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UMA ANÁLISE SEMÂNTICA DE ‘TAMBÉM’ COM USO ADITIVO NO PORTUGUÊS BRASILEIRO

RESUMO

Neste artigo, propomos uma análise semântica e pragmática do uso do item ‘também’ do português brasileiro como partícula aditiva. Para tanto, num primeiro momento, identificamos alguns dos diferentes usos de ‘também’, e, então, isolamos seu uso como partícula aditiva. Fazemos, na sequência, uma comparação de ‘também’ com o item ‘too’, do inglês, que apresenta comportamento semelhante com relação a esse tipo de uso. Feito isso, apresentamos as intuições e análises encontradas em alguns trabalhos anteriores e analisamos em mais detalhe as vantagens e desvantagens da teoria proposta por Amsili e Beyssade (2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, 2013AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Beyond obligatory presuppositions. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF LINGUISTS, 19., 2013, Geneva. Proceedings, Geneva, 2013. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/talks/slides_amsili13_cil.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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) sobre a partícula aditiva ‘too’ do inglês e ‘aussi’ do francês, quando aplicado ao item ‘também’ do português brasileiro. Propomos, então, em contraposição a Amsili e Beyssade (2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, 2013AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Beyond obligatory presuppositions. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF LINGUISTS, 19., 2013, Geneva. Proceedings, Geneva, 2013. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/talks/slides_amsili13_cil.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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), uma análise de ‘também’ como partícula aditiva cuja função é criar listas, com base no trabalho de Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, e que dá conta dos problemas que detectamos na análise de Amsili e Beyssade (2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, 2013AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Beyond obligatory presuppositions. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF LINGUISTS, 19., 2013, Geneva. Proceedings, Geneva, 2013. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/talks/slides_amsili13_cil.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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).

PALAVRAS-CHAVE
partícula aditiva; pressuposição; semântica; pragmática

ABSTRACT

In this paper, we propose a semantic and pragmatic analysis of the Brazilian Portuguese item ‘também’ (also) as an additive particle. In order to do so, we first identify some of the different uses of ‘também’, and then we isolate its use as an additive particle. Next we compare ‘também’ with the English ‘too’, which shows similar behavior in relation to the additive use. We then present the insights and analyzes found in some previous works and analyze in more detail the advantages and disadvantages of the theory proposed by Amsili and Beyssade (2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, 2013AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Beyond obligatory presuppositions. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF LINGUISTS, 19., 2013, Geneva. Proceedings, Geneva, 2013. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/talks/slides_amsili13_cil.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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) on the additive particles ‘too’ in English and ‘aussi’ in French, when applied to the item ‘também’ in Brazilian Portuguese. We therefore propose, in contrast to Amsili and Beyssade (2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, 2013AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Beyond obligatory presuppositions. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF LINGUISTS, 19., 2013, Geneva. Proceedings, Geneva, 2013. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/talks/slides_amsili13_cil.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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), an analysis of ‘também’ as an additive particle whose function is to create lists, based on the work of Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, which accounts for the problems we detected in the analysis by Amsili and Beyssade (2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, 2013AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Beyond obligatory presuppositions. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF LINGUISTS, 19., 2013, Geneva. Proceedings, Geneva, 2013. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/talks/slides_amsili13_cil.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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).

KEYWORDS
additive particle; presupposition; semantics; pragmatics

Introdução

O presente artigo tem por objetivo investigar um uso particular do item ‘também’ no português brasileiro, aquele no qual esse item tem valor de partícula aditiva. Defenderemos uma abordagem para o ‘também’ aditivo baseada na ideia de criação de listas que difere em pontos fundamentais de estratégias prévias de análise de seu equivalente em inglês (‘too’) e em francês (‘aussi’) e que, como será demonstrado ao longo deste artigo, tem vantagens importantes com relação a abordagens anteriores.

Com este propósito, a seção “Os ‘tambéns’ do português” delimita nosso objeto de análise por meio de uma lista não exaustiva dos usos ‘também’ no português brasileiro (PB), separando seu uso como partícula aditiva de outras possibilidades de uso, e traz um paralelo entre alguns usos do ‘também’ e de ‘too’, do inglês, um item que já conta com mais descrições linguísticas na literatura especializada em semântica das línguas naturais. Feita essa delimitação, na seção “Análises prévias” apresentamos um resumo de diversas abordagens do estudo de elementos com um uso similar, para demonstrar os conceitos que embasam a proposta de análise deste trabalho, assim como os problemas que ela soluciona. Na seção “Definição de partículas aditivas”, introduzimos uma ferramenta essencial para a estrutura da análise proposta, a saber, o conceito de partícula aditiva, que será utilizado para o restante do trabalho. A seção “Definição de partículas aditivas” também apresenta a estratégia de tratar operações aditivas como funções que resultam na criação de uma lista. Tal abordagem é crucial para a estruturação da nossa proposta que será o tema da seção “Uma nova proposta”. Finalmente, terminamos este artigo com uma Conclusão, que retoma o caminho percorrido e os resultados alcançados, além de citar alguns dos problemas em aberto, seguida pelas referências utilizadas.

Os ‘tambéns’ do português

O item ‘também’ apresenta alguns usos no português brasileiro contemporâneo que devem ser diferenciados por terem propriedades linguísticas diferentes, de modo a assim definirmos com clareza quais são os usos que analisaremos neste trabalho; é justamente esse o objetivo da presente seção. Ao final desta seção, faremos uma breve comparação entre ‘também’ e ‘too’, seu equivalente mais próximo em inglês, com o objetivo de ampliarmos essa análise inicial de ‘também’ e auxiliar na compreensão das propostas de análise semântico-pragmáticas para esses itens já pensadas para o inglês.

Etimologicamente, a palavra ‘também’ tem origem na contração das palavras ‘tão’ e ‘bem’, e é encontrada em registros escritos desde pelo menos o século XIII, com um significado já bastante próximo a alguns dos que temos hoje no português brasileiro (cf. Cunha, 2010CUNHA, A. G. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 4. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010.; Machado, 1987MACHADO, J. P. Dicionário etimológico da língua portuguesa: com a mais antiga documentação escrita e conhecida de muitos vocábulos estudados. 4. ed. Lisboa: Livros Horizonte, 1987.), principalmente relacionado ao uso como partícula aditiva (que veremos logo abaixo). Ou seja, ‘também’ é resultado de gramaticalização — processo pelo qual itens lexicais se transformam, através de etapas já reconhecidas e descritas minuciosamente pela literatura especializada, em itens funcionais. Nesse caso em particular, os itens ‘tão’ e ‘bem’ se unem num único item que é reconhecido pelas gramáticas tradicionais como um advérbio. Uma outra evidência de gramaticalização é a pronúncia reduzida, generalizada e encontrada em todo território nacional de ‘também’ como ‘tamém’, além do fato de ser cada vez menos transparente para os falantes de hoje sua origem nos itens ‘tão’ e ‘bem’.

Com relação aos usos de ‘também’ que encontramos atualmente no português brasileiro, vemos algumas das possibilidades ilustradas pelas sentenças abaixo. É interessante notar que muito provavelmente alguns dos usos listados surgiram no contexto do português brasileiro, sendo assim inovações semânticas1 1 Seria certamente muito interessante procurar a origem desses outros usos, mas trata-se de uma tarefa que foge ao escopo do presente trabalho. Além disso, a lista de usos que apresentamos aqui não tem o intuito de ser exaustiva. :

Partícula aditiva:

  • (1) a) João foi na festa também.

  • b) João também foi na festa.

Interjeição/conjunção:

  • (2)Também, do jeito que ventou ontem, certeza que aquele galho ia cair.

Interjeição/expressiva:

  • (3)Você também, hein, nem pra tomar cuidado com onde parar o carro.

No português brasileiro, como os exemplos acima ilustram, há outros usos para a palavra ‘também’, com funções que não a de partícula aditiva. Essas funções são tão distintas da sua forma como partícula aditiva, tanto em conteúdo semântico quanto em funcionamento sintático, que, salvo algum mecanismo composicional sintático-semântico responsável por isolar esses usos de ‘também’, seria possível, inclusive, avançar a hipótese de que estamos diante de itens linguísticos distintos, apesar de homófonos.

Essas funções outras são, pelo menos, duas, as únicas que serão abordadas nesta seção2 2 Deixaremos em aberto a possibilidade de outros usos e análises para ‘também’, que podem, por exemplo, ocorrer em variedades específicas do português brasileiro. . Uma delas tem uma função muito próxima a de uma interjeição3 3 Para uma descrição e tipologia semântica das interjeições do PB, ver Basso e Teixeira (2017, 2019). , com um conteúdo similar a expressões como “mas é claro” ou “é óbvio”. Tal função é exemplificada pelo exemplo (2), acima, assim como pelo exemplo (4a) em contraste com (4b), apresentados na sequência4 4 Lembramos que a pronúncia “tamém” cabe nos casos que analisamos. :

  • (4a) — O João chegou tarde pra caramba em casa.

  • — Também, ele foi na festa.

  • (4b) — Cara!, fui numa festona ontem, foi muito louco.

