ATUALIZAÇÃO
Fisiologia aplicada ao tratamento atual do recém-nascido com síndrome de hipoplasia do coração esquerdo
Fernando Antibas Atik
Cleveland Clinic Foundation - Cleveland, Ohio - USA
Correspondência Correspondência: Fernando Antibas Atik The Cleveland Clinic Foundation 9500 Euclid Avenue H35 Cleveland, Ohio 44195 USA Email: fernandoatik@aol.com
Palavras-chave: Lesão cardíaca congênita à esquerda, moléstia cardíaca congênita, cianótico, coração univentricular, neonato, cuidados no pós-operatório.
O tratamento cirúrgico da síndrome de hipoplasia do coração esquerdo (SHCE) ainda é um desafio. Poucos centros selecionados que adotaram os protocolos concentrados na compreensão da fisiopatologia pós-Norwood, diminuíram as taxas de mortalidade para aproximadamente 15%. A ineficácia inerente da circulação paralela na cirurgia de Norwood é responsável por problemas relacionados ao tratamento desses pacientes no pós-operatório, principalmente com relação à manutenção do equilíbrio entre o fluxo sanguíneo sistêmico (Qs) e o pulmonar (Qp). Este trabalho descreve a fisiologia do princípio de Norwood e a importância da avaliação hemodinâmica adequada para orientar as diferentes opções de tratamento no pós-operatório.
INTRODUÇÃO
A síndrome de hipoplasia do coração esquerdo (SHCE) é formada por uma série de anomalias cardíacas que resultam no subdesenvolvimento das estruturas no lado esquerdo do coração. Caracteriza-se pela atresia aórtica ou estenose grave com hipoplasia ou ausência do ventrículo esquerdo1. A coartação da aorta é a anomalia mais freqüentemente associada à SHCE e pode evitar o fluxo sanguíneo retrógrado para uma pequena aorta ascendente. A sobrevida pós-natal depende da patência do canal arterial e da comunicação ampla a nível atrial. A história natural quase sempre leva ao óbito no primeiro mês de vida2.
Na última década observamos grandes progressos no tratamento cirúrgico da SHCE. Diversas alternativas cirúrgicas hoje disponíveis foram amplamente examinadas (Tab. 1). Apesar de estudos multi-institucionais3, utilizando análises baseadas na intenção de tratar, terem mostrado melhor sobrevida intermediária nos pacientes submetidos ao transplante cardíaco4, esse último tornou-se menos ou igualmente importante que a abordagem cirúrgica paliativa estagiada. Os motivos incluem a escassez de doadores disponíveis, a morbidade pós-transplante e a sobrevida limitada a longo prazo5,6. E o mais importante, progressos significativos foram realizados na cirurgia paliativa, originalmente descritos por Norwood em 19837. A redução progressiva na mortalidade cirúrgica é conseqüência dos protocolos multidisciplinares incorporados à prática da cirurgia cardíaca pediátrica8. Apesar das elevadas taxas de mortalidade iniciais, o domínio das técnicas cirúrgicas e anestésicas e o desenvolvimento da circulação extracorpórea mais segura com a devida proteção miocárdica e cerebral fizeram com que fosse possível aplicar o princípio de Norwood à SHCE.
Entretanto, a maioria dos centros de cardiologia pediátrica ainda tem maus resultados no tratamento dessa complexa má-formação. Poucos centros selecionados que adotaram os protocolos concentrados na compreensão da fisiopatologia pós-Norwood, diminuíram as taxas de mortalidade para aproximadamente 10 a 15%9,10. É preciso mais concentração nesse ponto para que se consiga reduzir ainda mais esse índice e muitos concordam que isso pode ser obtido abordando as diretivas listadas na Tabela 2.
Este artigo de revisão descreve os princípios fisiológicos que orientam o tratamento cirúrgico moderno do recém-nascido com SHCE.
EQUILIBRANDO AS CIRCULAÇÕES NA FISIOLOGIA DE NORWOOD: O SEGREDO DO SUCESSO DO TRATAMENTO PÓS-OPERATÓRIO
A fisiologia pós-Norwood: por que o desafio?
Ao examinar a dinâmica dos fluxos de fluidos, as combinações de duas importantes equações físicas (a lei de Poiseuille e a de Ohm) nos oferecem as variáveis que são funções de fluxo, como mostra a tabela 3.
