costa Pinto (1949). . Além dos trabalhos que remontam ao arbítrio do poder de senhores rurais no século XIX e nas primeiras décadas deste século, em 1949 Nunes Leal reafirmava que "a liderança, nos municípios rurais ou predominantemente rurais, é própria das classes dominantes, incluindo os seus aliados (coronéis e doutores)". Jaguaribe e Guerreiro Ramos chamavam a atenção para a política de clientela, e o estudo clássico de Faoro (1958) fundamenta as origens do Estado patrimonialista e a supremacia das oligarquias sobre outros grupos de intermediação política. Carvalho (1968), Cintra (1971 e 1974), Cruz (1959), Carvalho Franco (1997), Graham (1997) Dillon Soares ( 1974), Hagopian (1986), Dulci (1986) e Canedo (1993) são, entre outros, estudiosos da persistência destas elites. O mesmo tema, sob o enfoque das dificuldades da institucionalização do poder ou do state-building no Brasil, nos é apresentado por Reis (1974). O autor leva em conta os estágios no processo de desenvolvimento político, ponto de referência para a discussão de problemas concretos, no panorama político da atualidade.

O enfoque aqui adotado é simples. Indagamos, em primeiro lugar, se há espaços mais favoráveis à continuidade de determinados partidos marcadamente tradicionais, e oligárquicos; segundo, se esses espaços têm a ver com o nível de desenvolvimento das respectivas regiões. Recorremos à geografia política, ao relacionar algumas condições estruturais, como o porte e a qualidade de moradia dos municípios, com a maior influência de algumas forças políticas nesses espaços4 4 NOTA METODOLÓGICA: Os dados utilizados neste trabalho têm fontes diversas: os dados sobre as eleições municipais brasileiras foram retirados dos registros do Tribunal Superior Eleitoral. No caso de alianças políticas, tomou-se como vitorioso o partido que forneceu o candidato a prefeito. Os dados sobre o porte e qualidade dos municípios foram retirados de um arquivo do Censo de 1991 do Instituto Brasileiro de Geografía e Estatística. As informações sobre os índices diferenciados de desenvolvimento - índice de Desenvolvimento Humano - para cada estado brasileiro foram retiradas do Relatório sobre Desenvolvimento Humano do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD/IPEA), 1996. As decisões metodológicas serão apresentadas no decorrer do texto. Justificamos a não utilização dos dados das eleições municipais de 1992 pela dificuldade do acesso aos mesmos em meios magnéticos - um enfoque que se inscreve no âmbito dos estudos da geografia eleitoral ou das análises ecológico-estruturais.

GEOGRAFIA POLÍTICA E ANÁLISE POLÍTICA

Os estudos que se utilizam da geografia político-eleitoral têm origens remotas. Assim nos mostram Linz et al.(1981) para a Espanha o fato de que já em 1913 André Siegfried escrevia uma obra clássica: Tableau de Politique de la France de l'Ouest sous la 111 Republique. Seguindo esta orientação, Rudolf Heberle escreveu uma das mais importantes obras para a compreensão do nazismo rural (1918-1932). Em seu exílio americano, promoveu vários estudos como o de Louisiana (1812-1952). Nos Estados Unidos seus seguidores foram muitos, mas destacam-se, entre eles, o trabalho de Harold Gosnell Grass Roots Politics: National Voting Behavior of Typical States (1942). A partir de então, multiplicaram-se os trabalhos, entre os quais destacaríamos os de Stuart Rice, O. Key, Stein Rokkan e David McKay5 5 Linz, Juán et al.. Atlas Electoral del País Vasco y Navarro. Madrid. Centro de Investigaciones Sociológicas, 1981. Este trabalho nos brinda com uma valiosa bibliografía, em que destacamos: Sigfried, André. Tableau de Politique de la France de l'Questt sous la III Republique. Paris. Armand- Collin, 1964, Heberle, Rudolf. Landbevölkerung und National Sozialismus. Eine soziologisclie Untersuchung der Politischen Willenshildung in Schlewig-Holstein, 1918-1932. Sttugart. Deutsche Verlags-Anstalt, 1963. Rice, Stuart. Farmers and Workers in American Politics: National Voting Behaviour of Typical States. Washington. American Council of Public Affairs, 1942; V. O. Key, Jr.. Southern Politics in State and Nation. New York. Knopf, 1949. .

Nestes estudos encontramos claras referências à influência das características estruturais, aliadas às especificidade históricas, no entendimento da política regional e municipal. Regiões, situação geográfica, porte dos municípios, são dimensões cruciais na configuração do perfil das elites políticas regionais e locais, assim como as orientações e preferências do eleitorado, quando queremos, além de investigar as continuidades políticas históricas e as descontinuidades em algumas regiões, fundamentar cogitações relativas à fortuna dos partidos no tempo e no espaço, seus avanços e retrocessos, sua força no âmbito local e no centro político nacional. Se a sociologia eleitoral analisa as preferências do eleitor conforme a sua posição social utilizando-se do conjunto das variáveis de background, as informações sobre o contexto ecológico do eleitor alargam o âmbito de interpretação, permitindo-nos identificar um grande número de dados que nenhum survey nacional por amostragem jamais nos permitiria obter. (Linz, 1969)6 6 Linz, Juan. "Ecological Analysis and Survey Research", in Dogan, Mattei and Rokkan, Stein (ed.) Quantitative Ecological Analysis in the Social Sciences. The MIT Press, 1969. Neste trabalho encontra-se valiosa bibliografia sobre geografia eleitoral e análise política sob o enfoque ecológico-estrutural. . Ainda segundo Linz, os dados ecológicos adquirem relevância particular para estudos no campo do desenvolvimento social e político, permitindo investigar as razões pelas quais algumas forças políticas dominam algumas partes do país enquanto outras se deslocam ou são absorvidas por novos movimentos e partidos.

No Brasil alguns memoráveis estudos buscaram a correlação entre contextos locais e resultados eleitorais. Faria (1976), estudando o município de São Paulo, o maior colégio eleitoral municipal do país, relacionou variáveis como a participação de mulheres na população economicamente ativa, a proporção de domicílios com luz elétrica e a proporção de pessoas vivendo em área rural, com o modo como os eleitores votaram em uma das eleições do período autoritário, se favoravelmente ao regime ou preferindo os candidatos da oposição. Lamounier (1978) buscou a tendência eleitoral nos bairros "aristocráticos" ou "periféricos". Lamounier e Marques (1994) analisaram os ganhos dos partidos políticos, classificados conforme suas tendências ideológicas, nas várias regiões do país. Martins Rodrigues (1995) refere-se à morfología do sistema partidário brasileiro em relação à eleições legislativas. Fleischer (1996) faz uma recuperação dos ganhos eleitorais, no âmbito local, em eleições sucessivas e nos vários sistemas de partidos, levando em conta os contextos regionais7 7 Na bibliografia brasileira os trabalhos principais são, entre outros: Faria, Vilmar. As eleições de 1974 no Estado de São Paulo: uma análise das variações inter-regionais; Lamounier, Bolivar. "Comportamento eleitoral em São Paulo: passado e presente", in Cardoso, F.H., Lamounier, B. Os Partidos e as eleições no Brasil. Paz e Terra, 1978. Reis, F.W. Os partidos e o regime. São Paulo. Brasiliense, 198. Marques Novaes, CA. "A geografia do voto em São Paulo". Novos Estudos Cebrap. n° 45, julho, 1996. .

