Resumo
Este artigo se propõe a explorar o fenômeno das intensas interações entre grafismos rupestres, valendo-se da interlocução teórica entre Arqueologia e Etnologia indígena brasileiras. As interações em painéis rupestres são aqui analisadas em duas regiões de Minas Gerais: o Vale do Rio Peruaçu e Diamantina, áreas de pesquisa da equipe do Setor de Arqueologia do Museu de História Natural e Jardim Botânico da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), enfatizando-se a primeira. Em ambas, há numerosíssimos casos de interações, quando novas pinturas (ou gravuras) são compostas em painéis que já estavam pintados (e/ou gravados). A interlocução com a Etnologia que aqui se faz tem como foco algumas das noções centrais apresentadas nos trabalhos etnográficos e nas sínteses etnológicas sobre sociedades ameríndias, sobretudo o caráter intensamente relacional de suas cosmologias e suas concepções sobre agência de não humanos. A proposta central, a partir do estudo dos acervos gráficos dessas duas regiões de Minas Gerais, é pensar a relação como elemento crucial da prática de pintar paredes rochosas já pintadas, relação essa em que pessoas e pinturas são, ambas, sujeitos.
Keywords Rock paintings; Rock art; Archaeological theory; Ethnology; Agency; Relationality
Abstract
This paper proposes a dialog between Brazilian archaeology and ethnology in order to understand intensive relationships among rock art elements. These interactions in rock art panels are analyzed in two regions of Minas Gerais (central Brazil), the Peruaçu River Valley and Diamantina, which have been studied by teams from the Archeology Sector of the Natural History Museum and Botanical Garden at the Federal University of Minas Gerais. We focus in this paper on the former region, but both are considered and feature many cases of interactions, in which new paintings or etchings are made on panels that already contain such rock art. The dialogue with ethnology focuses on some of the central notions presented in ethnographic studies and ethnological syntheses about Amerindian societies, mostly the strong relational character in their cosmologies and their understandings of non-human agency. The main finding from studying the broad-spanning indigenous graphic heritage from these two regions is to consider these relationships as a major element in the practice of rock art, a relationship in which both people and paintings are actors.
Palavras-chave Grafismos rupestres; Arte rupestre; Teoria arqueológica; Etnologia; Agência; Relacionalidade
INTRODUÇÃO
Paredes em que são tantas as linhas, que nossos olhos, procurando limites, se perdem; paredes em que são tantas as tintas, que nossos olhos mal distinguem figuras; paredes em que são tantas as figuras, que elas não cabem em nossos olhos; paredes em que são tantas as figuras sobre outras figuras, que nossos olhos não sabem onde se fixar: assim são muitos dos paredões de pedra que encontramos em Diamantina e no Peruaçu, serra e sertão de Minas Gerais.
Em diversas áreas de sertões e serras mineiras, mas especialmente no Vale do Peruaçu, no extremo norte de Minas Gerais, e em Diamantina, na porção sul da Serra do Espinhaço, onde temos trabalhado continuadamente, podemos observar muito numerosas sobreposições e justaposições entre grafismos indígenas pré-coloniais, que ocupam intensamente os paredões rochosos1. Foi possível observar que essa prática de sobrepor e/ou justapor novas figuras a outras precedentes envolve atitudes diversas: total repintura, repintura parcial, sobreposição sem apagamento, adição de elementos gráficos, incorporação de elementos gráficos (já existentes no suporte) à composição das novas figuras, obliteração parcial ou total, cuidadoso encaixe, sistemático evitamento de sobreposição. Em cada uma das regiões, foi possível identificar um conjunto de atitudes, fortemente recorrentes, e, sobretudo, no caso do Vale do Peruaçu, atitudes diferentes para os diversos estilos de grafismos que se sucedem nas paredes rochosas. Esses modos de interação são, tanto em Diamantina quanto no Peruaçu, muito intensos. São milhares de casos em que novos grafismos que chegam às paredes interagem com os grafismos precedentes. As autoras das figuras parecem seriamente interessadas em produzir relações com as pinturas anteriores, agindo intensamente sobre elas e – este é um dos pontos centrais desta proposta – sendo afetadas pela ação delas (Figura 1).
Vista parcial de painel densamente ocupado por pinturas e gravuras, na Lapa de Rezar, no Vale do Peruaçu (Itacarambi, norte de Minas Gerais).
Tais interações entre grafismos rupestres vêm sendo objeto de observação e de análise em diversos trabalhos conduzidos nas duas regiões e também em regiões vizinhas pela equipe de pesquisadoras(es) ligadas(os) ao Setor de Arqueologia do MHNJB/UFMG. Em alguns desses trabalhos, as relações entre grafismos foram exploradas de modo secundário (Câmpera, 2012; Isnardis, 2009a; Isnardis et al., 2008), enquanto, em outros trabalhos, o tema foi objeto de descrição mais detalhada e de discussão efetiva – especialmente em Linke et al. (2020), em Magalhães (2021), em Diniz (2020), em Baldoni (2016) e em Montovanelli (2022), mas também em Erik Oliveira (2016), em Dias (2017), em Isnardis (2004), em Linke e Isnardis (2008, 2012) e em Tobias Júnior (2010).
Na maioria desses trabalhos, não se propôs ou se enunciou uma explícita inflexão teórica, permanecendo a discussão no marco de esforços interpretativos mais direcionados à definição de distintos estilos que se sucederiam nos suportes rochosos – sobretudo no desenho de uma cronoestilística local ou regional –, ainda que se incorporasse(m) aos estilos regionalmente definidos o(s) comportamento(s) típico(s) em relação às figuras precedentes (Isnardis, 2009b, 2004; Linke & Isnardis, 2012; Linke, 2013; Tobias Júnior, 2010; Erik Oliveira, 2016). Sinalizou-se, sim, que se fazia aí um movimento de superação dos quadros cronoestilísticos muito estáticos, rumo a uma análise de interações, de continuidades e mudanças (Isnardis, 2004, 2009a, 2009b; Linke, 2013). Contudo, ao se falar de continuidades e mudanças, mantiveram-se majoritariamente as análises e conclusões nos marcos das perspectivas fundadas na diacronia e na organização (nessa diacronia) de diversidade ou de semelhanças culturais entre grupos de autoras(es). Os trabalhos que produziram uma inflexão mais efetiva e explícita nessa perspectiva são bastante recentes, já engajados no contexto das discussões de que este artigo participa, mais precisamente os de Linke et al. (2020), Magalhães (2021) e Montovanelli (2022).
Este artigo apresenta a proposta de explorar o diálogo entre a trama diversa e intensa de relações de grafismos rupestres e a produção etnográfica e sínteses etnológicas sobre os ameríndios, especificamente em certos aspectos que estes trabalhos destacam: o caráter intensamente relacional das cosmologias ameríndias, o estatuto ontológico dos artefatos e de outros seres não humanos e sua capacidade agentiva2. Não postulo aqui um diálogo que parta da sustentação de uma continuidade histórica direta entre os contextos arqueológicos analisados (no Peruaçu e em Diamantina) e os contextos ameríndios específicos tratados na produção etnológica, mas sim uma aproximação de natureza teórica: princípios filosóficos (teóricos) ameríndios, tal como etnólogas(os) as compreendem e apresentam, fornecendo repertórios teóricos para a análise dos contextos arqueológicos. O que a proposta tem em vista é que se possa agregar outros repertórios conceituais, de modo a possibilitar novas maneiras de compreender e qualificar as múltiplas interações entre pinturas rupestres (e entre pessoas e pinturas, como adiante desenvolverei) que temos observado. Contudo, explorarei também, ainda que essa não seja condição para o referido manejo teórico, a possibilidade de argumentar em favor de uma história profunda, conectando elementos ontológicos indígenas contemporâneos e os contextos arqueológicos do Holoceno médio, médio-recente e recente – períodos em que se inseriria boa parte dos acervos gráficos em pauta3.
Os pontos principais aqui propostos, com o apoio da referida interlocução teórica, são: relacionar-se é um elemento constitutivo central nas práticas de pintar (e gravar) suportes rochosos já pintados; e, nessa relação, tanto pessoas pintoras quanto pinturas (e gravuras) são sujeitos.
OBSERVANDO RELAÇÕES ENTRE GRAFISMOS RUPESTRES
Os estudos de grafismos rupestres conduzidos no Vale do Peruaçu e na região de Diamantina, dos quais tive e tenho a oportunidade de participar ativamente, focaram inicialmente suas energias na construção de quadros cronoestilísticos e nas discussões sobre a construção da paisagem por meio de grafismos rupestres, explorando, também, outros temas e abordagens. O objetivo da abordagem cronoestilística era estabelecer conjuntos estilísticos, a partir da temática, das características gráficas e de outros elementos das pinturas e gravuras, assim como estabelecer um esquema de cronologia relativa entre esses conjuntos, por meio das numerosíssimas sobreposições entre figuras, da identificação macroscópica das tintas e dos elementos de tafonomia das pinturas e dos suportes. Os esforços produziram sequências cronoestilísticas bastante sofisticadas para o Vale do Peruaçu e para a região de Montalvânia (também em Minas Gerais, ainda mais ao norte do que o Peruaçu – vide Figura 2). Construíram-se, desse modo, quadros cronoestilísticos regionais. Mais tarde, os esforços foram estendidos à região de Jequitaí (com o projeto de pesquisa de mestrado de Tobias Júnior, 2010, 2013) e à região de Diamantina (Isnardis, 2009a; Linke, 2008; Linke & Isnardis, 2012; Erik Oliveira, 2016; Leite, 2016; Dias, 2017; Baldoni, 2016). Abordagem semelhante foi também desenvolvida por outros grupos de pesquisa, em outras regiões do país, notadamente em áreas de pesquisa no Nordeste do Brasil, pelos grupos de pesquisadoras(es) ligadas(os) à Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM) e à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) (Martín, 1997; Martín & Guidon, 2010; Guidon, 1986, 1989; Pessis, 2003; Pessis et al., 2018; Cisneiros et al., 2021), assim como por pesquisadoras(es) ligadas(os) à Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), atuantes também na região de Diamantina e municípios imediatamente a norte, na área que poderíamos chamar de Alto Araçuaí4 (Leite, 2012; Ferreira, 2011; Fagundes et al., 2014) (Figura 2).