Podemos seguramente reiterar o princípio bem-compreendido da física relacionado aos circuitos elétricos ou hidráulicos quando duas resistências de diferentes valores são ligadas em paralelo, supridas por única fonte de força, há mais fluxo no menor resistor. De maneira semelhante, apesar de mais complexo, trata-se de um único ventrículo suprindo dois leitos vasculares com resistências diferentes conectados por um anastomose sistêmico-pulmonar que ejetará mais sangue em direção à via de menor resistência. Isso causará problemas no tratamento pós-operatório de pacientes submetidos à cirurgia de Norwood porque a resistência aumentada no leito sistêmico causa o hiperfluxo pulmonar, o chamado "desvio de fluxo" no lado sistêmico. Por outro lado, se a resistência for mais elevada no leito vascular pulmonar, haverá uma perfusão sistêmica adequada, mas com oxigenação sanguínea deficiente. De qualquer maneira, haverá uma situação de choque circulatório devido à anaerobiose tecidual. A ineficácia inerente da circulação paralela na técnica de Norwood causa problemas relacionados ao tratamento pós-operatório desses pacientes, principalmente para manter o equilíbrio entre o fluxo sanguíneo sistêmico (Qs) e o fluxo pulmonar (Qp);
Bartram e cols.11 avaliaram 122 pacientes que se submeteram à cirurgia de Norwood entre 1980 e 1995. O estudo apontou a incompatibilidade do fluxo sangüíneo sistêmico e pulmonar como a segunda principal causa de óbitos, abaixo apenas das causas coronarianas. A experiência clinica e os modelos simulados corroboram a idéia de equilibrar (Qp) e (Qs) para sustentar o meio aeróbico com adequação da oferta de oxigênio aos tecidos (DO2). Barnea e cols.12 correlacionou o (DO2) e a proporção Qp/Qs no modelo matemático da fisiologia de Norwood. Os autores concluíram que há um aumento de (DO2) proporcional a Qp/Qs até um certo ponto (entre 0,7 e 1)13, após o qual há um declínio.
Infelizmente, os efeitos prejudiciais do desvio do excesso de fluxo diastólico não são limitados à má-perfusão coronariana. As circulações cerebral, renal e esplâncnica correm o risco de comprometimento importante de sua perfusão. Apesar de os mecanismos adaptativos praticamente não divergirem entre adultos e crianças, algumas características devem ser avaliadas nos últimos, pois podem haver implicações relevantes durante o pós-operatório. Primeiramente, o consumo de oxigênio da criança em repouso é maior que o do adulto14. A hipotermia profunda com parada circulatória total, empregadas na maioria dos centros durante o primeiro estágio da cirurgia de Norwood, afetam a relação entre oferta e consumo de oxigênio. Além disso, a resposta metabólica ao stress é mais acentuada em crianças15. O consumo de oxigênio é independente de sua oferta em ampla gama de situações. Por exemplo, durante períodos de baixo débito cardíaco, o metabolismo aeróbico é mantido as custas de maior taxa de extração de oxigênio. Entretanto, esse último mecanismo tem um limite, que é compatível com a taxa de extração de oxigênio entre 50 a 60%, quando há instalação de acidose lática16,17. A circulação extracorpórea também pode ser um fator agravante devido a situações de oferta inadequada de oxigênio, perda excessiva do tono vasomotor e alterações na microcirculação. Além disso, os requerimentos metabólicos regionais podem estar aumentados, estreitamente relacionados ao resfriamento não-homogêneo e ao reaquecimento ou como resultado na deficiência de uma oferta adequada de oxigênio aos tecidos. A resposta inflamatória sistêmica à circulação extracorpórea pode estar envolvida nesta questão18. Durante a circulação extracorpórea pediátrica, o suprimento sangüíneo aos diferentes órgãos é alterado devido à redistribuição de fluxo, na hipotermia ou normotermia e com a perfusão de alto ou baixo fluxo19. A hipoperfusão mesentérica costuma ser uma conseqüência do comprometimento das distribuiçõies regionais do fluxo sangüíneo20. As conseqüências imediatas são a alteração da permeabilidade intestinal, a translocação bacteriana e a passagem de endotoxinas para a circulação sistêmica21. A ativação das citocinas promove a resposta inflamatória sistêmica, um dos mecanismos desencadeadores da insuficiência de múltiplos órgãos.
Determinantes importantes de Qp e Qs são a resistência vascular pulmonar (RVP) e a sistêmica (RVS), ambas freqüentemente suscetíveis às variações individuais em resposta à circulação extracorpórea e à hipotermia profunda com parada circulatória. Isso faz com que uma abordagem de tratamento fixo e não-individualizado que atenda às necessidades pós-operatórias de todos os pacientes submetidos à cirurgia de Norwood seja impossível. Apesar do uso da melhor proteção miocárdica, o coração do recém-nascido geralmente apresenta alguma depressão miocárdica imediatamente após a cirurgia, um problema que geralmente ocorre devido à reserva limitada de um ventrículo único, neonatal, morfologicamente direito e submetido a sobrecarga de volume.
Norwood modificado: por que mudar?
O procedimento "clássico" de Norwood consiste em septectomia atrial, reconstrução da aorta ascendente e arco aórtico, criação de retorno pulmonar venoso ilimitado por meio de uma grande comunicação atrial e implantação de anastomose sistêmico-pulmonar (Figura 1). O Children's Hospital da Filadélfia22, baseado em 15 anos de experiência com 840 pacientes submetidos ao estágio I de Norwood identificou os seguintes fatores preditivos independentes de mortalidade hospitalar: baixo peso ao nascer (<2,5 kg), cirurgia realizada após a segunda semana de vida, anomalias cardíacas associadas, tempo total de suporte e uso de assistência circulatória mecânica (ECMO).
