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Inter-relações entre envolvimento ocupacional e percepção de saúde na perspectiva de adolescentes

Resumo

Introdução

A adolescência constitui-se como um período fértil para o desenvolvimento de ações de promoção da saúde. Reflexões sobre como os adolescentes se envolvem em ocupações cotidianas e como estas se relacionam com a percepção de saúde fornecem subsídios importantes para o desenvolvimento de ações de educação em saúde.

Objetivo

Compreender as inter-relações entre o envolvimento ocupacional e a percepção de saúde na perspectiva de adolescentes.

Método

Estudo qualitativo alicerçado na investigação temática de Paulo Freire. A pesquisa foi realizada em escola pública municipal, com 33 adolescentes de 13 a 16 anos, em quatro etapas: aproximação com o campo, leitura da realidade, seminários de codificações e problematização. Os dados foram coletados através de grupo focal e observação participante e submetidos à análise de conteúdo temática.

Resultados

O envolvimento ocupacional se inter-relaciona de diferentes formas com a percepção de saúde no cotidiano. Entre as diversas ocupações, a fragilidade das vivências familiares se destaca por suas conexões com a percepção de sofrimento mental. O envolvimento em ocupações como uso do celular, dormir, atividades escolares, cuidados domésticos, lazer, amizades e atividades físicas também foi discutido. Identificou-se situações de desequilíbrio ocupacional, inequidades de poder (idade, classe e gênero) e injustiça ocupacional que atravessam e limitam o envolvimento ocupacional e impactam a percepção de saúde.

Conclusão

Os resultados corroboram a necessidade de práticas participativas de educação em saúde que possibilitem a construção de consciência crítica sobre o envolvimento ocupacional, com vistas a favorecer a saúde, bem-estar, garantia de direitos e participação social.

Palavras-chave:
Adolescentes; Educação em Saúde; Terapia Ocupacional

Abstract

Introduction

Adolescence is a fertile period for developing health promotion actions. Reflections on how adolescents engage in daily occupations and how these relate to their health perception provide important insights for the development of health education actions.

Objective

To understand the interrelationships between occupational involvement and health perception from the perspective of adolescents.

Method

Qualitative study based on Paulo Freire’s thematic investigation. The research was conducted in a municipal public school, with 33 adolescents aged 13 to 16 years, in four stages: familiarization with the field, reality reading, coding seminars, and problematization. Data were collected through focus groups and participant observation and subjected to thematic content analysis.

Results

Occupational involvement interrelates in various ways with health perception in everyday life. Among the diverse occupations, the fragility of family experiences stands out for its connection with the perception of mental suffering. Involvement in occupations such as cellphone use, sleeping, school activities, household chores, leisure, friendships, and physical activities was also discussed. Situations of occupational imbalance, power inequalities (age, class, and gender), and occupational injustice were identified, which intersect and limit occupational involvement, impacting health perception.

Conclusion

The results support the need for participatory health education practices that enable the construction of critical awareness about occupational involvement, aiming to promote health, well-being, rights assurance, and social participation.

Keywords:
Adolescents; Health Education; Occupational Therapy

Introdução

A adolescência é um período fértil para ações de promoção de saúde que podem impactar toda a trajetória de vida. É um ciclo de vida particularmente saudável, mas no qual os indivíduos vivenciam agravos em saúde, modos de fazer “andar a vida”, hábitos e comportamentos que, em determinadas conjunturas, acabam por vulnerabilizá-los (Brasil, 2017Brasil. (2017). Política Nacional de Promoção da Saúde: PNPS: Anexo I da Portaria de Consolidação nº 2, de 28 de setembro de 2017, que consolida as normas sobre as políticas nacionais de saúde do SUS. Brasília: Ministério da Saúde. Recuperado em 15 de novembro de 2023, de https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_promocao_saude.pdf.
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).

Entre os profissionais que atuam com adolescentes no campo da saúde, as terapeutas ocupacionais têm, como uma de suas preocupações, promover a saúde, o bem-estar e a participação social através das ocupações que fazem parte da vida cotidiana (World Federation of Occupational Therapists, 2012World Federation of Occupational Therapists – WFOT. (2012). Definitions of Occupational Therapy. Recuperado em 15 de novembro de 2023, de https://wfot.org/checkout/1213/22040
https://wfot.org/checkout/1213/22040...
). A Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece a saúde como o completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas como a ausência de doenças. Entretanto, é importante ir além dessa concepção e compreender a saúde a partir dos condicionantes e determinantes sociais (Buss, 2010Buss, P. M. (2010). O conceito de promoção da saúde e os determinantes sociais. Recuperado em 15 de novembro de 2023, de https://agencia.fiocruz.br/o-conceito-de-promo%C3%A7%C3%A3o-da-sa%C3%BAde-e-os-determinantes-sociais
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).

Entre as temáticas passíveis de problematização com adolescentes, reflexões sobre as ocupações e seus impactos na percepção da qualidade de vida e bem-estar constituem-se como um campo fértil para a educação em saúde (Gontijo, 2023Gontijo, D. T. (2023). Promoção da Saúde na Infância e Adolescência. In A. Cavalcanti & C. Galvão, Terapia ocupacional: fundamentação e prática (pp. 221-229). Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.). No entanto, para além das ocupações em si, é importante direcionarmos o nosso olhar para o envolvimento ocupacional dos seres humanos.

As discussões teóricas sobre envolvimento ocupacional têm origem em vários teóricos e modelos presentes na terapia ocupacional a partir dos anos 1960 nos EUA, principalmente a partir dos estudos de Mary Reilly, que propôs a Teoria do Comportamento Ocupacional (Correia, 2021Correia, R. L. (2021). Envolvimento ocupacional, analfabetismo urbanístico e interdisciplinaridade: A terapia ocupacional para as cidades pelas ideias da Erminia Maricato. Revista Políticas Públicas & Cidades, 10(1), 57-83.; Correia & Gonçalves, 2021Correia, R. L., & Gonçalves, M. V. (2021). Terapia ocupacional e o direito à cidade. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 29, 1-13.).

O conceito/termo envolvimento ocupacional, embora ainda não bem definido na literatura, vem sendo discutido no Brasil por Correia (2021)Correia, R. L. (2021). Envolvimento ocupacional, analfabetismo urbanístico e interdisciplinaridade: A terapia ocupacional para as cidades pelas ideias da Erminia Maricato. Revista Políticas Públicas & Cidades, 10(1), 57-83.. Para esse autor, o envolvimento ocupacional é uma manifestação sociocultural, que implica a compreensão das experiências humanas a partir do que as pessoas realizam para sobreviverem, desenvolverem-se e evoluírem. Assim, o envolvimento em ocupações, incluindo autocuidado, trabalho, brincar, estudo, mobilidade e lazer, constrói o cotidiano das pessoas na perspectiva do viver histórico, social, cultural e econômico. O envolvimento ocupacional de pessoas, grupos e populações, principalmente o coletivo, garante e fortalece a participação social e o movimento da comunidade.

