RESUMO
Neste artigo, pretende-se elaborar a trajetória expositiva do beque de proa de uma canoa pertencente ao acervo do Museu Paulista desde seu ingresso na instituição, em 1924, até os dias atuais, refletindo sobre a construção da memória das monções no museu ao longo do tempo. Também serão abordadas as atividades interdisciplinares realizadas entre o Museu Paulista, o Laboratório de Anatomia Vegetal do Instituto de Biociências - USP e o Departamento de Engenharia Naval da Escola Politécnica - USP, a fim de melhor compreender a constituição do canoão, agora musealizado, por meio dos resultados obtidos a partir da pesquisa histórica, dos trabalhos de conservação, dos processos de identificação anatômica da madeira e de fotogrametria de curto alcance.
PALAVRAS-CHAVE: Canoa; Monções; Museu; Fotogrametria; Anatomia da madeira
ABSTRACT
In this article, we intend to elaborate the expository trajectory of the bow of a canoe belonging to the collection of Museu Paulista since its acquisition in 1924, until the present day, reflecting on the construction of the memory of monsoon expeditions in the museum over time. The interdisciplinary activities conducted between Museu Paulista, the Laboratory of Plant Anatomy of the Institute of Biosciences - USP and the Department of Naval Engineering of the Polytechnic School - USP will also be addressed to better understand the constitution of the now musealized canoe, using the results obtained from historical research, conservation efforts, the processes of anatomical identification of wood and short-range photogrammetry.
KEYWORDS: Canoe; Monsoon expeditions; Museum; Photogrammetry; Wood anatomy
INTRODUÇÃO
Em 1917, no primeiro ano de sua gestão à frente do Museu Paulista, Afonso d’Escragnolle Taunay, ao agradecer uma âncora ofertada à instituição pela Prefeitura de Porto Feliz, solicitava ao então prefeito daquela cidade, Eugênio Motta, a doação de uma canoa de 15 metros que se encontrava às margens do rio Tietê, próxima ao porto de embarque das antigas monções. O mandatário negou o pedido, alegando dificuldades de transporte da peça ao museu em razão de suas dimensões e peso, da ausência de estrada de ferro e do elevado valor de carreto.8
Entretanto, dez dias depois dessa missiva, em 27 de dezembro de 1917, Eugênio Motta enviaria outra carta a Taunay, informando a existência na região de um batelão em poder de um fazendeiro que o transformara em cocho de garapa, com a diferença da peça se encontrar desprovida de popa e proa que haviam sido aparadas.9
Seis anos depois dessa troca de correspondências, Taunay recorreria novamente ao mesmo prefeito de Porto Feliz, indagando sobre o tal casco de canoão transformado em cocho e pleiteando uma doação por parte do proprietário.10 Após conversas e visita à fazenda, Taunay finalmente conseguiria a dádiva do beque de proa pelo Sr. João Batista Portella, o qual atestara que a peça já era propriedade de seus avós havia muito anos.11
Ainda que Taunay houvesse comunicado o Sr. Alarico Silveira, secretário do Interior do estado de São Paulo, a cuja pasta o Museu Paulista era subordinado na época, que o transporte ficaria por conta do Sr. Portella, ele deixara com o fazendeiro 30 mil réis para as despesas com o despacho da carga. O valor, na verdade, nem chegou a tanto, pois Taunay conseguira isenção de frete junto ao Coronel E. Johnston, superintendente da S. Paulo Railway Co.12
O batelão de 15 metros pretendido em 1917 seria oferecido pelo Prefeito de Porto Feliz - ainda o Sr. Eugenio Motta - a Taunay em 1937, ao que tudo indica, pelas dificuldades de proteção e manutenção. Desta feita, foi a vez do diretor do Museu recusar a doação, alegando não ter sala capaz de comportá-lo, a não ser que ficasse num corredor, e ponderando que os porto-felicences jamais perdoariam o ofertante.13
Finalmente, em 24 de janeiro de 1924, um periódico paulista de grande circulação noticiava que
O sr. João Baptista Portella, fazendeiro em Porto Feliz, acaba de fazer ao Museu Paulista a dádiva de um grande fragmento, com o beque de proa, de um canoão de monção. Destas embarcações, que outrora como todos sabem se empregavam na navegação de Porto Feliz a Cuyabá pelo Tietê, Paraná, Pardo, Taquary, São Lourenço, ao que se sabe, existem hoje apenas duas, estas mesmas fragmentadas. Uma, a maior, pertence à Câmara Municipal de Porto Feliz que mandou fazer um galpão para a resguardar no “Porto”, à ribanceira do rio Tietê. A segunda havia sido retirada há mais de sessenta anos da água e estava desde então em poder dos pais do sr. João Baptista Portella, infelizmente serrada em pedaços. Do que resta num comprimento de 3 ½ metros o sr. Portella fez presente ao Museu Paulista.14
Com a divulgação da doação pela imprensa encerrava-se o longo processo de tratativas para levar para a instituição uma canoa, segundo Taunay, utilizada na rota das monções entre Araritaguaba (atual Porto Feliz) e Cuiabá nos séculos anteriores (figura 1). Mas por que a insistência dessa empreitada?
Beque de proa de canoão (3,56m de comprimento, 1,17m de largura e 0,83 m de altura). Acervo do Museu Paulista. Fotografia de José Rosael da Silva.
Neste artigo, pretende-se investigar as razões que motivaram Afonso de Taunay a realizar uma coleta ativa de artefatos ligados às viagens fluviais para integrá-los ao acervo do Museu Paulista e elaborar a trajetória expositiva do beque de proa desde seu ingresso na instituição até os dias atuais, refletindo sobre a construção da memória das monções ao longo do tempo. Também serão abordadas as atividades interdisciplinares realizadas entre o Museu Paulista, o Laboratório de Anatomia Vegetal do Instituto de Biociências - USP e o Departamento de Engenharia Naval da Escola Politécnica - USP, a fim de melhor compreender a constituição do canoão musealizado15 e o uso de embarcações semelhantes a ele, por meio dos resultados obtidos a partir da pesquisa histórica, dos trabalhos de conservação e dos processos de identificação anatômica da madeira e de fotogrametria.
TRAJETÓRIAS SOCIAIS DE ARTEFATOS
Para entender o beque de proa como objeto musealizado, é preciso compreender sua trajetória desde seu contexto de origem - ou de outras embarcações de mesma tipologia - até os dias de hoje, refletindo sobre as pessoas por ele articuladas ao longo do tempo e o passado colonial paulista e monçoeiro que se quis representar no Museu Paulista por meio da disposição do canoão em diferentes exposições. Nesse sentido, tanto o desvendamento dos caminhos percorridos pelos artefatos na instituição, como a aproximação às conjunturas de produção e de usos precedentes fornecem subsídios para desfetichizar as peças como relíquias.
A construção de trajetórias de artefatos como instrumento metodológico tem sido largamente empregada na prática historiográfica e o clássico estudo de Igor Kopytoff, The cultural biography of things,16 em geral, tem sido referência para os trabalhos sobre circulação de objetos no tempo e no espaço. No entanto, tendo a concordar com as posições críticas de Hans Peter Hahn e Hadas Weiss17 quanto ao uso do termo biografia para objetos e coleções, devido à dificuldade de apontar momentos como o nascimento e a morte dos objetos, em favor do uso de termos como itinerários, trajetórias, percursos.
Os pesquisadores argumentam que investigações etnográficas e arqueológicas cada vez mais atestam as transformações das coisas, na medida em que novos significados emergem da reutilização de determinados artefatos posteriormente ao seu emprego original ou da atribuição de novos valores a objetos que permaneceram enterrados durante anos. A noção de itinerário, por sua vez, ilumina o caráter não linear da mobilidade de um objeto e as mudanças nos seus contextos e nos seus papéis sempre motivadas pela agência humana.