Vários grupos23,24 identificaram tamanho menor da aorta ascendente (menor que 2,5 mm) como fator de risco significativo para mortalidade e concentraram-se então em conseguir a melhor opção cirúrgica para lidar com a aorta ascendente longa e pequena. De modo geral, três métodos de reconstrução aórtica foram descritos. A técnica de Norwood e suas modificações7 e a modificação de Lamberti e cols.23 usam um homoenxerto para aumentar o arco aórtico. Na modificação de Lamberti, a aorta proximal e a artéria pulmonar foram seccionadas e uma anastomose término-terminal foi criada entre a neo-aorta proximal e o arco aórtico proximal ampliado. Qualquer uma das técnicas requer o uso de um remendo adequado que se prolongue distalmente ao tecido ductal. Deve-se tomar cuidado para evitar o uso excessivo de remendo, pois acredita-se que isso contribua para a obstrução precoce e tardia do arco, que atingem valores tão elevados quanto 20-25% dos casos24,25. O terceiro método é a anastomose direta sem o uso do homoenxerto para aumentar o arco, como descrito por Fraser e Mee26, que apresenta baixa incidência de obstrução tardia do arco segundo estudos realizados9. Entretanto, usando técnicas semelhantes sem o material prostético, Ishino e cols.25 do Birmingham Childrens Hospital (Reino Unido), em 1999, descreveram uma incidência de 23% de obstrução do arco aórtico em 120 pacientes. Esse índice é idêntico às incidências de obstrução do arco com uso de tecido exógeno para sua reconstrução observado por outros estudos27-29. Apesar de haver preocupação com relação à artéria pulmonar esquerda e a compressão bronquial esquerda quando se aplica a técnica sem uso de remendo, clinicamente sua freqüência não é maior quando comparada a outras técnicas de reparo com seu uso9.
Até há pouco tempo, a maioria das reconstruções do arco exigiam um período obrigatório de hipotermia profunda com parada circulatória. Diversos estudos30,31 avaliaram os efeitos da parada circulatória prolongada e mostraram claramente a presença de seqüelas neurológicas a longo prazo32, além de efeitos prejudiciais agudos nos rins, fígado e intestinos devido a longos períodos de isquemia global pelo frio. Mais importante, há relatos de que a hipotermia profunda com parada circulatória promova um aumento da resistência vascular pulmonar33-35 no pós-operatório. Além disso, Tweddell e cols.36 observaram que a resistência vascular sistêmica também estava aumentada após a técnica de Norwood usando a parada circulatória hipotérmica. Além disso, Tokunaga e cols.37 mostraram que a atividade simpática e a resistência vascular sistêmica aumentaram imediatamente e de maneira significativa após a hipotermia profunda com parada circulatória em modelos experimentais.
Imoto e cols.38,39 foram os primeiros a descrever a técnica de perfusão regional seletiva por meio da canulação da anastomose sistêmico-pulmonar a fim de promover a perfusão cerebral anterógrada, evitando totalmente a hipotermia profunda com parada circulatória. O procedimento pode ser realizado com baixo fluxo em hipotermia profunda40 ou com perfusão com baixa resistência, alto fluxo e hipotermia moderada41. Pigula e cols.42 acrescentaram a canulação da aorta descendente para manter a perfusão da parte inferior do organismo. Apesar de não haver estudos randomizados disponíveis que corroborem os benefícios da perfusão regional, observações clínicas sugerem retorno mais precoce da função renal e menor instabilidade hemodinâmica nos pacientes perfundidos regionalmente. Apesar de alguns estudos42,43 fornecerem evidências objetivas de melhora da atividade metabólica cerebral, não há nenhum impacto favorável na sobrevida com o uso da perfusão regional seletiva e ainda não é possível fazer uma avaliação do resultado neurológico a longo prazo.
Apesar das modificações acima mencionadas serem importantes, muitas outras modificações técnicas foram realizadas a fim de conseguir uma circulação equilibrada no início do período pós-operatório, uma vez que essa é o principal fator determinante na sobrevida imediata e durante o procedimento. Essas modificações concentraram-se em limitar o fluxo sanguíneo pulmonar (anastomoses sistêmico-pulmonar pequenas e mais longas ou bandagem da anastomose sistêmico-pulmonar) e melhorar o fluxo sangüíneo sistêmico44. O tamanho do shunt sistêmico-pulmonar é um fator muito importante que influencia a distribuição de fluxo entre duas circulações paralelas, comprometendo o fluxo sanguíneo coronariano durante a diástole45. Estudos que usaram o PET-SCAN (Positron Emission Tomography)46 para quantificar o fluxo sanguíneo coronariano em bebês após o reparo dos defeitos cardíacos congênitos mostraram menor reserva coronariana quando comparado ao de adultos. Particularmente após a técnica de Norwood, há um aumento do fluxo coronariano durante o repouso, mas um menor fluxo sangüíneo coronariano ao ventrículo sistêmico que aquele observado após um reparo biventricular. Isso está relacionado aos requerimentos aumentados de energia do ventrículo sistêmico, necessários para bombar sangue para os leitos pulmonar e sistêmico. Análise qualitativa do fluxo sanguíneo coronariano47 usando a ecocardiografia transesofagiana e a fluxometria de Doppler apontaram anormalidades de fluxo coronariano após a cirurgia de Norwood, quando o fluxo predominante ocorre durante a sístole. Tentativas recentes de eliminar ainda mais os efeitos prejudiciais da fonte arterial sistêmica de sangue pulmonar, usando o conduto não valvado entre o ventrículo direito e a artéria pulmonar é um acréscimo ao arsenal cirúrgico. Esse último ponto será discutido em outra parte deste trabalho, uma vez que representa uma importante contribuição que mudou a hemodinâmica pós-operatória e seus protocolos de tratamento.