  • — O João foi na festa também. / O João também foi na festa.

Como se pode observar a partir desses dois exemplos, as sentenças que aparecem em segunda posição nos dois casos são essencialmente idênticas (uma vez que se resolva a anáfora de ‘ele’ como sendo João em (4a)), com a exceção da posição sintática de ‘também’ e da prosódia associada a esse item nesses exemplos. Porém, o conteúdo semântico, bem como o conteúdo pragmático (considerado aqui como a articulação conversacional) das duas respostas são bastante distintos.

Em (4a), ‘também’ expressa uma forma de relação causal, à semelhança de implicaturas convencionais, que estabelece e ressalta a relação entre João ter chegado tarde e ele ter ido na festa, ao passo que em (4b) ‘também’ simplesmente coloca João no grupo de pessoas que foi na festa, e não há aqui nenhum tipo de criação (ou expectativa) de vínculo causal. É interessante notar ainda a posição sintática sempre inicial do tipo de ‘também’ que ocorre em (4a), que certamente é responsável, juntamente com uma entoação específica, pela interpretação que sugerimos. Por sua vez, o ‘também’ de (4b) apresenta maior liberdade sintática e não requer nenhuma entoação específica (i.e., pode ser proferida com uma entoação padrão ou flat).

O outro uso de ‘também’, exemplificado na sentença em (3), possui, por sua vez, uma propriedade de opinião do interlocutor, como os itens expressivos em língua natural5 5 Sobre os expressivos, ver Kaplan (1999), Potts (2005, 2007), Gutzmann (2015), entre vários outros. . Além disso, o ‘também’ de casos como aqueles em (3) têm uma estrutura sintática peculiar: ao passo que o ‘também’ em (2), que classificamos como uma interjeição-conjunção, requer uma sentença como argumento, o ‘também’ de (3) requer um indivíduo como argumento6 6 Uma evidência disso é que esse ‘também’ pode ser usado sem nenhum tipo de continuação explícita, e pode indicar uma avaliação positiva ou negativa do falante sobre um dado indivíduo. Imagine a sentença (a), dirigida a Pedro, quando João o repreende por ter esquecido a porta da geladeira aberta a noite toda; e imagina a mesma sentença, dirigida a Pedro, quando João recebe de Pedro um presente surpresa: (a) Você também, hein! . Tomemos mais um exemplo:

  • (5)Você também, hein, foi na festa na véspera da prova.

Note que, também nesse caso, o uso de ‘também’ carrega um conteúdo de desaprovação sobre algo relativo ao referente do item que funciona como seu argumento, e isso configura seu caráter expressivo, que é a opinião, no caso negativa, do falante7 7 É possível também encontrar exemplos com um uso “positivo” desse ‘também’, como no seguinte diálogo: (a) João tirou 10 de novo! (b) Também (né) ele é um gênio, né. É interessante notar, nesses casos, o uso de “partículas conversacionais”, como ‘hein’ e ‘né’. No entanto, investigar mais a fundo esses usos está fora do escopo do presente artigo. . Todas essas funções linguísticas neste item têm nuances e particularidades próprias, portanto merecem estudos profundos e detalhados, que não serão apresentados neste trabalho, no qual optamos por focar em um uso particular — o uso aditivo, mostrado nos exemplos (1a) e (1b).

Na sequência, passemos a uma breve comparação entre ‘também’, na interpretação que nos interessa, e sua contraparte em inglês para então nos voltarmos a algumas análises prévias desse tipo de item encontradas na literatura especializada, na seção “Análises prévias”. Essa comparação ajudará a entender outras nuances que itens que funcionam como partículas aditivas podem apresentar, bem como a salientar as propriedades de partículas aditivas.

Entre ‘também’ e ‘too

A palavra ‘too’ no inglês, assim como ‘também’, tem mais de uma acepção, e nem todas elas são relevantes ao presente estudo nem equivalem a todas as interpretações que identificamos para o ‘também’ do PB. Para fins de esclarecer as similaridades e diferenças entre ‘too’ e ‘também’, iremos trazer algumas das possibilidades de interpretação de ‘too’ e indicar quais delas são o foco do trabalho e como elas se comparam com ‘também’. Passemos, então, às acepções mais comuns de ‘too’ encontradas na literatura especializada, que são a intensificadora e a aditiva.

  • •a. Intensificador: ‘too’ pode ser usado como um indicador de intensidade, apontando que algo apresenta uma propriedade ou característica num grau maior que o esperado ou o convencional, ou mesmo que algo se encontra em uma quantidade acima do esperado, de modo similar a palavras como ‘demasiado’ ou ‘demais’ do português, como nos exemplos a seguir:

  • (6)You’ve put too much sugar in my coffee.

Você colocou açúcar demais/demasiado no meu café.

Esse uso do ‘too’, apesar de bastante produtivo em inglês, não é o que será analisado neste trabalho. Essa acepção de ‘too’ é muito diferente da que esse item tem como partícula aditiva, resultando em contextos sintáticos suficientemente diferentes para que a distinção seja feita sem grandes riscos de ambiguidade. Há também peculiaridades prosódicas importantes nesse uso de ‘too’, mas não as exploraremos aqui; aqui, basta notar esse uso de ‘too’ para separá-lo do aditivo.

  • •b. Aditiva: ‘too’ pode funcionar como uma partícula aditiva, ou seja, ela permite incluir múltiplos itens como um único argumento de um predicado8 8 A seção “Definição de partículas aditivas” será dedicada a uma definição mais precisa de partícula aditiva. . Note que, nas traduções que oferecemos, o item ‘também’ aparece como escolha natural para o uso como partícula aditiva em português.

  • (7)— I’m starting to feel hungry.

  • Me too.

  • — Estou começando a ficar com fome.

  • — Eu também.

  • (8)Helen’s got a beautiful voice, and she’s a good dancer too.

  • Helen tem uma linda voz, e ela é uma ótima dançarina também.

  • (9)Taking bribes is immoral. It’s bad policy too!

  • Aceitar subornos é imoral. É uma política ruim também!

  • (10) Of course, our customers complain, but we too have our problems.

  • Claro, nossos clientes reclamam, mas nós também temos nossos problemas.

Como podemos observar pelas traduções sugeridas, tanto a posição sintática, quanto a função semântica de ‘too’ e de ‘também’ são muito similares nesses casos, justificando assim utilizar propriedades postuladas para o ‘too’ e aplicá-las ao ‘também’ e vice-versa. É interessante citar que Amsili, em seus diversos trabalhos sobre o tema (Amsili; Beyssade, 2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, 2013AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Beyond obligatory presuppositions. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF LINGUISTS, 19., 2013, Geneva. Proceedings, Geneva, 2013. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/talks/slides_amsili13_cil.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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; Amsili; Ellsiepen; Winterstein, 2012, 2016; entre outros), compara o ‘too’ ao ‘aussi’ do francês, e conclui também que eles têm várias semelhanças importantes, principalmente quanto à interpretação aditiva. Passemos, a seguir, a apresentar algumas propostas já feitas para analisar o ‘too’, ‘também’ e afins.

Análises prévias

O valor de ‘too’ como partícula aditiva já foi alvo de vários trabalhos na literatura em sintaxe e semântica, como mencionamos, e nesta seção vamos considerar algumas ideias que podem ser encontradas nesses trabalhos prévios que, ao mesmo tempo, embasam também nossa proposta de análise e revelam propriedades de ‘too’ que devem ser explicadas por qualquer teoria que tenha esse item como foco, bem como o ‘também’. Sendo assim, o que segue é apenas uma amostra do que há na literatura, e não temos pretensão de exaurir os vários trabalhos existentes, mas de mapear minimamente o terreno, mostrando as principais questões a serem endereçadas.

Tomemos primeiramente um trabalho pioneiro que investiga a partícula ‘too’: o artigo “On too and either, and not just too and either, either” de Georgia M. Green (1968)GREEN, G. M. On too and either, and not just too and either, either. Chicago Linguistic Society, Chicago, v. 4, p. 22-39, 1968.. Nele, a autora afirma que ‘too’ e ‘either’ têm efetivamente a mesma função9 9 A única diferença é que sobre o either incide concordância negativa. , sendo esta função uma de conjunção que, em certos casos, vem acompanhada de uma implicação na qual as cláusulas conjuntas têm alguma relevância interna entre si, e que em outros casos funciona de uma forma que a autora chama de “pseudo pronominalização”10 10 Voltaremos a essa questão na seção “Uma nova proposta”. . Em seguida, a autora diz que uma análise mais completa de tal partícula requer uma gramática capaz de lidar com representações semânticas (uma vez que seu trabalho foi feito inteiramente sob a ótica do gerativismo em seus primeiros anos), que é o que de fato ocorreu em diversos trabalhos subsequentes. Tanto a ideia de “pseudo pronominalização” quanto à de que ‘too’ tem propriedades conjuntivas são ideias apresentadas de formas distintas neste trabalho, sendo a propriedade conjuntiva já citada acima (ela será trabalhada de modo mais aprofundado na seção “Definição de partículas aditivas”). A “pseudo pronominalização” está relacionada à propriedade anafórica do ‘too/também’, que será retomada na seção “Uma nova proposta”.