No entanto, é necessário considerar que as oportunidades de envolvimento em ocupações de maneira satisfatória e significativa não acontecem de maneira similar para pessoas e grupos sociais (Valério et al., 2020Valério, D. O. S., Oliveira, S. R. P. S., Facundes, V. L. D., Oliveira, M. P. C. A., Silva, V. B. F., & Gontijo, D. T. (2020). O pessoal deveria escutar mais a gente”: relações entre ocupações e saúde na Adolescência. Research. Social Development, 9(10), 1-27.). As pessoas podem ser impedidas de um adequado envolvimento ocupacional por conta de diversos fatores culturais, políticos, sociais e econômicos, que limitam suas habilidades e capacidades de participação na vida. Entre outros fatores, destacam-se a escassez ou precariedade do trabalho e geração de renda, pobreza, precarização de lazer, da convivência e dos modos de habitação, causados por racismo e sexismo. Tais fatores podem configurar-se como dispositivos de privação das liberdades, acarretando experiências sistemáticas e estruturais de injustiça ocupacional (Correia, 2021Correia, R. L. (2021). Envolvimento ocupacional, analfabetismo urbanístico e interdisciplinaridade: A terapia ocupacional para as cidades pelas ideias da Erminia Maricato. Revista Políticas Públicas & Cidades, 10(1), 57-83.).

A justiça ocupacional — na ciência ocupacional e na terapia ocupacional — está relacionada ao fortalecimento da participação da comunidade em ocupações que melhoram a saúde e promovem o bem-estar. Refere-se a oportunidades e recursos equitativos para fazer, ser, pertencer e tornar-se a partir do envolvimento nas ocupações. Está diretamente relacionada à abordagem dos impactos das desigualdades sociais para os seres humanos considerados não somente como seres sociais, mas também ocupacionais (Mthembu, 2021Mthembu, T. G. (2021). A Commentary of Occupational Justice and Occupation-based Community Development Frameworks for Social Transformation: The Marikana Event. South African Journal of Occupational Therapy, 51(1), 72-75.).

Nesse sentido, construir ações de educação em saúde na perspectiva da justiça ocupacional implica possibilitar que essas ações sejam pautadas a partir de processos reflexivos nos quais os participantes sejam escutados sobre a vida que vivenciam e tenham suas necessidades e capacidades reconhecidas (Brasil, 2017Brasil. (2017). Política Nacional de Promoção da Saúde: PNPS: Anexo I da Portaria de Consolidação nº 2, de 28 de setembro de 2017, que consolida as normas sobre as políticas nacionais de saúde do SUS. Brasília: Ministério da Saúde. Recuperado em 15 de novembro de 2023, de https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_promocao_saude.pdf.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
; Jucá et al., 2021Jucá, A. L., Gontijo, D. T., & Vieira, S. G. (2021). Contribuições Freireanas para ações de educação em saúde sexual e reprodutiva com adolescentes. Interritórios, Revista de Educação Universidade Federal de Pernambuco, 7(14), 101. http://doi.org/10.51359/2525-7668.2021.251598.
http://doi.org/10.51359/2525-7668.2021.2...
). Considerando esses aspectos, este artigo objetiva compreender as inter-relações entre o envolvimento ocupacional e a percepção de saúde na perspectiva de adolescentes.

Procedimentos Metodológicos

Este artigo integra uma pesquisa-ação que objetivou desenvolver e avaliar uma proposta de promoção de saúde com adolescentes subsidiada pelo referencial de Paulo Freire (2021aFreire, P. (2021a). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra., 2021bFreire, P. (2021b). Pedagogia da esperança. São Paulo: Paz e Terra.). A referida pesquisa foi composta por 3 momentos: 1) investigação temática; 2) revisão de literatura, com estudo aprofundado da obra Freiriana e planejamentos da intervenção, que ocorreu concomitante à etapa 1; 3) implementação das ações educativas através dos círculos de cultura.

A investigação temática (IT), foco deste artigo, tem como intuito compreender a realidade vivenciada pelos participantes e identificar os temas geradores que podem nortear práticas educativas (Freire, 2021aFreire, P. (2021a). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra., 2021bFreire, P. (2021b). Pedagogia da esperança. São Paulo: Paz e Terra.). A IT, enquanto processo metodológico, sustenta-se nas concepções fundantes do pensamento Freiriano, que defende a construção de práticas educativas dialógicas, problematizadoras, conscientizadoras e libertadoras das relações de opressão. Nesse sentido, a IT é um processo de construção de conhecimentos que se materializa a partir da identificação e compreensão dos diferentes níveis de percepção das pessoas sobre si mesmas, sua realidade e as relações que estabelecem com outras pessoas no mundo (Freire, 2021aFreire, P. (2021a). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra., 2021bFreire, P. (2021b). Pedagogia da esperança. São Paulo: Paz e Terra.). Nesse processo, a partir da problematização das diferentes leituras que os adolescentes fazem de sua realidade, busca-se compreender suas razões de ser e desvelar novas formas de pensar e agir no e com o mundo.

A IT aconteceu em uma escola de ensino fundamental localizada em uma comunidade marcada por situações de vulnerabilidade social da cidade de Recife/PE entre março e agosto de 2022. Participaram 33 adolescentes (26 meninas e 7 meninos), com idade entre 13 e 16 anos, alunos do 8º ano, que aceitaram o convite para participar do estudo. Os adolescentes foram divididos em quatro grupos (G 1–4), sendo que cada grupo participou de dois encontros com duração média de 1 hora 30 minutos. Baseado em Gontijo et al. (2021), aGontijo, D. T., Calheiros, M. N. S., & Santiago, M. E. (2021). Investigação temática freireana e produção do conhecimento na pesquisa acadêmica. Revista Educação e Cultura Contemporânea,18(55), 211-233. IT foi sistematizada em quatro etapas, nomeadas neste estudo como descrito a seguir:

  • Etapa 1 - Entrada no campo e mobilização para participação através da realização de atividades lúdicas.