Quando as trajetórias de objetos acabam sendo direcionadas para instituições de guarda, tal movimento nos permite estudar a formação de coleções e sua mobilização para a escrita da história e a produção de memórias, como magistralmente fizeram Regina Abreu, ao estudar a coleção Calmon no Museu Histórico Nacional,18 Francisco Régis Lopes Ramos, debruçado sobre os objetos do Caldeirão no Museu do Ceará,19 Ulpiano Bezerra de Meneses, ao discutir os documentos pessoais no espaço público,20 Mariana Françozo, ao analisar os caminhos percorridos por um manto tupinambá desde o período nassoviano até a exposição atual no Museu da Dinamarca.21
Interessado na composição de acervos de história natural e anatomia humana nos museus ingleses dos séculos XIX e XX, Samuel Alberti considerou três fases na vida dos objetos direcionados a instituições de guarda: a coleta e sua proveniência, a vida na coleção e a visão do objeto. Na medida em que tomou a cultura material como perspectiva analítica para a história das coleções e dos museus e não como o próprio objeto de estudo, o historiador da ciência jogou luzes sobre a atuação dos homens na história, pois, segundo ele, ainda que se esteja olhando o objeto, o que se observa são pessoas, especialmente suas práticas e instituições.22
O BEQUE DE PROA E OS REMANESCENTES DE EMBARCAÇÕES MONÓXILAS NO BRASIL
No Relatório Anual de Atividades de 1924, Afonso Taunay assim se refere ao beque de proa recém-chegado ao Museu Paulista: “É uma peça curiosíssima e tem grande valor evocativo este canoão escavado no tronco de uma grande peroba e cujo casco se acha relativamente bem conservado”.23
Passados 85 anos, ao elaborar o laudo de conservação para o transporte da peça do Museu Paulista para o Museu Republicano de Itu, o restaurador Julio Moraes afirmou tratar-se
de parte de uma embarcação, feita em um único tronco, escavado manualmente. Esta parte foi cortada em ambas pontas, em época evidentemente remota. Percebe-se que houve ao menos uma alteração além dos cortes, com possível implicação estrutural: a eliminação de um dos dois reforços internos, entalhados transversalmente ao sentido do corpo da embarcação; também se trata de intervenção muito antiga.24
O destaque para o emprego de uma só peça de madeira na confecção do canoão ilumina as embarcações monóxilas, obtidas pelo processo de redução da matéria-prima por meio de escavação e modelagem do tronco até se chegar à forma de uma embarcação.25
Segundo Rambelli, talvez seja a forma mais básica do transporte aquático universal, mas alerta que “as técnicas de confecção desses objetos, assim como os utensílios empregados, a matéria-prima escolhida, se diferenciam, mesmo levando-se em conta fatores semelhantes como a forma e a função”.26
Alguns exemplares remanescentes descobertos desde a década de 1990 no Brasil comprovam tal diversidade. A piroga indígena estudada por Rambelli, Mario Tomazello e Plínio Barbosa de Camargo, encontrada em Bragança Paulista, no estado de São Paulo, em 1998, fora feita a partir de um único tronco de pinheiro-do-brasil (Araucária angustifolia), escavada com enxó de pedra e fogo. A ausência de traços de ferramentas de metal em seu processo de confecção aliada à idade aproximada de 250 anos pelo método de datação por radiocarbono indicam que, embora os portugueses já se encontrassem em território brasileiro, havia embarcações monóxilas que continuavam a ser construídas de acordo com métodos indígenas tradicionais.27
Matéria-prima e técnica construtiva semelhantes foram identificadas na canoa achada em 2014 no Rio Grande, na divisa de Andrelândia e Santana do Garambéu, no sul de Minas. Teste feito com carbono 14 de uma amostra da madeira revelou que a peça inteiriça data de aproximadamente 1610. Segundo o engenheiro Gilberto Pires de Azevedo, conselheiro do Núcleo de Pesquisas Arqueológicas do Alto Rio Grande, a canoa tem procedência indígena, “pois ela foi escavada num único tronco de madeira, não tem sinais aparentes de uso de ferramentas modernas, como serras ou formões, e traz marcas de fogo, indicando a antiga técnica dos índios”.28 Por sua vez a embarcação encontrada em 1999 no rio Aiuruoca, também pertencente à bacia do Rio Grande, na localidade de São Vicente de Minas, em Minas Gerais, originou-se da escavação de uma peça de madeira de angelim-rosa (Andira fraxinifolia) e foi datada pelo método carbono 14 num período compreendido entre 1480 e 1660.29
Encontradas na década de 2010, quatro canoas monóxilas da Lagoa de Extremoz, no Rio Grande do Norte, foram analisadas pela equipe do arqueólogo Carlos Rios e datadas por radiocarbono. Os resultados revelaram que a embarcação denominada Extremoz 04 é o artefato náutico de águas abrigadas mais antigo já descoberto no Brasil, com idade calibrada de 1290-1320 e 1350-1385 d.C., que correspondem aos dois possíveis períodos de sua construção.30 Já as canoas Extremoz 01 e 02 datam do período colonial e apresentam traços das trocas culturais dos povos aqui em contato pelas modificações aplicadas nas estruturas das tradicionais monóxilas indígenas como, por exemplo, adoção de bancos de popa - indicando possíveis mudanças na forma de remar - e construção de proas mais lançadas e com formato elíptico ou ogival, proporcionando maior hidrodinâmica às embarcações.31
Para o caso dos fragmentos das embarcações encontrados em Porto Feliz no início do século XX - o beque de proa do Museu Paulista, de 3,56m, e o testemunho exposto Parque das Monções, localizado naquela cidade, de 9,25m - contamos com os registros arqueográficos realizados por Francisco Alves e sua equipe em 2008. A partir de observações, fotografias e medições, o arqueólogo português produziu desenhos dos dois artefatos e comparou suas dimensões com o desenho de uma ubá realizado pelos ilustradores Joaquim José Codina e José Joachim Freire, durante a Viagem Filosófica de Alexandre Rodrigues Ferreira, no final do século XVIII. Por meio dessa comparação lhe foi possível projetar os comprimentos dos canoões truncados do rio Tietê, atribuindo c. 11,5m ao do Museu Paulista e c. 16,5m ao do Parque das Monções. Teve ainda a oportunidade de enviar uma amostra de madeira do batelão de Porto Feliz para “datação por radiocarbono, cujo resultado se revelou equiparável ao da monóxila de Bragança Paulista”.32
A despeito de seu minucioso trabalho, no artigo escrito em 2013 sobre “A tradição monóxila náutica em Portugal e no Brasil”, Alves não se referiu à madeira de que fora feito o beque de proa do museu, nem descreveu as marcas de ferramentas usadas para redução do tronco monóxilo a fim de que se pudesse conjecturar sobre o período de sua confecção. Julgou ainda arbitrária a adjetivação dessas embarcações de grandes dimensões de Porto Feliz - conhecidas como canoões ou batelões - como sendo “das monções” por falta de comprovação histórico-arqueológica.33
Entretanto, o próprio Alves considerou tal demonstração difícil mesmo que se recorra ao método de datação de radiocarbono, isso porque
[...] a aplicação deste método de datação em árvores cujas datas de abate são relativamente “recentes” (datando apenas de alguns séculos), tem um índice de imprecisão demasiado lato, pelo fato de elas terem um reduzido índice de dissipação do carbono 14 atmosférico absorvido enquanto vivas.34
Dada a imprecisão apontada por Alves e a ausência da aplicação do método de radio carbono no beque de proa do Museu Paulista, e a fim de captar as técnicas utilizadas na confecção seguimos a orientação de Rambelli, Tomazello e Camargo, para os quais os “testemunhos diretos da ação do homem sobre a madeira são os traços de utensílios deixados escavados sobre ela”.35
Recorremos então à análise tecnológica do entalhamento do beque de proa realizado por Béat Arnold em visita ao Museu Republicano de Itu em 2016, segundo a qual
Une cloison est réserve dans le fond à mi-hauteur, excluant tout écartement secondaire des flancs par chauffage. Elle a été dégagée à l’aide d’herminettes à tranchant plan. Les traces d’herminettes à large tranchant concave peuvent être observées pour l’évidage du fond au niveau des bouchains. La partie haute des flancs, côté intérieur, a été finalement encore affiné à l’aide d’une herminette à tranchant concave utilisée dans un plan vertical, donc avec un manche court, sous la forme de séries parallèles. Enfin, on note la présence d’une nervure, probablement destinée à contrôler l’évidage du fond entre cette dernière et la cloison.36
O estudo da materialidade evidenciou, por meio das marcas das ferramentas no casco da embarcação, as técnicas construtivas empregadas, o que o levou a concluir que
L’outillage utilisé était en fer. La forme et les dimensions de l’esquif montrent qu’il ne s’agit pas une pirogue indienne traditionnelle, mais d’un esquif commandé ou réalisé par des colons pour effectuer des transports de marchandises lourdes, au vu de la forme de la section transversale.37
Análise do beque de proa do canoão mostra marcas de escavação com enxó de lâmina curta. Fotografia de Béat Arnold.