O próximo trabalho que citaremos é “Obligatory too in English”, de Jeffrey P. Kaplan (1984)KAPLAN, J. P. Obligatory too in English. Language, San Diego, v. 60, n. 3, p. 510-518, 1984., que explora principalmente, como o título sugere, as sentenças em que o ‘too’ é obrigatório, e é certamente um dos trabalhos mais importantes sobre a semântica de ‘too’. Em seu texto, o autor identifica que o ‘too’ implica em uma semelhança entre as duas cláusulas da conjunção,11 11 O que parece fazer sentido com a ideia de que o ‘too’, similarmente ao ‘and’ (‘e’), cria listas, sendo essa semelhança, na análise de Kaplan (1984), um reflexo do processo da criação da lista. Essa ideia será fundamental para nossa proposta a ser desenvolvida na seção “Uma nova proposta”. o que é bastante similar à noção de relevância interna de Green (1968)GREEN, G. M. On too and either, and not just too and either, either. Chicago Linguistic Society, Chicago, v. 4, p. 22-39, 1968.. Outras conclusões interessantes de Kaplan são: (i) um dos efeitos do ‘too’ é o de lançar foco sobre a cláusula na qual ele incide e (ii) diversas sentenças em que o ‘too’ ocorre demonstram manobras anafóricas, atribuídas pelo autor à elipse de uma sentença ou partes de uma sentença. Notamos que na proposta a ser defendida aqui, as características anafóricas descritas por Kaplan são, na realidade, consequências das propriedades do ‘too’ ao invés do efeito de uma elipse. Por fim, Kaplan identifica algumas configurações sentenciais que pautaram os trabalhos subsequentes sobre o tema. Há (i) sentenças em que o ‘too’ é obrigatório, como (11); (ii) sentenças em que o ‘too’ é, de certa forma, opcional12 12 Mais claramente exposto no trecho que diz “First note that, when the semantically identical material occurs in full rather than in anaphorically reduced form, too is less obligatory” (Kaplan, 1984, p. 511-512). (Primeiramente note que, quando o material semanticamente idêntico ocorre de maneira completa ao invés de anaforicamente reduzido o ‘too’ é menos obrigatório). em alguns contextos, ou seja, não afeta o sentido da sentença, como no exemplo (12); e (iii) sentenças em que o ‘too’ é opcional, mas altera o sentido da sentença, como no exemplo (13):

  • (11a)*John is sick and Mary.

  • *John está doente e Mary.

  • (11b)John is sick and Mary too.

  • John está doente e Mary também.

  • (12) a. Jo wrote an article to debunk Chomsky’s claim, and she wrote one to improve her tenure file (too).

  • b. Jo escreveu um artigo para desbancar a afirmação de Chomsky, e ela escreveu um para melhorar seu currículo (também).

  • (13) I bought a car so I could stay out late, and I bought one so I could get to school {(a) too / (b) Ø}

  • Eu comprei um carro para poder ficar fora até mais tarde, e eu comprei um para poder ir à escola {(a) também / (b) Ø}.

Vale a pena ressaltar que o exemplo (13) apresenta algum nível de ruído pragmático de clareza13 13 Especialmente porque nesta sentença o autor argumenta que a interpretação com o “too” tem a interpretação de que é o mesmo carro, o que é questionável em vista desta sentença, especialmente na tradução para o português. , uma vez que sua estrutura é desnecessariamente convoluta, uma vez que não há razão para um falante cooperativo usar o “one/um” novamente ao invés de “outro/another” numa circunstância em que se tratam de carros distintos; apesar disso, a intuição capturada por esse exemplo ainda se sustenta: tal realização é parte da necessidade de uma forma mais compreensiva de se definir o também, como será explorado em mais detalhes na seção 4.

Em “Additive particles under stress”, de Manfred Krifka (1998)KRIFKA, M. Additive Particles under Stress. In: STROLOVITCH, D.; LAWSON, A. (org.). SEMANTICS AND LINGUISTIC THEORY, 8., 1998, Ithaca, NY. Proceedings, Ithaca: Cornell University, 1998. p. 111-129. Disponível em: https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/Publications/ADDPART.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/...
, o autor se encarrega de analisar sentenças com paralelismo sintático, focando particularmente no efeito que o acento frasal em ‘too’ traz em situações dessa natureza, e conclui que o ‘too’, em conjunto com os devidos acentos frasais (quando necessários), serve para selecionar sobre qual tópico ‘too’ efetivamente acrescenta informações. Observe o exemplo (14):

  • (14a)Péter probably visited the exhibition, tòo.

  • Péter provavelmente foi na exposição, tambèm

  • (14b)Peter probably visited the exhibítion, tòo.

  • Peter provavelmente foi na exposíção, tambèm14 14 Os acentos gráficos em negrito são marcações fonéticas de acento (stress) conforme foram apresentados em Krifka (1998). Em nossas traduções, a ideia é replicar o que acontece em inglês.

Em (14a), o ‘too/também’ incide sobre ‘Peter’, mas em (14b), a partícula incide sobre a ‘exibição’. Nesse contexto, ‘Peter’ e ‘exibição’ são o que o autor chama de tópicos contrastivos, ou seja, tópicos que funcionam como uma alternativa de “alvos” para a partícula ‘too/também’. Esta afirmação, como outras apresentadas nesta seção, traz à tona fenômenos que podem ser explicados se considerarmos que uma das funções da partícula ‘too/também’ é formar listas com os argumentos aos quais um dado predicado se aplica (algo que desenvolveremos mais adiante). Sendo assim, e adiantando um pouco nossa análise, é interessante notar que a seleção entre tópicos contrastivos, como apresentada por Krifka (1998)KRIFKA, M. Additive Particles under Stress. In: STROLOVITCH, D.; LAWSON, A. (org.). SEMANTICS AND LINGUISTIC THEORY, 8., 1998, Ithaca, NY. Proceedings, Ithaca: Cornell University, 1998. p. 111-129. Disponível em: https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/Publications/ADDPART.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/...
, nada mais é do que uma forma de explicitar qual elemento está sendo acrescentado em que lista. No caso do exemplo (14a), Peter está sendo adicionado na lista de pessoas que visitaram a exposição, e em (14b) ‘exposição’ está sendo adicionada à lista de lugares que Peter visitou. Tais ideias, mesmo que focadas nas especificidades da resolução da anáfora, novamente reiteram as propriedades aditivas e anafóricas do ‘too/também’ como serão usadas neste trabalho.

Com a ajuda desse histórico de pesquisa, iremos neste momento focar em uma recente análise da partícula ‘too/também’, que leva em conta muito do que foi previamente proposto; trata-se do trabalho de Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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. A análise e crítica a esse trabalho, que exporemos na sequência, fundamenta em parte nossa própria análise, juntamente com os insights de Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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.

De acordo com Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, a partícula aditiva ‘too’ do inglês15 15 Neste trabalho, Amsili e Beyssade (2010) exploram o ‘too’ em comparação com a palavra ‘aussi’ do francês; no que segue, nosso foco será em ‘too’ visto que, segundo os autores, com relação ao comportamento como partícula aditiva, o item do inglês e do francês são bastante semelhantes. dispara um tipo particular de pressuposição chamada de “pressuposição obrigatória”, que é caracterizada por redundância de informação, ou seja, trata-se de uma partícula que (i) não tem conteúdo proposicional, mas que, ao mesmo tempo, (ii) é necessária/obrigatória em certos contextos sintático-semânticos, como no exemplo (15), abaixo:

  • (15a) John está doente, Mary está doente também.

  • (15b) #John está doente, Mary está doente ∅.16 16 Exemplo original: (a) John is sick, Mary is sick too (b) #John is sick, Mary is sick ∅.

Em seu trabalho, Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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explicam essa obrigatoriedade apoiados no “Princípio de maximização de pressuposições”, introduzido por Sauerland (2008)SAUERLAND, U. Implicated presuppositions. In: STEUBE, A. The Discourse Potential of Underspecified Structures. Berlin: New York: De Gruyter, 2008. p. 581-600. Disponível em: https://doi.org/10.1515/9783110209303.4.581. Acesso em: 1 mar. 2021.
https://doi.org/10.1515/9783110209303.4....
. Esse princípio propõe que uma contribuição conversacional deve pressupor tanto quanto possível, ou seja, sempre que possível um falante deve escolher um item ou uma construção/formulação que carregue o máximo de pressuposições possível frente a uma alternativa plausível nas mesmas circunstâncias, mas que carrega menos conteúdo pressuposicional. A ideia é que, caso o falante não opte por maximizar as pressuposições, então o ouvinte pode inferir que os pressupostos não se aplicam naquela conversação17 17 Um exemplo deste fenômeno é o caso em que há uma alternativa entre os verbos ‘saber’ e ‘achar’ (em que as pressuposições do verbo ‘saber’ estão satisfeitas, mas o falante opta por usar ‘achar’). O verbo ‘saber’ é claramente preferível, pois ele pressupõe mais que ‘achar’, como, por exemplo, em “Maria acha que está gripada” em oposição a “Maria sabe que está gripada”. Para mais detalhes, ver Schlenker (2008) e Percus (2006). .

Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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argumentam que o uso de ‘too’ estabelece uma relação contrastiva com ∅, na qual a presença de ‘too’ pressupõe a existência de um outro item, que é um argumento de um predicado similar (ou idêntico) àquele presente na sentença; no caso de (15), esse predicado é ‘be sick’/‘estar doente’. Dado que nesse contexto a pressuposição de ‘too/também’ é satisfeita no caso de Mary estar doente, o uso de ∅ é inadequado, segundo o princípio de maximizar pressuposição, uma vez que a pressuposição disparada por esta partícula está satisfeita no contexto, resultando assim num efeito de obrigatoriedade do uso de ‘too/também’ em contextos dessa natureza. É por isso que os autores propõem que ‘too/também’ tem um “efeito reparador”, pois sua presença restaura uma configuração que seria, de acordo com o princípio de maximizar pressuposição, inadequada.

Contudo, é possível argumentar que ‘too/também’ não são necessariamente uma partícula obrigatória e que o recurso de maximizar pressuposição não explica todas as suas ocorrências; essa é, a nosso ver, uma crítica importante a tal abordagem, que motiva a busca por alternativas de análise. Uma evidência a favor dessa ideia pode ser vista no exemplo (16), abaixo — note que ambas as sentenças (16a) e (16b) são válidas, porém possuem conteúdos proposicionais diferentes.

  • (16a) Compra um McLanche feliz, mas se você estiver com muita fome compra um BigMac.

  • Buy a Happy Meal, but if you are really hungry buy a BigMac.

  • (16b) Compra um McLanche feliz, mas se você estiver com muita fome compra um BigMac também.

  • Buy a Happy Meal, but if you are really hungry buy a BigMac too.

Como mostram esses exemplos, não só a partícula ‘também/too’ não se faz obrigatória como traz conteúdo assertivo/proposicional, o que é contrário a um aspecto-chave da descrição de Amsili e Beyssade (2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, p.18), que afirmam que ‘too’ não tem conteúdo assertivo/proposicional: “We claim that obligatoriness defines a sub-class of presupposition triggers, characterized by the fact that they have no asserted content.”18 18 Tradução: “Afirmamos que a obrigatoriedade define uma sub-classe de gatilhos pressuposicionais, caracterizados pelo fato de que eles não têm conteúdo assertado”. .

No entanto, o contraste entre (16a) e (16b) evidencia que ‘too/também’ é mais do que um gatilho de pressuposição obrigatória: em (16a), a opção sem o ‘too/também’ é perfeitamente aceitável causando uma interpretação de que a sugestão é de duas opções sendo uma o McLanche Feliz/Happy Meal e a outra o Big Mac; porém, quando se inclui o ‘too/também’, em (16b), comprar somente um Big Mac não é mais uma opção, agora a compra do Big Mac passa a incluir o Mclanche Feliz/Happy Meal. Em vista desse tipo de exemplo, a descrição da partícula ‘too’ como gatilho de pressuposição obrigatória de Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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não é suficiente para acomodar este tipo de fenômeno, uma vez que pressuposições não têm poder de afetar explicitamente o conteúdo assertivo/proposicional de sentenças, como ocorre no exemplo (16).

Apesar do contexto sintático apresentado em (16) ser significativamente diferente do apresentado em (15), a função de ‘too/também’ parece ser a mesma, ou, ao menos, bastante similar, o que aponta, num primeiro momento, para o caso de estarmos lidando com uma mesma partícula, com uma mesma função semântica. Isso torna a diferença proposicional entre (16a) e (16b) particularmente intrigante, pois ela não pode ser atribuída a nenhum outro item, uma vez que a única diferença entre as duas é, como dissemos, a presença ou ausência de ‘too/também’. Por outro lado, levar em consideração que essa estrutura seja um caso de uma nova função de ‘too/também’ traz diversos problemas, por exemplo: Como diferenciar os dois? Quais contextos são apropriados para um e para outro? Por que eles são tão semelhantes?

Neste trabalho, consideraremos a hipótese de que temos uma mesma partícula, uma vez que a definição proposta na seção “Definição de partículas aditivas”, conforme argumentaremos, é suficiente para explicar todos os casos considerados, e, de acordo com o exemplo (16), ela aparenta ser necessária para explicar esse tipo de contexto, o que faz nossa proposta ser mais econômica e abrangente.

Considere ainda os exemplos a seguir:

  • (17a) Passe aqui hoje à tarde, e lembre de vir com o cachecol, ou se estiver muito frio com as luvas.

  • Come by in the evening, and remember to come with your scarf on, or if it’s too cold with your gloves.

  • (17b) Passe aqui hoje à tarde, e lembre de vir com o cachecol, ou se estiver muito frio com as luvas também.

  • Come by in the evening, and remember to come with your scarf on, or if it’s too cold with your gloves too.

  • (18a) Depois dessa música eles vão tocar Índios, a não ser que liberem mais tempo, porque aí eles vão tocar Faroeste Caboclo.

  • After this song they’ll play Índios, unless they’re given more time, in that case they will play Faroeste Caboclo.

  • (18b) Depois dessa música eles vão tocar Índios, a não ser que liberem mais tempo, porque aí eles vão tocar Faroeste Caboclo também.

  • After this song they’ll play Índios, unless they’re given more time, in that case they will play Faroeste Caboclo too.

Esses exemplos apresentam em sua estrutura uma operação de alternativa condicional, marcada pelas sequências “ou se” e “porque aí”. Essa operação alternativa condicional revela uma propriedade crucial de ‘também’ como partícula aditiva, que é sua capacidade de alterar o conteúdo proposicional assertado pelas sentenças, uma vez que as diferenças entre cada um dos pares acima não podem ser o resultado de operações de natureza exclusivamente pressuposicional. Uma vez que não há unicidade desencadeada neste contexto, por consequência da presença de duas alternativas, a análise proposta por Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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não tem meios para descrever adequadamente estes contextos. Em vista disto, pode-se apreciar a necessidade de uma nova abordagem para ‘também’ como partícula aditiva.

Nas próximas seções tal abordagem será apresentada, e ela, conforme argumentaremos, dará conta de todas as propriedades de ‘também’ como partícula aditiva já apresentadas neste trabalho. Por meio de uma definição fundamentada sobre a estrutura de formação de listas, de acordo com a proposta de Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, que apresentaremos a seguir, é também possível explicar as propriedades anafóricas e pressuposicionais de ‘também’ como manobras sobre a lista como estrutura de armazenamento de informação.

Definição de partículas aditivas

Até aqui, mobilizamos uma noção intuitiva de partícula aditiva, como um item que aumenta os argumentos aos quais um predicado se aplica, e que dá conta dos casos analisados. Mais formalmente, adotaremos a definição de partículas aditivas proposta por Linmin Zhang em seu trabalho de 2015, que pode ser resumida brevemente da seguinte maneira: uma partícula aditiva, como ‘e’ ou ‘ou’, é um operador que toma dois elementos do mesmo tipo sintático e semântico como input e os combina de modo a resultar em um único elemento sintático de um único e mesmo tipo semântico19 19 Nas palavras da autora: “And/or takes arguments of the same type and returns an output of that type” (Zhang, 2015, p. 3). . No entanto, a parte mais relevante de tal proposta para os objetivos deste trabalho não se encontra particularmente no efeito que as partículas aditivas exercem sobre o contexto em que se encontram, mas sim no processo pelo qual esse resultado é alcançado.

Para abordar de maneira mais detalhada a teoria proposta por Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, é necessário primeiramente analisar as duas hipóteses lançadas por Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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que Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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cita em seu artigo, e os problemas que a autora aponta em tais hipóteses. São justamente esses problemas e sua resolução que levaram Zhang à sua proposta, que, como dissemos, é a que adotaremos para lidar com ‘também’. Comecemos, então, com a análise dos itens ‘e’ e ‘ou’ para depois nos voltarmos para a análise de ‘também’.

Conjunção como partícula aditiva

A primeira hipótese de Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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é que a partícula ‘and’20 20 As teorias de Winter (2006) e Zhang (2015), apresentadas nesta seção, em larga medida também se aplicam à partícula ‘or’ do inglês, uma vez que o foco de suas análises incide sobre Coordenações Múltiplas, e ambas essas partículas são capazes de construí-las. Porém, dado o escopo do presente artigo, a inclusão da partícula ‘or’ nas definições será omitida para fins de simplicidade e economia. (‘e’), do inglês, consiste em um operador binário (ou 2-tuplo21 21 Esta forma de notação é uma adaptação da notação ‘n-ary’ do inglês, cuja tradução mais comum é n-tuplo. Em alguns momentos, esta notação será utilizada. ) que pode se manifestar de forma silenciosa. Essa hipótese define coordenações múltiplas como aplicações recursivas sucessivas desse operador binário de forma aninhada. É justamente nessa definição de coordenações múltiplas que se encontra o problema apresentado por Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, na medida em que tal definição prevê mais leituras do que certos contextos de fato permitem. Tal situação pode ser observada em (19): de acordo com esta hipótese, (19a) e (19b) seriam semanticamente equivalentes, mas esse não é o caso. Para que (19a) seja verdadeira, podemos considerar cenários em que há a exigência de dois ou de três requerimentos, conforme representamos a seguir. Contudo, (19b) só permite a leitura de que há três requerimentos distintos, excluindo a possibilidade de serem dois, diferentemente do que temos para (19a). Essa diferença, como nota Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, não pode ser explicada por uma hipótese que, como vimos, considera que ‘e’ seja um operador binário recursivo com estrutura aninhada.