Nos esforços empreendidos no Peruaçu, a perspectiva teórica não era propriamente inovadora (embora, talvez, não tivesse sido realizada com tanta intensidade em outras regiões) e poderia ser conectada à construção de uma história cultural, em termos tradicionais. Os conjuntos cronoestilísticos eram congregados sob os termos das ‘tradições’ de grafismos propostas por André Prous (Prous, 1992; Prous & Junqueira, 1995; Prous et al., 1984), por Niède Guidon (Guidon, 1986, 1989), Gabriela Martín (Martín, 1997) e Anne-Marie Pessis (Pessis, 2003) e em novos conjuntos de natureza afim ou em subconjuntos construídos no processo, por Prous e colaboradoras(es) (eu, entre estes)5. Contudo, a observação intensa dos casos de sobreposição entre tintas e figuras nos levou a atentar para uma dimensão que não estava previamente desenhada entre os objetivos da pesquisa: percebemos que havia atitudes, comportamentos diferentes por parte das pessoas pintoras em relação ao que já se encontrava nas paredes, quando compunham novas figuras6. Havia casos em que a sobreposição por uma nova figura obliterava parcial ou integralmente as figuras anteriores; enquanto, em outros casos, havia um evitamento de sobreposições (ou uma sobreposição apenas marginal entre as figuras); havia, ainda, grafismos antigos que eram integralmente contornados por uma nova tinta (que também podia ser vista isolada na composição de outras figuras, na mesma parede); podiam ser vistos casos em que pequenos traços emolduravam parcialmente as formas de pinturas precedentes; enquanto, em outros casos, as figuras se encaixavam no espaço não pintado entre figuras já compostas. A partir da observação sistemática desses casos e de sua correlação com os conjuntos estilísticos delineados, propusemos que havia comportamentos recorrentes, típicos, dos grupos humanos autores dos grafismos de cada um dos conjuntos, em relação às pinturas que os haviam precedido (Isnardis, 2004, 2009b; Isnardis & Linke, 2010).
Ao caracterizar tais comportamentos, entendíamos que havia ali um proceder dos grupos de pessoas autoras de cada conjunto estilístico em relação aos grafismos anteriores, mas um proceder que conectava elementos de tempos diferentes; entendíamos as relações como essencialmente diacrônicas. Essa compreensão está explícita nos artigos de minha autoria e de parceiras de pesquisa7. Pensada com a diacronia em seu centro, a prática de grafar ou, mais especificamente, a prática de grafar locais já grafados era desdobrada numa compreensão de processo histórico, ao longo do qual novos grupos de autores chegavam às paredes e interagiam com os grafismos ‘mais antigos’.
Mesmo que sempre fizéssemos ressalvas, sublinhando o fato do lapso de tempo entre os conjuntos estilísticos ser radicalmente incerto, as nossas interpretações sobre os significados dos comportamentos propunham que estávamos, em certas situações, diante de elementos de continuidade cultural ou, em outras, diante de mudança cultural significativa. Estávamos sempre pensando numa relação entre as novas pessoas pintoras, em seu presente, e pinturas precedentes, feitas em seu passado. Os casos em que as interações davam claro sinal de reconhecimento das pinturas precedentes e em que as intervenções não as obliteravam, somando-se a isso afinidades temáticas e/ou estilísticas, eram interpretados como indicadores de continuidade cultural. Enquanto os casos em que havia substantivas diferenças temáticas e estilísticas, combinadas a uma ruptura na organização dos espaços gráficos, eram interpretados como descontinuidades culturais. Contudo, questionávamo-nos quanto às possibilidades interpretativas dos casos em que se sobrepunha de modo a apagar apenas parcialmente as figuras mais antigas, casos esses que, se não permitiam uma leitura clara de continuidade, tampouco permitiam sustentar que houvesse desinteresse pelas figuras precedentes.
Levantávamos questionamentos sobre o que essas diferentes atitudes poderiam significar. Valendo-nos, naqueles momentos, da noção clássica de ‘signo’ (Saussure, 1995), nos perguntávamos se haveria elementos para supor em que medida o interesse pelas figuras ‘mais antigas’ corresponderia à atribuição de novos ‘significados’ a ‘significantes’ sugestivos ou a uma manutenção dos significantes e dos significados das figuras (Isnardis, 2004, 2009a, 2009b; Isnardis & Linke, 2010). Mas ainda não havíamos dado destaque ao que recentemente indicamos (Linke et al., 2020) e que pretendo aqui desenvolver: a centralidade que a disposição para se relacionar parece ocupar na prática de pintar.
A região de Diamantina foi campo fundamental para se abrirem novos caminhos, com suas pinturas nos estimulando e demandando novas elaborações para seu entendimento. Façamos uma visita às paredes quartzíticas do Espinhaço meridional.
Assim que ganharam fôlego os trabalhos com os grafismos rupestres em Diamantina e municípios do entorno, ficaram evidentes a intensidade e a frequência das sobreposições nos sítios da área, sobretudo naqueles onde os grafismos eram mais numerosos (Isnardis et al., 2008; Linke, 2008; Linke & Isnardis, 2008; Isnardis, 2009a). Aliás, a prática de sobrepor intensamente já tinha sido assinalada por Prous e colaboradores nas regiões do Planalto Cárstico de Lagoa Santa e da Serra do Cipó (Figura 2), onde grafismos temática e estilisticamente semelhantes aos de Diamantina já eram conhecidos (Prous et al., 1980; Prous, 1992). Porém, foi possível perceber – o mérito de observar pela primeira vez e atrair a atenção da equipe para o fenômeno é de Vanessa Linke – que as numerosas sobreposições, descritas pela bibliografia sobre as outras áreas como produzindo uma ‘impressão de caos’, estavam muito longe de serem caóticas; pelo contrário, mostravam um cuidadoso jogo de encaixes entre figuras. A partir do momento em que passamos a estar atentas(os) ao fenômeno, pudemos descrever que a interação ia muito além dos encaixes. Nos painéis de Diamantina, que são visual e numericamente dominados por figuras zoomorfas, havia casos em que figuras eram integralmente repintadas com uma nova tinta; em outros casos, apenas partes das figuras eram repintadas; havia casos em que se pintava (com diferente tinta) uma nova ‘anca’ e novas ‘pernas’ para uma figura elafomorfa8 que já estava na parede; havia também casos em que ‘pernas’ de uma figura zoomorfa eram incorporadas como traços de preenchimento de outra pintura zoomorfa (guardando-se coerência rítmica entre os traços anteriores, das ‘pernas’, e os traços do preenchimento da nova figura); em certas pinturas, uma nova ‘cabeça’ era agregada a um ‘corpo’ de figura elafomorfa que já apresentava uma ‘cabeça’; em alguns painéis, os limites externos do ‘corpo’ de uma figura se definiam para tocarem ligeiramente os limites das demais figuras que a contornavam, gerando sobreposições marginais, discretas, suficientes apenas para reconhecermos a antecedência; havia, por fim, casos em que os limites externos de duas figuras eram longamente coincidentes (Figuras 3 a 6)9.
Painel na Lapa do Boi (Diamantina, Minas Gerais). Os três quadros menores representam três estágios de composição do painel. No terceiro estágio, faz-se uma repintura parcial da figura maior, acrescentando-lhe uma ‘galhada’. As ‘pernas traseiras’ e o ‘ventre’, contudo, não são repintados. O quadro inferior apresenta a figura ‘original’ e a repintura (com contraste de cores acentuado). Revisão e consolidação do documento-base: Larissa Magalhães (2020); composição da figura: A. Isnardis (2022).
Reprodução de pequena porção do Painel 1 da Lapa do Caboclo de Diamantina. A figura inferior em tinta vermelha é posterior àquelas em seu entorno. Observe que sua composição faz com que ela se ajuste ao espaço disponível, tocando levemente as demais figuras (as sobreposições são marginais). O traço diagonal que a atravessa é alinhado ao traço diagonal que parece partir da ‘cabeça’ da figura elafomorfa laranja-clara. Observe também que a figura superior em cor vermelha toca levemente com as extremidades de suas ‘pernas’ o ‘pescoço’ da figura central em cor laranja-claro.
Reprodução parcial da extremidade sul do Painel I da Lapa do Boi (Diamantina, Minas Gerais). O quadro à esquerda apresenta as pinturas iniciais e intermediárias da sequência de construção do painel. O quadro à direita inclui também as pinturas finais. Observe como a tinta ocre, que compõe a figura antropomorfa na porção esquerda, se distribui paralelamente a traços e figuras em tinta vermelho-alaranjada. Ao colocar-se sobre a figura elamorfa da parte inferior, os traços em ocre alternam-se com os traços vermelhos; enquanto a composição dos ‘braços’ do antropomorfo contorna a figura linear vertical, no centro, à esquerda. Revisão, consolidação do documento-base e análise: Larissa Magalhães (2020); composição da figura: A. Isnardis (2022).
Os quadros representam dois momentos de composição de um trecho de um dos painéis pintados da Lapa do Boi (Diamantina, Minas Gerais). A tinta ocre adiciona uma ‘cabeça’ e ‘parte de um corpo’ à composição, sem que os demais elementos do ‘corpo’ sejam pintados. Revisão, consolidação do documento-base e análise: Larissa Magalhães (2020); composição da figura: A. Isnardis (2022).
Destacamos a esse respeito que, nos sítios da região de Diamantina, parecia não haver necessidade de, ao se pintar, compor grafismos inteiros, completos, autônomos10 (Isnardis, 2009a, p. 86; Linke et al., 2020, p. 14). Na maioria dos casos, pintam-se figuras em que todo um ‘corpo’ de zoomorfo é composto, somando-se a outros zoomorfos que já ocupam as paredes. Mas há uma realização de figuras, e estas não são poucas, em que se pintam apenas ‘partes do corpo’ – ‘pernas’, ‘ancas’, ‘pés’, ‘cabeças’ ou ‘chifres’, justapostos ou parcialmente sobrepostos a figuras zoomorfas pré-existentes na parede. Parece que compor grafismos é, na região de Diamantina, algo que, em importante medida, envolve grafismos que já habitam as paredes (conforme propusemos em Linke et al., 2020). Parece que estamos diante de uma prática em que se pinta com o que já está na parede. As Figuras 2, 4 e 5 exemplificam esses comportamentos, assim como a Figura 7.
Painel da Lapa do Voador (Diamantina, Minas Gerais). A figura mostra quatro momentos de composição do painel. Vários encaixes entre figuras são feitos ao longo dos momentos. No último momento, uma grande figura envolve todas as demais, sendo o seu ‘dorso’ formado pelas linhas superiores das primeiras figuras pintadas.
Com a motivação e o incremento na reflexão que os trabalhos em Diamantina produziram e têm produzido, neste artigo, a atenção vai se concentrar no Sertão do São Francisco, nos calcários da bacia do rio Peruaçu.
Apresentando um exuberante relevo cárstico, o Vale do Peruaçu é marcado por um cânion principal, por onde corre o rio, e uma trama de cânions secundários e condutos subterrâneos. Muitas grutas e abrigos rochosos se formam, de morfologias diversas, indo desde pequenas cavidades a abrigos de mais de 100 metros de comprimento e cavernas de mais de 50 metros de altura. O número de sítios com pinturas rupestres registrado, hoje, é próximo a cem, em uma área que corresponde a menos de 40 km2. Uma marca característica do vale é a presença muito densa de pinturas e gravuras em diversos sítios, com vários deles excedendo o número de mil figuras.