A menção ao transporte de mercadorias pesadas na avaliação de um renomado especialista em arqueologia naval nos leva a conjecturar sobre a utilização da canoa para o abastecimento de populações interioranas em período pregresso ao que servira como cocho para os cavalos na fazenda da família Portella em Porto Feliz.
A PRODUÇÃO E O USO DAS CANOAS NAS MONÇÕES DOS SÉCULOS XVIII E XIX
Embarcações semelhantes àquela de que o beque de proa é fragmento foram fabricadas durante o período das monções, que se estendeu desde a segunda década do século XVIII, com o descobrimento do ouro nos barrancos do rio Coxipó e outros afluentes do rio Cuiabá, até os anos de 1830, com fins comerciais, de prospecção de pedras preciosas, de fundação de vilas, de demarcação de limites, de reconhecimento científico e artístico.
A rota das monções compreendia a viagem pelos rios Tietê, Paraná e Pardo; travessia terrestre pelo varadouro de Camapuã; retorno ao caminho fluvial pelas águas dos rios Coxim, Taquari, Paraguai, São Lourenço e Cuiabá. A duração dessas viagens era de cerca de cinco meses, mesmo período que levavam os viajantes de Portugal a Índia. Esse itinerário, entretanto, não foi o primeiro a ser percorrido pelos paulistas em direção ao oeste do continente, mas foi a última possibilidade de chegar às minas no século XVIII, pois os índios mbaiá e caiapó já haviam dominado outras regiões das bacias do Paraná e do Paraguai, deixando sem opções os viajantes ávidos para acessar o extremo oeste.38
Para o sucesso das viagens fluviais, somem-se a existência de um varadouro ¬- Camapuã - para pouso e reabastecimento, a especialização dos mareantes advinda da cultura mameluca, a presença do braço negro para carregamento das cargas e trabalho nas plantações e nas minas e a aliança com determinados grupos indígenas.
Essa rota e os muitos varadouros de um caminho de mais de cem cachoeiras impuseram o recurso a embarcações mais afiladas que os contemporâneos compararam repetidas vezes a lançadeiras de fiar algodão. Segundo Sérgio Buarque de Holanda, as dimensões das canoas podem ter sido sugeridas e impostas pelas formas florestais típicas da área do Tietê, onde a possibilidade de escolha dos paus ficava restrita a duas espécies, a peroba39 e a ximboúva.40 As embarcações eram monóxilas, algumas lavradas a ferro e a fogo. Possuíam dimensões de 11,5 a 16,5m (ou mais) e transportavam passageiros, mantimentos, fazendas, escravos africanos. Tanto a técnica do fabrico das embarcações quanto o seu manejo se filiavam a uma tradição indígena comum, desenvolvida pelos ituanos que se especializaram desde cedo na confecção das canoas e remos.41
O BEQUE DE PROA NO MUSEU PAULISTA E A CONSTRUÇÃO DA MEMÓRIA DAS MONÇÕES
À porta do Museu dois titans se erguem animados pelo escopro de um grande cinzelador: Antonio Raposo perscruta o horizonte das terras ignotas e hostis, Fernão Dias Paes aprofunda o sub-solo virgem e inimigo que o logo o matará. E, como remate ainda, tendes, sob os vossos sentimentos immediatos, um documento material do bandeirismo: o veículo essencial dos paulistas da última phase sertanisadora: um canoão de monção, uma caravela deste rio do Oeste que foi, durante dois séculos, a lança dos paulistas enristada contra o hespanhol.42
Entre as primeiras tentativas de trazer um suposto canoão de monção para museu, em 1917, e o discurso proferido em 1926, mencionando a embarcação monóxila de peroba sob a proteção de Fernão Dias Paes e Raposo Tavares, Taunay arquitetara a decoração interna do Museu Paulista e a montagem de salas expositivas com vistas às comemorações do centenário da independência em 1922. Nesse projeto, São Paulo teve papel de destaque como lugar material e simbólico da Independência no eixo central do museu, a partir da atuação dos bandeirantes, e seu passado colonial - como alicerce da história nacional - fora efusivamente recriado em várias salas expositivas.43
As viagens fluviais entre Porto Feliz e Cuiabá ganharam proeminência com a inauguração, em 1929, da sala A-9, consagrada às monções e a Almeida Júnior (figura 3). A sala contava com o beque de proa, âncoras, caldeirão, canastra e reproduções em pinturas de documentos iconográficos do século XIX,44 sobretudo dos desenhos de Hercule Florence, integrante da expedição científica chefiada pelo barão Georg Heinrich von Langsdorff, que percorrera territórios orientais do Brasil por trilhas fluviais, entre 1825 a 1829, refazendo a rota das monções setecentistas.
Vista parcial da sala A-9 consagrada às monções e a Almeida Júnior, com o beque de proa ao fundo, década de 1930. Acervo do Museu Paulista, São Paulo. Fotógrafo não identificado.
Ainda que as cenas retratassem os momentos da expedição russa numa fase de decadência das monções, para Taunay as tintas dos pintores remetiam às já desaparecidas viagens dos paulistas por possuírem, na sua visão, visos de autenticidade que poderiam servir a uma verdade maior.45 A associação da viagem de Florence do século XIX com as monções do XVIII e destas com as bandeiras do XVII fica ainda mais evidente, no conjunto da sala, quando se percebe que as pinturas baseadas em Florence foram colocadas ao lado de telas que retratavam bandeirantes e missionários.
Tal narrativa visual decorre da produção historiográfica de Taunay, para quem as monções seriam um capítulo derradeiro das bandeiras e estariam intimamente relacionadas com a atividade mineradora, tanto que, segundo ele, teriam começado a escassear quando do esgotamento da extração aurífera, ainda que ele próprio reconhecesse a existência dos comboios fluviais até os inícios do XIX, quando partiu de Araritaguaba a expedição Langsdorff.
Ora, essa permanência ao longo dos setecentos e a regularidade anual das viagens foram os fatores que fizeram com que Sérgio Buarque de Holanda, já na primeira edição de Monções, publicada em 1945, dissociasse as monções de povoado da história das bandeiras, atrelando-as à atividade mercantil, tanto que em Caminhos e fronteiras, lançado em 1957, intitulou o capítulo dedicado a essas expedições fluviais de Frotas de comércio.46
Com a desmontagem da sala A-9, em 1939, para dar lugar à Galeria Almeida Júnior, iniciativa do interventor federal Ademar de Barros, as telas de Oscar Pereira da Silva e Aurélio Zimmermann, retratando aspectos da expedição Langsdorff, e os objetos relacionados às viagens fluviais foram deslocados para outros espaços da instituição até que, em 1944, passaram a figurar na sala B-4.