Aprofundando a questão regional e relacionando-a com classes sociais, Reis e Castro (1992)8 8 Reis, Fábio Wanderley e Castro, Mônica Mata Machado de. "Região, classe e ideologia no processo eleitoral brasileiro". Lua Nova, n.o 26, 1992. adotaram um esquema interpretativo, considerando simultaneamente os modelos de "centralidade" e de "consciência de classe" e uma interação entre os dois modelos, para explicar a profunda diferenciação social e política do eleitorado brasileiro. O conceito de centralidade, referindo-se tanto às dimensões contextuais quanto às sociais, aliado ao conceito de consciência de classe, permitiriam indicar tendências eleitorais mais ou menos estáveis no âmbito das unidades geoadministrativas. A conclusão a que chegam os autores, entres outras, refere-se à peculiar condição do eleitor dos estratos populares, que constitui a grande maioria numérica no país. Ele está muito longe de ser um modelo de autonomia, lucidez e informação, apresentando imagens de pouca sofisticação cognitiva e ideológica, sujeitas a perturbações circunstanciais. Segundo os referidos autores, "há uma combinação especial de fluidez e consistência, baseadas em imagens toscas de partidos e candidatos". Os eleitores de mais alto status socioeconômico e de maiores posições de centralidade, que são uma minoria numérica, apresentam condições muito mais favoráveis de construção de um universo cognitivo, integrando issues, o que lhes possibilita elaborar o diagnóstico da situação política do momento. Têm preferências, fazem escolhas, passam a reagir seletivamente e se orientam consoante objetivos de longo prazo. Esse estudo é parte de uma série de surveys eleitorais realizados nas duas últimas décadas, apontando mudanças de orientação do eleitorado com impacto sobre o perfil das elites, mas também dando conta de que eleitores de regiões mais periféricas, pelas condições de vida, acabam reafirmando as antigas estruturas o poder político tradicional.

Nesta mesma linha de trabalho, Baquero (1994, 1997) chama a atenção para formas emergentes de comportamento eleitoral em municípios dos estados do extremo Sul, nas regiões mais desenvolvidas do país. Conclui que com a melhoria da qualidade de vida o alinhamento político-partidário também se alterou, tendo os eleitores preferido, em eleições sucessivas, propostas partidárias com capacidade gerencial de resolver os problemas administrativos locais essenciais.

O que fica claro nos estudos citados é que as realidades são muito distintas e os eleitores muito diferenciados tanto do ponto de vista regional quanto social. Essas diferenciações acabam se refletindo na estrutura atual do poder político, o que reafirma a importância das análises ecológicas, tal como fizeram os autores anteriormente citados ao identificar regiões e contextos, procurando estabelecer alguma correspondência com a estrutura do poder político. Serão significativas as mudanças na base do poder político tradicional? Se forem, podemos identificar características mais favoráveis a elas?

Com estas questões em mente e centrando nos resultados de eleições municipais como a base por excelência do poder político que se estrutura a partir de "periferias", procuramos investigar, em primeiro lugar, a maior influência de alguns partidos, tomando o porte e o desenvolvimento dos municípios; em seguida, tomando a inserção das localidades nas regiões classificas conforme o índice de Desenvolvimento Humano, procurando identificar quais as regiões de maior competição interpartidária, ou seja, aquelas em que estão presentes forças políticas de origem distintas e representando numerosos segmentos sociais, diferentemente daquelas regiões nas quais se observa dominação do tipo tradicional (Dahl, 1971).

PESO PARTIDÁRIO, PORTE E QUALIDADE DO MUNICÍPIO

A primeira preocupação foi configurar espaços que se definiriam pela combinação entre porte e desenvolvimento dos municípios brasileiros9 9 O critério utilizado para a classificação do porte dos municípios foi o seguinte: micro município seria quele com menos de 10 mil habitantes; município pequeno, encontramos entre 10 mil e 19.999 habitantes, médio, entre 20 mil e 99.999 habitantes, e grande, com 100 mil ou mais habitantes. Observar que o número de habitantes não guarda relação com a área do município. Quanto à qualidade de moradia dos municipios, há inúmeras maneiras de se avaliar esta dimensão. Os dados foram tirados de arquivo do Censo de 1991, do IBGE, onde constavam o número de dormitórios e o número de moradores para cada município, propriciando, assim, o cálculo do índice utilizado. A classificação foi dada por meio de quartis (ou tercis), ou seja, um número igual de municípios para cada quartil ( ou tercis), obtendo-se o número de moradores por quarto de dormir. Foram considerados municípios de qualidade boa aqueles nos quais vivem, em méia, de 1,0 a 1,19 moradores oor quarto de dormir; municípios de qualidade média, aqueles nos quais vivem de 1,2 a 2,59 moradores por quarto de dormir, e de qualidade ruim, aqueles nos quais vivem 2,6 ou mais moradores por quarto de dormir. A análise de variância mostrou que há diferenças significativas entre os três grupos e que a medida diferencia os municípios. , perguntando-nos se seria possível encontrar uma lógica na disputa do poder municipal se incursionássemos nestes espaços. Se o grosso do eleitorado brasileiro não se encontra mais nas áreas rurais, dado o espetacular movimento migratório das últimas três décadas, é ainda grande o número de municípios muitos pequenos que perpetuam a intermediação política do tipo tradicional10 10 Os estudos sobre poder local e clientelismo tratam amplamente do tema, apontando a dependência política da população aos chefes locais que perpetuam a dependência financeira dos municípios de qualidade pior e os menores. Os estudos, além dos já citados: Nunes Leal (1949); Duarte, Nestor (1956); Rebello Horta, Cid (1955); Faoro (1958); Carvalho (1968); Barbosa (1963); Cintra (1971 e 1974) Reis (1974), Elisa Reis (1980), Jaguaribe (1950), Carone (1978), Skidmore (1968), e os estudos publicados na Revista Brasileira de Estudos Políticos, dirigida por Orlando Carvalho, com valiosos estudos de casos. Ver Schwartzman (1982), Diniz (1984), O'Donnell (1994), Abruccio e Ferreira (1998), Chilcote (1990), Graham (1997). Sobre clientelismo político, a literatura é extensa. Ver, mas, entre outros: Eisenstadt e Roniger (1980), Clapham (1982), Eisenstadt e Lemarchand (1981) Rouquié (1978), O'Donnell (1988), Graziano (1983). O artigo de Jonathan Fox (1994), oferece uma revisão da bibliografia sobre clientelismo político. . Se vários trabalhos nos informam sobre as importantes mudanças políticas ocorridas após ciclos de desenvolvimento nas cidades do interior, particularmente nas "cidades médias", outros trabalhos nos informam sobre a continuidade e resistência do poder local diante destas mudanças (Cintra, op. cit. p. 88)11 11 Ver especialmente os trabalhos de Lamounier para Presidente Prudente (SP), 1976; de Reis para Juiz de Fora (MG), 1976. . Na literatura jornalística do país o tema é recorrente, quase sempre informando sobre a força política dos grupos locais, com acentuada representação no centro político, mas cuja força é originária dos municípios de pequeno porte12 12 Em edição de outubro de 1996, a revista Carta Capital publicou uma ampla matéria de autoria do repórter Bob Fernandes e do fotógrafo Luciano Andrade. Sob o título de Os Donos do Poder, valendo-se do trabalho pioneiro de Raymundo Faoro, 1958, os autores mostram as várias famílias de numerosas regiões do país que controlam o poder a partir de municípios menores, tirando daí a sua força política e eleitoral para a representação no centro político nacional. Em outra publicação, de Lamounier & Nohlen (1993), um dos participantes dos debates organizados pelos referidos autores usa a expressão "vereadores federais" para resumir esta função de intermediação dos chefes locais no plano federal . é também cruciai, segundo a literatura, considerar a dimensão qualidade de moradia dos municípios: haveria ruptura do poder tradicional quando ocorresse desenvolvimento municipal, com a emergência de lideranças de origens distintas disputando o poder? (Sampaio, 1960; Cintra, op. cit. p.101).