No Peruaçu, comportamentos em alguma medida similares àqueles observados em Diamantina, porém com particularidades, assim como comportamentos distintos, foram descritos e inicialmente analisados (Ribeiro & Isnardis, 1996-1997; Isnardis, 2004; Ribeiro, 2006; Isnardis, 2009b; Guanaes, 2015). Uma peculiaridade dessa região, contudo, influencia fortemente a questão ali e absorveu boa parte dos esforços de compreensão. Ao contrário de Diamantina, onde há uma forte continuidade temática entre os assim propostos diferentes momentos de ocupação gráfica dos suportes rochosos, acompanhada de alguma continuidade também estilística (Isnardis & Linke, 2010; Linke & Isnardis, 2012; Linke, 2013; Erik Oliveira, 2016; Baldoni, 2016; Dias, 2017; Diniz, 2020; Magalhães, 2021; Montovanelli, 2022; Isnardis, 2009a), o Vale do Peruaçu é internamente muito rico em diversidade temática e estilística. Desde os primeiros até os mais recentes trabalhos sobre grafismos rupestres no Vale, a presença de conjuntos estilísticos diversos foi indicada e explorada. Percebeu-se que parecia haver coerência entre as muito recorrentes sobreposições e a variabilidade temático-estilística, o que levou as(os) pesquisadoras(es) (a mim intensamente, inclusive) a dedicarem boa parte de seus (nossos) esforços à delimitação de conjuntos estilísticos com coerência de cronologia relativa. Com essa diversidade, conforme já mencionado, os comportamentos das figuras (sejam elas pintadas ou gravadas) diante das figuras precedentes foram inicialmente analisados em termos de fenômenos que poderiam ser típicos ou recorrentes de cada um dos conjuntos propostos (vide Isnardis, 2004, 2009b; Ribeiro, 2006; Ribeiro & Isnardis, 1996-1997; Guanaes, 2015). No que se refere a elementos de interação mais intensa entre grafismos, foram descritos sobretudo os comportamentos dos ‘quatro diferentes momentos’ da chamada ‘tradição São Francisco’ (Ribeiro & Isnardis, 1996-1997). Observemos alguns casos mais de perto.
Numerosas vezes, as autoras das pinturas entendidas como integrantes do ‘quarto momento da tradição São Francisco’ (Isnardis, 2004; Ribeiro & Isnardis, 1996-1997) tomam grafismos mais antigos, atribuídos aos ‘momentos’ anteriores dessa unidade estilística, e agem sobre eles de modo a agregar-lhes novos elementos de composição. Por exemplo, na Lapa de Rezar, uma série de cadeias losangulares em cor branca (atribuídos ao ‘primeiro momento’) foi contornada por linhas vermelhas (atribuídas ao ‘quarto momento’)11. Além da comparação com outras tintas e informações de cronologia relativa, construídas por correlações com outras figuras no sítio, a composição da bicromia em dois momentos, nesse caso, tem um forte argumento: outra figura, em tinta amarela, está sobreposta às cadeias de losangos brancos, mas embaixo da tinta vermelho-clara que as contornou (Figura 8). Num outro caso, na Lapa dos Desenhos, as autoras de figuras atribuídas ao momento tardio repintaram integralmente uma figura ictiomorfa, aplicando nova camada de tinta preta (a cor original era também preta, porém em uma tinta nitidamente distinta e que fora recoberta por um filme natural de calcita) e adicionaram um contorno à figura, em tinta branca (Figura 9). No mesmo painel, uma figura herpetomorfa, também originalmente em cor preta (na mesma tinta que fora recoberta pelo filme de calcita), foi repintada por outra tinta também preta, porém não integralmente; seu ‘pé’ direito, que já havia sido sobreposto por uma figura em amarelo e vermelho, não foi repintado, evitando-se, assim, que a nova demão de tinta preta cobrisse a figura amarela e vermelha (Figura 10).
Detalhes do Painel I da Lapa de Rezar (Vale do Peruaçu, Itacarambi, Minas Gerais). Composição de bicromia (A) em dois momentos, intermediados por outra pintura (em tinta amarela). Observe na foto superior direita que a tinta amarela (da figura intermediária, [B]) se sobrepõe à tinta branca, mas a tinta vermelho-clara se sobrepõe à amarela. Fotos e composição: A. Isnardis (2021-2022).
Porção central do Painel IIIb da Lapa dos Desenhos (Vale do Peruaçu, Itacarambi, Minas Gerais). Os quadros reconstituem a sequência proposta para a composição do painel. Observe que a figura central em preto recebe, no momento 2, dois traços longitudinais vermelhos e, no momento 4 da composição do painel, recebe uma repintura e um contorno em tinta branca. Foto: A. Isnardis (2014); consolidação do documento-base e análise: Luiz Fernando Miranda e A. Isnardis; composição da figura: A. Isnardis (2022).
Reprodução da porção superior do Painel IIIb da Lapa dos Desenhos (Vale do Peruaçu, Itacarambi, Minas Gerais). Os quadros reconstituem a sequência proposta em nossas análises para a composição do painel. Observe que a figura central em preto, herpetomorfa, foi composta no primeiro momento de pintura e, à semelhança do exemplo anterior, recebe, no momento 2, dois traços longitudinais em vermelho. No momento 4 da composição do painel, recebe uma repintura em preto, porém essa repintura não incide sobre a extremidade inferior direita, que já havia sido sobreposta por uma figura bicrômica em amarelo e vermelho. Consolidação do documento-base e análise: Luiz Fernando Miranda e A. Isnardis; composição da figura: A. Isnardis (2022).
Outros casos similares ocorrem, assim como procederes outros podem ser observados e descritos. Entre estes, vale destacar a pintura de figuras de mesmas formas do que outras já dispostas na parede, em proximidade direta, o que ocorre diversas vezes num dos maiores painéis verticais do Peruaçu, na Lapa dos Desenhos (Figura 11), mas também por numerosas vezes, em diversos outros lugares – em sua tese, Linke (2014) dimensiona a elevada frequência com que associações homotemáticas são produzidas.
Além de se comporem figuras semelhantes, há contornos ou traços longitudinais vermelhos adicionados a algumas das pinturas anteriores (Figuras 10 e 11). Percebe-se também, nesse painel, outro aspecto fortemente notado no Peruaçu: a continuidade na organização do espaço gráfico. É recorrente que as pinturas posteriores se distribuam pelo espaço graficamente definido pelas pinturas iniciais dos suportes (Figura 11).
Reprodução parcial do Painel IIIb da Lapa dos Desenhos (Vale do Peruaçu, Itacarambi, Minas Gerais). Os quadros apresentam os dois primeiros momentos de composição propostos. Observe como o segundo momento (quadro inferior) pinta temas semelhantes aos anteriores e os coloca em proximidade imediata, sobretudo nas margens do painel. Consolidação do documento-base e análises: Luiz Fernando Miranda e A. Isnardis; composição da figura: A. Isnardis (2022).
O desenvolvimento das pesquisas em Diamantina me levou a retomar os casos de relações entre grafismos no extremo norte de Minas Gerais e, em interação com colaboradoras, revê-los ou propor-lhes novos entendimentos (sobretudo em Linke et al., 2020); desdobramentos podem ser vistos também em Chanoca (2017). Nessa direção, comportamentos já observados e descritos podem ser agora tratados com mais ênfase e sob outra perspectiva teórica.
OUTRAS POSSIBILIDADES DE ENTENDIMENTO DAS RELAÇÕES (E DO LUGAR DESTAS NA PRÁTICA DE PINTAR/GRAVAR)
É possível pensar nas práticas de interação entre figuras (e de composição de painéis) de outras maneiras que não sejam somente a interpretação de que há continuidades e/ou descontinuidades culturais ao longo dos momentos de ocupação dos painéis e sítios.
As análises da Lapa do Caboclo de Diamantina conduzidas na pesquisa de Raíssa Baldoni (Baldoni, 2016; Linke et al., 2020) deixaram claro que havia uma prática de realizar sobreposições no que nossas ferramentas analíticas mostravam como um só ‘momento’ de pinturas. Nesse sítio, a caracterização macroscópica das tintas e o exame dos casos de sobreposição indicavam que havia tintas diferentes que se sobrepunham mutuamente. Portanto, compor pinturas sobre outras pinturas é algo que opera sincronicamente, mesmo se considerarmos a composição dos painéis como um processo histórico e cumulativo. Nos estudos de Magalhães (2021), na Lapa do Boi, também em Diamantina, o mesmo fenômeno se tornou evidente, mas em outra magnitude: nada menos do que sete diferentes tintas se sobrepõem mutuamente, formando um grande bloco de composição sincrônica12. Com o trabalho de Baldoni (2016), nossa expectativa de sempre encontrar um arranjo diacrônico linear entre eventos de pintura foi seriamente abalada. O trabalho de Magalhães (2021) amplificou o abalo. Ambas nos deram argumentos arqueológicos fortes de que, embora permaneçam evidências de uma diacronia na composição dos painéis, a prática de sobrepor pinturas, nessa região, também opera internamente ao que definiríamos como um momento de construção dos painéis, também opera sincronicamente.
Mas é possível pôr em cheque a diacronia – ou desapegar-se analiticamente dela, aproveitando seu abalo – de outro modo.
No momento que uma autora se coloca diante de um painel já pintado e vai realizar nele novas pinturas, temos uma relação sincrônica, uma relação no presente (nesse momento de realização de figuras novas). A organização das práticas de pintar em uma sequência diacrônica é um modo possível (e analiticamente produtivo) de organizar a complexa composição dos painéis. Mas podemos pensar de outro modo. Se estamos percebendo que há uma interação forte entre alguém que pinta (e o que esse alguém está pintando) e o que já está pintado, estamos falando de uma relação sincrônica. Quem pinta não está se relacionando com figuras no passado, está sim se relacionando com figuras que estão presentes (no seu presente), diante dessa pessoa pintora. É sim possível que quem compõe novos grafismos sobre uma parede já pintada pense que aquelas figuras tenham sido feitas no passado, que sejam obra de seres (ou seres em si mesmos) humanos ou não humanos do passado. Mas essa é apenas uma possibilidade13. Nada nos autoriza a projetar nossa compreensão de um tempo linear (ao longo do qual cremos que a parede tenha sido pintada) no entendimento e na prática da pessoa pintora14. Em termos analíticos, se estou descrevendo uma relação (entre quem pinta [e suas pinturas] e o que está pintado), trata-se de uma relação no presente desse ato de pintar a parede. Desloca-se desse modo, analiticamente, a prática de estabelecer relações entre pinturas da diacronia para a sincronia.
Assim, tiramos de seu (nosso) conforto nossa noção de tempo linear e, mais ainda, nosso entendimento de que pinturas sob outras pinturas sejam grafismos de um tempo mais antigo do que aquele das pinturas que estão sobre elas.
Creio que será útil agregar mais alguns exemplos, antes de prosseguirmos nesta exploração.
Na Lapa dos Desenhos, no Peruaçu (no mesmo painel usado como exemplo anteriormente), temos uma figura em bicromia (base branca com contorno vermelho) que, ao ser elaborada, foi encaixada no espaço vazio disponível na parede (Figura 12).
Porção central superior do Painel IIIb da Lapa dos Desenhos (Vale do Peruaçu, Itacarambi, Minas Gerais). Os quadros apresentam os dois últimos momentos de composição propostos. A figura em bicromia branca e vermelha coloca-se no espaço não pintado disponível na parede. Acima dos longos traços verticais em vermelho e amarelo (à esquerda no quadro), também há encaixe de novas figuras no espaço disponível. Foto: A. Isnardis (2015); consolidação do documento-base e análises: Luiz Fernando Miranda e A. Isnardis; composição da figura: A. Isnardis (2022).