Antes de discutir os diversos tópicos relacionados ao tratamento, é obrigatório conhecer os avanços realizados nas técnicas empregadas para orientar o tratamento desses recém-nascidos.
AVALIAÇÃO HEMODINÂMICA NA SHCE
A maior parte dos fármacos tradicionalmentes utParâmetros clínicos, amplamente usados de rotina, mostraram que não são fatores preditivos dos principais eventos adversos após a cirurgia cardíaca pediátrica, principalmente em recém-nascidos. É extremamente difícil definir um marcador confiável de hipoperfusão tecidual por causa das limitações do monitoramento invasivo impostas pelo peso do paciente e de algumas características anatômicas, tais como os defeitos septais do átrio que podem interferir na medição exata do débito cardíaco, da saturação venosa mista de oxigênio e da oferta e consumo de oxigênio. Além disso, poucos estudos48,49 avaliaram ou incluíram indicadores da oferta de oxigênio sistêmico no tratamento pós-operatório de pacientes submetidos à cirurgia de Norwood.
Individualmente, nenhum dos parâmetros obtidos na gasometria são considerados importantes em termos de estimativa do estado hemodinâmico. Por outro lado, parâmetros combinados conseguem indiretamente estimar a oferta de oxigênio e a perfusão tecidual50. A saturação arterial de oxigênio acima de 80% foi proposta como um indicador de hiperfluxo pulmonar e, conseqüentemente, de hipoperfusão sistêmica, mas isso não se confirmou em alguns estudos clínicos51.
A saturação venosa mista de oxigênio (SvO2) é geralmente aceita como indicador da adequação do débito cardíaco e é fortemente associada à acidose lática em pacientes na unidade intensiva52. Considerando um teor arterial estável de oxigênio e um metabolismo celular adequado, valores de SvO2 acima de 60% representam débito cardíaco adequado. As principais vantagens de sua determinação são a capacidade na determinação tanto da oferta quanto do consumo de oxigênio. Entretanto, diversos fatores além do débito cardíaco interferem nos valores de SvO2, tais como a concentração sérica de hemoglobina, saturação arterial de oxigênio e taxa metabólica. Uma vez que o SvO2 representa a mistura de todo sangue de retorno venoso do organismo, o melhor ponto de amostragem deveria ser a artéria pulmonar53. Entretanto, esse não é o local ideal na presença de más-formações cardíacas congênitas com comunicações interatriais, visto que o desvio de sangue da esquerda para a direita pode resultar em inexatidão. Outros autores54,55 validaram a determinação de SvO2 na veia cava superior, próxima à anastomose ao átrio direito. Recentemente, pequenos cateteres oximétricos compatíveis para uso em recém-nascidos foram desenvolvidos e usados com segurança. A aquisição dessa tecnologia provou ser benéfica na determinação da oferta de oxigênio sistêmicos após a operação de Norwood56, com impacto positivo na morbidade e na mortalidade48. O tratamento é orientado por dados de oximetria e a expectativa é que se atinja uma oferta adequada de oxigênio sistêmico, definido como SvO2 acima de 50%, com relação entre os fluxos pulmonar e sistêmico próximo a um.
A diferença arteriovenosa de oxigênio (DO2AV) é outro parâmetro que pode ser usado como marcador de perfusão tecidual57 e é considerado indicativo de circulação equilibrada quando seus valores forem menores ou iguais a 5 mL/dL.
Apesar da identificação da acidose lática ter sido sugerida como indicador útil na redução de oferta de oxigênio, sua detecção previsivelmente é posterior ao período inicial de oferta inadequada de oxigênio tecidual. Apesar de diversos estudos58-61 com resultados conflitantes terem analisado o valor prognóstico do lactato sangüíneo após cirurgia cardíaca pediátrica, existe concordância em relação ao poder de sua determinação seriada62. Rossi e cols.62 postulam que níveis elevados de lactato podem representar um comprometimento hemodinâmico prévio, pré ou intra-operatório, algumas vezes associado com disfunção hepática. Sobreviventes da operação de Norwood que não desenvolvem complicações importantes apresentam nível aumentado de ácido lático precocemente no período pós-operatório61. Além disso, pode haver reduções repentinas e graves da oferta de oxigênio sistêmico antes que haja um aumento dos níveis de ácido lático.