De acordo com a notícia publicada em 24 de março de 1944, no jornal O Estado de S. Paulo, Taunay informava que
Na sala B-4, do segundo pavimento do palácio do Ipiranga, sala exclusivamente consagrada às monções, há a notar vinte quadros a óleo dos quais cinco de grandes dimensões. São todos relativos à iconografia das navegações fluviais para as terras do centro longínquo, em Mato Grosso, com exceção de duas composições. São as demais reproduções de documentos hoje mais que seculares, datando quase todos de 1826. Representam aspectos diversos da navegação do Tietê, Paraná, Pardo, Paraguai e mais rios do oeste.47
No alto, em destaque, Hercule Florence, pintado por Oscar Pereira da Silva. Sob seu retrato, as telas Benção das canoas, de Aurélio Zimmermann, e Carga das canoas, Encontro de monções no sertão e Partida de Porto Feliz, de Oscar Pereira da Silva.
Em duas paredes, separadas por uma porta, Pouso do sertão - Queimada, de Aurélio Zimmermann, Mulheres do povo em Porto Feliz e Dama de Porto Feliz com mucama, de Nicolò Petrilli, Monstro fluvial piracangava e Canoa fantasma no rio Tietê, de Nair Opromolla Araújo. Por fim, Pouso de monção à margem do Tietê, Vista de Camapuã, Pirapora do Curuçá e Desencalhe de canoa, de Zilda Pereira, e Sítio do Capitão José Manoel em Porto Feliz, Vista de Porto Feliz e Porto Feliz, de Sylvio Alves.
Integram ainda a exposição o mapa confeccionado pelo astrônomo e matemático paulista Francisco José Lacerda e Almeida, e outro sobre a rota das monções. No centro da sala, o beque de proa do canoão, contendo uma âncora e um grande tacho (figura 4).
Vista parcial da sala B-4 consagrada às monções, com o beque de proa ao centro, década de 1940. Acervo do Museu Paulista, São Paulo. Fotógrafo não identificado.
O que muda ou não de uma montagem para outra? O que as salas podem nos dizer sobre a construção da memória das monções por Afonso Taunay durante sua gestão no Museu Paulista?
Por um lado, reforça-se a aproximação do referencial da expedição científica Langsdorff a todas as outras possíveis monções. Dessa forma, os desenhos de Florence passavam a desempenhar uma função demiúrgica de reconstituir o passado paulista.48
Os motivos registrados por um artista viajante numa expedição científica durante a década de 1820 foram encarados como elementos autênticos de qualquer monção ocorrida ao longo do século XVIII. O pouso no sertão vivenciado por Florence e o encalhe de canoas da expedição Langsdorff dizem muito sobre os momentos de descanso e de dificuldades de navegação experimentados por todos os passageiros de qualquer monção.
Por outro lado, nessa sala o projeto expográfico não contou com referências às bandeiras. Se tal constatação poderia nos fazer conjecturar que Taunay estivesse buscando afastar as monções das bandeiras, o próprio artigo escrito por ele na ocasião da inauguração da sala B-4 colocaria em dúvida tal suposição. Embora afirmasse que a sala era exclusivamente consagrada às monções, o diretor encerrou a descrição do ambiente com “um tacho que serviu longamente aos bandeirantes”.49 Ademais, o continuum entre os movimentos bandeirante e monçoeiro ficaria explicitado na sua monumental História Geral das Bandeiras Paulistas, quando finalizou o último tomo de 11 volumes, escrito em 1950, com as monções.
Por fim, cabe salientar que quando Taunay encerrou sua gestão no Museu Paulista, em 1945, a sala consagrada às monções é a B-4. Ela só voltaria a ocupar a sala A-9, em 1947, quando a Galeria Almeida Junior foi desmontada em razão da transferência de 19 telas para a Pinacoteca do Estado. Nesse ano, Sérgio Buarque de Holanda, diretor do Museu Paulista, mandou regressar àquela sala o beque de proa do canoão, utensílios usados pelos paulistas em suas viagens fluviais e cópias de quadros de Hercule Florence.
Desde os anos 1970 até os dias de hoje a tela A Partida da Monção está na sala B-29 tendo o canoão com companheiro até 2007. O beque de proa voltaria a ter papel relevante numa das salas da exposição Cartografia de uma história - São Paulo colonial: mapas e relatos, que ficou em cartaz no Museu Paulista, entre março de 2005 e novembro de 2006. No espaço “Caminhos e caminhantes: vivências do sertão”, o canoão era o elemento dominante em uma sala cujo verde das paredes evocava a floresta a ser percorrida por meio de mapas em criação, rasurados, manuscritos (figura 5).50
Vista parcial da sala Caminhos e caminhantes: vivências do sertão, com o beque de proa em primeiro plano, década de 2000. Acervo do Museu Paulista, São Paulo. Fotografia de José Rosael da Silva.
Mais uma vez, tendo sua sala desmontada, para dar lugar à exposição Imagens recriam a História, o beque de proa foi deslocado para o saguão do museu, na lateral da escadaria monumental. Ainda que aparentemente tivesse perdido sua importância no discurso museográfico, foi nesse espaço que foi objeto de estudos de arqueometria realizados pelo arqueólogo português Francisco Alves em 2008, como comentado anteriormente.51
Já em 2010, com os dias contados no Museu Paulista, frente à iminente transferência para o Museu Republicano de Itu, o canoão foi alvo de laudo de conservação por parte de Julio Moraes, e exposto no saguão do Museu Paulista, novamente sob o olhar e proteção dos dois bandeirantes que o acolheram na fala de Taunay em 1926 (figura 6).
Vista parcial do peristilo do Museu Paulista, notando-se o canoão exposto no hall, 2010. Museu Paulista, São Paulo. Fotografia de José Rosael da Silva.
Uma vez no Museu Republicano, o canoão foi colocado no centro de uma pequena sala, onde permaneceu de 2010 a 2017, identificado apenas com suas dimensões, proveniência e data de ingresso no museu.
Nova história começaria a ser contada a partir do segundo semestre de 2016, quando foi estabelecida uma parceria com o grupo do Departamento de Engenharia Naval da Escola Politécnica da USP que, a partir da fotogrametria e de outras técnicas combinadas com a observação de dados dos desenhos de Hercule Florence e Aimé-Adrien Taunay, conseguiu reconstruir digitalmente o canoão.
O BEQUE DE PROA SOB O OLHAR DE ENGENHEIROS
A partir do beque de proa do canoão, com cerca de 3,5 metros de comprimento, foi realizado um procedimento de digitalização do artefato e a reconstrução digital de um exemplar completo de canoa das monções do início do século XVIII, este segundo com cerca de 14,5 metros de comprimento.
A fotogrametria de curto alcance52 foi a técnica de metrologia ótica utilizada para obtenção de uma nuvem de coordenadas espaciais, resultando em 800 pontos que caracterizaram o contorno e a superfície do artefato histórico. A partir destes pontos obteve-se, por meio de manipulação digital em software CAD (Computer Aided Design, da sigla em inglês), um modelo digital 3D de alta fidelidade da porção frontal da canoa das monções em exposição em Itu (figura 7 e 8). Posteriores inferências matemáticas e o estabelecimento de relações interdisciplinares possibilitaram a reconstituição digital 3D de um exemplar do canoão das monções. A obtenção das superfícies matemáticas que representam a superfície da canoa é necessária para a realização de estudos empregando software CAE (Computer Aided Engineering, da sigla em inglês) para determinação da capacidade de carga e características de navegabilidade da canoa. Essa análise, em última instância, permite maiores questionamentos e considerações a respeito do papel do canoão naquele sistema primitivo de transporte de mercadorias, sua tripulação e as operações necessárias para a transposição de barreiras nos rios com tamanha embarcação.