A ocupação do espaço vazio pela nova figura branca e vermelha é um caso poderoso para se argumentar em favor da ideia de que se relacionar tem centralidade na prática de pintura. O que se observa ali? Não é apenas um aproveitamento trivial do espaço. Observe bem: a forma da nova figura é definida pelo espaço disponível. Ela não se sobrepõe às demais, a não ser muito marginalmente – o bastante para constatarmos sua sequência de execução. Considerando que ela foi inicialmente pintada em branco para, em seguida, os traços brancos serem contornados, as sobreposições que se pode observar são somente pelas bordas dos traços vermelhos e são bastante marginais às figuras vizinhas15. Esse zelo pela não sobreposição e o fato de a forma final da figura corresponder ao espaço não pintado indicam que a forma se definiu para a adequação da figura ao espaço. No que essa figura consiste? Não há outra igual em todo vale (ao menos entre os mais de 20 sítios que tiveram seus grafismos levantados, o que excede um total de 15.000 figuras); a forma é sui generis. Há diversas figuras semelhantes, nenhuma, porém, com esse mesmo arranjo de traços e contornos finais. Algumas dessas formas semelhantes estão na Figura 13.
Combinações de figuras antropomorfas e ‘losangulares’ (ou ‘redes’), assinaladas pelas elipses tracejadas, em diversos sítios do Vale do Peruaçu: A) Lapa dos Desenhos; B) Lapa do Tikão; C) Lapa de Rezar; D) Lapa da Hora. Composição: A. Isnardis, a partir do acervo do MHNJB, 2022; foto: A. Isnardis (2018).
Portanto, a composição branca e vermelha não parece se tratar de uma figura cuja forma já era definida e que, coincidentemente, se encaixava no espaço disponível ou que tivesse sido ligeiramente adaptada para caber ali. Creio que, com os elementos que nos são observáveis, podemos dizer que a forma se define para que o modo de relação se estabeleça; a forma se define para que a figura esteja ali, ou mais, para que a figura seja ali justaposta às outras, no meio daquela profusão de formas e cores. Relacionar-se é de tal maneira relevante que a forma da figura se define na relação. Vale destacar que a esmagadora maioria dos estudos de grafismos rupestres praticados parte da forma final da figura para análise16.
Com este esse último caso, proponho: pintar é uma forma de relação.
EM BUSCA DE REPERTÓRIOS TEÓRICOS PARA PINTURAS E PESSOAS EM RELAÇÃO
Em Linke et al. (2020), qualificamos como ‘dialógica’ a prática da composição dos painéis, tendo em vista os conjuntos gráficos de Diamantina, em lugar de ‘diacrônica’, como vínhamos fazendo até então.
Estas situações indicam-nos que as relações mais do que diacrônicas, ou sincrônicas, podem ser entendidas enquanto dialógicas, uma vez que o modo de construção dos grafismos e do painel parece exprimir relações que se estabelecem nos suportes, nos grafismos e através deles
(Linke et al., 2020, p. 14).
Essa ideia da dialogia é poderosa e inteiramente convergente com os argumentos básicos aqui apresentados. Quero, contudo, em relação a essa proposição de entendimento, produzir um certo deslocamento, enfatizando a relação como elemento constitutivo e acionando outros referentes para seu entendimento.
Para apoiar a ideia de pintar como forma de relação, aproximemo-nos de certos conteúdos propostos pela bibliografia etnológica a respeito dos modos ameríndios de pensamento.
Entre os aspectos destacados por um ampla produção etnológica que tem as comunidades ameríndias como tema, seja em esforços de síntese, seja em etnografias, está a natureza intensamente relacional das cosmologias indígenas – o que se observa inclusive entre autoras(es) de orientações teóricas um pouco diversas. Esse destaque pode ser encontrado tanto nas sínteses proponentes do perspectivismo ameríndio (Viveiros de Castro, 2002a; Lima, 1996, 2005) e nas etnografias de pesquisadoras(os) ligadas(os) a essa construção teórica (Vilaça, 1992; Lima, 2005; Fausto, 2001; Teixeira-Pinto, 1997; Viveiros de Castro, 1986, 2002b), quanto em sínteses de outras tendências (Descola, 2005; Gallois, 2005) e em outras produções etnográficas (Overing, 1991; Lea, 2012; Novaes, 2006; Descola, 2006; Kopenawa & Albert, 2015).
Diversas(os) autoras(es) destacam que o mundo nas filosofias ameríndias é pleno de seres ativos, com os quais as pessoas travam relações. As relações que se estabelecem entre pessoas e animais, entre pessoas e plantas, entre pessoas e seres sobrenaturais são sociomorfas, ou seja, têm o mesmo caráter das relações entre humanos. A predação, a afinidade, a consanguinidade se veem desdobradas nas relações com os animais caçados, com os inimigos, com as plantas cultivadas, com seres sobrenaturais (Viveiros de Castro, 2002a; Vilaça, 1992; Lima, 2005; Teixeira-Pinto, 1997; Descola, 2006; Fausto, 2001; Barcelos Neto, 2008). Fenômeno recorrentemente presente nas etnografias e explicitamente destacado nas sínteses (Viveiros de Castro, 2002a; Descola, 2005), os animais edíveis são postos numa forma relacional de semelhante natureza que os afins humanos, sendo outros, portanto, mas sendo potencialmente conversíveis em integrantes diretos da pessoa, pela aliança ou pela predação. O inimigo é predado e devorado, sendo consumido de modo a se integrar ao seu predador/matador (Viveiros de Castro, 2002a; Fausto, 2001; Vilaça, 1992). As plantas domesticadas se integram a uma trama relacional muito estreita, na qual podem agir sobre as pessoas que delas cuidam, sobre suas crianças, num renovar contínuo de relações de compromisso, não isentas de riscos (Descola, 2005, 2006; Viveiros de Castro, 2002a), algumas vezes envolvendo mesmo consanguinidade (Descola, 2006).
O mesmo ou equivalente destaque à intensa relacionalidade das cosmologias é visível também na produção etnológica interessada na discussão das artes/artesanatos e tecnologias de fabricação ameríndias (Lagrou, 2007, 2009; van Velthem, 2003; Barcelos Neto, 2008; Velden, 2011; Rodrigues, 2022). A relacionalidade se expressa de forma vigorosa nos fazeres, nas tecnologias e habilidades humanas, tanto nos cantos e cerimônias, quanto na produção de pinturas, cestaria, cerâmica ou no cultivo das plantas. As tecnologias e habilidades, via de regra, não são invenção humana, produto do gênio humano per se, que domina e transforma. Recorrentemente, além de envolverem relações de ensino e aprendizagem entre adultas(os) e jovens, as tecnologias e habilidades advêm de conhecimentos e capacidades recebidas de, aprendidas com ou tomadas/roubadas de seres sobrenaturais e de animais especialmente potentes (Barcelos Neto, 2008; Lagrou, 2007; van Velthem, 2003; Tugny, 2011; Descola, 2006; Fausto, 2001; McCallum, 1996; Souza, 2001).
Essa relacionalidade intensa se percebe e se efetiva na construção da pessoa, que só é possível em relação com (ou através das relações de) outras pessoas. Os corpos das pessoas são ativamente fabricados. A construção da pessoa é continuada e se atualiza constantemente na interação estreita com seus consanguíneos, com seus afins, suas presas e, também, com seus inimigos (Seeger et al., 1979; Seeger, 1980, 2015; Viveiros de Castro, 2002a, 2002b; Lima, 2005; Fausto, 2001; Stutzman, 2012; van Velthem, 2003; Souza, 2001).
Os seres com os quais as pessoas se relacionam na produção de si e nos seus fazeres são seres de séries muitas vezes não humanas (animais, plantas, seres sobrenaturais), que são plenamente ativos, atuam no mundo e sobre os outros seres conforme seus desejos, seus atributos, sua corporalidade própria e suas potências peculiaridades, porém compartilhando com os humanos a capacidade de entender a si e ao mundo (à sua maneira) e a plena capacidade agentiva. Algumas(ns) autoras(es) acrescentam a esses atributos (ou dão articulação a eles por meio da ideia de) que tais seres têm perspectiva e personitude (Viveiros de Castro, 2002a; Lima, 2005; Lagrou, 2007; Vilaça, 1992). Outras(os) autoras(es) não propõem que se trate de perspectivas, mas sim da atribuição de características humanas fundamentais a esses seres outros (Descola, 2005, 2006). Para além das diferenças de ênfase e síntese teórica, parece haver uma forte convergência em reconhecer nos outros seres do mundo uma condição ontológica da qual a capacidade agentiva é constituinte relevante, que se funda em uma natureza de gente, de pessoa, que é interna aos diferentes corpos. E entre esses seres estão artefatos. Nas cosmologias das gentes ameríndias não há uma descontinuidade ontológica entre seres humanos, animais (ao menos alguns deles), plantas (ao menos algumas delas), seres sobrenaturais (todos eles) e artefatos (ao menos alguns deles). Nos termos de Viveiros de Castro (2002a), as diferenças entre essas séries de seres são sobretudo de grau, e não de natureza. Junto ao compartilhamento de uma “essência antropomorfa de tipo espiritual” (Viveiros de Castro, 2002a, p. 273) entre os seres diversos, diversas corporalidades externas se constituem, corporalidades essas cruciais para as especificidades do agir no mundo de cada ser (Vilaça, 1992; Viveiros de Castro, 2002a).
Outra dimensão informada pela Etnologia – que também vem sendo objeto de ampla discussão e demonstração em outros campos das ciências humanas – é a inadequação da ideia de representação para máscaras, pinturas e composições gráficas na cestaria, nos tecidos, na cerâmica, nas peles das pessoas. Quando máscaras de uso ritual são compostas, elas se constituem como manifestações corpóreas de seres sobrenaturais. E isso pode ser observado em contextos ameríndios bem diversos – como entre os Wauja alto-xinguanos, de língua da família Arawak (Barcelos Neto, 2008), entre os Ramkokamekrá (Canela), de língua da família Jê (Paes, 2004), entre os Wayana, de língua da família Karib (van Velthem, 2003). As máscaras não são representações desses seres. Tanto não são que, após os rituais, esses corpos precisam ter destinos específicos que os tirem do convívio das pessoas ou os destruam (matem), para que sua capacidade de agir saia de cena ou se encerre. Se assim não for, esses seres, com esses seus corpos, podem ter efeitos deletérios sobre a comunidade, ou seja, sua capacidade de agir claramente não reside na animação que as pessoas que os vestem ou manuseiam lhes conferem durante os rituais. Assim, tais diversas máscaras são formas corporais dos seres sobrenaturais, são esses seres, e não representações deles. A ideia de representação implica necessariamente a ausência do representado. E esse, seguramente, não é o caso nos contextos ameríndios.