  • Etapa 2 (encontro 1) - Leitura da realidade, na qual objetivou-se identificar as principais concepções, ideias e experiências dos participantes acerca da sua própria realidade. Os dados foram coletados através de grupos focais e observação participante, com utilização de atividades lúdicas que mobilizaram a participação dos adolescentes. Para condução desse momento, foi utilizado um roteiro contendo questões que possibilitaram (entre outros aspectos não abordados neste artigo) a identificação das principais ocupações nas quais os adolescentes se envolviam tanto em dias úteis como nos finais de semana (e nos diferentes períodos do dia) e implicações desse envolvimento para a percepção de saúde na sua perspectiva.

  • Etapa 3 - Construção das codificações pela equipe de pesquisa com base nos dados coletados na Etapa 2. As codificações são representações das situações existenciais apresentadas pelos sujeitos construídas a partir de diferentes linguagens (Freire, 2021aFreire, P. (2021a). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra., 2021bFreire, P. (2021b). Pedagogia da esperança. São Paulo: Paz e Terra.). Neste estudo, os conteúdos trazidos pelos adolescentes nos grupos focais foram representados em três atividades que se configuraram como codificações: um jogo (bola no pote), uma tirona interativa (composta por quadros curtos integrados de vídeos) e uma montagem de vídeos curtos.

No jogo bola no pote foram descritas frases trazidas pelos adolescentes referentes a sua rotina cotidiana, que ao serem lidas pelos mediadores nos grupos da Etapa 4, os participantes inicialmente apontavam se a frase tinha ressonância ou não na sua vida, colocando bolinhas de gude em um pote com o rotulo (eu também, eu não ou não sei). A tirona interativa consistiu uma história construída com base nos relatos dos adolescentes que abordava as relações familiares e com amigos. Na discussão dessa atividade (Etapa 4), os adolescentes relataram possíveis desdobramentos para a história apresentada. Por fim, foi realizada a montagem de um conjunto de vídeos curtos que abordavam conteúdos disponíveis na Internet que refletiram o que os adolescentes trouxeram na leitura da realidade sobre a saúde mental.

  • Etapa 4 (encontro 2) - Problematização com os adolescentes sobre as concepções apresentadas na Etapa 2, que estavam representadas nas codificações descritas na Etapa 3. A problematização é a construção de perguntas com a intencionalidade – de maneira clara e explícita – de favorecer a reflexão dos sujeitos entre si e o mundo, para que percebam a realidade analisada (Freire, 2021aFreire, P. (2021a). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra.).

O detalhamento do processo metodológico da investigação temática da presente pesquisa, assim como de suas potencialidades no campo da promoção de saúde e da pesquisa com adolescentes, foi realizado nos trabalhos de Gontijo, Calheiros e Santiago.

Os encontros foram gravados e transcritos na íntegra, assim como foram realizados registros em diário de campo. Os dados foram submetidos a adaptação para pesquisas qualitativas da análise de conteúdo temática, sistematizada nas seguintes etapas de análise: Exploração dos Materiais; Tratamento dos Resultados; Inferências; Interpretação (Gomes, 2021Gomes, R. (2021). Análise e interpretação de dados de pesquisa qualitativa. In M. C. S. Minayo (Org.), Pesquisa Social: Teoria, método e criatividade (pp. 72-95). Petrópolis: Vozes.). Os dados foram categorizados tematicamente tendo como referência os diferentes tipos de envolvimento ocupacional destacados pelos adolescentes na pesquisa. As nove categorias resultantes abrangem, de forma integrada, os dados coletados no momento da leitura da realidade e da problematização, uma vez que esta última etapa consiste no aprofundamento da discussão da etapa precedente.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFPE sob parecer n.º 3.633.355. A participação no estudo foi condicionada à assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelos responsáveis legais e do Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE) pelos adolescentes, que são aqui identificados através de codinomes escolhidos pelos mesmos.

Resultados

  • 1- “Toda hora e todo instante”: o uso do celular no cotidiano dos adolescentes

Entre as ocupações realizadas pelos jovens, a utilização do celular é relatada como a principal. É citada como a primeira atividade que fazem ao acordar e a qual dedicam muito tempo nos diferentes turnos do dia, nos diversos espaços onde convivem. Destaca-se a utilização inclusive nos períodos que seriam destinados a dormir, pois muitos adolescentes relataram que acordam algumas vezes durante a noite para verificar o celular. Os jovens utilizam o aparelho celular para jogar, assistir a vídeos, desenvolver relações sociais, ler e gravar vídeos para compartilhar nas redes sociais.

Lua:Mexo no celular. Eu faço a mesma coisa de todo dia. (G4).

Joaninha:Eu, toda hora e todo instante. (G4).

Vênus:A primeira coisa que eu faço é ficar no celular. (G4).

Pastel:Eu fico vendo besteira, fico no Discord, mexo no Instagram, fico vendo vídeo de besteira e fico fazendo fofoca com as amigas. (G4).

Na problematização, os jovens reconhecem que, ainda que gostem de se envolver nessa ocupação, utilizam o aparelho celular por muito tempo durante o dia, o que prejudica sua participação em outras atividades, como dormir. Refletem que o uso excessivo se dá em consequência de não encontrarem outros afazeres mais interessantes para passar o tempo, e que, mesmo assim, em alguns momentos nem mesmo o celular é interessante. Quando estimulados a refletirem o porquê de não terem outras atividades para fazer, atribuem isso principalmente ao fato de não terem dinheiro para participar em outras ocupações.

Lua:Nem celular é interessante. Tô ligada, é entediante. No grupo que tem com as meninas, eu tava reclamando que eu tinha um monte de coisa, jogo, aplicativo no celular, só que nada era bom, nada era legal, nada era interessante (...) não é viciada, é que não tem o que fazer. Porque não tem nada de interessante pra fazer, só mexer no celular. (G4).

Stella:Por que tá faltando dinheiro. Porque não tem nada para fazer. Você pensa, vou fazer o que agora? A pessoa enjoa. Aí fica lá mexendo, e não tem nada pra fazer. (G1).

Os jovens acreditam que o uso excessivo do celular reverbera concretamente em problemas para a saúde, destacando principalmente possíveis problemas visuais, precariedade na alimentação realizada de forma concomitante ao uso do aparelho, sedentarismo decorrente de seu uso em detrimento de envolvimento em outras ocupações.

Maria Flor:Celular, ele interfere na visão, porque é muito ruim, mas a gente não deixa de usar ele (...) comer interfere também, porque se você não comer, você fica passando mal, pega uma doença e tal. (G2).

Lua: Mexer no celular? Prejudica a visão, eu fico sedentária, porque eu só fico fazendo isso desde que eu acordo. (G4).