  • (19a) Você precisa [[dançar e pular] e cantar].

  • Duas leituras disponíveis:

  • ✓2 requerimentos (dançar & pular; cantar); | ✓3 requerimentos (dançar; pular; cantar)

  • (19b) Você precisa dançar, pular e cantar.

  • Apenas uma leitura disponível:

  • #2 requerimentos; | ✓3 requerimentos (dançar; pular; cantar)22 22 Adaptado do exemplo trazido por Zhang (2015, p. 3).

Um segundo problema que a autora aponta (Zhang, 2015ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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), ainda referente à definição de coordenação múltipla da hipótese de Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, é de que ela prevê resultados indesejáveis, como pode ser notado no exemplo (20)23 23 Originalmente, exemplo 7 em Zhang (2015 p. 3). . Nesse exemplo, uma vez que não é definida claramente uma regra para restringir adequadamente o apagamento da partícula ‘and’ em coordenações, esse tipo de resultado em que a partícula aparece em posições arbitrárias em meio à coordenação é inevitável, o que demonstra a necessidade de uma hipótese mais detalhada quanto à função e definição da partícula aditiva.

  • (20) *Al, Bill e Cal, Jo sorriram. (com a intenção de significar Al, Bill, Cal e Jo sorriram)

Forma lógica da coordenação múltipla:

Um problema similar é notado na segunda hipótese de Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, conforme introduzida por Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, na qual observamos que há uma mudança de paradigma na forma em que o operador funciona: agora a operação de aplicar um operador binário múltiplas vezes sucessivamente pode ser generalizada num operador n-tuplo (ou seja, um operador que tem como argumentos n elementos), de modo que, em coordenações múltiplas, todas as instâncias de tal operação seriam silenciosas exceto a última24 24 A crítica à segunda hipótese de Winter (2006), como apresentada em Zhang (2015), é: “In Winter (2006), Hypothesis 2 proposes that binary operators and and or can be generalized into n-ary operators with a recursive definition (see (8a) and (8b)), so that MC [coordenação múltipla] is built with a flat structure, as (8c) shows. Also a stipulation is needed here: and and or are never silent in MC, but always pronounced right before the rightmost item”. .

Porém, essa definição também não é adequada, e permite a geração de outro tipo de resultados indesejáveis como pode ser visto no exemplo (21)25 25 Originalmente exemplo número 9 em Zhang (2015, p. 4). , extraído de Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, e também no exemplo (22), que consiste na versão textual completa do exemplo anterior.

  • (21) *A, e B, C, D e E sorriram. (querendo dizer A, B, C, D, e E sorriram.)

Forma Lógica:

a. *A, and B, C, D and E smiles. (intended meaning: A, B, C, D, and E smiled.)

b.

  • (22) a. João e Paulo, Alberto, Pedro e Júlio foram lá em casa ontem.

  • b. João, Paulo, Alberto, Pedro e Júlio foram lá em casa ontem.

Analisando os exemplos (22a) e (22b), podemos perceber que eles não são completamente equivalentes, sendo que, de acordo com a descrição feita da hipótese de Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, seria precisamente esse o resultado esperado, uma vez que utilizando dois operadores (um 2-tuplo e um 4-tuplo) os resultados gerados não deveriam ser diferentes de um operador 5-tuplo, uma vez que esse tipo de operação não impõe uma hierarquia semântica entre seus itens internos nem quanto ao resultado da operação, assim como não há nenhuma regra nesta hipótese que requeira que seja utilizado apenas um operador quando possível. No entanto, olhando cuidadosamente para o exemplo (22a), a interpretação é de que ‘João e Paulo’ formam um grupo distinto e que esse grupo está ocupando o espaço de um elemento da lista no qual ele está incluso.

O cerne destes problemas consiste do fato de não haver uma definição compreensiva da partícula “e”, especialmente sua conexão com o restante da coordenação múltipla, sendo assim Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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propõe que o funcionamento de partículas aditivas26 26 A hipótese de Zhang (2015), assim como as de Winter (2006) anteriormente, também se aplicam a partículas disjuntivas como ou/or, porém elas fogem ao escopo do presente trabalho. consiste não de um único operador, mas sim de um conjunto de três deles que são sempre representados por apenas uma instância de partícula aditiva, e todas estas operações incidem sobre uma lista com propriedades similares às da função list (ou lista) de uma linguagem de programação como Haskell, ou seja, uma sequência ordenada de itens ou valores de um mesmo tipo. Vejamos a seguir como isso se dá em mais detalhes.

Em Zhang (2015ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, p. 4–7), a autora argumenta que a partícula ‘and’ na realidade é um operador binário que opera sobre a estrutura da informação de uma sentença, e a operação que ela realiza é a criação de uma lista. Isso é feito em três partes: (i) uma operação de construção de lista, que consiste na adição de um item a uma lista (pode ter uma lista formada por um único item); (ii) uma operação de seleção que, no caso, consiste na aplicação de uma função identidade sobre a lista; (iii) uma função fold 27 27 Note que a função fold é um tipo de função específica na computação, que, em associação a um tipo de operação, aplica tal operação a todos os membros de um conjunto , demonstrada no exemplo (23), que utiliza informações contextuais para determinar qual operação seria distribuída a todos os itens da lista, tornando a lista um objeto único, ou mantendo-a como objetos individuais.

  • (23a) João, Maria e Pedro se sentaram. cada um, individualmente

  • (23b) João, Maria e Pedro construíram a casa da Joana. juntos, coletivamente

Dessas operações a que é mais relevante para este trabalho é a (i), a de formação de lista, uma vez que a operação (ii), de seleção, é pouco pertinente dado que sua função se resume a distinguir entre disjunções e conjunções. Partindo do ponto de que estamos lidando com uma conjunção, este ponto se faz pouco relevante. Por sua vez, a função fold, apesar de ser uma forma interessante de lidar com a questão da distributividade vs. coletividade (para mais detalhes ver Champollion (2014)CHAMPOLLION, L. Distributivity, collectivity and cumulativity. 2014. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~bcrabbe/mpri/champollion.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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e Nicolae et al. (2016)) não é a única proposta debatida, além de que a análise proposta não é predicada nesta particularidade, sendo assim potencialmente compatível com mais de uma forma de descrever este fenômeno.

Nesta definição, pode-se perceber a versatilidade de processar a coordenação múltipla como uma lista, uma vez que essa é uma forma eficiente de processar a arbitrariedade da quantidade de itens possíveis numa coordenação, preservando regras claras e bem delimitadas sobre quando os operadores podem ser omitidos e a consequência dessa omissão na estrutura gerada.

Até aqui, em resumo, apresentamos alguns dos problemas relevantes na descrição semântico-funcional de partículas aditivas, assim como uma possível solução baseada na ideia de listas. Em vista da versatilidade da proposta de Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, no restante deste artigo essa será a abordagem adotada quanto ao funcionamento de partículas aditivas.

O caso de ‘também’

Uma vez definido o conceito de partícula aditiva, podemos explorar a propriedade aditiva do item ‘too/também’. No trabalho de Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, os únicos itens aos quais são atribuídas propriedades aditivas são ‘and/e’ e ‘or/ou’; para o presente trabalho, como mostraremos na sequência, o mais relevante desses dois itens é o ‘and/e’, pois eles compartilham muitas similaridades funcionais com ‘too/também’.

Nos contextos dos exemplos anteriores (4), (7) e (9), podemos perceber que não só a estrutura de ‘and’ e de ‘e’ são similares, como que o ‘too’ e o ‘também’ apresentam a propriedade de adicionar um novo elemento a uma lista pré-estabelecida; sendo assim, ao menos num primeiro momento pode-se assumir que pelo menos alguns dos processos descritos em Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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devam se aplicar ao ‘também’ como partícula aditiva.