O mesmo pode ser dito para as pinturas corporais, que não estão nas peles das pessoas representando ninguém, mas sim agindo sobre as pessoas, instituindo uma condição corpórea e espiritual específica, adequada a certo contexto da vida social (ou seja, das relações entre as pessoas da comunidade) ou das relações (também de caráter social, em sentido ampliado) entre as pessoas humanas e seres não humanos. De novo, essa é uma noção que se vê presente nas sínteses etnológicas, senão nas gerais, ao menos naquelas direcionadas ao exame das artes e construções materiais indígenas (Lagrou, 2007, 2009; Severi & Lagrou, 2013) e em etnografias de povos de diversas filiações linguísticas e amplíssima distribuição geográfica, como os Huni Kuin (Kaxinawá) (Lagrou, 2007), os Wauja (Barcelos Neto, 2008), os Mebengokre (nos casos dos Xikrin, reinterpretando-se Vidal, 1992, à luz das novas construções teóricas), e os Mekragnoti (Lagrou, 2009; Verswuijver, 1992, 1996), os Asurini (Müller, 1992) e os Wayana (van Velthem, 2003).
Há uma potente produção teórica e de pesquisa antropológica contemporânea, fora de contextos especificamente ameríndios, explorando a ideia de que seres não humanos são participantes ativos no mundo de relações em que os humanos se inserem. Uma parte importante dessa produção se articula a partir de proposições de Bruno Latour (e de sua teoria do ator-rede e de outras de suas proposições que a precederam) (Latour, 1994, 2001, 2007). Os esforços analíticos de Latour não se direcionam propriamente a sociedades indígenas, pelo contrário, focam-se na sociedade industrial dita ‘moderna’, quando não na própria ciência ocidental, para pôr em relevo a efetividade da agência dos seres não humanos em plena integração de nossa trama de relações sociais.
Outra linha que tem produzido fértil inspiração, esta se estendendo de forma concreta também à Arqueologia, são as formulações de Alfred Gell sobre arte, nas quais a noção de agência tem lugar central (Gell, 2005, 2018). Propondo-se a construir uma Antropologia da Arte, que, conforme sua avaliação, era efetivamente inexistente até então, Gell (2018) vai centrar atenção na capacidade de agir e influenciar as condutas humanas para a definição mesma dos objetos de arte (Benassi, 2020). Abre-se aí um leque potente de compreensão da capacidade dos artefatos de agir nas relações e de influenciar condutas.
A Arqueologia veio construindo um caminho próprio (já longo) de discussão de agência dos ‘artefatos’, sem que estivessem nas linhas antropológicas acima suas bases, como em Hodder (1982, 2012), em Webmoor (2007) e em Olsen (2010). Uma produção contemporânea da Arqueologia brasileira tem desenvolvido análises com uma influência forte de Gell, sobre um terreno de receptividade à ideia da agência de artefatos já criados na disciplina (Barreto, 2009; Barreto & Erêndira Oliveira, 2016; Erêndira Oliveira, 2016, 2020; E. Silva, 2017).
Na produção etnológica, pode-se perceber sem dificuldade que as teorias ameríndias não só admitem como também enfatizam a capacidade agentiva de seres não humanos, entre eles podendo se ver com nitidez alguns artefatos (Barcelos Neto, 2008; Seeger, 2015; Santos-Granero, 2012; Velden, 2011; van Velthem, 2003; Lagrou, 2007, 2009; Lolli, 2010). Na teoria antropológica de pretensões mais amplas, não articulada a contextos ameríndios, a capacidade agentiva de não humanos é tratada como analiticamente construtiva e necessária, considerando-se esse espectro amplo de atores para o entendimento da vida social. Um intenso debate se trava sobre a adequação dessa noção de agência, sobre sua natureza e seu grau, assim como a respeito da intencionalidade que a acompanharia ou não (Tim Ingold em discussão com Latour – Ingold, 2000, 2008; e na obra de Alfred Gell – Gell, 2018; Benassi, 2020). Através da produção etnológica, pode-se perceber que, nas filosofias ameríndias, as dúvidas dos teóricos da Antropologia parecem não se aplicar. No assim chamado ‘pensamento ameríndio’ e nas experiências descritas nas etnografias, a capacidade agentiva de não humanos é muito clara. E ela se realiza num conjunto de princípios que atribui não só agência, mas também intencionalidade aos não humanos diversos, incluindo artefatos.
Nas cosmologias ameríndias, a potência dos demais seres do mundo estabelece e incita condutas e procederes de primeira relevância dos humanos. Não se trata apenas de gerir com precaução as agências dos outros seres, mas sim de buscá-las. Se as relações com esses atores diversos podem implicar riscos muito concretos para os humanos, elas são, ao mesmo tempo, objeto de intenso interesse, sendo sistematicamente buscadas, pois estar em relação com outros é crucial para realizações fundamentais da vida e para a constituição mesma da pessoa humana (Descola, 2006; Viveiros de Castro, 2002b; Lagrou, 2007; Fausto, 2001; Lima, 2005). As potências dos seres não humanos são desejadas e obtidas por modos diversos de relações.
Uma produção crescente em Arqueologia tem construído caminhos na interlocução com a Etnologia, caminhos esses que têm rumos um tanto diversos. Nos trabalhos em que há uma expressiva interlocução com Alfred Gell17, faz-se uma aproximação de conteúdos propostos pela Etnologia, notadamente em contextos amazônicos, para explorar possibilidades interpretativas de contextos arqueológicos pré-coloniais do Holoceno superior, em que a conexão histórica entre tais contextos e as populações indígenas amazônicas contemporâneas é acionada (Barreto, 2009; Barreto & Erêndira Oliveira, 2016; Erêndira Oliveira, 2016; Gomes, 2012). Num sentido algo diferente, Benjamin Alberti tem proposto a interlocução com a noção de perspectivismo ameríndio para a interpretação de contextos arqueológicos outros (Alberti, 2014, 2016; Alberti & Marshall, 2009). Outras tentativas de conexão com o perspectivismo e a interpretação de contextos arqueológicos foram e estão sendo construídas (Gomes, 2012; Polo, 2019, 2023).
Nesse cenário, Cabral (2020, 2022) tem explicitado o recurso ao pensamento ameríndio como teoria, avançando substantivamente no deslocamento em relação a um ponto crucial, ao qual muitas(os) autoras(es) parecem-me se manter apegadas(os). Em muitos trabalhos, percebe-se que a aproximação com os elementos das filosofias indígenas se faz como sendo eles ‘representações’, ‘ideologias’ ou ‘percepções’ sobre uma realidade (um ‘como se fosse’), o que faz com que a realidade por si mesma permaneça ‘objetiva’ (em consonância com a tradição filosófica europeia), externa a quaisquer entendimentos que dela se possa ter. Convirjo com a perspectiva de Cabral de se aproximar das cosmologias ameríndias como teoria. E concordo que essa aproximação deve implicar outros modos de entender – e modos de analisar – o que os seres são efetivamente, como as teorias indígenas nos colocam; e não de tratá-los ‘como se eles fossem’.
Numa avaliação bem sucinta dessa bibliografia, é possível destacar que algumas(uns) das(os) referidas(os) autoras(es) se aproximam de aspectos distintos da produção antropológica ou, mais especificamente, etnológica. Sem dúvida, agência dos artefatos é uma das pautas cruciais – que centralmente interessa a nossa discussão sobre grafismos rupestres. Essa é a dimensão mais evidente em Barreto e Erêndira Oliveira (2016), assim como em Erêndira Oliveira (2016, 2020), que denota uma perspectiva específica sobre a natureza dessa agência, a partir da referência teórica de Gell e de fontes etnológicas (especialmente Lagrou). Outra dimensão explorada contemporaneamente é o emprego da ideia de que o perspectivismo seria marca premente da lógica de pensamento ameríndia, o que alimenta tentativas de compreensão de formas compósitas antropozoomorfas; conexa a ela, segue a ideia da natureza transitiva das formas dos seres, que inspira esforços interpretativos da iconografia – como em Gomes (2012) e em Polo (2019, 2023), cada qual a um modo. Mas, por vezes, não se produz um deslocamento efetivo da base ontológica dita ‘ocidental’, pois se segue operando na matriz representacional e nas mesmas expectativas de conexão entre formas cerâmicas (ou líticas ou gráficas) e formas corporais dos seres (animais, humanos, seres sobrenaturais) que são típicas do modo ocidental moderno de estabelecer tais conexões.
A discussão direta com a proposta de Severi e Lagrou (2013) sobre a natureza quimérica das figurações ameríndias foi também objeto de aproximação por certas(os) autoras(es) (Barreto & Erêndira Oliveira, 2016; Polo, 2019)18. Outro aspecto de algumas abordagens que buscam interlocução com a Etnologia é a própria superação da dimensão representacional das figurações, proposta em Alberti (2016) e em Polo (2019, 2023). Dimensões como a corporeidade (ou ‘corporalidade’, conforme a[o] autora[or]) e a compreensão das formas e constituição dos corpos também figuram nas discussões (Isnardis & Linke, 2021; Barreto, 2009; Barreto & Erêndira Oliveira, 2016; Polo, 2019; Cabral, 2020), sendo especialmente valiosas para o enfrentamento de temas já há muito pautados pela Arqueologia, como a natureza corpórea dos recipientes cerâmicos e a articulação entre corpos cerâmicos, corpos humanos e corpos cerâmicos antropomorfos.
Raoni Valle, em interlocução com pesquisadores indígenas Tuyuka e Munduruku, tem mergulhado nos recursos interpretativos das teorias indígenas para entender a diversidade, a distribuição e a forma de engajamento das pessoas contemporâneas com os grafismos rupestres em certas áreas amazônicas (especialmente no rio Negro)19. As produções dessa colaboração realizam um efetivo deslocamento do lugar usualmente conferido aos grafismos e às relações entre eles e as pessoas (Valle, 2012; Valle et al., 2018). Colocam pessoas e gravuras em relações efetivas, em que elas se afetam mutuamente. Esse encontro de saberes é muito potente e original, sem equivalente no cenário das pesquisas sobre arte rupestre no Brasil.
Uma investigação mais aprofundada dessas trilhas abertas é de grande interesse para a discussão aqui proposta, entendendo que tais esforços, em diferentes medidas, põem em evidência possibilidades, dificuldades e, já, resultados efetivos dessa interlocução. Ela excede, porém, os limites viáveis neste artigo. Gostaria, contudo, de destacar, diante dessa bibliografia, que um dos pontos centrais aqui pautados é a investigação das formas de relação entre os seres, visando a compreensão dos elementos arqueológicos em relação uns com os outros, o que nem sempre está em pauta na referida produção arqueológica. Trata-se do mesmo esforço interpretativo que se pode encontrar nas análises de Cabral (2020), com resultados muito consistentes e estimulantes sobre contextos funerários do litoral norte do Amapá. A ênfase interpretativa, ali, como pretendo aqui, envolve as relações entre os elementos arqueológicos, valendo-se de princípios do pensamento ameríndio.