Ao final, o recurso do qual nos utilizamos consistiu no seguinte. Em primeiro lugar, verificamos quantos municípios no país incluíam-se em cada uma das três categorias da dimensão qualidade dos municípios no país - boa, média ou ruim - , e quantos nas categorias da dimensão porte dos municípios - micro, pequeno, médio ou grande. Na combinação dessas dimensões encontramos a seguinte distribuição.

A esta distribuição denominamos padrão Brasil. A partir dela, calculamos, para os partidos que alcançaram votação acima de 2% dos votos válidos nas eleições municipais de 1996:

1) qual a sua respectiva distribuição neste espaço, ou seja, quantas prefeituras conquistou em cada uma das células acima;

2) o percentual de prefeituras que cada partido conquistou nessa combinação;

3) partindo das duas medidas anteriores realizamos o cálculo do delta percentual, ou seja, a distância que cada partido alcançou em relação ao padrão Brasil

A leitura dessa medida estatística deve ser feita do seguinte modo: um delta percentual positivo nos permite saber o quanto aquele partido conquistou mais prefeituras nas células correspondentes às várias combinações de porte x qualidade dos municípios, se comparado à média brasileira. O delta percentual negativo indica o quanto o partido conquistou menos prefeituras, se comparado com a média obtida pelo padrão Brasil.

4) Os partidos políticos foram agrupados conforme a sua tendência ideológica, do seguinte modo. Consideramos como partidos de direita o Partido da Frente Liberal - PFL, o principal dentre todos desta tendência e que nessa eleição municipal de 1996 conquistou 17,2 % dos votos; o Partido Liberal -PL, um desdobramento do PFL, com 2,5% dos votos, e o Partido Progressista Brasileiro - PPB, que obteve 18% dos votos, devido à eleição do prefeito do município de São Paulo; o Partido Trabalhista Brasileiro - PTB; outros partidos menores também foram incluídos nesta tendência, como o PSD, o PRP, o PSC, que juntos fizeram 2,6% dos votos.

Os partidos de centro foram o Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB, herdeiro da oposição ao regime militar que promoveu a transição política mas que, nos últimos anos da abertura política, curvou-se ao fisiologismo político. Sua importância no âmbito municipal é incontestável. Nestas eleições obteve 16,8 % dos votos. E, também, o Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB, resultante de uma cisão na cúpula do PMDB na era pós-autoritária, com enorme crescimento nessas eleições, alcançando 15,9% dos votos.

Como partidos de esquerda foram considerados o Partido dos Trabalhadores - PT, constituído a partir dos movimentos sociais dos anos 70 (5,1% dos votos); o Partido Democrático Trabalhista - PDT, partido fortemente ligado à liderança de Leonel Brizola, antigo líder socialista do país, com 9,4% dos votos e o Partido Socialista Brasileiro - PSB, ligado à liderança de outro líder socialista, Miguel Arraes, com 5,6% dos votos (ver Lamounier e Marques, 1990; Figueiredo e Limongi, 1995).

As tabelas abaixo nos informam sobre as áreas de influência dos principais partidos políticos, na configuração obtida pelo cruzamento entre o porte e a qualidade dos municípios.

As tabelas nos permitem chegar a algumas conclusões. 13 13 As tabelas do PTB e do PTB não foram incluídas no texto, mas uma análise dos resultados mostra que em ambos os casos, não existe um padrão subjacente de onde estes partidos retirarem sua força eleitoral. Analisando em primeiro lugar os partidos de direita, iniciando pelo PFL, concluímos o seguinte: este partido apresentou delta percentual positivo, nos municípios de porte micro, pequeno e grande de qualidade ruim, e nos micro e pequenos de qualidade média. Ou seja, ele conquistou um percentual de prefeituras acima da média brasileira, nos municípios desta condição - os menores e os piores. Apresentou delta percentual negativo, ou seja, teve menores resultados, abaixo do padrão Brasil, nos municípios de qualidade boa, seja qual for o seu porte. Interessante observar que a distribuição observada para o PL é próxima a do PFL, o que nos leva a cogitar sobre a continuidade da disputa de forças políticas da mesma origem nos municípios de menor centralidade (um enfoque pouco privilegiado na literatura como o dos conflitos intra-elites e influência sobre o número de partidos). Já o PPB é influente nos municípios de qualidade boa, seja qual for o seu porte, como mostram as vitórias no Estado de São Paulo em Santos, Campinas, Guarulhos e Bauru. Como se pode depreender, as siglas da direita têm destacada importância em todos os espaços geográficos.

Quanto às siglas do centro, o PMDB teve melhor desempenho nos municípios pequenos e médios de qualidade boa, conforme nos indica o delta percentual positivo, dividindo com a direita o poder político municipal nas localidades de menor população. O PSDB cresceu indistintamente em variadas condições de municípios, sem um padrão ao qual se possa fazer especial referência, mas destacando-se nos municípios de grande porte e qualidade média.