Beque de proa de canoão em exposição no Museu Republicano de Itu (USP) e reconstrução digital 3D por meio de fotogrametria, respectivamente. Acervo do Museu Republicano “Convenção de Itu” - MP, Itu, SP.
Os dados necessários para as estimativas e inferências a respeito de geometria, dimensões e considerações da capacidade de carga foram obtidos pela análise de gravuras, relatos, características físicas da madeira constituinte da canoa e consulta a pesquisas antropológicas, construindo assim as conexões pertinentes para a caracterização da canoa das monções de Porto Feliz.
PLANEJAMENTO E EXECUÇÃO DA FOTOGRAMETRIA
O procedimento completo em campo foi idealmente dividido em cinco etapas, realizadas por diferentes equipes em intervalos de tempos subsequentes. A movimentação do beque de proa de uma sala do museu onde estava exposto para o saguão onde foi fotografado requereu uma equipe especializada devido ao cuidado de conservação da peça. Uma segunda equipe especializada em içamento ergueu o canoão cerca de 70 centímetros em relação ao piso, a fim de permitir as fotografias do fundo da canoa. Em seguida, a peça foi preparada com a aplicação dos alvos adesivos e posicionamento do equipamento de referenciamento. Uma inspeção foi realizada antes de serem realizadas as tomadas de fotografia, conforme a figura 9. A fim de prever a eficiência e, consequentemente, a necessidade de recursos a serem empregados em todo o trabalho de campo, previamente foram realizadas simulações baseadas em estudos de tempo e movimento (MTM1) para os cinco passos da fotogrametria. O cronograma total foi estabelecido com a ferramenta PERT de gestão de projetos.
Fluxo do trabalho em campo realizado no Museu Republicano de Itu, SP. Fotografia de Bernardo Andrade.
O plano de ação em campo foi estruturado com base no conhecimento das dimensões máximas da peça, das especificações do equipamento de içamento e do espaço selecionado no Museu Republicano “Convenção de Itu” para acolher todo o procedimento. Sabia-se de antemão que o beque de proa possui comprimento máximo de 3,55 metros e diâmetro máximo de pouco mais de um metro. Para içá-lo foram necessários dois guindastes hidráulicos de modo a proporcionar estabilidade à peça, tal medida é essencial em levantamentos fotogramétricos de curto alcance em que qualquer movimento do objeto pode comprometer o sucesso de uma tomada de fotografias. A tabela 1 explicita os principais valores referentes ao trabalho em campo de levantamento fotogramétrico.
A partir da planta baixa do museu preparou-se uma sequência de procedimentos que contornassem a dificuldade de captura detalhada dos elementos internos. Bordas e regiões escondidas da canoa são de difícil captura e identificação, devido à necessidade de uma correta projeção de luz sobre o objeto e uma prejudicada ergonomia no processo em campo. Foram consideradas 19 seções transversais imaginárias na superfície externa do canoão, cada uma composta por 18 pontos de superfície, e 18 seções imaginárias transversais na superfície interna, com 19 pontos cada. Adicionalmente, caracterizaram-se as estruturas internas com a aplicação de 50 pontos de superfície. Na figura 10(a) observam-se as posições de tomadas de fotografia. As estações em verde caracterizam a necessidade de captura detalhada de elementos internos. A figura 10(b) destaca a necessidade de cobrir a lateral da canoa em diferentes ângulos e cotas verticais.
Na fotogrametria, a posição espacial de cada ponto do objeto é definida por três coordenadas, mas cada imagem pode ser definida apenas em um sistema de coordenadas 2D, ocorrendo mudanças na geometria do objeto devido a seu formato, posição relativa da câmera e objeto, perspectiva da imagem e defeitos ópticos das lentes.53 A identificação se baseia nos princípios de colinearidade e de agrupamento. No primeiro, princípios básicos de geometria a partir do conhecimento do centro de projeção do ponto identificado permitem, em conjunto com o segundo princípio, a adequada consideração espacial das coordenadas capturadas.54 Dessa forma, cada alvo adesivo aplicado na superfície da peça pode ser identificado como um ponto em um sistema de coordenadas tridimensional.
Foi utilizada sobreposição de área de fotografias de aproximadamente 75% no levantamento da superfície do canoão. Foram distribuídos 50 pontos codificados do tipo RAD (Ringed Automatically Detected, da sigla em inglês) uniformemente por toda a superfície, forçando o fotógrafo a realizar intuitivamente alta sobreposição para que possuísse certeza da correta junção das fotografias. O processo requer a identificação de cinco pontos codificados em cada fotografia e que cada um seja reconhecido em pelo menos três fotografias para que seja validado. A figura 11 ilustra os alvos adesivos identificados na fotogrametria e as posições de tomada das fotografias.
CONSTRUÇÃO DE MODELO DIGITAL 3D DO BEQUE DE PROA
Concluído o processamento fotogramétrico de campo, foi realizado processamento das imagens em software comercial de fotogrametria GOM Tritop 6.2, identificando-se por meio de triangulação a posição espacial de cada alvo colocado no objeto. A partir dessas coordenadas tridimensionais, o processo de modelagem digital é iniciado, seguindo o processo de primitivas geométricas, ou seja, partindo de pontos para geração de curvas e destas para geração de superfícies, conforme pode ser visto na figura 12.
Coordenadas espaciais obtidas por fotogrametria, curvas construídas a partir destas e superfície final do beque de proa do canoão, respectivamente.
É necessário observar o comportamento das curvas geradas a fim de garantir sua continuidade. Para tal, foi realizado um estudo comparativo a partir de diferentes configurações de comandos de software CAD para caracterização da melhor combinação de comandos computacionais para geração do conjunto de curvas caracterizadoras da superfície. Tal estudo pode ser visualizado com mais detalhes no apêndice 1 APÊNDICE 1 - ANÁLISE COMPARATIVA DE CONTINUIDADE E CURVATURA PARA DIFERENTES CONFIGURAÇÕES DE COMANDOS EM SOFTWARE CAD .
INTERDISCIPLINARIDADE E INFERÊNCIAS PARA MODELAGEM DA CANOA COMPLETA
A reconstrução digital do canoão foi iniciada a partir da estimativa total de seu comprimento, levando-se em consideração gravuras históricas de Hercules Florence e Adriano Taunay. O fundamento utilizado para essa análise foi a proporção entre a altura dos homens e o tamanho da canoa, bem como a relação comprimento/boca da embarcação. Considerando a altura masculina da época entre 160cm e 170cm (conforme pode ser visto na figura 14) e utilizando o valor da boca obtido com a peça, calculou-se um comprimento aproximado de 14,5 m.
a) Dados para a madeira caracterizada; b) Aimé-Adrien Taunay, A Partida da Expedição Langsdorff no Rio Tietê (1825), aguada de nanquim sobre papel, 21 x 32,2 cm, Coleção Martha e Erico Stickel. Acervo Instituto Moreira Salles.
Em seguida, verificou-se a viabilidade dessa construção, tendo em vista que as canoas eram esculpidas a partir de um único tronco. A árvore utilizada era uma peroba típica e suas dimensões máximas já registradas - 50m de comprimento e 390cm de diâmetro, como mostra a figura 13a - validam as considerações. Seguindo o mesmo raciocínio da estimativa de comprimento, foi determinado o calado da embarcação (profundidade do casco submerso) em 55cm. As dimensões máximas da canoa modelada (figura 16) com um beque de proa como aquele em exposição no Museu Republicano Convenção de Itu foram 14,5m de comprimento, 1,16m de boca e 0,8m de pontal.
Outra etapa na reconstrução foi determinar os detalhes não existentes na extremidade da proa. Para tal, considerou-se a continuidade da curvatura no costado dessa região e detalhes das gravuras de Taunay e Florence.