A escolha que aqui faço por privilegiar como repertório teórico os princípios do pensamento ameríndio, tais como nos são dados a conhecer por meio da Etnologia (e também pela Arqueologia em interlocução com sociedades ameríndias), faço por motivos de diferentes ordens. Em primeiro lugar, por sua potência transformadora de nossas práticas analíticas usuais, considerando sua originalidade e sua radical independência epistemológica, na origem, em relação à tradição filosófica eurocêntrica (independência epistemológica essa que, invariavelmente, nos chega mediada pelas análises etnológicas e pelas experiências de arqueólogas(os) em interlocução com comunidades indígenas e, portanto, permeada de um esforço de compreensão e tradução de raízes eurocêntricas; hemos de dormir com esse barulho). Em segundo lugar, pelo fato de os contextos ameríndios serem ameríndios e, assim, se colocarem num lugar muito especial em relação às práticas das pessoas pintoras das paredes rochosas que estão aqui em pauta. Conexões históricas, ao menos em escala ampla, entre as pessoas que realizaram o que chamamos de grafismos rupestres e os povos ameríndios contemporâneos são tão óbvias quanto pouco exploradas. Colocar em diálogo as práticas pretéritas de pintar paredes e as filosofias indígenas que nos são dadas a conhecer no presente é um esforço que pode ajudar a superar a desmesurada ruptura que a prática arqueológica no Brasil, em especial no Sudeste, no Centro-Oeste e no Nordeste do Brasil, estabeleceu entre os contextos a que chamou de ‘pré-históricos’ e os contextos indígenas contemporâneos (Bueno, 2019; Isnardis, 2019; Reis & Cabral, 2019). É também uma possibilidade de discutir uma história profunda que conecte os contextos arqueológicos que encontramos nas paredes rochosas às comunidades indígenas contemporâneas.
Buscar repertórios analíticos de matriz filosófica não europeia pode, em si, permitir que sejamos mais criativos. E nos exige mais autoconsciência (Alberti & Marshall, 2009). Se essa matriz é regional (macrorregional, no caso), mais potência devem ganhar suas possibilidades analíticas. E, mesmo se não houvesse uma continuidade filosófica forte entre as pessoas pintoras de muitos séculos ou alguns milênios atrás e as gentes ameríndias contemporâneas, isso não diminuiria o valor e a potência de usarmos princípios filosóficos e ontológicos ameríndios como teoria. Afinal, como amplamente se vem questionando na América do Sul (Haber, 2006, 2012; Gnecco, 2002, 2009, 2010; Hartemann, 2019; Reis & Cabral, 2019; Cabral, 2020), por que somente teorias de matriz eurocentrada deveriam ter espaço na construção arqueológica?
Não é necessário que se sustente a continuidade histórica direta entre os contextos produtores das pinturas rupestres, nas serras e sertões de que trato aqui, e os contextos ameríndios contemporâneos para o esforço de interlocução (ou de manejo teórico) a que me proponho. Contudo, a própria questão da continuidade ou da possibilidade de uma história profunda (Cabral, 2020; Bueno, 2019; Machado, 2017; F. Silva, 2013; Barreto & Erêndira Oliveira, 2016; Barreto, 2009) pode ser explorada nesta proposta de investigação teórica e empírica de grafismos rupestres, questão à qual retornarei adiante. Creio que estejamos num cenário cultural e político em que isso se reveste de especial relevância e pertinência. Acredito também que esse esforço pode se aproximar das discussões de outros contextos, em que pesem diferenças de natureza entre os esforços, junto a um movimento multifacetado de interlocução entre as(os) arqueólogas(os) e os conhecimentos indígenas, que nos têm dado frutos muito saborosos e nos têm permitido (exigido, na verdade) nos deslocarmos de nosso lugar tradicional de fala (Wai Wai, 2017, 2022; Cabral, 2014, 2016a, 2020, 2022; Machado, 2017, 2021; Machado et al., 2020; F. Silva, 2013; Valle, 2012; Valle et al., 2018; Haber, 2006, 2012; Reis & Cabral, 2019; Hartemann, 2019; Hartemann & Moraes, 2018; Moraes, 2021).
Um ponto a ser seriamente considerado a respeito dos princípios cosmológicos ameríndios, tanto para se pensar em sua potência e uso como referência teórica, quanto para se pensar na aplicabilidade desses conceitos a contextos ameríndios de expressiva profundidade cronológica (que abordamos arqueologicamente), é a ampla dispersão geográfica das manifestações desses princípios. Parece-me insustentável a ideia de que povos do alto rio Madeira e do Cerrado de Minas Gerais, do litoral catarinense e da região das Guianas compartilhem certos princípios sem que eles se fundem numa rede complexa de interações e numa grande profundidade cronológica de interações. Parece-me fora de questão que tal compartilhamento possa ser produto do contexto colonial (inclusive porque lhe foi e é contraponto), tampouco da expansão da sociedade nacional no século XX e de seus impactos sobre as comunidades ameríndias dessas tantas e distantes áreas. Esse compartilhamento não resulta em uma homogeneidade no modo como tais princípios se realizam nas diferentes coletividades ameríndias. Antes pelo contrário, é marcado por atualizações ou expressões específicas exuberantemente diversas, ainda que substantivamente coerentes. Esse compartilhar em tão ampla escala geográfica aponta claramente para uma grande escala cronológica, que parece envolver concepções que se conectam numa história profunda, atualizando-se e desdobrando-se em múltiplas formulações contextuais específicas.
VOLTANDO ÀS PAREDES
Voltando às paredes pintadas do Vale do Peruaçu, vejamos mais elementos bastante veementes que dão destaque às interações. A Figura 14 mostra repinturas parciais e o acréscimo de contornos, na Lapa de Rezar. A Figura 15 apresenta associações por proximidade direta e justaposições de figuras semelhantes na Lapa do Piolho de Urubu. A Figura 16 mostra como o espaço gráfico se mantém e se adensa, enquanto se compõem novas pinturas, na Lapa dos Desenhos. A Figura 17 mostra a incorporação de elementos precedentes por novas composições, na Lapa dos Bichos. A Figura 18 apresenta a repetição de repertórios anteriores por composições em novo estilo, na Lapa de Rezar. A Figura 19, por fim, mostra a definição de formas para se adequarem à justaposição de figuras, na Lapa do Caboclo.
No Painel II da Lapa de Rezar (Vale do Peruaçu, Itacarambi, Minas Gerais), a figura bicrômica amarela + preta (A), assinalada pelo retângulo escuro, na foto de cima, à esquerda, recebe um contorno em tinta branca (B), indicado no detalhe ampliado e editado da imagem, à esquerda e embaixo. No mesmo painel, na foto inferior direita, uma figura (C) é parcialmente repintada; e essa repintura parcial integra uma nova figura (D), muito semelhante à anterior; o detalhe ampliado, acima e à direita, mostra a área de sobreposição entre as tintas. Fotos e composição: A. Isnardis (2018/2022).
Painel IIb da Lapa do Piolho de Urubu (Vale do Peruaçu, Januária, Minas Gerais). O quadro superior mostra os momentos iniciais de composição; o inferior combina os iniciais e os intermediários. Observe a afinidade entre as novas figuras e aquelas que as precedem: antropomorfos se agrupam na área central inferior e na borda esquerda do painel, onde havia formas similares; enquanto as formas geometrizadas compostas de linhas, bi ou tricrômicas, se concentram onde já havia figuras afins, ao centro e à direita. Composição: A. Isnardis (2022), feita a partir do acervo do MHNJB.
No Painel IIb da Lapa dos Desenhos (Vale do Peruaçu, Itacarambi, Minas Gerais), vê-se que a organização do espaço gráfico definida pelos momentos iniciais de pintura (quadro 1) é mantida pelas pessoas autoras das figuras dos momentos posteriores (quadro 2). As novas figuras são colocadas somente entre as precedentes ou logo ao lado delas, sendo que havia muito suporte igualmente regular, disponível em todas as direções. Consolidação do documento-base e composição: A. Isnardis (2022).
No Painel I da Lapa dos Bichos (Vale do Peruaçu, Januária, Minas Gerais), uma figura quadrangular alongada (B) e um conjunto de bastonetes (A), compostos entre os momentos iniciais de ocupação do suporte – quadro à esquerda –, são incorporados na composição de uma figura tricrômica (C) – quadro à direita. Consolidação do documento-base e composição: A. Isnardis (2022).
No Painel II da Lapa de Rezar (Vale do Peruaçu, Itacarambi, Minas Gerais), as figuras assinaladas pela elipse (D) parecem replicar as figuras assinaladas pela elipse (B), que as precedem. O mesmo parece ocorrer com a figura na elipse (C), em relação à elipse (A), sendo que, entre essas a diferença de estilo é mais visível. Registre-se ainda que as figuras das elipses (D) e (C) parecem compostas com a mesma tinta (considerando-se sua cor, textura, espessura, grau de homogeneidade). Foto e composição: A. Isnardis (2018/2022).
No Painel III da Lapa do Caboclo (Vale do Peruaçu, Januária, Minas Gerais), as figuras (A) e (B) dos momentos iniciais, no quadro da esquerda, agem respectivamente na composição das figuras (C) e (D), no quadro da direita, participando da definição de suas posições e formas. Consolidação do documento-base: Mara Chanoca e A. Isnardis; composição da figura: A. Isnardis (2022).
Todo esse leque de comportamentos – de comportamentos das pessoas pintoras em relação às pinturas presentes nas paredes, quando elas se põem a aplicar novas tintas – traz a intenção de estabelecer relações para o centro da prática de pintura.
Se tomamos a ideia da relacionalidade como constituinte básico na construção das pessoas humanas (e demais seres), essa nos permite dar sentido a diversos elementos que encontramos nos grafismos rupestres, tanto do Peruaçu quanto de Diamantina. A ênfase recai, no alcance deste artigo, na primeira região, mas as interpretações feitas aqui podem-se aplicar, em grande medida, também à segunda. Uma pessoa pintora que compõe seus grafismos incorporando elementos gráficos de pinturas que já estão na parede (como se pode ver na Figura 17), a está constituindo por meio da interação direta com o Outro (no caso a outra pintura ou gravura). O mesmo se pode dizer quanto à repintura parcial e aos contornos adicionados a pinturas pré-existentes – como nos casos que se veem na Figura 14. E diferente não é quando a pessoa pintora incorpora em seu repertório figuras semelhantes ou faz reproduções de grafismos já pintados, mantendo, porém, atributos estilísticos que, somados às sobreposições e às características das tintas, nos permitem perceber as diferenças entre os elementos em relação – como se vê na Figura 18.
Pintar, tal como a Etnologia indica claramente para muitas práticas de fabricações indígenas (de artefatos, de corpos de bebês, de corpos de pessoas tornando-se adultas, de corpos de seres sobrenaturais), é algo que se faz em relação. Pinturas se constroem em (pelas) relações com outras pinturas. As relações são intensamente buscadas e efetivadas, quando se pinta ou se grava em paredes já grafadas. Se as figuras atuam na definição dos locais a serem pintados, na temática a ser pintada e na forma do que se pinta, a relacionalidade é uma das dimensões que mais fortemente atua na prática de pintar. Assim, a extensa e profunda relacionalidade com não humanos ocorre também entre as pinturas rupestres e novas pinturas rupestres, ou, dito de outro modo, entre as pinturas rupestres e as pessoas que estavam pintando novas figuras.