A esquerda, representada pelo PT, prevalece (delta positivo) nos municípios de porte médio e grande, independentemente da qualidade destes. é um partido de grandes centros urbanos. Em contrapartida, está abaixo do padrão Brasil entre os micro e pequenos municípios. O PSB, por sua vez, prevalece nos municípios de qualidade média e ruim entre aqueles de porte pequeno, médio e grande. Como se sabe, estes casos ocorrem nas regiões de menor desenvolvimento, nas quais disputa com as siglas da direita e com o PMDB o poder municipal em alguns municípios.

Quais as conclusões a se tirar destes dados ?

A primeira delas é que há uma clara continuidade das forças político-oligárquicas nos municípios menores e piores, representada pela maior importância do PFL nos municípios com estas características, reforçada pelas siglas da mesma tendência, como o PL. Melhorando a condição dos municípios o destaque maior é o PPB ou do PMDB, ou seja, o centro disputa poder nos mesmos espaços dos partidos cuja origem é a do poder oligárquico tradicional.

As razões para tal divisão são numerosas. Mas, a título de ilustração, citaríamos um estudo realizado em 1982, que mostrava, para algumas localidades quase rurais que, na substituição da liderança do coronel pela dos militares, estes, perpetuando então a relação patrão/cliente, levavam às populações os bens que anteriormente eram negociados pelos líderes tradicionais (Graças Rua, 1982). Outras vezes, "o próprio governo federal oferece incentivos às forças de oposição, provocando a queda das oligarquias", como observa Cintra. Nos anos militares, foi comum observar a mudança dos chefes locais, mesmo que tradicionalmente herdeiros dos PRs, PSD ou UDN, para o MDB, com o objetivo de conseguirem acesso aos recursos do Estado (Hagopian, op. cit.). O que os estudos mostram é que nem sempre a divisão da influência dos partidos entre o centro e a direita significa um eixo de mudança política.

Também podemos cogitar sobre as razões de o PT ter a sua maior influência nos maiores centros urbanos. Keck (1992) deixa claro em seu estudo a vocação desse partido, desde a sua fundação, para ser a expressão dos interesses da classe trabalhadora urbana, desde os operários manuais à elite intelectual profissional. Estruturou novas identidades políticas e diferenciou-se substantivamente daqueles da política tradicional, ao tornar-se um pólo de recepção de interesses da não-elite, organizados através da política da sociedade organizada, fora do acesso aos recursos controlados pelo Estado. Em estudos como os de César (1996) e Meneguello (1988), há clara ênfase no fato de que o PT articulou um novo bloco social e político, diferente da política tradicional brasileira.

Em segundo lugar, ocorreu, com o desenvolvimento do país e a diferenciação entre as classes, a perda do monopólio da mediação política pelos canais tradicionais. Se os partidos populistas foram os primeiros herdeiros desta mudança, ocorreu em seguida o surgimento de solidariedade horizontais e da organização política construída a partir de interesses coletivos e ação solidária (Pizzorno, 1966). Não é sem razão que o espaço político-geográfico desse partido de esquerda seja o dos municípios de maior porte, já que é aí que se estruturam novas identidades políticas de maneira autônoma na luta pelos bens coletivos. Dificilmente isto ocorre nas localidades pequenas, nas quais não é difícil o controle do eleitorado, controle feito tanto pelos recursos clientelísticos quanto semiclientelísticos, com recursos do Estado. Este tema tem sido amplamente estudado, inclusive sob o enfoque das dificuldades de transição do clientelismo para a cidadania (Fox, 1994).

A análise propiciada pelo delta percentual nos instigou no sentido de avançarmos no estudo da relação entre os espaços geográfico-políticos e os resultados de eleições municipais. Decidimos então pesquisar, através de uma medida do desenvolvimento social, o índice de Desenvolvimento Humano, a relação porventura existente entre desenvolvimento e poder político. O IDH, diferenciando estados e regiões do país, nos permite olhar a influência dos partidos políticos nas várias regiões classificadas conforme o desenvolvimento atingido.

A DIFERENCIAÇÃO INTERREGIONAL

Nos anos 50, o cientista social francês Jacques Lambert tornou-se muito conhecido no meio acadêmico brasileiro ao publicar obra que se tornaria fonte obrigatória de referência quando se tratava de analisar as enormes desigualdades econômicas e sociais do país. A obra, traduzida com o sugestivo título Os dois brasis, apontava, com rara sensibilidade, as diferenças regionais, quando o processo de industrialização se encontrava ainda em suas primeiras fases. Sua análise, como a maioria das que se seguiram sobre as diferenças regionais no Brasil, tomava as divisões político-administrativas como referência, sendo Sul e Sudeste as regiões mais desenvolvidas, em contraste com as regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste.

As diferenças inter e intra-regionais atuais são expressas hoje de modo muito mais sensível nos cálculos do índice de Desenvolvimento Humano Municipal, calculado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Entre os vários exemplos citaríamos o do dinamismo vivido por algumas capitais dos estados nordestinos, com municípios de bons índices de desenvolvimento humano (Relatório PNUD/IPEA, 1998).

O eleitorado das regiões brasileiras é profundamente diferenciado, conforme nos mostram dados do IBGE e do IPEA. Para um total de 100.996.348 eleitores em 1996, em termos de número médio de anos de estudo, os eleitores das regiões de mais alto IDH têm 4,23 anos de estudo; os das regiões de IDH médio têm, em média, 3,02 anos de estudo; os dos estados que constituem a região de baixo IDH apresentam uma média de anos de estudo de 2,18 (Relatório PNUD/IPEA).14 14 No grande interior do país, o padrão é o de municípios muito extensos com populações rarefeitas. 15 15 Para um total de 4.360 municípios, a média encontrada foi a de 1,99 moradores por quarto para 1.655 municípios da região de mais alto IDH; de 2,15 moradores por quarto para 1.201 municípios da região de IDH médio; e a de 2,35 moradores por quarto para 1.635 municípios da região de baixo IDH. Embora esta dimensão não tenha sido incluída para os cálculos do índice de Desenvolvimento Humano - IDH, a relação encontrada foi indiscutível: os índices pioram à mediada que se passa da primeira para as outras regiões. Além disso, as condições de moradia dos municípios onde vivem os eleitores são muito distintas: a realidade do país é a de municípios muito carentes em contraste com outros de boa qualidade de vida.

Levando em conta estas diferenças, a análise apresentada anteriormente nos informou que há espaços mais favoráveis à determinação do tipo de poder do que outros, ou, pelo menos, mais favoráveis à dominação do tipo tradicional ou à emergência de focos de pluralismo. Os itens que apresentamos a seguir fazem parte de um outro conjunto de dados, que nos informam sobre como os partidos políticos governam a população e os municípios em todo o país e em cada sub-região.