Tal pensamento vai ao encontro das ideias expressas em Green (1968)GREEN, G. M. On too and either, and not just too and either, either. Chicago Linguistic Society, Chicago, v. 4, p. 22-39, 1968., Krifka (1998)KRIFKA, M. Additive Particles under Stress. In: STROLOVITCH, D.; LAWSON, A. (org.). SEMANTICS AND LINGUISTIC THEORY, 8., 1998, Ithaca, NY. Proceedings, Ithaca: Cornell University, 1998. p. 111-129. Disponível em: https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/Publications/ADDPART.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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e Szabolcsi (2017)SZABOLCSI, A. Additive presuppositions are derived through activating focus alternatives. In: AMSTERDAM COLLOQUIUM, 21., 2017, Amsterdam. Proceedings, Amsterdam: University of Amsterdam. 2017. p. 455-465. em que os autores consideram ‘too’ uma partícula com propriedades aditivas, portanto, comparável ao ‘and’. Apesar disto, o ‘too/também’ tem também consideráveis propriedades distintas de ‘and/e’. A primeira e mais notável é a possibilidade de não estar adjacente ao conteúdo sobre o qual a aditividade será aplicada, como pode ser observado no exemplo (24), em que Rui é adicionado a João e Pedro, mesmo estando distante da coordenação inicial. Neste trabalho, não haverá uma discussão em detalhes sobre a comparação entre o ‘too/também’ e o ‘and/e’. Apesar de tal discussão ser necessária e produtiva, neste momento a similaridade exposta pelo exemplo mostrando que ele é capaz de formular listas é suficiente para embasar a estrutura da proposta de definir o ‘too/também’.

  • (24) Eu estava jogando bola com o Pedro e o João no sábado passado, todos curtiram jogar bola, até o Rui, que também foi, mas participou pouco.

É interessante observar que essas funções estão presentes em coordenações, porém nem sempre são disparadas por uma partícula explícita, em certos contextos, como abaixo:

  • (25) Mário tá doente; Pedro tá doente; meu irmão tá doente. O que tá acontecendo?

(25) é uma conjunção, mas note que sabemos isso somente devido à continuação “O que tá acontecendo?”, pois o trecho que traz os elementos da lista sem uma partícula explícita — “Mário tá doente; Pedro tá doente; meu irmão tá doente” — é ambíguo. Essa lista pode ser tomada como uma conjunção, como no exemplo (25), ou como uma disjunção, como nos exemplos (26) e (27), o que demonstra que esta estrutura atípica sem demarcações não é inerentemente uma conjunção, mas, sim, é ainda suscetível ao contexto seguinte.

  • (26) Mário tá doente; Pedro tá doente; meu irmão tá doente?

  • (27) Mário tá doente; Pedro tá doente; meu irmão tá doente; ou é o seu primo que tá doente?

Além disso, é pertinente observar que essa omissão da partícula aditiva se apresenta com uma prosódia diferente daquela de coordenações típicas, em que o último elemento da lista tem uma curva prosódica distinta dos itens anteriores, e neste caso todos os itens vêm acompanhados de uma prosódia muito similar28 28 Esse fenômeno merece certamente um estudo mais aprofundado, porém sua natureza fonética o coloca fora do escopo do presente estudo, que tem o foco voltado à semântica desses fenômenos. .

Em vista disto, é razoável postular que, no exemplo (25), essa ambiguidade é resolvida por conta do princípio pragmático de maximização de informatividade — trata-se de um princípio decorrente das Máximas Griceanas que determina que há uma preferência por estruturas com maior conteúdo informativo. Uma vez que a conjunção é mais informativa do que a disjunção, na ausência de um fator decisivo a conjunção é a alternativa preferencial por default. Porém, o resultado final, ou seja, a lista produzida, mesmo em sentenças desse tipo, em nada difere de qualquer outra produzida por uma coordenação múltipla29 29 A discussão deste tipo de fenômeno de listas criadas sem partículas aditivas, por mais interessante que seja, não cabe no escopo deste trabalho, uma vez que as estruturas pertinentes, sendo estas o funcionamento das funções que Zhang (2015) usa para definir partículas aditivas, não são afetadas de forma significativa por este tipo de fenômeno. .

Uma vez demonstradas as análises anteriores bem como as ferramentas necessárias, a próxima sessão construirá, a partir dessas partes, uma nova forma de análise do ‘também’, mais concisa e abrangente que as anteriores.

Uma nova proposta

Nossa proposta sobre como definir o significado e a contribuição linguística de ‘too/também’ se embasa principalmente em sua função como partícula aditiva, como definida na seção “Definição de partículas aditivas” deste artigo, na qual pudemos observar que o ‘too/também’, segundo essa análise, apresenta a propriedade30 30 As outras duas funções descritas na seção anterior ainda se aplicam, mas para os fins desta análise a de formação de listas é a mais pertinente. de adicionar um item em uma lista não nula. Essa propriedade consegue, em princípio, explicar tanto os exemplos do tipo apresentado em (15a) quanto aqueles do tipo apresentado em (16b). Em (15a), a lista formada em última instância é a lista John e Mary, enquanto em (16b), a lista é McLanche Feliz e Big Mac.

A lista dá conta de explicar o processo de anáfora uma vez que ela estabelece as regras de indexação e a maneira pela qual o item indexado é tratado. Vale a pena ressaltar, porém, que as restrições típicas de saliência contextual ainda se aplicam como em qualquer tipo de anáfora. Dito isto, a redução de resolução desse processo pode ser vista observando a análise do exemplo a seguir:

  • (28a) João foi à praça, comprar cebolas na quinta-feira. Ele ficou muito frustrado com o preço e quase brigou com a vendedora. Ele também fez caminhada e jogou tênis antes de voltar para casa.

  • (28b) João foi à praça, comprar cebolas na quinta-feira. Ele ficou muito frustrado com o preço e quase brigou com a vendedora. Joana também comprou cebolas, mas ela foi mais esperta e comprou na outra feira que era mais barata.

  • (28c) João foi à praça, comprar cebolas na quinta-feira. Ele ficou muito frustrado com o preço e quase brigou com a vendedora. Ele também comprou bananas e laranjas antes de voltar para casa.

Como pode ser observado, a seleção do material que funcionará como antecedente é feita pelo predicado que acompanha cada ‘também’, e a estrutura é sempre a mesma: o predicado contendo o ‘também’ estabelece uma lista que inclui o antecedente, que compartilha a mesma função no predicado, seja o núcleo do predicado (verbo) — em (28a), a lista é composta de coisas que João fez, ou seja comprou cebolas, caminhou e jogou tênis, ou qualquer uma das posições de argumento do predicado; em (28b) e (28c), há listas de pessoas que compraram cebolas (João e Joana), e coisas que João comprou (cebolas, bananas e laranjas), respectivamente, respeitando a estrutura predicativa que acompanha a ocorrência do ‘também’.

Contudo, há um problema com o uso dessa definição para o ‘too/também’, pois essa partícula tem uma diferença crucial com partículas aditivas, no quesito de que ela não precisa estar adjacente aos outros elementos da lista. Por essa razão é necessário observar que ‘too/também’ possui propriedades anafóricas, conforme defende Roberts (2017)ROBERTS, C. Anaphora in discourse. São Carlos, SP, 2017. Minicurso dado na Universidade Federal de São Carlos. e conforme é notado desde, pelo menos, o trabalho de Green (1968)GREEN, G. M. On too and either, and not just too and either, either. Chicago Linguistic Society, Chicago, v. 4, p. 22-39, 1968.. Sendo assim, é necessário definir como o ‘too/também’ seleciona o conteúdo retomado anaforicamente. A proposta de solução que aqui será defendida é a de que a retomada é sempre ditada pelo predicado ao qual a partícula aditiva está associada. Portanto, toda vez que ‘too/também’ for usado em um dado contexto, é necessário que ou exista um antecedente explícito ou exista uma informação de common ground que permita esse uso, como no exemplo em (29):

  • (Considere a seguinte frase escrita na janela de uma cafeteria).

  • (29) Nós temos comida também.

  • We have food too.

Nesse exemplo, o processo de retomada anafórica de ‘too/também’ se apoia fortemente em algumas manobras pragmáticas amplas, como a mobilização do conhecimento de mundo; por exemplo, essa frase não faria muito sentido na janela de um restaurante, justamente porque a ideia de lá haver comida é óbvia, e, portanto, dizer “temos comida” seria redundante. Por outro lado, o uso da partícula aditiva nesse caso só se faz possível porque é esperado que uma cafeteria ofereça diversas coisas, e, sendo assim, ‘too/também’ estaria adicionando algo à lista implícita de coisas que uma cafeteria oferece; tal lista só pode ser acessada pelo conhecimento esperado de alguém que leia essa frase de que uma cafeteria vende primeiramente café e não necessariamente precisa vender comida para ser considerada uma cafeteria, bem como não é contraditório que cafeterias vendam, eventualmente, comida.

Por fim, podemos nos voltar para o efeito de obrigatoriedade do ‘too’, que pode ser estendido para o caso de ‘também’, mostrado por Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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em exemplos como (15a), repetido abaixo:

  • (15a) John está doente, Mary está doente também.

  • (15b) #John está doente, Mary está doente ∅.