  • 2- “Muitos dos problemas dos adolescentes seriam resolvidos se eles pudessem conversar com seus pais”: o envolvimento nas relações com os pais

Na busca da compreensão de como o envolvimento ocupacional se relaciona à percepção de saúde na adolescência, as discussões sobre as características e dificuldades das relações estabelecidas com os pais foram as mais presentes, tanto na frequência quanto na intensidade dos relatos e reflexões. Nos grupos, destacou-se a existência de dificuldades e até mesmo a incapacidade – na perspectiva dos adolescentes – dos pais em estabelecer diálogo com os filhos. Os adolescentes apontam que, na relação com os pais, há limitações para participar e poucas ou nenhuma oportunidade de falar para expressar o que sentem, o que também resulta no medo em iniciar o diálogo. Para os participantes, essa limitação tem implicações no envolvimento em outras ocupações, pois, muitas vezes, os pais impõem restrições ao envolvimento em atividades que são significativas para eles, sem que os filhos possam se manifestar.

Stella: (..) Tipo, os pais não conversam, minha mãe nunca conversou comigo, tipo ‘filha, você tá bem?’ (G4).

Os participantes referem que se sentem incompreendidos, pois, no dia a dia, os pais não estariam dispostos a se colocar no lugar dos filhos, enfatizando que suas atitudes são marcadas mais por condutas de julgamento do que de empatia e compreensão.

L:Compreender. (...). Porque o adulto fica tipo: ‘nossa, ele é mais novo que eu ainda não sei nada da vida. Tu ainda vais sofrer muito, tu ainda vai cair muito’, sabe? (...). (G1)

PNI:Muitos dos problemas dos adolescentes seriam resolvidos, se eles pudessem conversar com seus pais, se eles soubessem ouvir, ao invés de julgar. (G4)

Os adolescentes refletem que não se percebem como seres com autonomia, e que não têm direito à voz. Para eles, tal limitação se dá em consequência de os adolescentes serem considerados pelos pais como carentes de maturidade e sem experiência. Assim, em meio às pressões, reclamações e comparações recebidas pelos familiares, os adolescentes defendem a perspectiva de que têm direito a errar na vida, uma vez que todas as pessoas erram.

Sol:Não tem a voz, por causa da idade também. O pessoal fala que gente mais velha, já teve muitos traumas, levou muitos baques. maturidade não vem com idade, saca. (G1).

Estrela:Todo mundo erra na vida né (...). A pessoa pra fazer um gol a bola vai pro lado, nem sempre vai pra frente, vai errar uma vez na vida. (G1).

Lua:Porque os pais botam muita pressão nos filhos. Tem escola, tem que estudar em casa, tem que fazer isso, você tem que ser o filho perfeito, você tem que ser exemplo para o seu irmão mais novo, ou então tem que ser igual ao seu irmão mais velho. Sim, eles comparam você … tipo “a filha de não sei quem faz isso, isso e isso. (G4).

Quando questionados especificamente sobre o impacto das relações com os pais na saúde, os adolescentes acreditam que diversos problemas de saúde mental têm sua origem na forma como essas relações são construídas. Relatam que se sentem sempre pressionados, e que têm a “sensação” de nunca serem “bons o suficiente”. Além disso, apontam que se sentem sozinhos, que não são escutados, e que esta solidão, assim como a baixa autoestima, que são vivenciadas nas relações com os pais e com os amigos (conforme discutido posteriormente) são algumas das principais causas de sofrimento mental (ansiedade, depressão) vivenciadas por muitos jovens na atualidade.

Accioly:É como se os adolescentes não fizessem nada bom, se você varre a casa, falta fazer mais algo ali. Na sua idade, no meu tempo eu fazia X coisas. Você se sobrecarrega muito para tentar ser melhor orgulhar alguém, e no final nunca consegue. (G3).

PNI:Eu falo, é ser escanteada, se sentir inferior, se sentir sozinha, tipo, tem um monte de gente aqui, mas eu me sinto sozinha, e isso causa ansiedade. (G2).

Dominique:Porque assim, é muita coisa ruim na minha vida, mas eu não falo. Ninguém escuta. (G1).

  • 3- “E quem gosta de estudar?: o envolvimento com as atividades escolares

O envolvimento com as atividades escolares também foi citado pelos adolescentes, que referiram que a escola é o local onde permanecem durante toda a tarde ao longo da semana e também em alguns turnos na manhã. Os participantes relatam que a maioria dos adolescentes não gosta de estudar, sendo que alguns apontam que só vão para a escola por serem obrigados pelos adultos. No entanto, durante a problematização, mesmo referindo que não gostam de estudar, há o reconhecimento da importância dos estudos para a construção da vida futura.

L:No futuro, a gente não precisar passar por necessidades, não precisar passar por falta de dinheiro, precisar estar numa casa que está caindo aos pedaços. (G3).

Lua: Eu faço porque eu sou obrigada a vir. Porque se não, eu não vinha não. (G3).

No ambiente escolar, para além de estudar (ou não) os conteúdos, os adolescentes realizam várias atividades, destacando que não gostam de escrever, mas que gostam do encontro com os amigos para conversar e dos lanches.

Flor:A gente chega e assim que a gente chega já vai pra sala. Quando chega na sala de aula, vai fazer atividades ou corrigir atividades e, quando acaba, o horário de todas as aulas, a gente desce, e se for um lanche que a gente gosta (...) sei lá, porque é chato você fica lá só escrevendo o tempo todo. Pela parte sim, conversar e encontrar as amigas. (G4)

Alguns adolescentes pontuam dificuldades na aprendizagem, relatando pouca concentração, conflito com professores e a percepção de que não conseguem apreender os conteúdos.

Sol:Eu fico pensando como eu fui da garota que tirava dez em matemática pra tirar quatro em matemática! Antes eu estudava bem mais, eu conseguia entender tudo, aí, depois, tipo, teve algum momento que parei de compreender. (...). (G3)

Os adolescentes também discutiram o envolvimento na escola na intersecção com as questões de classe e estabelecimento e manejo das relações com os pais, como discutido anteriormente. Em relação à classe e condições econômicas, inicialmente, os adolescentes apontam que não existe diferença no envolvimento com a escola, uma vez que todos precisam estudar. No entanto, os participantes observam que, para quem possui condições socioeconômicas melhores, esse envolvimento “é mais fácil”, em consequência de não precisarem realizar outras atividades remuneradas para conseguirem pagar um curso, por exemplo. Refletem ainda que, apesar de acreditarem que o estudo é para todos, os filhos de pais ricos não precisariam estudar, pois vão herdar as coisas da família. Também foram feitas referências à percepção de que adolescentes de famílias mais ricas sofrem uma cobrança maior em relação às notas.