Populações governadas pelos principais partidos e tendências ideológicas

A tabela abaixo nos informa sobre a força dos partidos políticos no âmbito municipal e a proporção da população governada pelos partidos, agrupados conforme suas tendências ideológicas nas eleições municipais de 1996 nas respectivas sub-regiões, classificadas conforme o IDH.

O que se pode depreender é que o PFL e o PPB, ambos partidos de direita, juntos governam cerca de 35% da população no âmbito municipal, seguidos dos dois partidos de centro, PMDB e PSDB, que, também juntos, governam 34% dessa população. Os quatro partidos governam 69% da população.

Passemos à análise do que ocorreu nas eleições de 1988 e 1996, considerando-se estados e regiões classificados conforme o IDH.

A análise anterior, na qual utilizamos o recurso do delta percentual, ganha em clareza quando olhamos o modo como as várias tendências e partidos governam a população nas sub-regiões entre 1988 e 1996. São muito altos os percentuais da direita e do centro se comparados com os alcançados pela esquerda, particularmente em 1996. Contudo, a força da direita aumenta quando se passa da região de alto IDH para as de médio e baixo IDH. Em 1988 a esquerda governava uma proporção da população muito maior do que em 1996, particularmente na região mais desenvolvida, graças ao fato de um dos seus partidos, o PT, ter ganho a prefeitura de São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, com aproximadamente 9 milhões de eleitores. Mas se é ali que a esquerda governava uma população mais significativa, é também ali que a direita recupera-se entre 1988 e 1996, firmando uma dinâmica de alternância, mesmo que devido à fluidez e volatilidade do numeroso eleitorado popular16 16 Sobre o comportamento do eleitorado popular brasileiro, ver os estudos eleitorais realizados no Brasil nas últimas três décadas e que concluem sobre a profunda clivagem social que divide os eleitores brasileiros, com conseqüências no plano político. Para uma referência inicial ver Reis (1989). . Os partidos de centro melhoram seu desempenho na região de mais alto IDH, graças às conquistas municipais do PSDB, em 1996. Embora com percentuais mais baixos, avançaram as forças de esquerda no âmbito municipal, particularmente na região de mais alto IDH, com crescimento também nas regiões de menor desenvolvimento. Contudo, fica claro que é nas regiões de maior desenvolvimento que os partidos de esquerda alcançaram maiores vitórias. Esta tendência já se manifestara nos últimos anos do período autoritário, como apontam os estudos que falam das "metrópoles oposicionistas", por referência a um padrão de voto anti-governo no período militar nas capitais dos estados brasileiros, o que teria sido um forte fator para a deslegitimação do regime. Desde então, as capitais das mais variadas regiões do país apresentam o componente de incerteza dos resultados eleitorais, o que não ocorria necessariamente em outros períodos da história.17 17 Segundo informações do Tribunal Superior Eleitoral, após as eleições de 1988, conseguiram registros os seguintes partidos: o Partido da Mobilização Nacional - PMN, o Partido Progressista Brasileiro - PPB (fusão do PPR e PP), o Partido da Reconstrução Nacional - PRN, o Partido da Reedificação da Ordem Nacional - PRONA, o Partido Republicano Progressista - PRP, o Partido Social Cristão - PSC, o Partido Social Democrático - PSD, o Partido Social Democrata Cristão - PSDC, o Partido Social Liberal - PSL, o Partido Solidarista Nacional - PSN, todos estes agremiações de tendências de direita. Entre os de centro, o Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB. Entre as agremiações que reivindicam o rótulo de trabalhista , o Partido Social Trabalhista - PST, o Partido Social dos Trabalhadores Unificados - PSTU, o Partido Trabalhista do Brasil - PT do B, o Partido Trabalhista Nacional - PTN, além do Partido Popular Socialista - PPS (antigo Partido Comunista do Brasil) e do Partido Verde - PV. Um partido com registro provisório é o Partido dos Aposentados da Nação, PAN. Ver trabalho de Jairo Nicolau, 1996. . Além disso, como vimos na análise dos espaços favoráveis ao florescimento de partidos de tendências distintas, a esquerda, mais particularmente o PT, é o partido dos municípios de maior porte, razão pela qual também se observa seu crescimento nos municípios de mais altos índices de Desenvolvimento Humano.

Maior número de prefeituras no país e em cada sub-região.

Neste bloco apresentamos dois tipos de dados: o número de prefeituras que cada partido conquistou nas eleições de 1996, em ordem decrescente, e o número de prefeituras conquistadas pelos partidos e tendências ideológicas em cada uma das regiões classificadas conforme o IDH.

Na tabela 5 podemos ver que PMDB, se não é o primeiro na lista dos que governam a população brasileira, é o que conquistou o maior número de prefeituras em todo o país, seguido pelo PFL e PSDB, sendo estes partidos os fulcros da aliança política que conduziu Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República.

Apresentamos, em seguida, os dados apresentados na tabela 6, que nos informam sobre o número de prefeituras obtidas pelos partidos e tendências ideológicas nas eleições de 1988 e 1996, em cada sub-região.

Os dados acima nos informam, antes de tudo, sobre a influência das forças de direita e do centro nas regiões de menor IDH, mais do que na região de alto IDH, dado o avanço do centro representado pelo PSDB nessa sub-região muito mais do que nas outras. O PFL é o principal partido da direita, e tanto conquista mais prefeituras quanto passa das regiões mais desenvolvidas para as menos desenvolvidas. Quando perde, isto ocorre por duas razões: a primeira, porque a fragmentação partidária é muito maior entre as siglas que compõem as forças da direita, tal como podemos ver pelas informações do registro de partidos nos últimos anos; a segunda, porque o PSDB vai conquistando espaços nas mesmas áreas de influência.18 18 A mudança de partidos pelos chetes locais é amplamente conhecida. No geral, eles tendem a seguir o partido atual tanto no govemo do estado quanto no governo federal, de modo a conseguir verbas para os municípios. Hagopian (1996), estudando o caso do Estado de Minas gerais, observa que, em 1982, no período da transição política, quando os governadores dos estados são novamente eleitos e vencem, na grande maioria, os filiados ao PMDB, o partido de oposição aos militares, 200 prefeitos mineiros do PDS, partido governista, mudam para o PMDB, da noite para o dia. é o realinhamento das elites locais ao longo das tendências que as irão beneficiar em termos do acesso aos recursos do Estado, em troca do apoio político local. é muito importante observar que as forças políticas da direita perderam em todas as sub-regiões entre essas duas eleições.