Nesse caso, argumentaremos que tal efeito pode ser explicado por outras manobras pragmáticas. Observando o exemplo (15b), notamos que o problema, pelo menos de acordo com nossa proposta, é que existe o mesmo predicado associado a dois objetos em duas instâncias diferentes. Por conta disso, é esperado que estes predicados signifiquem coisas diferentes, pois num contexto em que o predicado seria o mesmo, o esperado seria que ambos os objetos estivessem juntos, unidos por uma partícula aditiva sob um mesmo predicado; portanto, a partícula aditiva funcionaria para reparar o fato de que estes dois objetos são, na verdade, argumentos de um mesmo predicado, apesar de a predicação estar repetida. Ou seja, nesse contexto o ‘too’ funciona como uma espécie de reparador de uma sentença que seria pragmaticamente anômalo em sua ausência — mas é importante notar que o “efeito reparador” é consequência da propriedade que ‘too/também’ tem de criar listas, e não o contrário, ou seja, é porque esse item pode criar listas que ele pode ser usado como um “elemento reparador” de certas estruturas.

Por outro lado, existe a situação de que sentenças como (15a) utilizam a forma pragmática não usual, com a repetição dos predicados para gerar foco, que usualmente é um efeito atribuído à partícula ‘too’ (Kaplan, 1984KAPLAN, J. P. Obligatory too in English. Language, San Diego, v. 60, n. 3, p. 510-518, 1984.; Krifka, 1998KRIFKA, M. Additive Particles under Stress. In: STROLOVITCH, D.; LAWSON, A. (org.). SEMANTICS AND LINGUISTIC THEORY, 8., 1998, Ithaca, NY. Proceedings, Ithaca: Cornell University, 1998. p. 111-129. Disponível em: https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/Publications/ADDPART.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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), mas é plausível que isto seja influenciado pelo ato de se estruturar a sentença de uma forma pragmaticamente “inesperada”, causando, assim, o efeito de foco. Nesse contexto, ‘too/também’ serviria duas funções: (i) criar uma lista, que, como argumentaremos a seguir, é uma forma mais econômica de lidar com a informação31 31 Pois o efeito de criação de lista não se perde ao se atribuir foco; inclusive, o foco é amplificado pela estruturação da lista, uma vez que é feito um contraste do elemento focado com os outros elementos pertencentes à lista. , e (ii) direcionar o foco, talvez com o auxílio (aparentemente opcional) de acentos frasais (Krifka, 1998KRIFKA, M. Additive Particles under Stress. In: STROLOVITCH, D.; LAWSON, A. (org.). SEMANTICS AND LINGUISTIC THEORY, 8., 1998, Ithaca, NY. Proceedings, Ithaca: Cornell University, 1998. p. 111-129. Disponível em: https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/Publications/ADDPART.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
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). Porém, o embasamento na máxima de quantidade não parece ser completamente suficiente em certos casos, como, por exemplo, (30) (Amsili; Beyssade, 2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, p. 6) e em sua tradução em (31):

  • (30) Swift Deer could see pine-clad mountains on the other side of the Rain Valley. Far away to the east and west the dry prairies stretched out as far as the eye could see. To the north lay the yellow-brown desert, a low belt of green cactus-covered ridges and distant blue mountain ranges with sharp peaks. To the south (#/ too) he could see mountains32 32 No texto original esse exemplo é identificado como o de número 11 (Amsili; Beyssade, 2010). .

  • (31) Swift Deer podia ver montanhas cobertas de pinheiros do outro lado do Vale da Chuva. Bem longe a leste e oeste as pradarias secas se estendiam tão longe quanto os olhos podiam ver. Ao norte, ficava o deserto amarelo-amarronzado, um baixo cinturão verde de cumes cobertos por cactos e distantes cadeias de montanhas azuis com picos afiados. Ao sul ele (# ∅/também) podia ver montanhas.

Nesse exemplo, não há uma forma claramente mais econômica de dizer que havia montanhas ao sul e ao norte e ainda preservar todas as informações. De toda forma, há o argumento de que uma estrutura de lista é informacionalmente econômica, pois ela recicla informações presentes no contexto ao invés de introduzir uma informação como inteiramente nova, o que demanda uma distinção entre informação nova e as outras informações já contidas no contexto. Porém, quando listas aproveitam conteúdos contextuais já introduzidos, a quantidade de informações novas é diminuída, e, portanto, mais eficiente. Sendo assim, o uso do ‘too/também’ no final do exemplo respeita este argumento.

Sendo assim, a nova proposta contempla os casos em que ‘também’ é claramente uma partícula aditiva como em (32), no qual uma lista também é criada com o lugar onde o contexto da sentença se situa e o lugar perto da casa do falante como lista de lugares que vendem o “negócio”. Além disso, a proposta abrange situações como (33) e (15), em que o processo de criação de listas é uma solução elegante como forma de reparo de uma construção pragmaticamente ruidosa. Por fim, essa proposta também consegue contemplar exemplos como (34) e (16b), nos quais a criação de listas se depara com uma disjunção criada pela palavra ‘ou’, sendo assim como a lista criada está de um lado da disjunção e um de seus elementos formadores está do outro, não há o efeito de atualização de conteúdo que as listas criadas por partículas aditivas costumam ter, mas sim uma oposição da lista com os dois elementos e de um dos elementos sozinho.

  • (32) Por que a gente veio até aqui mesmo? Lá perto de casa também vendia esse negócio.

  • (33) O meu primo votou nele e a minha tia também.

  • (34) Você vai no cinema ou vai no teatro Ø/também

Passemos então às conclusões deste artigo.

Conclusão

Ao fim desta análise, concluímos que a proposta de Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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de considerar ‘too’ como uma partícula de pressuposição obrigatória não parece ser inteiramente adequada, pois ela requer que esse item não possua conteúdo assertivo/proposicional, e, como esperamos ter demonstrado neste trabalho, com a análise de exemplos com a estrutura de (16), esse não é sempre o caso. Isso não quer dizer, obviamente, que o conceito de pressuposição obrigatória não seja adequado às outras estruturas analisadas em Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
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, mas esta discussão está para além do escopo deste trabalho.

Além disso, concluímos que a partícula ‘too’ compartilha características suficientes com a partícula ‘também’ (pelo menos no que concerne ao uso aditivo de ambas) para que uma mesma análise seja aplicável aos dois itens, sendo que dentre tais características compartilhadas está inclusa a propriedade anafórica.

Ao fim, juntando as peças, propomos uma forma de análise que, por meio do uso da ideia de estender a capacidade de formação de lista à partícula ‘também’, permite capturar mais eficientemente a capacidade anafórica do ‘também’, uma vez que a função de adição a listas permite que as anáforas sejam feitas de uma forma mais clara e direta, uma vez que a manobra anafórica passa a consistir em criar uma lista composta de um elemento, prévio no contexto e adicionando a uma lista, criada33 33 Ou atualizada, no caso da anáfora retomar uma lista ao invés de um item singular. no momento da anáfora, o que aproxima a anáfora do funcionamento típico de uma conjunção simples, assim gerando economia no processo anafórico, uma vez que não se faz necessário o uso de outras ferramentas teóricas.

Essa economia, aliada à capacidade de descrever adequadamente tanto o uso focal da partícula, quanto os contextos de alternativa condicional, é uma das mais importantes contribuições deste artigo. Dito isto, alguns dos pormenores da forma com o que o predicado é retomado na anáfora ainda restam a ser trabalhados, uma vez que as condições de retomada ainda não são totalmente evidentes.

Agradecimentos

Agradecemos à CAPES por financiar a pesquisa de mestrado de Matheus Bittencourt Cipolli, que contribui para a escrita deste artigo.