DETERMINAÇÃO DA CAPACIDADE DE CARGA
Foi verificada a compatibilidade entre a densidade calculada da madeira e o intervalo considerado aceitável para a peroba. O volume em madeira verificado pela digitalização da peça foi de 0,39m3, enquanto a massa medida foi de 278,5kg. Com isso, obtém-se uma densidade de 714 kg/m3, o que condiz com o intervalo de 660kg a 790kg/m3, densidades básica e aparente com 15% de umidade, respectivamente. Com a densidade da peroba, a massa própria da canoa completa foi calculada em 1,2 tonelada.
A partir da modelagem, o software CAE recebeu como entrada o calado estimado por meio de gravuras e relatos históricos. Trabalhando com geometrias digitalizadas, o software calcula o volume de água deslocado pela embarcação, o que possui relação com a massa total da canoa. Em seu equilíbrio estático, a canoa completa apresenta deslocamento em massa de aproximadamente 6,5 toneladas. Esse deslocamento corresponde à massa de madeira, tripulação e seu carregamento.
De acordo com a média de peso das pessoas da época e o número típico de tripulantes, a massa total dos homens foi estabelecida em 0,7 tonelada. Dessa forma, para dez tripulantes, pôde-se estimar a capacidade de carga de uma canoa com essas dimensões em até 4,6 toneladas. Outra informação que deu suporte à determinação da capacidade de carga da canoa foi a descrição de Hércules Florence a respeito do tema, corroborando os resultados obtidos em software.
Essa informação permite revisitar aqueles incipientes sistemas logísticos sob uma ótica completamente nova, tomando a canoa das monções como sua principal fonte material. As formas entalhadas internamente no tronco demonstram certo conhecimento, ainda que empírico, de alguns conceitos fundamentais da engenharia naval como, por exemplo, o aproveitamento do volume interno, a presença de elementos estruturais e formas que favorecem a estabilidade do casco flutuando.
Enquanto o trabalho de fotogrametria estava em andamento e novas informações mais precisas sobre o tamanho original do canoão vinham à tona, entramos em contato com o Laboratório de Anatomia Vegetal do Instituto de Biociências da USP para que se pudesse realizar a identificação anatômica da madeira da embarcação.
Enquanto Taunay afirmava que o canoão era de peroba, Sérgio Buarque de Holanda dizia que o canoão do Museu Paulista era de ximboúva.55 Embora ambas as espécies estivessem presentes na cobertura vegetal da região de Itu e Porto Feliz, área privilegiada para a construção das canoas, a peroba tem densidade média de 790kg/m3, enquanto a ximboúva (também chamada fava-orelha-de-negro, orelha-de-macaco, timborana, timboúva ou tamboril) tem densidade média de 500kg/m3, o que impactaria de forma diferenciada o desempenho na embarcação em velocidade e capacidade de carga.
IDENTIFICAÇÃO ANATÔMICA DA MADEIRA
A anatomia da madeira é um método consagrado de identificação que já foi empregado em diversas oportunidades para o estudo de canoas históricas ou arqueológicas com grande sucesso e precisão.56
Para a análise anatômica da madeira foram retiradas amostras que estavam se desprendendo da canoa localizada no Museu Republicano de Itu, sob a supervisão da conservadora do Museu Paulista Fabíola M.Z.F. de Miranda. Os segmentos foram cuidadosamente retirados, sem comprometer a peça, e levados para preparação de lâminas permanentes no Laboratório de Anatomia Vegetal do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP).
Uma vez que a madeira se encontra bem envelhecida e com a cor oxidada, a coloração típica rosa-salmão não estava presente. Além disso, a simples identificação macroscópica (usando navalha e lupa de 10 aumentos in situ no Museu Republicano) não permitia a confirmação de que se tratava de uma peroba-rosa ou de outras espécies do mesmo gênero (Aspidosperma spp.). Assim, as biólogas Gisele Costa e Milena Godoy-Veiga atuaram arduamente em preparações microscópicas e fotomicrografias de amostras do canoão e de perobas atuais de forma a permitir a identificação microscópica mais precisa possível. As observações seguiram a padronização de características microscópicas de madeira para identificação com computador compilada pela International Association of Wood Anatomists,57 embora vários caracteres não pudessem ser observados em amostras muito pequenas.
Os métodos tradicionais, envolvendo apenas cortes manuais com lâminas descartáveis ou o uso de micrótomo de deslize com navalha do tipo C, os mais usados em anatomia de madeira, não permitiram a obtenção de preparações de boa qualidade para a identificação, visto que o canoão apresenta certo nível de deterioração estrutural, causada por xilófagos, como bactérias e fungos, bem como pela oxidação por raios ultravioleta. A preparação das amostras do canoão envolveu a inclusão em polietilenoglicol (PEG), um polímero à base de água, para o posterior secionamento em micrótomo.
O material foi amolecido apenas em estufa, utilizando uma mistura de água e glicerina (1:1) por um dia. Em seguida, a amostra foi incluída em PEG, observando aproximadamente os procedimentos descritos por Antônio Carlos Franco Barbosa,58 técnico com experiência de 50 anos do Instituto de Pesquisa Tecnológicas (IPT). Para a inclusão, foram feitas soluções de PEG com água destilada em diversas concentrações (20%, 40%, 60% e 80%). O material foi mantido em cada solução por 24 horas em estufa aquecida a 58°C, sendo que o padrão de troca são 12 horas. Após atingir PEG 80%, a amostra foi colocada em PEG 100% e levada à estufa a vácuo por cerca de oito horas. Apenas então foi feito o emblocamento em pequenas caixas de papel para a confecção dos cortes histológicos.
A amostra foi cortada em micrótomo de deslize nos três planos - transversal, longitudinal radial e longitudinal tangencial. Os cortes foram colocados em água para dissolver o PEG e clarificados com hipoclorito de sódio 50%. Em seguida, o material passou por uma bateria de desidratação (de etanol 10% até 100%), sendo que, quando estavam em etanol 50%, os cortes foram corados com safranina 1% e azul de astra 1% (modificado de Kraus e Arduim).59 Após desidratados, foram montados em lâminas permanentes com bálsamo do Canadá. Também foram preparados macerados para analisar as células individualmente com solução de Franklin (peróxido de hidrogênio e ácido acético 1:1).60 O material com o reagente permaneceu em estufa aquecida a 60°C por 24 horas. Após esse procedimento, a amostra foi lavada algumas vezes com água destilada - uma lavagem com etanol 50% e então corado com safranina 1%. Todas as lâminas foram fotografadas com uma câmera digital acoplada a um microscópio óptico (Leica Microsystems).
As amostras de referência de perobas pertencem às Xilotecas Nanuza Luiza de Menezes (SPFw) e Calvino Mainieri (BCTw).61 Foram usadas amostras para comparação já preparadas, bem como amostras de peroba-rosa preparadas exclusivamente para este fim, usando métodos tradicionais de anatomia de madeira, similares ao acima explicado, mas sem a necessidade de inclusão em PEG. Também foram usadas imagens de repositório internacional e banco de dados colaborativo para identificação de madeiras, sediado na Universidade da Carolina do Norte, denominado InsideWood.62
Os resultados das análises anatômicas e comparações com imagens de coleções virtuais e laminários de xilotecas de São Paulo indicam com segurança se tratar de um tronco de peroba-rosa, Aspidosperma polyneuron Muell. Arg. (família Apocynaceae) (figura 18). Essa madeira se caracteriza por apresentar anéis de crescimento visíveis e delimitados por zona fibrosa, com fibras de parede mais espessa e achatada radialmente, porosidade difusa, vasos sem arranjo característico e predominantemente solitários (> 90%) em densidade média de 54 vasos por mm2. Os vasos possuem diâmetro com média de 40µm (9µm¬-80µm). O comprimento médio dos elementos de vaso é de 295µm (161µm-547µm), as placas de perfuração são sempre simples e as pontoações intervasculares são alternas e guarnecidas. As pontoações radiovasculares são similares às intervasculares. Os vasos frequentemente são obstruídos por tilos, e algumas traqueídes estão presentes próximas aos vasos. Há fibras não septadas com comprimento médio de 987µm (172µm-1.324µm), paredes muito espessas e pontoações areoladas no plano radial e tangencial. O parênquima é axial difuso e escasso. Os raios possuem de uma a três células de largura, predominantemente duas, e altura do raio variando de 113µm a 260µm, com média em 191µm. Sua composição é homocelular, sendo compostos apenas por células procumbentes. Existem cristais prismáticos em células subdivididas do parênquima axial.