Lua:Oxe, pra que ia querer saber de nota? Se não vai precisar. E não ia vir nem pra escola. Pra que estudar, se eu já vou ter o dinheiro? (G1).

Saturno:Eu acho família de rico muito fresca, aí querem ter a nota mais alta da escola. (G1).

Estrela:É sim, pra quem tem dinheiro, é mais fácil fazer e conseguir as coisas. E a gente tem muita dificuldade, tem que trabalhar e se esforçar pra conseguir pagar um curso, uma faculdade. (G3).

No que se refere às interrelações entre escola e relação com os pais, houve relatos, em todos os grupos, da vivência de um cenário significado como de intensa cobrança em relação às notas, sendo destacado que os “pais não consideram ficar na média como uma boa nota” e não valorizam quando o desempenho é superior a esta, uma vez que “tirar boas notas é uma obrigação”.

L:Geralmente falam ‘mas você pode ser melhor’, que era pra melhorar. Minha mãe não gosta não. (...) Se eu tirar uma nota na média, a minha mãe, ela fica fria comigo, ela não fala comigo até tirar uma nota boa. (G3).

Sol: Se eu falo que tirei oito, minha mãe fala: ‘é o mínimo’. Se eu tirar um dez, ela fala ‘não é mais que sua obrigação, você estuda pra quê?’ (G3).

Ao refletirem sobre a importância da escola para a construção do futuro, os adolescentes problematizaram sobre o “peso” de atender a expectativa social de serem o “futuro do Brasil”, o que engloba hegemonicamente representações relacionadas à conquista de um emprego com diploma universitário, formar família, ter independência financeira. Nesse sentido, refletem que “este futuro ideal” não se materializa da mesma forma para todos, uma vez que as vivências e oportunidades não são iguais, o que caracteriza uma multiplicidade de formas de se viver no presente e de construir o futuro.

Lua:Não existe ser o futuro do Brasil, ele vai ser a gente de qualquer jeito e pronto, a gente vai votar, só que cada um vai ser do seu jeito. Tem uns que vai tá roubando, matando por aí, tem outros que vai tá rico, tem uns que vai tá estudando, tem outros que vai tá cheio de filho, tem outros que vai tá morando na rua. Não existe ser o futuro do Brasil, pra ser o futuro do Brasil tem que ser de tal jeito, não. (G4).

Durante a problematização, ao serem questionados sobre as relações da escola com a percepção de saúde, os adolescentes mencionaram que muitas vezes tem crises de ansiedade no contexto escolar. Mas de forma geral, atribuem essas crises a fatores relacionados ao envolvimento nas relações com pais, como anteriormente apontado, e com amigos, conforme discutido a seguir.

Luz:Eu já vim pra escola e tive uma crise de ansiedade, porque meu tio tinha morrido no dia, e eu também tinha muita crise de ansiedade. (...) mas é por qualquer besteira que eu fico nervosa e começa a dar um aperto no peito e fico sem conseguir respirar. (G3).

  • 4- “Sozinha eu não fico, mas me sentir sozinha é diferente”: a vivência das amizades no cotidiano

Quando direcionamos a atenção à análise do envolvimento dos adolescentes nas relações de amizade com outros adolescentes, o primeiro ponto destacado por eles, é a percepção de que têm muito mais amigos virtuais, oriundos de redes sociais e de jogos pelo celular, do que presenciais. Os participantes enfatizaram a facilidade para se comunicarem e fazerem amigos no contexto online.

Sol:Eu gosto de fazer amigo online, é muito bom. (...) eu faço pelo whatsapp mesmo. Discord, isso! Eu entro lá no servidor e começo a contar todos os meus problemas pras pessoas (...). Eu fico falando toda minha vida, que minha vida é uma merda pras pessoas que eu não conheço e viro amiga do povo. (G1).

Assim como apontado ao discutir as relações com os pais, os participantes acreditam que a maioria dos adolescentes apresenta o sentimento de solidão (e suas repercussões na saúde mental), mesmo estando convivendo com amigos, visto que se sentem sozinhos ainda que acompanhados.

Lua:Eu tô cheia de amigos, cheia de pessoas que eu gosto, mas mesmo assim eu me sinto sozinha. (G2).

Stella:É diferente (estar sozinha e se sentir sozinha), com certeza, é diferente. Que depressão, cara. Eu tô sozinha, literalmente, e me sentindo sozinha, literalmente. (G2).

É relevante destacar que, na leitura da realidade, não foram feitas menções espontâneas às relações afetivas, especialmente o namoro, como parte do cotidiano dos participantes. Na problematização, essa ausência foi pontuada pelas pesquisadoras, e os jovens mencionam que, dentro de sua realidade, não podem namorar por causa da idade. A maioria dos adolescentes não quis se posicionar sobre a questão do estabelecimento de relações afetivas sexuais ao longo da IT, sendo que algumas meninas enfatizam que é cedo para namorar e que essa experiência poderia prejudicar o envolvimento em outras ocupações.

Keily:Eu não acho normal não. Acho que é muito cedo ainda, para uma experiência muito forte. Namorar é uma experiência muito forte, para uma criança de 13 anos, 13-14 anos, eu acho que é muito cedo, dar tempo ao tempo, vai ter tempo na vida. (G2).

Savannah:Mais ou menos. Pra mim, idade pra namorar é a partir dos 17-18 anos. Se você quiser namorar, você pense bem e namore. É bom você namorar (...). Minha mãe nem falou de terminar os estudos, minha mãe falou assim: se você quiser tudo bem, agora tem que focar também nos estudos. Aí minha irmã não aceitou, quis focar nos estudos e mais pra frente quando terminar os estudos ela vai namorar. (G2).

  • 5- “Fico assim, olhando para o teto, tentando dormir”: compreensões sobre o envolvimento com o sono

Dormir foi destacado como uma das principais ocupações nas quais os adolescentes se envolvem, relatando que, a maior parte do turno da manhã (uma vez que estudam a tarde), permanecem dormindo. Nos grupos, eles acham que “dormem muito” e por isso acordam tarde, o que os impede de se envolver em outras ocupações durante a manhã.

Cinderela: Eu durmo. (G2).

Rose:Depende do dia, tem dia que eu durmo de meia noite, tem dia que eu durmo de uma hora da manhã. É que eu tenho insônia, não consigo dormir de noite. (G3).

Acioli:A manhã, eu, eu perco. (G3).