Outro dado que atrai a nossa atenção é que o PMDB é o partido dos estados que se encontram mais na região de médio IDH em 1988 do que em 1996, quando também ali, naquela sub-região, avança impresssio-nantemente o PSDB. Esta clara alternância e volatidade entre as forças de centro é, talvez, um dos focos mais interessantes de análise.19 19 Ver, também, Leão de Andrade, Elza Araújo. Políticas e poder: os mecanismos de implementação de políticas públicas e o fortalecimento de novas elites políticas no Nordeste. Tese de Doutorado. IFCH. Unicamp. 1994. Quanto às forças de esquerda, elas ganham mais prefeituras nos municípios dos estados da primeira sub-região, particularmente o PT e o PDT, enquanto o PSB vai avançando nas prefeituras da região de menor IDH. é incontestável o crescimento dos partidos de esquerda no âmbito municipal, como foi reiteradamente observado; mas isto se dá em um contexto de lentas mudanças políticas, reafirmando nossa tese de que há um hiato entre as mudanças econômicas e as políticas, as mudanças políticas ocorrendo em ritmo muito mais lento.

Destaque dos partidos conforme o porte dos municípios

Se há espaços mais favoráveis ao florescimento dos diferentes partidos e tendências ideológicas, cabe investigar a distribuição do poder político municipal, conforme o porte dos municípios.

Na região de mais alto IDH (tabela 7), são as forças do centro, o PMDB e o PSDB, os partidos que governam a maioria da população dos municípios, do seguinte modo: o PMDB tem maior força quanto menor o porte dos municípios, e o PSDB, ao que tudo indica, cresceu indistintamente do porte. Os dados também mostram que as siglas da direita nessas eleições tiveram melhor desempenho nos municípios grandes, em parte por causa do peso da população do município de São Paulo, em que o partido vitorioso foi o PPB. Assim, também pode-se ver que, se o PFL é mais forte nos municípios menores, o PPB o é nos municípios maiores. As outras siglas da direita têm maior destaque nos micro e pequenos municípios. Já a esquerda, no conjunto, governa proporcionalmente às populações dos municípios maiores, como já vimos. Contudo, este é o caso do PT, pois o PSB é quase inexistente nos municípios dessa sub-região do país, ao passo que o PDT tem a sua força em qualquer que seja o porte dos municípios. é uma conclusão que nos abre a possibilidade de uma leitura sobre as especificidade dos partidos de tendência à esquerda no âmbito do fragmentado quadro partidário brasileiro.

Já na região representado por IDH médio, entre 07, e 0,8, os percentuais acusam que tanto as siglas da direita quanto do centro aumentam sua força particularmente nos municípios maiores.

Nesta sub-região, tanto o PFL quanto o PMDB disputam o poder nos micromunicípios, bem como nos pequenos e médios. Já a esquerda, com percentuais pequenos, só tem melhor desempenho quando aumenta o tamanho dos municípios. Exatamente a mesma relação pode ser encontrada na terceira sub-região.

Também se destaca a proeminência do PFL e do PMDB, verdadeiros pólos da disputa de poder no âmbito municipal. A esquerda, principalmente o PT e o PSB, crescem com o tamanho das localidades. Se à análise acrescentamos a "qualidade dos municípios", dimensão fortemente associada com o índice de Desenvolvimento Humano, apenas reafirmamos o já visto antes: a direita, de um modo geral, tem melhor desempenho nos municípios de qualidade pior e nas regiões de menor desenvolvimento.

Estes resultados nos conduzem, sumariamente, à discussão sobre a política tradicional e os mecanismos de perpetuação do poder oligárquico, já amplamente mencionados no texto, naquilo que confirma estudos anteriores.

FOCOS DE CONTINUIDADE E DE MUDANÇA

O plano de análise adotado sugere futuras investigações empíricas sobre o estágio atual das forças políticas tradicionais no âmbito municipal. As pesquisas devem levar em conta o modo como as forças políticas tradicionais utilizam-se das siglas partidárias como cinturões de transmissão de interesses a partir da manipulação clientelística ou semi-clientelística do eleitorado que habita os municípios muito pequenos, particularmente nas regiões de menor desenvolvimento e cuja estrutura social é pouco diferenciada, com níveis baixos de desenvolvimento social. Condições estas que, entre outras, possibilitam a continuidade do poder oligárquico. Tal como nos mostram Linz e Miguel (1981), em um estudo sobre as Oito Espanhas, citando Hirschman (1958), destacam o fato de que "as regiões mais pobres do país, nas quais as carreiras na indústria e no comércio não se apresentam como promissoras, frequentemente produzem, por esta razão, um grande número de político bem sucedidos na área governamental". Seja por não apresentar alternativas à novas gerações, seja por razões de continuidade do poder político familiar, só recentemente nas chamadas regiões "periféricas" é que se observam mudanças no recrutamento e no perfil das elites políticas, tal como recente estudo nos mostra.

Também no caso brasileiro o estudo sugere que o sucesso das lideranças de origem local, com seus desdobramentos para o centro nacional, deve-se à continuidade das forças políticas tradicionais no âmbito municipal, particularmente nas regiões de menor desenvolvimento e nos municípios de menor porte. A modernização política é, então, muito lenta. Os municípios continuam se desmembrando, como um dos recursos das elites tradicionais para manter o eleitorado sob lideranças de tipo clientelístico, retardando a passagem (difícil) para a cidadania. Para as próximas eleições de 2000 quanta mudança pode ser esperada sem a expansão da organização política fundada em focos coletivos de interesse, que incrementa a consciência dos direitos sociais e políticos da população, e com os eleitorados socialmente dependentes e que não têm outra opção senão a do imediatismo político? Nisso a estratégia clientelística é eficiente e assegura a sobrevivência do poder tradicional, uma sobrevivência testada até mesmo quando o país passa por regimes políticos distintos.