Se assumimos a noção de agência de artefatos e outros seres não humanos, temos recurso teórico para compreender de modo renovado as intensas relações que se efetivaram nos (e que nos chegam por meio dos) suportes rochosos. Quando uma pessoa pintora está diante da parede pintada e constrói nela figuras, e essa construção envolve destacadamente as pinturas da parede, não se trata de um uso, pelas pessoas, de passivas figuras precedentes. As pinturas agem sobre as pessoas e suas composições (as novas pinturas), definindo parcial ou integralmente os diversos aspectos que as constituem. A composição do painel que se estabelece envolve todos esses atores. E podemos, assim, entender que as pinturas são não só uma categoria de seres com capacidade agentiva, mas com intencionalidade tão nítida para quem pinta, que esta pessoa se engaja na relação conforme elementos, demandas, contingências e possibilidades que as figuras ali presentes lhe colocam.
Valendo-nos dos princípios teóricos de que o mundo é uma arena de relações entre seres potentes diversos, de corporalidades distintas, do princípio de que se relacionar é crucial para as produções humanas – para a constituição mesma dos seres – e do princípio de que seres diversos têm intencionalidade e agência, temos pessoas pintoras que se engajam numa sofisticada trama de interações, onde pessoas e pinturas são agentes que recíproca e relacionalmente se definem. Abdicando da chave da representação como modo de compreender os grafismos, vemos as pinturas e gravuras incitarem e conduzirem condutas das pessoas e de serem – de forma também ativa e recíproca – (re)construídas por elas.
Aparentemente é possível, para os Pakaa Nova, classificar todas as coisas em duas categorias mutuamente exclusivas: wari’ e karawa. Wari’ é o pronome pessoal enfático da primeira pessoa do plural inclusivo e significa “nós”. Wari’ significa, tradicionalmente, “ser humano”, e, portanto, índio Pakaa Nova. Todos os outros índios, como também os “civilizados”, são chamados wijam, “inimigos”, e são classificados como karawa. Karawa pode ser traduzido como “animal”, “caça”, “comida”...
Do ponto de vista de sua definição em compreensão, as categorias wari’ e karawa são mutuamente exclusivas: ou se é wari’ ou se é karawa. Do ponto de vista de sua extensão, entretanto, as coisas são um pouco mais complicadas: seres que sob certos aspectos são karawa, sob outros são wari’ e vice-versa. Em outras palavras, muitos karawa, enquanto animais, só o são fisicamente. Num outro nível são wari’, humanos, e podem passar de presas a predadores, vendo os Pakaa Nova como karawa. . . . Trata-se em suma de uma definição essencialmente relativa, recíproca, destas categorias: wari’ é a posição de sujeito, e esta posição é esquematizada como a de devorador; karawa é a posição de objeto, isto é, arquetipicamente, a posição de presa, de devorado.
(Vilaça, 1992, pp. 49-51, grifos do autor).
Os seres se definem na relação. O contorno branco posto na pintura em amarelo e preto da Figura 14 não é, por si apenas, nada. O mesmo pode ser dito para a pintura ‘C’, em tinta ocre, na Figura 6. Ambas as pinturas só são algo por contornarem a figura amarela e preta, no primeiro caso, ou, no segundo, por se encaixarem nos ‘corpos’ elafomorfos já presentes na parede. Extraídas das paredes, excluídas da relação, não têm sentido (palavra usada aqui como equivalente a ‘destino’, ‘papel’, ‘função’, ‘lugar no mundo’, e não como ‘significado’ em termos linguísticos). A pintura bicrômica ‘D’ da Figura 19 não estaria naquele lugar da parede e não teria a forma que tem se não fosse pela figura ‘B’; o mesmo vale para a figura ‘C’, em relação à figura ‘A’.
A abordagem de base representacional lidaria como com esses fenômenos? Que sentido se poderia dar, a partir dela, ao contorno branco da pintura em preto e amarelo da Figura 14? Se a figura é uma representação, então seu sentido está dado, posto; restaria a operação mental de reconhecer o ser ou o conceito representado – ou dar-lhe um novo sentido, eventualmente diferente daquele que lhes haviam atribuído suas autoras originais. Na chave representacional, bastaria um retoque, caso a representação (a figura) estivesse pendendo visibilidade. Mas definitivamente não é o caso, pois a figura bicrômica é muito claramente visível – enquanto o contorno branco, ele sim, é relativamente discreto. Se a figura fosse um significante de forma estável, referindo-se a um significado, parecem caber as mesmas considerações, bastaria também a operação mental. Não parece haver lugar para uma intervenção que aplica uma tinta branca em torno da figura posta, se não há vontade, necessidade e/ou intenção de relacionar-se ativa, concreta e materialmente com a pintura bicrômica em preto e amarelo.
Dialogar mais profundamente com o estudo das especificidades dos modos de relações entre humanos e outros seres (inclusive outros humanos) em contextos ameríndios etnográficos, assim como avançar na caracterização das especificidades dos modos de relações entre pinturas, poderá nos conduzir a refinar a percepção dos diferentes modos de interação, nas áreas de pesquisa aqui referidas, e, potencialmente, em outras, onde sobreposições e justaposições pareçam operar significativamente na composição dos grafismos e painéis. Esse me parece um caminho promissor. Desde já, sem a exploração mais verticalizada das formas de relação específicas, considerando-as como um todo, creio que a proposta aqui apresentada seja estimulante e apta a nos ajudar a lidar com o exuberante universo de sobreposições, justaposições, repinturas, usos de elementos gráficos, formatações e evitamentos que as paredes do Peruaçu nos oferecem, assim como se constitui numa inflexão significativa do modo de percebermos as pinturas, de percebermos a prática mesma de pintar. Em Diamantina, comportamentos semelhantes aos descritos no Peruaçu, assim como comportamentos diferentes, podem ser observados e têm sido objeto de análise. As paredes pintadas diamantinenses nos provocaram intensamente a pensar sobre relações e foram agentes cruciais na releitura dos elementos que conhecíamos no Peruaçu. Alguns dos trabalhos de nossa equipe estão explorando os casos diamantinenses – Linke et al. (2020), Magalhães (2021), Diniz (2020), Dias (2017), Baldoni (2016), Montovanelli (2022) e os trabalhos em andamento de Baldoni e de Magalhães – e estabelecendo uma base mais robusta de elementos para que possamos avançar nas discussões das especificidades dos intensamente repintados painéis de Diamantina.
Em publicação coletiva recente (Linke et al., 2020), sinalizamos que a relevância dos processos de composição das figuras e dos painéis de diferentes áreas de Minas Gerais, aspecto central daquele artigo, convergia com o fenômeno hoje presente e relevante nas sociedades ameríndias, em que o fazer e o modo de fazer, e não somente seu resultado, ocupam papel de destaque nas produções de artefatos e de seres outros. Indicávamos que essa convergência é sugestiva de uma continuidade entre contextos indígenas antigos e contextos indígenas contemporâneos, “sinalizando positivamente no sentido de que os grafismos rupestres indicariam uma continuidade expressiva, uma história profunda – algo que pode e deve ser objeto de um exame e de uma discussão mais densa” (Linke et al., 2020, p. 23). A constituição de figuras por meio da relação com outras figuras parece-me sinalizar na mesma direção. As características das pinturas rupestres que emergem das análises aqui consideradas apontam no sentido de que, como nas comunidades ameríndias contemporâneas, os desenhos e as pinturas não são representações de seres, não são figurações representativas de seres; e, sobretudo, têm capacidade de agir no mundo. A intensidade e a radicalidade com que as figuras agem sobre as pessoas pintoras e suas pinturas, permitindo que se interprete que a própria relação é interesse e tem papel central na constituição das novas composições, falam de um mundo que é seriamente afim àquele descrito pelas etnografias e sínteses etnológicas sobre as comunidades indígenas contemporâneas. Procurei usar essas noções como recurso teórico, mas me parece que a adequação desse repertório, mais do que se constituir como um recurso teórico externo, indica uma continuidade ontológica e, por que não, cosmopolítica entre as produções ameríndias contemporâneas e aquelas do Holoceno médio e médio-recente. Apesar do risco de produzir uma circularidade de raciocínio, no presente estado desta formulação, parece-me que estamos diante, ao mergulharmos nas pinturas e gravuras e em suas interações, de um fenômeno histórico de longa duração. O fenômeno de constituir-se na relação, tão perceptível nas coletividades indígenas contemporâneas, é também perceptível nas paredes rochosas e suas tintas e cores, que nos chegam hoje, vindas desde, possivelmente, o Holoceno médio. Os fenômenos que procurei apresentar e discutir aqui parecem-me constituir-se num desdobramento do cronologicamente profundo compartilhamento de princípios filosóficos a que me referi anteriormente. O tema pode ser mais explorado e segue demandando mais discussão.
Chegando ao final da trilha deste texto, considero necessário destacar que as interpretações propostas aqui se sustentam não na simples projeção de princípios teóricos ou filosóficos a contextos arqueológicos recém-tomados para discussão. Pelo contrário, trata-se de um esforço, longo e coletivo, de produção de inscrições (no sentido latouriano20; Latour, 2001) e de análises de fartos repertórios de pinturas e gravuras e de suas relações observáveis. E derivam de uma insatisfação com o repertório usual de análise, com o qual nos aproximávamos das pinturas sob as chaves da representação e da diacronia, que se nos mostraram ineficazes para dar sentido aos comportamentos que observamos.
As interpretações propostas aqui são, elas mesmas, resultado de intensas interações entre grafismos e pessoas – no caso, nós, pesquisadoras(es) desses conjuntos de pinturas rupestres. Não posso deixar escapar a conclusão de que a intensidade de relações entre grafismos e pessoas é geradora também desta narrativa que lhes apresento. E, assim como teria sido nos contextos indígenas, essas interações não são experiências individuais isoladas; elas são pessoais sim, mas, justamente por serem pessoais, são relacionais, coletivas; foram construídas no trabalho conjunto, no compartilhamento de ideias, nas discussões entre as pessoas sobre suas percepções e experiências. As experiências de relações envolvem, na maior parte do tempo de nosso trabalho, as inscrições que produzimos das pinturas e gravuras. Estas não foram conosco para o laboratório. O que levamos, ao deixar os sítios, são construções nossas, que julgamos adequadas para falarmos delas. Mas nossas construções também envolvem relações diretas (também elas coletivas e compartilhadas) com os grafismos, nas lapas; relações essas que sempre foram decisivas e centrais em nosso processo de produção de conhecimento21.