No entanto, na problematização, foi notado que não necessariamente os adolescentes dormem muitas horas, pois a maioria relatou que, mesmo com forte interesse em construir esse hábito, não conseguem dormir cedo. Os participantes atribuem a dificuldade no sono ao uso do celular (discutido anteriormente), à insônia e a pesadelos. Entre os participantes, houve também relatos de que ficam acordados na madrugada para realizar chamadas online com os amigos, para ficar com eles conversando e jogando.

L:Eu não consigo mais dormir cedo de jeito nenhum, só durmo tarde, por conta de algumas vezes eu acordar com pesadelos, alguns pesadelos terríveis. Celular. (G3).

Stella:Eu posso até tentar dormir, mas aí eu fico assim olhando para o teto, tentando dormir, não consigo não, eu só consigo dormir se eu fico mexendo no celular. (G1).

Saturno: Eu tenho um amigo virtual. Para ficar conversando e jogando com eles de noite. (G1)

Ao refletirem sobre quais os impactos da (des)organização do sono na saúde, os jovens relatam que dormir pouco interfere negativamente na saúde e contribui para a realização de outras ocupações (uso celular e alimentação desregrada) que também podem prejudicar a saúde.

Lua:Eu acho que interfere de maneira negativa. Porque não faz bem dormir lá para às quatro, cinco horas da manhã e acordar de oito horas. (G2).

  • 6- “Só raramente”: o lazer no cotidiano dos adolescentes

No que se refere ao envolvimento com o lazer, conforme apresentado anteriormente, a utilização do celular foi identificada como a principal forma de diversão dos adolescentes. Para além do uso do celular, observamos um envolvimento restrito em ocupações significadas como de lazer no cotidiano. Entre as situações de lazer relatadas, a maioria acontece aos finais de semana, sendo citados passeios esporádicos em lugares próximos, shopping, praia ou casa de familiares.

Saturno:Não, só raramente. (G4).

PNI:De vez em quando, sim. Às vezes eu vou pra piscina, ou vou para a praia. (G4).

Accioly:dormindo, às vezes saio para algum canto. (G3).

PNI:Pra praça, pro shopping. (G4).

Flor:Com minha mãe ou com meu pai e com meu irmão. Assim, eles que decidem e dizem: “a gente vai para praia hoje”. (G4).

Significado como uma forma de lazer, brincar foi trazido pelos adolescentes como uma ocupação na qual se envolvem no cotidiano. Foram citadas a participação em brincadeiras de rua, mas também vinculadas ao uso de tecnologias, principalmente vídeo game e jogos no celular. Na problematização, quando questionados sobre a existência ou não de uma faixa etária para brincar, eles expressam que não existe idade para isso, que em qualquer momento desejado é permitido brincadeiras, indo de encontro às falas dos adultos, que afirmam que eles já “estão grandes para brincar”. Relatam, ainda, apego aos brinquedos da infância, que mesmo não sendo mais utilizados, viraram recordações.

Saturno:De bola. De queimado, da rua. (G4).

Matrix:Eu sei. Jogar, Assistir e Queimado. Jogar Roblox. (G1).

Stella:Tem idade não. (G1).

Lua:Brinca até quando quiser. Porque não? Porque eles já ficam falando assim "Tu já tá grandinha demais pra isso" então pra eles então já tão grande. (G1).

Na problematização sobre o envolvimento no lazer e no brincar, os adolescentes destacam que, na maior parte do tempo, ficam na rua perto de casa ou dentro de casa. A possibilidade de sair para a rua acontece de maneira diferente quando na comparação entre meninos e meninas, pois os meninos podem sair sem questionamentos e reclamações, o que não acontece com as meninas. Assim, consideram que os pais são mais flexíveis com os meninos, enquanto para as meninas, impõem maiores limitações em consequência das obrigações atribuídas a elas no cuidado da casa e de um maior cuidado com sua segurança.

Stella:Menino pode, sair né. A mãe não vai reclamar porque é menino, vai para tudo que é canto. (...) Então não é a mesma coisa. Porque menino geralmente não tem muita preocupação porque é menino “Ah não é menino deixa” não sei o que, agora quando é menina, “bota essa menina dentro de casa”. (G1).

  • 7- “Aí eu coloco uma música e vou embora arrumar as coisas”: o envolvimento com o cuidado doméstico

Entre as ocupações que os adolescentes se envolvem também foi identificada a realização de atividades domésticas que envolvem o cuidado da casa, de animais e de outras pessoas como a supervisão de irmãos e crianças mais novas e administração de medicação de idosos.

PNI:Lavar os pratos. Tirar o cocô do cachorro. (G4).

Cinderela:Para dar o medicamento do meu avô. É de dez da noite, cinco da manhã e três da tarde. (G2).

Savannah:Tem vezes que eu cuido de um menininho que minha mãe cuida, aí tem vez que eu fico em casa com ele (...). Eu fico responsável pela criança que minha mãe cuida (...). (G2).

Na problematização, alguns adolescentes relatam que gostam de realizar algumas dessas atividades desde que concomitantes a ouvir música. A estratégia de ouvir música também é adotada por aqueles que não gostam de executar tarefas domésticas, que destacam que preferem realiza-las sozinhos, pois assim evitam a reclamação e punições de familiares.

Nayara:Lavar os pratos. Não é que eu não goste, eu tenho nojo. Eu faço sozinha. Meu pai diz, desliga a televisão e vai. Aí eu coloco uma música e vou embora arrumar as coisas. Se eu não vou, ele toma o controle. Aí eu vou fazer por bem. Porque fazer por mal é bom não. (G2).

Saturno: Eu fico feliz só porque eu boto o fone e fico ouvindo lá minha playlist. (G4).

Os jovens compreendem que existem, na maioria das vezes, especificidades de gênero na realização das atividades domésticas, uma vez que estas são atribuídas principalmente às mulheres, sem a participação dos homens. Além disso, relatam a existência de diferenças nesse envolvimento considerando-se a questão da renda, pois acreditam que quem tem mais dinheiro não precisa fazer isso, pois há quem as faça para eles, por poderem pagar.

Stella:Não, meu irmão não fazia merda nenhuma. (G1).

Maria Flor:Porque às vezes as mulheres fazem, e os homens não fazem nada. (G2).

Keily:É porque muitas vezes, o povo fala, a mulher tem que fazer, por ser mulher, e o homem, fica, tem que ser homem. (G2).

L:Acho que sim. Acho que assim, você pode pagar quem faça. (G3).