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    » http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf
  • 1
    Seria certamente muito interessante procurar a origem desses outros usos, mas trata-se de uma tarefa que foge ao escopo do presente trabalho. Além disso, a lista de usos que apresentamos aqui não tem o intuito de ser exaustiva.
  • 2
    Deixaremos em aberto a possibilidade de outros usos e análises para ‘também’, que podem, por exemplo, ocorrer em variedades específicas do português brasileiro.
  • 3
    Para uma descrição e tipologia semântica das interjeições do PB, ver Basso e Teixeira (2017BASSO, R. M.; TEIXEIRA, A. Interjeições como indexicais expressivos: um tratamento em semântica formal. Veredas atemática, Juiz de Fora, v. 21, n. 2, p. 78-94, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.34019/1982-2243.2017.v21.27976. Acesso em: 16 abr. 2024.
    https://doi.org/10.34019/1982-2243.2017....
    , 2019BASSO, R. M.; TEIXEIRA, A. Uma tipologia para as interjeições do português brasileiro. Revista do GEL, São Paulo, v. 16, n. 3, p. 10-34, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.21165/gel.v16i3.2593. Acesso em: 16 abr. 2024.
    https://doi.org/10.21165/gel.v16i3.2593...
    ).
  • 4
    Lembramos que a pronúncia “tamém” cabe nos casos que analisamos.
  • 5
    Sobre os expressivos, ver Kaplan (1999)KAPLAN, D. The meaning of ouch and oops. Los Angeles: University of California, 1999. Publicado pelo canal University of California Television (UCTV). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=iaGRLlgPl6w&t=84s. Acesso em: 1 mar. 2021.
    https://www.youtube.com/watch?v=iaGRLlgP...
    , Potts (2005POTTS, C. The logic of conventional implicatures. Oxford: Oxford University Press, 2005., 2007POTTS, C. The expressive dimension. Theoretical Linguistics, Berlin, v. 33, n. 2, p. 165-197, 2007.), Gutzmann (2015)GUTZMANN, D. Use-conditional meaning: studies in multidimensional semantics. Oxford: Oxford University Press, 2015., entre vários outros.
  • 6
    Uma evidência disso é que esse ‘também’ pode ser usado sem nenhum tipo de continuação explícita, e pode indicar uma avaliação positiva ou negativa do falante sobre um dado indivíduo. Imagine a sentença (a), dirigida a Pedro, quando João o repreende por ter esquecido a porta da geladeira aberta a noite toda; e imagina a mesma sentença, dirigida a Pedro, quando João recebe de Pedro um presente surpresa:
    (a) Você também, hein!
  • 7
    É possível também encontrar exemplos com um uso “positivo” desse ‘também’, como no seguinte diálogo:
    (a) João tirou 10 de novo!
    (b) Também (né) ele é um gênio, né.
    É interessante notar, nesses casos, o uso de “partículas conversacionais”, como ‘hein’ e ‘né’. No entanto, investigar mais a fundo esses usos está fora do escopo do presente artigo.
  • 8
    A seção “Definição de partículas aditivas” será dedicada a uma definição mais precisa de partícula aditiva.
  • 9
    A única diferença é que sobre o either incide concordância negativa.
  • 10
    Voltaremos a essa questão na seção “Uma nova proposta”.
  • 11
    O que parece fazer sentido com a ideia de que o ‘too’, similarmente ao ‘and’ (‘e’), cria listas, sendo essa semelhança, na análise de Kaplan (1984)KAPLAN, J. P. Obligatory too in English. Language, San Diego, v. 60, n. 3, p. 510-518, 1984., um reflexo do processo da criação da lista. Essa ideia será fundamental para nossa proposta a ser desenvolvida na seção “Uma nova proposta”.
  • 12
    Mais claramente exposto no trecho que diz “First note that, when the semantically identical material occurs in full rather than in anaphorically reduced form, too is less obligatory” (Kaplan, 1984KAPLAN, J. P. Obligatory too in English. Language, San Diego, v. 60, n. 3, p. 510-518, 1984., p. 511-512). (Primeiramente note que, quando o material semanticamente idêntico ocorre de maneira completa ao invés de anaforicamente reduzido o ‘too’ é menos obrigatório).
  • 13
    Especialmente porque nesta sentença o autor argumenta que a interpretação com o “too” tem a interpretação de que é o mesmo carro, o que é questionável em vista desta sentença, especialmente na tradução para o português.
  • 14
    Os acentos gráficos em negrito são marcações fonéticas de acento (stress) conforme foram apresentados em Krifka (1998)KRIFKA, M. Additive Particles under Stress. In: STROLOVITCH, D.; LAWSON, A. (org.). SEMANTICS AND LINGUISTIC THEORY, 8., 1998, Ithaca, NY. Proceedings, Ithaca: Cornell University, 1998. p. 111-129. Disponível em: https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/Publications/ADDPART.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    https://amor.cms.hu-berlin.de/~h2816i3x/...
    . Em nossas traduções, a ideia é replicar o que acontece em inglês.
  • 15
    Neste trabalho, Amsili e Beyssade (2010)AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://www.linguist.univ-paris-diderot.f...
    exploram o ‘too’ em comparação com a palavra ‘aussi’ do francês; no que segue, nosso foco será em ‘too’ visto que, segundo os autores, com relação ao comportamento como partícula aditiva, o item do inglês e do francês são bastante semelhantes.
  • 16
    Exemplo original:
    (a) John is sick, Mary is sick too
    (b) #John is sick, Mary is sick ∅.
  • 17
    Um exemplo deste fenômeno é o caso em que há uma alternativa entre os verbos ‘saber’ e ‘achar’ (em que as pressuposições do verbo ‘saber’ estão satisfeitas, mas o falante opta por usar ‘achar’). O verbo ‘saber’ é claramente preferível, pois ele pressupõe mais que ‘achar’, como, por exemplo, em “Maria acha que está gripada” em oposição a “Maria sabe que está gripada”. Para mais detalhes, ver Schlenker (2008)SCHLENKER, P. "Be articulate": A pragmatic theory of presupposition projection. Theoretical Linguistics, Berlin, v. 34, p. 157-212, 2008. e Percus (2006)PERCUS, O. Antipresuppositions. In: UEYAMA, A. (org.). Theoretical and empirical studies of reference and anaphora: toward the establishment of generative grammar as an empirical science. A report of the Japan Society for the Promotion of Science Grant-in-Aid for Scientific Research (B), Project No. 15320052. Kyushu University, 2006. p. 52-73. Disponível em: https://www.academia.edu/432035/Antipresuppositions. Acesso em: 18 abr. 2024.
    https://www.academia.edu/432035/Antipres...
    .
  • 18
    Tradução: “Afirmamos que a obrigatoriedade define uma sub-classe de gatilhos pressuposicionais, caracterizados pelo fato de que eles não têm conteúdo assertado”.
  • 19
    Nas palavras da autora: “And/or takes arguments of the same type and returns an output of that type” (Zhang, 2015ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN...
    , p. 3).
  • 20
    As teorias de Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/Wint...
    e Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN...
    , apresentadas nesta seção, em larga medida também se aplicam à partícula ‘or’ do inglês, uma vez que o foco de suas análises incide sobre Coordenações Múltiplas, e ambas essas partículas são capazes de construí-las. Porém, dado o escopo do presente artigo, a inclusão da partícula ‘or’ nas definições será omitida para fins de simplicidade e economia.
  • 21
    Esta forma de notação é uma adaptação da notação ‘n-ary’ do inglês, cuja tradução mais comum é n-tuplo. Em alguns momentos, esta notação será utilizada.
  • 22
    Adaptado do exemplo trazido por Zhang (2015ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN...
    , p. 3).
  • 23
    Originalmente, exemplo 7 em Zhang (2015ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN...
    p. 3).
  • 24
    A crítica à segunda hipótese de Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/Wint...
    , como apresentada em Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN...
    , é: “In Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/Wint...
    , Hypothesis 2 proposes that binary operators and and or can be generalized into n-ary operators with a recursive definition (see (8a) and (8b)), so that MC
    [coordenação múltipla] is built with a flat structure, as (8c) shows. Also a stipulation is needed here: and and or are never silent in MC, but always pronounced right before the rightmost item”.
  • 25
    Originalmente exemplo número 9 em Zhang (2015ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN...
    , p. 4).
  • 26
    A hipótese de Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN...
    , assim como as de Winter (2006)WINTER, Y. Multiple coordination: meaning composition vs. the syntax-semantics interface. 2006. Manuscrito. Disponível em: https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/WinterMultipleCoordination.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    https://www.phil.uu.nl/~yoad/papers/Wint...
    anteriormente, também se aplicam a partículas disjuntivas como ou/or, porém elas fogem ao escopo do presente trabalho.
  • 27
    Note que a função fold é um tipo de função específica na computação, que, em associação a um tipo de operação, aplica tal operação a todos os membros de um conjunto
  • 28
    Esse fenômeno merece certamente um estudo mais aprofundado, porém sua natureza fonética o coloca fora do escopo do presente estudo, que tem o foco voltado à semântica desses fenômenos.
  • 29
    A discussão deste tipo de fenômeno de listas criadas sem partículas aditivas, por mais interessante que seja, não cabe no escopo deste trabalho, uma vez que as estruturas pertinentes, sendo estas o funcionamento das funções que Zhang (2015)ZHANG, L. Decomposing English particles and and or. In: ANNUAL MEETING OF THE NORTH EAST LINGUISTIC SOCIETY, 45., 2015, Cambridge, Mass. Proceedings, Cambridge, 2015. v. 3. p. 261-270. Disponível em: http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN2Y2O/Zhang_2015_AndOr_NELS45.pdf. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://semanticsarchive.net/Archive/ThhN...
    usa para definir partículas aditivas, não são afetadas de forma significativa por este tipo de fenômeno.
  • 30
    As outras duas funções descritas na seção anterior ainda se aplicam, mas para os fins desta análise a de formação de listas é a mais pertinente.
  • 31
    Pois o efeito de criação de lista não se perde ao se atribuir foco; inclusive, o foco é amplificado pela estruturação da lista, uma vez que é feito um contraste do elemento focado com os outros elementos pertencentes à lista.
  • 32
    No texto original esse exemplo é identificado como o de número 11 (Amsili; Beyssade, 2010AMSILI, P.; BEYSSADE, C. Obligatory presupposition in discourse. In: BENZ, A.; KUEHNLEIN, P.; SIDNER, C. (org.). Constraints in Discourse 2. Amsterdam: Benjamins Publishers, 2010. p. 105-123. Disponível em: http://www.linguist.univ-paris-diderot.fr/~amsili/docs/amsili09_pcid_proof. Acesso em: 1 mar. 2021.
    http://www.linguist.univ-paris-diderot.f...
    ).
  • 33
    Ou atualizada, no caso da anáfora retomar uma lista ao invés de um item singular.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    01 Mar 2021
  • Aceito
    07 Nov 2022
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