O uso de cateteres intracardíacos inseridos antes do desmame da circulação extracorpórea é importante na estimativa da volemia e da função ventricular. Também podem servir como guia diagnóstico de efeitos residuais no pós-operatório. Além disso, o benefício de sua determinação em tempo real pode incentivar outros exames complementares mais sensíveis como a ecocardiografia bidimensional e o cateterismo cardíaco. Além do diagnóstico dos defeitos residuais responsáveis pela recuperação conturbada no pós-operatório, a ecocardiografia desempenha um papel fundamental na avaliação quantitativa e qualitativa da função ventricular regional e global e no diagnóstico de derrames do pericárdio. Avaliando especificamente o período pós-operatório da operação de Norwood, algumas situações clínicas e características anatômicas merecem atenção especial durante a avaliação ecocardiográfica. A detecção ou piora da insuficiência tricúspide pode ser um indicador precoce da disfunção ventricular. A persistência de hipoxemia grave pode indicar artérias pulmonares hipoplásicas ou sinais de estenose na anastomose sistêmico-pulmonar. Uma comunicação interatrial restritiva pode diminuir o débito cardíaco e manter a pressão arterial esquerda constantemente aumentada. A obstrução residual do arco aórtico é outro fator que pode comprometer o débito cardíaco e causar hipoperfusão sistêmica. As obstruções da artéria pulmonar esquerda e do brônquio principal esquerdo podem estar associados com alguns tipos de reconstrução do arco aórtico.
OPÇÕES DE TRATAMENTO NO PÓS-OPERATÓRIO
Atualmente há duas escolas que buscam atingir este equilíbrio exato após a operação de Norwood. É importante entender que essas escolas não são estáticas e que costumam estar interligadas, em diferentes protocolos, de acordo com a instituição. A primeira usa principalmente manobras para manipular o Qp pela redução da ventilação minuto e inalação de misturas de gás com baixo e/ou alto teor de oxigênio. A segunda manipula a Qs por meio de infusão de vasodilatadores sistêmicos.
Manipulação de Qp
RVP - Os efeitos da acidose, da hipóxia e hipercapnia na vasculatura pulmonar são bem conhecidos. Desde 1986, sabe-se que a indução da acidose respiratória permissiva para efetivamente controlar a Qp tem efeitos positivos na evolução de pacientes com hipoplasia do coração esquerdo. Desde então os métodos evoluíram: no início o objetivo era reduzir o volume de gás alveolar expirado por minuto e aumentar o espaço morto, promovendo a retenção de dióxido de carbono. Isso poderia ser atingido por meio da redução da freqüência respiratória, volume corrente ou ambos com pressão positiva expiratória final e fração inspirada de oxigênio em ar ambiente. A redução quase instântanea do fluxo sangüíneo pulmonar era uma vantagem usada por centros que se esforçavam para melhorar os resultados após a técnica de Norwood. Por outro lado, identificaram-se algumas desvantagens desse tratamento: esses métodos hipoventilatórios causaram a redução da capacidade funcional residual, microatelectasias e aparecimento de desvios arteriovenosos intrapulmonares no recém-nascido63, o que resultava em incompatibilidade entre ventilação-perfusão, desaturação pulmonar venosa e hipóxia. Obviamente que a falta de oxigênio é indesejável na evolução normal da recuperação após a circulação extracorpórea cardiopulmonar e parada circulatória.
Portanto, deve-se buscar outras maneiras de se induzir a acidose respiratória. Sugeriu-se o aumento da fração de dióxido de carbono (CO2) no gás inspirado como método alternativo64,65 quando as variáveis mecânicas da ventilação (freqüência respiratória, volume corrente e pressão positiva expiratória final) são definidas independentemente da PCO2. A vantagem dessa técnica foi conseguir aumentar a RVP sem causar efeitos adversos à DO2. O acréscimo de quantias maiores de CO2 (níveis de oferta de 1-2% ou 8-30 mmHg) no gás inspirado é usado para manter a paCO2 na faixa de 45-50 mmHg66. Apesar de atraente, essa estratégia foi utilizada em associação ao aumento da ventilação minuto63,67-69. Teoricamente, o aumento na ventilação minuto causaria um incremento adicional na RVP devido a elevação na pressão média das vias aéreas70. A redução simultânea da eliminação de CO2 e a subseqüente alcalose por hipocapnia causada pelo aumento da ventilação minuto pode ser compensada com a inspiração de CO2. Bradley e cols.71 concluíram que o CO2 inspirado pode melhorar o DO2 de maneira efetiva apenas se a ventilação minuto é mantida constante. A hipercapnia representa outra vantagem com relação à redução da relação Qp: Qs já que o efeito vasodilatador sistêmico pode favoravelmente aumentar e redistribuir o débito cardíaco total.
Entretanto, estudos experimentais72 mostraram que as concentrações de CO2 necessárias no gás inspirado para que haja um aumento estatisticamente significativo da RVP eram extremamente elevadas (80-95 mmHg). Também demonstrou-se que há um aumento significativo da RVP quando há uma redução da concentração de O2 inspirado. Dessa maneira, o próximo passo lógico aplicando-se esse princípio foi reduzir o teor de oxigênio na mistura de gás inspirado abaixo de 21%. Isso foi conseguido pelo acréscimo de nitrogênio no gás inspirado. A gasoterapia hipóxica ou subatmosférica foi usada com sucesso, mantendo a fração de oxigênio inspirado entre 14 e 20%73,74.