Notoriamente melindrosos para se alinharem a cronologias absolutas, os grafismos rupestres nos impõem desafios sérios para estabelecermos conexões entre eles e outros elementos dos contextos arqueológicos. Talvez possamos avançar nessas conexões se investigarmos possibilidades interpretativas sobre o fenômeno do pintar e do gravar, mais do que por fazer presunções de temática e nos agarrarmos aos escassos elementos de datação absoluta. Se, como acontece recorrentemente, a afinidade com contextos não se pode estabelecer por inserção estratigráfica, coerência iconográfica ou obtenção de amostras de datações fartas e confiáveis, talvez a afinidade possa ser reconhecida não com a cronologia das ocupações, mas com um fundo ontológico e cosmológico de longa duração, que avança até as comunidades conhecidas etnograficamente. Em diversos trabalhos, as afinidades entre contextos arqueológicos indígenas pré-coloniais e sociedades indígenas atuais vêm sendo postas em evidência (notadamente a respeito de contextos arqueológicos amazônicos). Como já dito, essa é uma direção que os grafismos que discuto aqui também sugerem.
Por fim, os elementos que apresentei aqui parecem-me apontar que os grafismos não são uma imagem com uma mensagem autônoma, fixa em sua forma; eles não se aproximam de uma escrita, nem de nada vagamente parecido. Se eles interagem do modo como interagem, se eles se conformam ao interagirem, parece inadequado pensar que eles sejam uma transmissão de mensagem com conteúdo fixo relacionado a formas também fixas. Creio que os múltiplos casos demonstrem que as pinturas (e gravuras) podem ser assim: constituídas na relação. Demonstram que elas não precisam ter (e parece improvável que tenham) uma existência prévia à relação; que elas se fazem o que são, na relação. E, assim, as pinturas não são antes de serem pintadas; elas não precisam se atar a um ideal de forma e conteúdo prévio à relação; elas não chegam prontas antes do ato de pintar, mas são constituídas no pintar, pois essa constituição envolve, intensamente, as relações com as outras pinturas.
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1
‘Nós’, aqui, refere-se à equipe do Setor de Arqueologia do Museu de História Natural e Jardim Botânico (MHNJB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que integro. Os trabalhos com grafismos rupestres nas duas regiões têm se desenvolvido através da cooperação com colegas pesquisadoras(es), bem como através de projetos de pesquisa específicos e pesquisas de estudantes de pós-graduação e graduação, que tive e tenho o privilégio de orientar.
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2
Esta proposta se articula diretamente ao projeto de pós-doutorado desenvolvido junto ao Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da Universidade de São Paulo (USP), com supervisão da Profa. Dra. Fabíola Silva, cujo acolhimento e incentivo foram muito importantes para o desenvolvimento do que aqui se propõe.
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3
As datações absolutas de pinturas rupestres são bem escassas. Mas, conforme discutimos em Bueno e Isnardis (2018) e em Bueno et al. (2023), sua mais intensa realização parecer ter-se dado a partir do Holoceno médio. Considerando as referências de cronologia absoluta disponíveis para o Peruaçu e para a Serra do Espinhaço, o Holoceno médio e médio-recente foram palco de parte significativa dos grafismos nas duas regiões. Para outras referências específicas, vide Ribeiro (2006) e Prous e Baeta (1992-1993).
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4
Municípios de Senador Modestino Gonçalves, Felício dos Santos e Itamarandiba.
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5
Um artigo de síntese, na virada do século, que representa bem o esforço é o de Ribeiro e Isnardis (1996-1997).
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6
As primeiras formulações a respeito podem ser encontradas em Ribeiro (1997) e em Ribeiro e Isnardis (1996-1997); a seguir, aparecem reformuladas ou ampliadas em Isnardis (2004) e em Ribeiro (2006), e sintetizadas em Isnardis (2009b).
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7
Os próprios títulos de alguns trabalhos já expressam bem essa perspectiva, onde ‘relações diacrônicas’, ‘períodos’ e ‘sequência’ são expressões recorrentes (Ribeiro & Isnardis, 1996-1997; Isnardis, 2009b, 2004; Ribeiro, 2006).
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8
Uso aqui o termo ‘elafomorfo’ para designar as figuras que nossa educação cognitiva percebe como tendo formas semelhantes a veados (cervídeos). Opto pelo termo (assim como Magalhães, 2021), que pode parecer um tanto exótico, para manter a coerência com a designação das figuras através de termos baseados nos radicais gregos (como em ‘zoomorfo’ e ‘antropomorfo’), em lugar de empregar o termo mais recorrente na bibliografia, ‘cervídeo’, que é na verdade um termo de classificação zoológica e, portanto, no meu entendimento, gera confusões entre pinturas e animais. É crucial que não confundamos pinturas e animais, pois, embora possa parecer estranho, tal confusão não é nada incomum na bibliografia.
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9
A colocação entre aspas dos nomes de elementos das pinturas que, ao nosso olhar, se assemelham a partes corporais, que aqui procuro adotar sistematicamente, pretende evitar a confusão a que me referi na nota de rodapé 8. Contudo, especialmente em relação ao universo gráfico de Diamantina, mas não só a ele, há uma questão que estamos começando a explorar que é a corporalidade das figuras. Sabemos que, nas filosofias ameríndias, corpos são fabricados (relacionalmente) e conhecemos a centralidade que os corpos têm na definição dos seres e de seu modo de atuar no mundo (Vilaça, 1992; Souza, 2001; Fausto, 2001; Viveiros de Castro, 2002a). Santos-Granero (2012), a propósito dos papéis dos artefatos nas cosmologias ameríndias, também destaca a dimensão construtiva dos corpos e como essa dimensão tece relações e engajamentos entre seres. As pinturas rupestres podem ser abordadas por meio dessa discussão da corporalidade. Montovanelli (2022), em recente e original pesquisa sobre grafismos rupestres da região de Diamantina, tratou do tema e propôs que compreendêssemos as pinturas como corpos ameríndios de facto. Contudo, no corpo deste artigo (o termo é uma provocação), opto por não trazer essa discussão, por entender que ela nos demandaria mais páginas e mais referências, desviando um pouco o foco aqui proposto.
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10
A questão da completude das figuras é complexa e prexisa ser melhor discutida, conforme apresentado em Linke et al. (2020). Alinho-me aqui à postura adotada nessa publicação.
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Não discutirei aqui essas atribuições a cada um dos quatro ‘momentos’ da ‘tradição São Francisco’, em parte por uma questão de economia na construção deste texto e por seus elementos constitutivos estarem disponíveis na bibliografia já referida. Mas, sobretudo, porque operarei um deslocamento em relação a esse esquema, acionando-o minimamente, em razão da inflexão de perspectiva aqui proposta.
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12
O trabalho de Magalhães (2021) contém uma apresentação clara e cuidadosa dos métodos de registro e de análise dos grafismos, em especial da descrição macroscópica das tintas, descrição esta que pode ser encontrada sistematizada primeiramente no trabalho de Dias (2017).
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13
Cá está mais um ponto de interlocução possível com a Etnologia e com as arqueologias construídas em colaboração com comunidades indígenas e pelas(os) arqueólogas(os) indígenas. Conforme se tem discutido e demonstrado, o passado, nas filosofias e práticas ameríndias, não está confinado num tempo superado; os seres do passado, as características marcantes e distintivas deles, atuam no presente. Para a apresentação da questão em contextos etnológicos, veja van Velthem (2003), Lagrou (2007), Lima (2005), Viveiros de Castro (2002a), Vilaça (1992); para potentes desdobramentos arqueológicos da questão, veja Cabral (2014, 2016a, 2016b, 2020, 2022), Reis e Cabral (2019); e ainda os trabalhos de Wai Wai (2022) e de Machado (2017, 2021), a quem os Laklãnõ-Xokleng disseram inclusive que “o passado está na nossa frente” (J. Machado, comunicação pessoal, 2021).
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14
Um dos interlocutores marcantes para a fermentação dessa reflexão foi Aiano Mineiro, antropólogo, que, numa breve discussão, me pôs diante da radicalidade de meu raciocínio diacrônico.
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15
A observação em campo (anotada em nossos registros) não deixa dúvida: a figura é composta por uma trama de traços brancos em zigue-zague e volteios; a seguir, a composição em branco recebe um contorno vermelho. A tinta vermelha se sobrepõe claramente (em suas margens) à branca.
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16
Temos proposto tomar o modo de elaboração das figuras como tema de análise. Essa proposta pode ser vista, apresentada detidamente, em Linke et al. (2020). Pode ser observada em ação sobretudo em Magalhães (2021), em Diniz (2020), em Dias (2017) e em Alcantara (2015), e está presente também, em graus diferentes, em Montovanelli (2022), em Erik Oliveira (2016), em Baldoni (2016) e em Tobias Júnior (2010).
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17
Dupla interlocução, pois o autor é referido tanto pela produção arqueológica, quanto pela produção etnológica com que a primeira dialoga, como nos casos de Erêndira Oliveira (2016) e Barreto (2009; Barreto & Erêndira Oliveira, 2016), em diálogo com Lagrou (2007, 2009).
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O olhar ativo que percorre as imagens, guiado por seus volteios e conexões, e a potência destas como elementos para pensar o mundo são aspectos que podem ser discutidos, ao menos em alguma medida, nas pinturas rupestres do Peruaçu e de Diamantina – nesta última região, mais intensamente, conforme sugeriu Montovanelli (2022). Este ponto nos abre mais um caminho de interlocução interessante com a Etnologia, que será reservado para uma outra oportunidade.
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Mestre Higino Poani Tuyuka nos deixou, após luta feroz contra a covid-19, em 2020. Lembramos da magnitude dessa perda e de tantas outras, de grandes mestres indígenas, que foram levados não somente pelo vírus, mas pela inoperância do Ministério da Saúde e de todo o Governo Federal em criar políticas de prevenção e prover a assistência adequada às comunidades indígenas (assim como às demais comunidades brasileiras) durante a pandemia.
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20
‘Inscrição’: termo geral referente a todos os tipos de transformação que materializam uma entidade num signo, num arquivo, num documento, num pedaço de papel, num traço. Usualmente, mas nem sempre, as inscrições são bidimensionais, sujeitas a superposição e combinação. São sempre móveis, isto é, permitem novas translações e articulações ao mesmo tempo que mantêm intactas algumas formas de relação. Por isso, são também chamadas ‘móveis imutáveis’, termo que enfatiza o movimento de deslocamentos e as exigências contraditórias da tarefa. Quando os móveis imutáveis estão claramente alinhados, produzem a referência circulante (Latour, 2001, p. 350).
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21
Para comentários e discussões da relevância das experiências de campo, vide Câmpera (2012), Diniz (2020), Isnardis (2009a), Linke (2013, 2014) e, especialmente, Magalhães (2021).
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todas as pessoas que compõem nossa Trama e todas que deram e dão vida à Casa do Zezinho, pois foi com essas fibras que este texto foi trançado. Esta composição é de minha responsabilidade, mas tudo que a sustenta é resultado de esforço e envolvimento coletivos. Gratidão a Mariana Cabral, Lucas Soares, José Renó e Luana Rodrigues, que me deram o prazer de discutir uma versão prévia deste texto.
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Isnardis, A. (2024). Pintar como relação: interações de pessoas e pinturas nas paredes de pedra. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, 19(1), e20220082. doi: 10.1590/2178-2547-BGOELDI-2022-0082.
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Editado por
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Responsabilidade editorial: Cristiana Barreto
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
01 Mar 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
04 Jan 2022 -
Aceito
27 Jun 2023