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  • * Este trabalho contou com a colaboraçăo de Gisela de Avellar, da Empresa Brasileira de Pesquisa em Agricultura - Embrapa, no que tange ŕ organizaçăo das tabelas. Somos gratos aos professores Antônio Octavio Cintra e Fábio Wanderley Reis pela leitura e comentários ao texto. Agradecemos, também, ao parecerista desta revista pela leitura cuidadosa e importantes sugestőes. Outra versăo do texto foi publicada pela Revista Brasiliense de Política Comparada, vol. III, número 1, julho de 1999.
  • 5 Linz, Juán et al.. Atlas Electoral del País Vasco y Navarro. Madrid. Centro de Investigaciones Sociológicas, 1981.
  • Este trabalho nos brinda com uma valiosa bibliografía, em que destacamos: Sigfried, André. Tableau de Politique de la France de l'Questt sous la III Republique. Paris. Armand- Collin, 1964,
  • Heberle, Rudolf. Landbevölkerung und National Sozialismus. Eine soziologisclie Untersuchung der Politischen Willenshildung in Schlewig-Holstein, 1918-1932. Sttugart. Deutsche Verlags-Anstalt, 1963.
  • Rice, Stuart. Farmers and Workers in American Politics: National Voting Behaviour of Typical States. Washington. American Council of Public Affairs, 1942;
  • V. O. Key, Jr.. Southern Politics in State and Nation. New York. Knopf, 1949.
  • 6 Linz, Juan. "Ecological Analysis and Survey Research", in Dogan, Mattei and Rokkan, Stein (ed.) Quantitative Ecological Analysis in the Social Sciences. The MIT Press, 1969.
  • 7 Na bibliografia brasileira os trabalhos principais săo, entre outros: Faria, Vilmar. As eleiçőes de 1974 no Estado de Săo Paulo: uma análise das variaçőes inter-regionais;
  • Lamounier, Bolivar. "Comportamento eleitoral em Săo Paulo: passado e presente", in Cardoso, F.H., Lamounier, B. Os Partidos e as eleiçőes no Brasil. Paz e Terra, 1978.
  • Reis, F.W. Os partidos e o regime. Săo Paulo. Brasiliense, 198.
  • Marques Novaes, CA. "A geografia do voto em Săo Paulo". Novos Estudos Cebrap. n° 45, julho, 1996.
  • 8 Reis, Fábio Wanderley e Castro, Mônica Mata Machado de. "Regiăo, classe e ideologia no processo eleitoral brasileiro". Lua Nova, n.o 26, 1992.
  • 19 Ver, também, Leão de Andrade, Elza Araújo. Políticas e poder: os mecanismos de implementação de políticas públicas e o fortalecimento de novas elites políticas no Nordeste. Tese de Doutorado. IFCH. Unicamp. 1994.
  • *
    Este trabalho contou com a colaboração de Gisela de Avellar, da Empresa Brasileira de Pesquisa em Agricultura - Embrapa, no que tange à organização das tabelas. Somos gratos aos professores Antônio Octavio Cintra e Fábio Wanderley Reis pela leitura e comentários ao texto. Agradecemos, também, ao parecerista desta revista pela leitura cuidadosa e importantes sugestões. Outra versão do texto foi publicada pela
    Revista Brasiliense de Política Comparada, vol. III, número 1, julho de 1999.
  • 1
    Esta é uma questão reiteradamente tratada na literatura da ciência política no Brasil. Tal como veremos nas indicações bibliográficas seguintes, um dos maiores desafios à análise política é a identificação da variedade dos arranjos políticos no país de correntes da história de um poder local que se estruturou a partir da propriedade da terra. Para uma indicação inicial, ver Cintra, 1971 e 1974. No trabalho de 1974 o autor oferece importante literatura sobre estudos de poder local. Ver, também, o trabalho de Carone, 1972, sobre "Oligarquias: definição e bibliografia". O trabalho de Robert Putnam ( 1993) sobre a Itália, tornou-se importante referência. Os temas do poder tradicional, do clientelismo político e das análises ecológico-estruturais são o fulcro das indicações bibliográficas.
  • 2
    Os trabalhos sobre a aristocracia prussiana, que sobreviveu a enormes crises e reformas da terra, ou sobre
    os Junker, tal como nos mostra Gerschenkron (1962) atestam sobre a sua capacidade de sobrevivência. Assim, também, os estudos de Moore (1966), sobre a aristocracia rural nos Estados Unidos. Linz (1975) discutindo regimes autoritários ( 1975), mostra como também a política tradicional é desmobilizadora e não-ideológica.
  • 3
    Os estudos que se tomaram referências obrigatórias são os de Nunes Leal (1949) e Faoro (1958). Uma pesquisa na literatura nos leva também a Prado (1967), Duarte (1966), Costa Pinto (1949), Brandão Lopes (1967), Oliveira Vianna (1955), Pereira de Queiroz (1956), Soares, 1974, Schwartzman (1988), Carvalho (1968), Carvalho Franco (1998). Sobre as rivalidades intra-elites, um enfoque importante quando se quer estudar a proliferação de partidos de direita, o estudo inicial é o de Costa Pinto (1949).
  • 4
    NOTA METODOLÓGICA: Os dados utilizados neste trabalho têm fontes diversas: os dados sobre as eleições municipais brasileiras foram retirados dos registros do Tribunal Superior Eleitoral. No caso de alianças políticas, tomou-se como vitorioso o partido que forneceu o candidato a prefeito. Os dados sobre o porte e qualidade dos municípios foram retirados de um arquivo do Censo de 1991 do Instituto Brasileiro de Geografía e Estatística. As informações sobre os índices diferenciados de desenvolvimento - índice de Desenvolvimento Humano - para cada estado brasileiro foram retiradas do Relatório sobre Desenvolvimento Humano do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD/IPEA), 1996. As decisões metodológicas serão apresentadas no decorrer do texto. Justificamos a não utilização dos dados das eleições municipais de 1992 pela dificuldade do acesso aos mesmos em meios magnéticos
  • 5
    Linz, Juán et al..
    Atlas Electoral del País Vasco y Navarro. Madrid. Centro de Investigaciones Sociológicas, 1981. Este trabalho nos brinda com uma valiosa bibliografía, em que destacamos: Sigfried, André.
    Tableau de Politique de la France de l'Questt sous la III Republique. Paris. Armand- Collin, 1964, Heberle, Rudolf. Landbevölkerung und National Sozialismus.
    Eine soziologisclie Untersuchung der Politischen Willenshildung in Schlewig-Holstein, 1918-1932. Sttugart. Deutsche Verlags-Anstalt, 1963. Rice, Stuart.
    Farmers and
    Workers in American Politics: National Voting Behaviour of Typical States. Washington. American Council of Public Affairs, 1942; V. O. Key, Jr..
    Southern Politics in State and Nation. New York. Knopf, 1949.
  • 6
    Linz, Juan. "Ecological Analysis and Survey Research", in Dogan, Mattei and Rokkan, Stein (ed.)
    Quantitative Ecological Analysis in the Social Sciences. The MIT Press, 1969. Neste trabalho encontra-se valiosa bibliografia sobre geografia eleitoral e análise política sob o enfoque ecológico-estrutural.
  • 7
    Na bibliografia brasileira os trabalhos principais são, entre outros: Faria, Vilmar.
    As eleições de 1974 no Estado de São Paulo: uma análise das variações inter-regionais; Lamounier, Bolivar. "Comportamento eleitoral em São Paulo: passado e presente", in Cardoso, F.H., Lamounier, B.