Este protocolo deve ser particularmente vantajoso em algumas situações clínicas, tais como em recém-nascidos de baixo peso ao nascer com valores desproporcionalmente elevados de RVP, que não respondam à mistura hipóxica de gases75. Diferentemente, esses efeitos eram mais acentuados antes da circulação extracorpórea para reduzir o Qp comparado ao quadro pós-circulação extracorpórea, após a operação de Norwood.
Por outro lado, estudos recentes76 mostraram que níveis elevados da fração inspirada de oxigênio pode, na verdade, melhorar a saturação venosa mista de oxigênio e da oferta de oxigênio sistêmico. Bradley e cols.76 sugeriram que protocolos que busquem minimizar a FiO2 e controlem a ventilação cuidadosamente, possam não ser justificados.
Hematócrito - O aumento da viscosidade sangüínea cria uma resistência inerente ao fluxo de acordo com a lei de Poiseuille. Esse efeito é exponencial quando os valores do hematócrito são acima de 45% e mais evidentes nas condições de hiperfluxo que de hipofluxo77. Alguns autores incluíram essa estratégia como rotina na conduta pós-operatória9.
A manipulação de Qs
Demonstrou-se48 que após a operação de Norwood, os recém-nascidos mantêm uma elevação basal da RVS que também está sujeita às flutuações súbitas, independentemente da estratégia de circulação extracorpórea utilizada. O controle constante da resistência vascular sistêmica é um amálgama das influências do sistema nervoso autônomo em função da mudança do rádio das artérias e arteríolas e dos fatores metabólicos locais. Do lado aórtico em direção ao venoso, há maior resistência no nível arteriolar (60%), seguido dos capilares e pequenos vasos (15% cada) e das artérias grandes e de tamanho médio (10%)78.
A lógica do uso de vasodilatadores é justificada inicialmente pelas conseqüências comuns da circulação extracorpórea, como o edema pulmonar endotelial, edema pulmonar intersticial e microatelectasia, que já mantêm a RVP elevada, tornando desnecessária qualquer elevação posterior. Além disso, desaturação venosa pulmonar não-reconhecida ocorre logo após a operação de Norwood76,79. Acredita-se também que uma piora na disponibilidade de oxigênio alveolar apenas agravaria a saturação venosa pulmonar, prejudicando assim a DO2.
A redução do RVS foi obtida com um dilatador arteriolar (nitroprussiato de sódio), um antagonista alfa-receptor (fenoxibenzamina) ou clorpromazina ou um inodilatador (milrinona). O nitroprussiato é um vasodilatador misto, arterial e venoso, com mecanismo de ação relacionado ao óxido nitrico, tem meia-vida curta e é facilmente reversível. A desvantagem do nitroprussiato de sódio é que não combate as frequentes e repentinas mudanças na RVS.
A fenoxibenzamina bloqueia, de maneira irreversível e não-competitiva, os receptores alfa-adrenérgicos, prolongando a vasodilatação. A fenoxibenzamina foi defendida por muitos centros que realizam a cirurgia neonatal durante a circulação extracorpórea. Geralmente pode ser titulada com a pressão arterial média, apesar de alguns grupos terem defendido a infusão contínua da mesma no período pós-operatório56,80,81. O uso da fenoxibenzamina depois da operação de Norwood melhora a DO2 e induz uma proporção fixa e equilibrada de Qp:Qs. Neste contexto, qualquer aumento na pressão arterial média com a redução pós-carga promovida pela fenoxibenzamina melhora a SvO2. Portanto, nenhuma medida é necessária para reduzir a FiO2 ou para manipular a ventilação mecânica. Há relatos de problemas relacionados à vasodilatação excessiva com o uso de fenoxibenzamina82, o que pode ser contrabalanceado pelo uso criterioso de vasoconstritores como nor-epinefrina e vasopressina.
A clorpromazina83, uma droga neuroléptica fenotiazina com significativa capacidade alfa-bloqueadora, tem sido usada com sucesso. A escolha de agentes inotrópicos mudou daqueles que apresentavam propriedades vasoconstritivas para aqueles com propriedades vasodilatadoras. A fim de reduzir a faixa de variação de resistência vascular pulmonar, a vasculatura pulmonar pode ser dilatada ao máximo no desmame da circulação extracorpórea com inalação de óxido nítrico e alta concentração de oxigênio inspirado como potentes vasodilatadores pulmonares84. Nessa situação, o fluxo sangüíneo pulmonar depende de ajustes de anastomose sistêmico-pulmonar. Essa abordagem inovadora foi proposta por Nakano e cols.41, e simplesmente reduz o óxido nitroso inalado e a fração inspirada de oxigênio quando há melhora da saturação arterial de oxigênio, com infusão contínua de clorpromazina para reduzir a RVS. A manipulação frequente do ventilador é raramente necessária.
CONDUTO DO VENTRÍCULO DIREITO-ARTÉRIA PULMONAR: A SOLUÇÃO DEFINITIVA?