Cortes histológicos de peroba-rosa (Aspidosperma polyneuron) da madeira do canoão e de uma madeira atual: A, B e C - Corte transversal, longitudinal tangencial e radial da madeira do canoão; D, E e F - mesmos planos de corte de uma peroba-rosa atual (SPFw-5379).63
Pelas características anatômicas observadas, de forma nenhuma a madeira se trata de ximboúva, como sugerido por Holanda. A ximboúva (corruptela ou nome alternativo de timboúva) se trata de uma leguminosa, do gênero Enterolobium, possivelmente E. contortisiliquum (Vell.) Morong. ou E. timbouva Mart., que possui vasos muito largos (> 300µm) e parênquima axial vasicêntrico, ambos visíveis a olho nu. Os vasos de peroba são difíceis de enxergar até sob lente de dez aumentos. Nos casos das espécies de tamboril, todas as madeiras possuem densidade média, abaixo de 500 kg/m3, coloração clara, baixa resistência mecânica e ao apodrecimento. Dificilmente teriam sido conservadas nas condições em que o canoão esteve visto e que são muito susceptíveis a diversos xilófagos.64
Outro aspecto do canoão musealizado a ser destacado é que se trata de uma peça entalhada em um só tronco, ou seja, monóxilo. Para ser possível esculpir uma canoa desse porte, foi necessário o uso de um tronco muito grande e muito reto de uma árvore com diâmetro maior que 1,5m. Tal diâmetro ainda não foi calculado, mas se está recorrendo a outros métodos anatômicos que estão sendo aprimorados. Com base em observações de campo, para obter uma canoa de mais de 14 metros em um único lenho seria necessária uma peroba adulta de cerca de 25 metros de altura e ponto de inversão morfológica65 mais alto que quinze metros.
Adicionalmente, mais uma conclusão obtida pela análise morfológica do beque de proa é que as marcas observadas sugerem o provável emprego do método tradicional caiçara para sua fabricação, envolvendo entalhe com machado e uma ferramenta de corte parecida com uma enxada curta, a enxó.66 Tal método é comum até hoje para troncos monóxilos e, em alguns casos, pode contar também com a alternância entre entalhe e queima de partes internas.
Perobas-rosa do Parque Estadual de Porto Ferreira, demonstrando o grande porte das árvores. A) árvore com 35m de altura; B) árvore com cerca de 1,65m de diâmetro. Levi Itepan aparece como referência da dimensão do tronco. Fotografia de Gregório Ceccantini.
O CANOÃO EM ITU, OUTRORA BOCA DO SERTÃO E DAS MONÇÕES
Finalmente em 23 de setembro de 2017 - cem anos após as primeiras tratativas para a vinda do canoão para o Museu Paulista - foi montada nova exposição sobre a temática das monções, sob curadoria de Maria Aparecida de Menezes Borrego e de Rodrigo da Silva, intitulada Viagens fluviais: homens e canoas na rota das monções, no Museu Republicano Convenção de Itu, na região de seu primitivo emprego.
Em razão dos trabalhos interdisciplinares, o canoão teve protagonismo no que tange à sua materialidade. Os resultados das investigações realizadas pelos historiadores, engenheiros e biólogos da Universidade de São Paulo foram integrados à própria concepção da exposição e ao projeto museográfico, tanto que, próximos à embarcação, figuram dois infográficos - elaborados por Cláudio Rother e Ricardo Bogus - sobre a madeira de que é feita, sua dimensão, capacidade de carga, e comparação com outros modais de transporte, além de um breve documentário sobre os trabalhos de fotogrametria, exibido ininterruptamente (figura 20).
Vista parcial da exposição Viagens fluviais: homens e canoas na rota das monções, estando o canoão em destaque, 2017. Museu Republicano Convenção de Itu, MP, Itu, SP. Fotografia de Helio Nobre.
Diferentemente das propostas expositivas de Taunay no Museu Paulista, o beque de proa não teve papel cenográfico para ratificar o que estava nas telas por ele encomendadas com base nos desenhos de Florence. Em momento algum afirma-se que o fragmento do canoão participou da expedição Langsdorff ou de qualquer outra monção específica, mas sugere-se que ele pode ser similar às canoas utilizadas nas viagens que partiam de Porto Feliz nos séculos XVIII e XIX.
A partir dos resultados obtidos, foi possível projetar que, nas grandes expedições que percorriam a rota das monções, 90 canoas eram capazes de transportar 360 toneladas de carga entre São Paulo e Mato Grosso. Esse total de canoas correspondia a 360 carros de boi, ou 15 caminhões, ou 2.850 bois ou 3750 mulas. Tal capacidade fabulosa nos faz entender porque as viagens fluviais permaneceram ativas durante todo o século XVIII, ainda que já houvesse caminho terrestre aberto de São Paulo a Goiás e daí a Cuiabá desde a década de 1730.
Para compor as salas, foram levadas para o Museu Republicano telas encomendadas por Taunay nas décadas iniciais do século XX - Carga das canoas, de Oscar Pereira da Silva, Bênção das canoas e Pouso no sertão - Queimada, de Aurélio Zimmermann - e as reproduções dos desenhos realizados por Hercule Florence, nos anos 1820, pertencentes à coleção Cyrillo Florence (figuras 21 e 22).
Vistas parciais das salas da exposição Viagens fluviais: homens e canoas na rota das monções, 2017. Museu Republicano Convenção de Itu, MP, Itu, SP. Fotografias de Helio Nobre.
Pela primeira vez, telas e desenhos foram expostos lado a lado, informando o público sobre a expedição Langsdorff e explicando a perspectiva de Afonso Taunay na construção da narrativa visual das monções. Embora muitos elementos presentes nos dois suportes temporalmente distantes sejam considerados traços das expedições monçoeiras que precederam a expedição Langsdorff, buscamos não confundir os dois períodos, tomando um pelo outro. Afinal, eram outros homens e objetivos diferentes que os guiavam.
AGRADECIMENTOS
Somos gratos à Fapesp pelos auxílios que possibilitaram a coleta de material de referência deste trabalho e expansão da xiloteca - Procs: 2009/54902-0 e 2012/50457-4. À bióloga Paula Alécio, com auxílio na coleta deste material e na curadoria da coleção. Ao Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) pelo acesso à xiloteca Calvino Mainieri (BCTw).
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- SOUZA, Carlos Celestino Rios e; LINS Júnior, Hamilton Marcelo Morais. A evolução da conoa monóxila em Pernambuco, Brasil (séculos XVI ao XX). Clio Arqueológica, Recife, v. 31, n. 2, p. 58-80, 2016.
- TEODORO, Carla Regina de Oliveira et al. Aplicação de fotogrametria para o levantamento das características geométricas do casco de embarcações de planeio. In: XXIII Congreso Panamericano de Ingeniería Naval, Costa Afuera e Ingeniería Portuaria, 2013, Margarita. Libro de Ponencias y Conferencias del COPINAVAL, 2013, p. 1316-1353.
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WERNECK, Gustavo. Canoa indígena construída em 1610 é encontrada em Minas Gerais. O Estado de Minas. Belo Horizonte, 6 mar. 2015. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2Po9h8a
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» https://bit.ly/2Po9h8a - WHEELER, Elisabeth. InsideWood - a web resource for hardwood anatomy. IAWA Journal, v. 32 n. 2, 199-211, 2011.