    Os Partidos e as eleições no Brasil. Paz e Terra, 1978. Reis, F.W.
    Os partidos e o regime. São Paulo. Brasiliense, 198. Marques Novaes, CA. "A geografia do voto em São Paulo".
    Novos Estudos Cebrap. n° 45, julho, 1996.
  • 8
    Reis, Fábio Wanderley e Castro, Mônica Mata Machado de. "Região, classe e ideologia no processo eleitoral brasileiro".
    Lua Nova, n.o 26, 1992.
  • 9
    O critério utilizado para a classificação do porte dos municípios foi o seguinte:
    micro município seria quele com menos de 10 mil habitantes;
    município pequeno, encontramos entre 10 mil e 19.999 habitantes,
    médio, entre 20 mil e 99.999 habitantes, e
    grande, com 100 mil ou mais habitantes. Observar que o número de habitantes não guarda relação com a área do município. Quanto à qualidade de moradia dos municipios, há inúmeras maneiras de se avaliar esta dimensão. Os dados foram tirados de arquivo do Censo de 1991, do IBGE, onde constavam o número de dormitórios e o número de moradores para cada município, propriciando, assim, o cálculo do índice utilizado. A classificação foi dada por meio de quartis (ou tercis), ou seja, um número igual de municípios para cada quartil ( ou tercis), obtendo-se o
    número de moradores por quarto de dormir. Foram considerados municípios de qualidade boa aqueles nos quais vivem, em méia, de 1,0 a 1,19 moradores oor quarto de dormir; municípios de qualidade média, aqueles nos quais vivem de 1,2 a 2,59 moradores por quarto de dormir, e de qualidade ruim, aqueles nos quais vivem 2,6 ou mais moradores por quarto de dormir. A análise de variância mostrou que há diferenças significativas entre os três grupos e que a medida diferencia os municípios.
  • 10
    Os estudos sobre poder local e clientelismo tratam amplamente do tema, apontando a dependência política da população aos chefes locais que perpetuam a dependência financeira dos municípios de qualidade pior e os menores. Os estudos, além dos já citados: Nunes Leal (1949); Duarte, Nestor (1956); Rebello Horta, Cid (1955); Faoro (1958); Carvalho (1968); Barbosa (1963); Cintra (1971 e 1974) Reis (1974), Elisa Reis (1980), Jaguaribe (1950), Carone (1978), Skidmore (1968), e os estudos publicados na
    Revista Brasileira de Estudos Políticos, dirigida por Orlando Carvalho, com valiosos estudos de casos. Ver Schwartzman (1982), Diniz (1984), O'Donnell (1994), Abruccio e Ferreira (1998), Chilcote (1990), Graham (1997). Sobre clientelismo político, a literatura é extensa. Ver, mas, entre outros: Eisenstadt e Roniger (1980), Clapham (1982), Eisenstadt e Lemarchand (1981) Rouquié (1978), O'Donnell (1988), Graziano (1983). O artigo de Jonathan Fox (1994), oferece uma revisão da bibliografia sobre clientelismo político.
  • 11
    Ver especialmente os trabalhos de Lamounier para Presidente Prudente (SP), 1976; de Reis para Juiz de Fora (MG), 1976.
  • 12
    Em edição de outubro de 1996, a revista
    Carta Capital publicou uma ampla matéria de autoria do repórter Bob Fernandes e do fotógrafo Luciano Andrade. Sob o título de
    Os Donos do Poder, valendo-se do trabalho pioneiro de Raymundo Faoro, 1958, os autores mostram as várias famílias de numerosas regiões do país que controlam o poder a partir de municípios menores, tirando daí a sua força política e eleitoral para a representação no centro político nacional. Em outra publicação, de Lamounier & Nohlen (1993), um dos participantes dos debates organizados pelos referidos autores usa a expressão "vereadores federais" para resumir esta função de intermediação dos chefes locais no plano federal
  • 13
    As tabelas do PTB e do PTB não foram incluídas no texto, mas uma análise dos resultados mostra que em ambos os casos, não existe um padrão subjacente de onde estes partidos retirarem sua força eleitoral.
  • 14
    No grande interior do país, o padrão é o de municípios muito extensos com populações rarefeitas.
  • 15
    Para um total de 4.360 municípios, a média encontrada foi a de 1,99 moradores por quarto para 1.655 municípios da região de mais alto IDH; de 2,15 moradores por quarto para 1.201 municípios da região de IDH médio; e a de 2,35 moradores por quarto para 1.635 municípios da região de baixo IDH. Embora esta dimensão não tenha sido incluída para os cálculos do índice de Desenvolvimento Humano - IDH, a relação encontrada foi indiscutível: os índices pioram à mediada que se passa da primeira para as outras regiões.
  • 16
    Sobre o comportamento do eleitorado popular brasileiro, ver os estudos eleitorais realizados no Brasil nas últimas três décadas e que concluem sobre a profunda clivagem social que divide os eleitores brasileiros, com conseqüências no plano político. Para uma referência inicial ver Reis (1989).
  • 17
    Segundo informações do Tribunal Superior Eleitoral, após as eleições de 1988, conseguiram registros os seguintes partidos: o Partido da Mobilização Nacional - PMN, o Partido Progressista Brasileiro - PPB (fusão do PPR e PP), o Partido da Reconstrução Nacional - PRN, o Partido da Reedificação da Ordem Nacional - PRONA, o Partido Republicano Progressista - PRP, o Partido Social Cristão - PSC, o Partido Social Democrático - PSD, o Partido Social Democrata Cristão - PSDC, o Partido Social Liberal - PSL, o Partido Solidarista Nacional - PSN, todos estes agremiações de tendências de direita. Entre os de centro, o Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB. Entre as agremiações que reivindicam o rótulo de
    trabalhista , o Partido Social Trabalhista - PST, o Partido Social dos Trabalhadores Unificados - PSTU, o Partido Trabalhista do Brasil - PT do B, o Partido Trabalhista Nacional - PTN, além do Partido Popular Socialista - PPS (antigo Partido Comunista do Brasil) e do Partido Verde - PV. Um partido com registro provisório é o Partido dos Aposentados da Nação, PAN. Ver trabalho de Jairo Nicolau, 1996.
  • 18
    A mudança de partidos pelos chetes locais é amplamente conhecida. No geral, eles tendem a seguir o partido atual tanto no govemo do estado quanto no governo federal, de modo a conseguir verbas para os municípios. Hagopian (1996), estudando o caso do Estado de Minas gerais, observa que, em 1982, no período da transição política, quando os governadores dos estados são novamente eleitos e vencem, na grande maioria, os filiados ao PMDB, o partido de oposição aos militares, 200 prefeitos mineiros do PDS, partido governista, mudam para o PMDB, da noite para o dia. é o realinhamento das elites locais ao longo das tendências que as irão beneficiar em termos do acesso aos recursos do Estado, em troca do apoio político local.
  • 19
    Ver, também, Leão de Andrade, Elza Araújo.
    Políticas e poder: os mecanismos de implementação de políticas públicas e o fortalecimento de novas elites políticas no Nordeste. Tese de Doutorado. IFCH. Unicamp. 1994.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jun 2010
    • Data do Fascículo
      2000
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