O conduto ventrículo direito-artéria pulmonar (VD-AP) para reestabelecer o suprimento sanguíneo pulmonar no estágio I paliativo para tratar a SHCE foi introduzida por Norwood em 198185. Naquela época, as anastomoses sistêmico-pulmonares eram muito grandes e todos os pacientes morriam ou por hiperfluxo pulmonar ou por insuficiência do ventrículo direito. Kishimoto e cols.86 reviveram o conceito inicial usando um conduto valvado com xenopericárdio, posteriormente substituído por Sano e cols.87 que usaram um conduto de PTFE (politetrafluoretileno) não-valvado de 4 a 5 mm (Figura 2). A experiência inicial desse grupo com 19 pacientes consecutivos chegou à excelente taxa de 89% de sobrevida hospitalar. Mais importante, o estabelecimento das circulações pulmonar e sistêmica em paralelo tornaram a recuperação pós-operatória mais previsível. O leito pulmonar não ficava nem sujeito nem dependente do fluxo diastólico e havia menos alterações no fluxo sanguíneo pulmonar na presença de crise hipertensiva pulmonar ou ressucitação na ocorrência de baixo débito cardíco ou após uma parada cardíaca. Não foi necessário realizar nenhuma manipulação especial em Qp e/ou Qs no pós-operatório e houve uma manutenção da oxigenação adequada com pressões diastólicas mais elevadas88,89. O excelente resultado hemodinâmico dessa técnica era particularmente benéfica para recém-nascidos com baixo peso ao nascer, um subgrupo com reconhecido maior índice de mortalidade hospitalar, geralmente devido a hiperfluxo pulmonar mesmo com o Blalock-Taussig com tubo de 3 mm.
O conduto VD-AP tornou-se conhecido no mundo todo e seus resultados foram considerados reproduzíveis88-91, com melhora constante das taxas de mortalidade após o primeiro estágio da reconstrução paliativa em muitos centros87,90,92. Entretanto, os resultados de centros com ampla experiência88,91,93 na realização da operação de Norwood modificada não apresentaram impacto favorável na sobrevida hospitalar.
Diversos estudos não-aleatorizados88-94 compararam o conduto VD-AP e a anastomose de Blalock-Taussig modificado como fonte de fluxo sanguíneo pulmonar. O resumo das evidências hemodinâmicas desses estudos são apresentadas na tabela 4. Apesar da hemodinâmica mais previsível no grupo com conduto VD-AP, não houve diferenças significativas no período de internação na UTI, duração do suporte ventilatório, uso inotrópico88,91,93,95 e oferta sistêmica de oxigênio93.
O conduto VD-AP tem potenciais limitações que precisam ser mais estudadas. Os efeitos da ventriculotomia direita são ponto de muita preocupação em termos de disfunção ventricular ou de desencadeamento de arritmias. Evidências atuais não sustentam esse conceito, uma vez que a função ventricular (dp/dt) durante a cateterização aos cinco meses de seguimento apresentou melhor desempenho no grupo com conduto VD-AP que o grupo com anastomose BT90,96. Além disso, o desempenho ventricular sistólico preliminar avaliado pelo teste de esforço com Doppler-ecocardiografia sugeriu melhor função ventricular precoce no grupo com conduto VD-AP95. Esses resultados foram atribuídos à sobrecarga ventricular direita reduzida por causa da menor proporção Qp:Qs, assim como melhora da perfusão coronariana devido a valores aumentados das pressões diastólicas89.
Outro potencial problema está relacionado ao grau de reversão de fluxo no conduto não-valvado. Apesar disso, a regurgitação pulmonar livre parece ser bem tolerada a curto prazo. Assim como qualquer outro tubo de protése na cirurgia cardíaca pediátrica, ela fica obstruída com o tempo, principalmente três meses depois da cirurgia. Isso obriga a realização precoce do segundo estágio, que pode ser favorável em termos de redução do atrito interprocedimento. Nesse estágio, a resistência pulmonar é maior. Apesar de controverso mostrou-se que o crescimento da artéria pulmonar parece ser87,89,90,97,98 tão bom quanto o anastomose BT, apesar da baixa proporção Qp:Qs. Geralmente o conduto VD-AP é mantido aberto a fim de oferecer uma fonte adicional de fluxo sangüíneo pulmonar. Os resultados após o segundo estágio realizado precocemente sustentam a idéia de que o fluxo sanguíneo pulmonar é mais baixo, mas suficiente90,94 para promover a boa oxigenação sem nenhuma carga ventricular importante. Essse conceito é corroborado por outros resultados semelhantes em pacientes submetidos ao segundo estágio precocemente (3 meses) após a cirurgia de Norwood modificada99, mas espera-se um período de recuperação mais longo no pós-operatório. Entretanto, Malec e cols.94 não observaram nenhuma necessidade para antecipar o segundo estágio em pacientes com conduto VD-AP, já que a baixa proporção Qp:Qs garantiu boas condições para o desenvolvimento da vasculatura pulmonar (anastomoses mais centrais e fluxo pulsátil do ventrículo direito).