Em seus discursos, alguns jovens destacaram que não significam o envolvimento nas atividades domésticas como uma “exploração” realizada pelos pais e cuidadores, e sim como uma maneira de ensinar, que vem acontecendo desde a infância até a adolescência.

Bruno:Eles não exploram a gente, eles ensinam. (G2).

De forma geral, as atividades domésticas e seus impactos na percepção de saúde foram associadas à maneira como as relações com os pais são construídas. Nesse sentido, percebe-se que as mães desejam que as atividades domésticas sejam realizadas exatamente como elas fazem, considerando qualquer outra forma errada e interpretando-a como um teste para o adolescente.

Keily:Assim, o maior motivo que eu tô falando da minha mãe é assim, limpei a casa, fiz tudo com o maior amor e carinho, escutando o quê? Exatamente, e tipo, ela quer que fique do jeito dela’. (G2).

Lucas:Eles testam a gente. (G2).

  • 8- “Se eu não comesse muita ‘besteira’”: percepções sobre o alimentar-se

A alimentação também foi citada espontaneamente como uma ocupação na qual os adolescentes se envolvem durante o cotidiano. Na rotina alimentar, as refeições, quando acontecem dentro do ambiente domiciliar, em alguns momentos são realizadas de forma solitária, em outros, na presença de familiares.

Estrela:Eu como. (G1).

Flor:Às vezes, eu almoço com minha mãe na mesa, ou sozinha, ou com meu padrasto, porque na hora que eu tô saindo para escola, ele tá saindo também para trabalhar. (G4).

Quando refletem sobre os impactos do alimentar-se na saúde, os jovens expressam a compreensão de que a alimentação, quando não organizada e não nutritiva, tem consequências negativas à saúde. A maioria dos adolescentes referem que se alimentam mal, em relação à qualidade nutritiva dos alimentos, tanto por escolha própria quanto pelo não acesso por questões financeiras a outras opções, e que isso pode tanto trazer novos problemas de saúde quanto agravar questões de saúde pré-existentes (conhecidas ou não).

Lua:eu acho que sim porque eu como muita besteira, pirulito, e eu acho que isso interfere na minha saúde. Vai que eu tenho alguma coisa né? Não interferia se eu não fizesse isso, se eu não comesse muita besteira. (G1).

Dominique:Eu acho que, comer muita coisa que não é saudável, porque todo mundo sabe que comer salada, essas coisas, é saudável. (G1).

  • 9- “Eu sei que tenho que ir, mas aí tem que aturar”: o envolvimento em atividades físicas

Durante a IT, a prática de atividades físicas foi citada pelos adolescentes como benéfica para a saúde de forma recorrente. No entanto, o envolvimento efetivo em atividades físicas só foi citado como aquele vinculado a brincadeiras nas ruas (futebol) pelos meninos e a obrigatoriedade da educação física na grade curricular da escola. Entre os participantes, alguns poucos adolescentes relatam gostar da educação física e manifestaram interesse em participar com maior regularidade de atividades físicas tanto no ambiente educacional como também como uma alternativa para a vida profissional no futuro.

Vênus:Eu tento fazer, mas eu desisto. Educação física, eu sei que tenho que ir, mas aí tem que aturar. (G4).

Saturno:Sim, mas eu não gosto. Eu gosto muito de ir pra educação física, vou falar também pra diretora, porque ela disse pra gente se inscrever lá, pra ser um atleta né. (G4).

Discussão

O envolvimento ocupacional dos adolescentes caracterizou-se como um fenômeno marcado pela interconexão entre as diferentes ocupações realizadas no cotidiano. Assim, a discussão dos resultados se direciona, principalmente, para dois aspectos que transversalizaram os dados, e a análise das inter-relações do envolvimento ocupacional com as percepções de saúde mostrou desequilíbrios e ambiguidades nos processos de escolha ocupacional e impactos das diferentes relações de poder vivenciadas no cotidiano.

O equilíbrio ocupacional apresenta definição subjetiva relacionada à maneira como as pessoas escolhem gastar o tempo em atividades obrigatórias e significativas. De forma geral, o equilíbrio ocupacional implica o envolvimento significativo em uma variedade de ocupações que promovam saúde e bem-estar. O desequilíbrio entre as ocupações pode afetar a saúde física e emocional e o bem-estar, tendo como consequência a ocorrência de problemas de saúde, como lesões, ansiedade, depressão, esgotamento, tédio, burnout e distúrbios do sono (Wada et al., 2010Wada, M., Backman, C. L., & Forwell, S. J. (2010). Theoretical perspectives of balance and the influence of gender ideologies. Journal of Occupational Science, 17(2), 92-103.).

Uma revisão de literatura conduzida por Wada et al. (2010)Wada, M., Backman, C. L., & Forwell, S. J. (2010). Theoretical perspectives of balance and the influence of gender ideologies. Journal of Occupational Science, 17(2), 92-103. identificou quatro principais perspectivas teóricas sobre o equilíbrio ocupacional nos campos da Ciência Ocupacional e da Terapia Ocupacional. Sem intencionalidade de afiliar-se a uma dessas perspectivas, sua análise amplia a possibilidade de discussão dos dados encontrados neste estudo.

Uma primeira perspectiva compreende que o equilíbrio se relaciona à quantidade de tempo de envolvimento nas ocupações. Nessa perspectiva, uma situação de equilíbrio ocupacional se expressa quando há alocação de tempo de maneira ideal no envolvimento em ocupações físicas, mentais, sociais e de descanso. No entanto, críticas relacionadas a essa perspectiva apontam que o equilíbrio se refere à proporção ideal de diferentes experiências ocupacionais, em vez da alocação igualitária do tempo, considerando os diferentes tipos de vivências. Assim, para manter o equilíbrio é necessário alternar entre a participação em atividades e a restauração de energia para favorecer o bem-estar, ou seja, envolver-se em atividades de descanso para que a energia seja restabelecida para o próximo envolvimento em atividades desgastantes (Wada et al., 2010Wada, M., Backman, C. L., & Forwell, S. J. (2010). Theoretical perspectives of balance and the influence of gender ideologies. Journal of Occupational Science, 17(2), 92-103.).

Os adolescentes trouxeram diferentes situações de desequilíbrio ocupacional considerando o tempo de envolvimento nas ocupações, como por exemplo, o tempo excessivo destinado ao uso do celular, que impacta outras ocupações como sono, alimentação, atividades físicas e relações de amizade e familiares.