- WHEELER, Ryan J. et al. Archaic Period Canoes from Newnans Lake, Florida. American Antiquity, v. 68, n. 3, p. 533-551, 2003.
SOFTWARES
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CLOUD COMPARE. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2L5I1qN
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» https://bit.ly/2L5I1qN - GOM OPTICAL MEASURING TECHNIQUES. Application Example: 3D-Coordinate Measurement - Mobile 3D Coordinate Measurement for Shipbuilding. Alemanha, 2009.
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- GOM PHOTOGRAMMETRY TRITOP 6.2 MANUAL BASIC. Alemanha, s/d.
-
8
Carta de Eugenio Motta, prefeito de Porto Feliz, a Afonso de Taunay, de 25 de outubro de 1917, Arquivo Permanente do Museu Paulista/ Fundo Museu Paulista (APMP/FMP) - Série: correspondência.
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9
Carta de Eugenio Motta, prefeito de Porto Feliz, a Afonso de Taunay, de 27 de dezembro de 1917, APMP/FMP - Série: correspondência.
-
10
Carta de Afonso de Taunay a Eugênio Motta, de 29 de novembro de 1923, APMP/FMP - Série: correspondência.
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11
Carta de Afonso de Taunay a Alarico Silveira, secretário do Interior, de 08 de janeiro de 1924, APMP/FMP - Série: correspondência.
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12
Carta de Afonso de Taunay a Cel. E. Johnston, superintendente da S. Paulo Railway Co., de 19 de janeiro de 1924, APMP/FMP - Série: correspondência.
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13
Carta de Afonso de Taunay a Eugênio Motta, de 1937, APMP/FMP - Série: correspondência.
-
14
MUSEU PAULISTA. O Estado de S. Paulo, 28 jan. 1924, Geral, p. 3.
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15
Entre os funcionários do Museu Paulista e do Museu Republicano de Itu, o beque de proa muitas vezes é chamado de canoão, mesmo sendo dele apenas um fragmento, e aqui também assim será denominado.
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16
Cf. Kopytoff (2008).
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17
Cf. Hahn; Weiss (2013).
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18
Cf. Abreu (1996).
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19
Cf. Ramos (2011).
-
20
Cf. Meneses (2011).
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21
Cf. Françozo (2012).
-
22
Alberti (2005, p. 561).
-
23
Relatório de Atividades referente ao ano de 1924, APMP/FMP, L08, p. 2-3.
-
24
Moraes (2010, p. 1).
-
25
Souza; Lins Júnior (2016, p. 61-62).
-
26
Rambelli; Tomazello; Camargo (2000, p. 32).
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27
Ibid.
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28
Cf. Werneck (2015). <https://bit.ly/2Po9h8a>. Acesso em 25 jul 2019.
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29
Idem.
- 30
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31
Cf. Lins; Rios (2016)
-
32
Alves (2013, p. 14).
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33
Ibid., p. 8-9.
-
34
Ibid., p. 39.
- 35
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36
Arnold (2016, p. 1). “No fundo, à meia altura, observa-se uma antepara, o que exclui qualquer abertura secundária dos flancos por aquecimento. Foi talhada com um enxó de lâmina reta. As marcas de enxós de grandes lâminas côncavas podem ser observadas na escavação do fundo no nível dos encolamentos. A parte alta dos flancos, do lado interno, foi ainda afinada com um enxó de lâmina côncava utilizado em um plano vertical e, portanto, de cabo curto, em forma de séries paralelas. Finalmente, nota-se a presença de uma nervura, provavelmente destinada a controlar a escavação do fundo entre a nervura e a antepara [sic]” (tradução de Márcia Valéria Aguiar).
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37
Arnold (2016, p. 1). “Os instrumentos utilizados eram de ferro. A forma e as dimensões dessa pequena embarcação mostram que não se trata de uma piroga indígena tradicional, mas de uma pequena embarcação encomendada ou feita por colonos para efetuar transportes de mercadorias pesadas, considerando-se a forma da seção transversal” (tradução de Márcia Valéria Aguiar).
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38
Cf. Carvalho (2006).
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39
Perobas são madeiras do gênero botânico Aspidosperma, sendo a mais utilizada no passado a peroba-rosa, Aspidosperma polyneuron, por sua alta resistência à deterioração e existência de troncos retos de grandes dimensões: mais altos que 45m e com diâmetro de até 3m.
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40
Cf. Holanda (2014).
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41
Cf. Godoy (2002).
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42
AUTOGRAPHO do Padre Anchieta, O Estado de S. Paulo, 28 de abril de 1926, p. 5.
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43
Cf. Brefe (2005).
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44
Como já avaliaram Solange Ferraz de Lima e Vânia Carneiro de Carvalho (1993), os desenhos originais, muitos deles não coloridos e de tamanhos reduzidos, não permitiriam a eficácia na sua função pedagógica, e não possuíam o grau de enobrecimento, respeitabilidade e prestígio que detinha a pintura, daí Taunay solicitar que os artistas os ampliassem.
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45
Cf. Pardim (2005); Lima Jr. (2015).
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46
Cf. Holanda (1945; 1994).
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47
MUSEU PAULISTA. O Estado de S. Paulo, 24 de março de 1944, p. 6.
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48
Pardim (2005, p. 201).
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49
MUSEU PAULISTA. O Estado de S. Paulo, 24 de março de 1944, p. 6.
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50
Cf. Bogus (2009).
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51
Cf. Alves (2013).
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52
Cf. Luhmann (2011).
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53
Ibid.
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54
Cf. Kraus (1997).
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55
Ao solicitar isenção do frete para o transporte do beque de proa de Porto Feliz a São Paulo, Taunay explica ao inspetor da ferrovia que o objeto “é aberto num tronco de peroba, não podendo dizer a V. Exa. quanto aproximadamente pesará” (Carta de Afonso de Taunay a Calixto de Paula Souza, inspetor da Estrada de Ferro Sorocabana, de 6 de janeiro de 1924, APMP/FMP - Série: correspondência). Já no capítulo reescrito de Monções, Caminhos do sertão, Sérgio Buarque de Holanda comenta: “Outro [resto de canoa], bem ou mal identificado como beque de proa, está no Museu Paulista. Deste, muito pouco há o que dizer. Feita de ximbó, a antiga canoa acha-se hoje reduzida a um fragmento de 3,5 metros de comprimento” (2014, p. 277-278) (grifo nosso).
- 56
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57
Cf. IAWA Committee (1989).
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58
Cf. Barbosa et al. (2010).
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59
Cf. Kraus; Arduim (1997).
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60
Comunicação pessoal de A.C.F. Barbosa, modificado de Franklin (1945).
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61
Havia 461 amostras disponíveis, sendo 264 amostras de 28 nomes aceitos como corretos para o gênero. Das oito espécies que ocorrem no Estado de São Paulo disponíveis em xilotecas, só não examinamos uma, Aspidosperma redelii, indisponível em nenhuma coleção do mundo.
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62
Cf. InsideWood (2004-onwards), Wheeler (2011).
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63
Coleta: G. Ceccantini 3983 e P. Alécio, Set. 2013, Estação Ecológica de Caetetus, Gália, SP.
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64
Cf. Mainieri; Chimelo (1989).
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65
O ponto de inversão morfológica (PIM) é a região da árvore onde termina o tronco e começa a copa.
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66
Cf. Németh (2011).
APÊNDICE 1 - ANÁLISE COMPARATIVA DE CONTINUIDADE E CURVATURA PARA DIFERENTES CONFIGURAÇÕES DE COMANDOS EM SOFTWARE CAD
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
05 Dez 2019 -
Data do Fascículo
2019
Histórico
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Recebido
21 Nov 2018 -
Aceito
29 Jul 2019