USO DE STENT NO DUTO ARTERIAL E BANDAGEM DAS ARTÉRIAS PULMONARES
Usar um stent no duto arterial associado à bandagem das artérias pulmonares e, se necessário, realizar uma septotomia atrial representa uma abordagem diferente ao tratamento paliativo da SHCE100. A reconstrução da neo-aorta e o estabelecimento de uma anastomose cavopulmonar bidirecional pode então ser realizada em uma única cirurgia101. Além disso, nos ventrículos esquerdos com hipoplasia estudados, nos quais o crescimento do ventrículo esquerdo pode ser melhor observado durante o seguimento pós-natal, a decisão cirúrgica tomada imediatamente após o nascimento foi o método paliativo em um único ventrículo, apesar de a reconstrução biventricular poder ser realizada poucos meses depois no mesmo paciente. Nesse contexto, apesar das múltiplas lesões obstrutivas no coração esquerdo, considera-se a reconstrução biventricular preferível sempre que possível.
Michel-Behnke e cols.102 adotaram essa estratégia em 20 pacientes. Baseados na sua experiência inicial, defendem que um recém-nascido com SHCE admitido com infusão de prostanglandina E1 com amplo duto aberto, sem estreitamento de duto e sem defeito atrial-septal seria candidato à bandagem bilateral nos primeiros 3 a 5 dias de vida. Se houver um escoamento de fluxo pulmonar (run-off) como conseqüência da resistência vascular pulmonar, esse procedimento deve ser antecipado. O uso de stent no duto, assim como reavaliação da efetividade da bandagem pulmonar deve ser realizada 2 a 3 dias antes da alta hospitalar. Depois a infusão de prostaglandina é interrompida por aproximadamente 2 horas antes da cateterização para que se tenha um duto menor e mais estreito, facilitando a colocação do stent e evitando seu deslocamento.
Um recém-nascido com forame oval restritivo seria cateterizado antes da realização da bandagem bilateral. No caso de qualquer estreitamento dentro do duto, um stent seria colocado antes da septotomia atrial. A reconstrução do arco e a anastomose cavopulmonar bidirecional seriam realizadas 3,5 a 6 meses depois. Estruturas maiores geralmente evitam a hipotermia profunda com parada circulatória por meio da perfusão cerebral através da artéria inominada. A anastomose cavopulmonar bidirecional permite a descompressão do ventrículo único morfologicamente direito em estágio mais precoce, estabelecendo circulações sistêmico-pulmonar em série em vez de paralelas. A recuperação pós-cirúrgica foi geralmente tratada com vasodilatadores arteriais e venosos e com doses baixas de inibidor de fosfodiesterase. A taxa inicial de sucesso dessa abordagem foi de 90%. Além disso, aumentou os períodos de espera para transplante cardíaco em 10% dos pacientes candidatos nos quais a técnica de Norwood não foi a de escolha. Isso minimiza o desenvolvimento de hipertensão pulmonar grave antes do transplante, amplia o período de espera dos pacientes na lista para transplantes com segurança e e facilita a posterior realização do transplante103.
Entretanto, essa técnica precisa ser melhor estudada com períodos mais longos de seguimento. Os potenciais problemas incluem óbito interprocedimento devido à insuficiência cardíaca ou à hipertensão pulmonar. É preciso um seguimento mais próximo para se detectar defeitos restritivos atrial septal, estreitamento do duto ou comprometimento do fluxo sanguíneo pulmonar. Além disso, o desenvolvimento de coartação aórtica significativa pode comprometer o fluxo sangüíneo retrógrado e a perfusão coronariana.
CONCLUSÕES
O tratamento cirúrgico da síndrome de hipoplasia do coração esquerdo ainda é um desafio. O transplante cardíaco é uma alternativa viável a esse problema104 e é influenciado pelas preferências da instituição e da disponibilidade de doador. O comprometimento contínuo da função ventricular direita, regurgitação grave da tricúspide ou fistulas coronarianas tornam o transplante cardíaco o tratamento de escolha. Aperfeiçoamentos progressivos foram realizados na cirurgia paliativa, principalmente baseados na aplicação detalhada de princípios fisiológicos. O equilíbrio entre as circulações sistêmica e pulmonar ainda é crucial no sucesso do tratamento pós-operatório da cirurgia de Norwood modificada. A literatura atual oferece forte apoio a esse conceito, apontando a saturação venosa mista de oxigênio como a melhor opção de perfusão tecidual adequada. As opções de tratamento variam muito entre as diversas instituições. Manipulações da RVP e da RVS são bem-vindas e algumas vezes deveriam ser combinadas. Apesar de ser quase sempre possível controlar a complexa interação das duas circulações em paralelo, algumas vezes é preciso muito trabalho em equipe e experiência. Novas modificações técnicas, tais como o conduto ventricular-pulmonar, foram incorporadas à cirurgia a fim de reduzir as complicações no pós-operatório, baseando-se em uma via mais "fisiológica". Ainda não se sabe qual é o impacto da ventriculotomia na função ventricular sistólica, diastólica e elétrica, assim como na função da válvula atrioventricular. Os dados atualmente disponíveis não são suficientes para se determinar qualquer benefício à sobrevida a longo prazo. Apenas o futuro poderá nos dizer qual é a melhor maneira de se tratar a síndrome de hipoplasia do coração esquerdo.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes
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Recebido em 06/07/05
Aceito em 12/09/05
Correspondência:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
16 Out 2006 -
Data do Fascículo
Set 2006