O uso exacerbado do celular na adolescência pode ser relacionado às características peculiares desse período, uma vez que o sentimento de inclusão social e pertencimento de grupo é potencializado nessa fase da vida (Nunes et al., 2021Nunes, P. P. B., Abdon, A. P. V., Brito, C. B., Silva, F. V. M., Santos, I. C. A., Martins, D. Q., Meira, P. M. F., & Frota, M. A. (2021). Factors related to smartphone addiction in adolescents from a region in Northeastern Brazil. Fatores relacionados à dependência do smartphone em adolescentes de uma região do Nordeste brasileiro. Ciencia & Saude Coletiva, 26(7), 2749-2758.). Estudos apontam também que as redes sociais são um espaço de lazer e distração que proporciona aos adolescentes, além da interação entre pares, a oportunidade de pensar e agir sem constrangimento (Bienzobás, 2021Bienzobás, S. M. (2021). Adolescência, internet e saúde mental: uma revisão de escopo (Trabalho de conclusão de curso). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos.).

Por outro lado, estudos realizados com adolescentes – assim como apontado pelos participantes desta pesquisa, mesmo ponderando os benefícios da utilização dos celulares no cotidiano, relatam que o excesso pode implicar alteração no ciclo sono-vigília e na concentração para leitura e escrita, impactando negativamente o desempenho escolar e potencializando a presença de estresse, depressão, isolamento social e dificuldades na fluidez para o desenvolvimento de relações na vida real (Oliveira et al., 2019Oliveira, G., Silva, I. B., & Oliveira, E. R. A. (2019). O sono na adolescência e os fatores associados ao sono inadequado. Revista Brasileira de Pesquisa em Saúde, 21(1), 135-145. http://doi.org/10.21722/rbps.v21i1.26477.
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; Guerin et al., 2018Guerin, C. S., Priotto, E. M. T. P., & Moura, F. C. (2018). Geração Z: a influência da tecnologia nos hábitos e características de adolescentes. Revista Valore, 3(spe), 726-734.).

Nesse sentido, os adolescentes referiram que, se por um lado o uso do celular potencializa a vinculação com “amigos virtuais”, por outro, seu uso excessivo limita as relações com pessoas no mundo real, acarretando o sentimento de solidão e situações de sofrimento mental. Na adolescência, é esperado que os jovens ampliem a rede de amigos. Esse processo, além de ser permeado por diferentes aspectos (individuais, sociais, culturais etc.), pode ter consequências positivas (criação e fortalecimento de laços afetivos, vivências para a construção da identidade de forma saudável) e negativas (potencialização de fatores de risco) (Brasil, 2017Brasil. (2017). Política Nacional de Promoção da Saúde: PNPS: Anexo I da Portaria de Consolidação nº 2, de 28 de setembro de 2017, que consolida as normas sobre as políticas nacionais de saúde do SUS. Brasília: Ministério da Saúde. Recuperado em 15 de novembro de 2023, de https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_promocao_saude.pdf.
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; Malta et al., 2018Malta, D. C., Machado, Í. E., Felisbino-Mendes, M. S., Prado, R. R. do, Pinto, A. M. S., Oliveira-Campos, M., Souza, M. F. M., & Assunção, A. Á. (2018). Uso de substâncias psicoativas em adolescentes brasileiros e fatores associados: Pesquisa Nacional de Saúde dos Escolares, 2015. Revista Brasileira de Epidemiologia, 21(Supl. 1), 1-16.; Reis et al., 2018Reis, A. A. C., Malta, D. C., & Furtado, L. A. C. (2018). Desafios para as políticas públicas voltadas à adolescência e juventude a partir da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE). Ciencia & Saude Coletiva, 23(9), 2879-2890.). Assim, destacamos a importância de ações de promoção de saúde pautadas no fortalecimento de vínculos, no mundo real, entre os adolescentes. Ações que possibilitem o encontro, o diálogo e a construção de pertencimento e de relações que sejam compreendidas como fontes efetivas de suporte social.

Outro ponto discutido pelos adolescentes, relacionado à análise do equilíbrio a partir da alocação temporal, foi a percepção de que eles dormem muito e, por isso, não têm tempo de se envolver em outras atividades que gostariam de fazer e que poderiam potencializar sua saúde, como por exemplo, as atividades físicas. Corroborando as informações relatadas por Valério et al. (2020)Valério, D. O. S., Oliveira, S. R. P. S., Facundes, V. L. D., Oliveira, M. P. C. A., Silva, V. B. F., & Gontijo, D. T. (2020). O pessoal deveria escutar mais a gente”: relações entre ocupações e saúde na Adolescência. Research. Social Development, 9(10), 1-27., neste estudo, observou-se que o envolvimento nessas atividades não necessariamente resulta em muitas horas de sono, mas sim em um padrão de realização desequilibrado. Em muitas situações, os adolescentes se envolvem em outras ocupações, como o uso do celular, em momentos que deveriam ser destinados ao sono. Uma revisão de literatura realizada por Oliveira et al. (2019)Oliveira, G., Silva, I. B., & Oliveira, E. R. A. (2019). O sono na adolescência e os fatores associados ao sono inadequado. Revista Brasileira de Pesquisa em Saúde, 21(1), 135-145. http://doi.org/10.21722/rbps.v21i1.26477.
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constatou uma diminuição no número de horas e na qualidade do sono entre os jovens na atualidade, principalmente em decorrência do aumento do uso do celular. A precarização da qualidade do sono repercute na saúde de diferentes maneiras, especialmente no que se refere às questões cognitivas e de humor (Nunes et al., 2021Nunes, P. P. B., Abdon, A. P. V., Brito, C. B., Silva, F. V. M., Santos, I. C. A., Martins, D. Q., Meira, P. M. F., & Frota, M. A. (2021). Factors related to smartphone addiction in adolescents from a region in Northeastern Brazil. Fatores relacionados à dependência do smartphone em adolescentes de uma região do Nordeste brasileiro. Ciencia & Saude Coletiva, 26(7), 2749-2758.).

Retomando a discussão sobre as diferentes perspectivas teóricas a respeito do equilíbrio ocupacional identificadas por Wada et al. (2010)Wada, M., Backman, C. L., & Forwell, S. J. (2010). Theoretical perspectives of balance and the influence of gender ideologies. Journal of Occupational Science, 17(2), 92-103., essas autoras trazem que esse equilíbrio pode ser percebido como a congruência entre as ocupações nas quais nos envolvemos e nossos valores e objetivos pessoais. Nesse sentido, o equilíbrio e o consequente bem-estar se relacionam ao envolvimento em ocupações significativas (mesmo as obrigatórias), que vão ao encontro dos objetivos e da representação de quem se é e de quem quer se tornar. Por outro lado, o desequilíbrio se manifesta quando as relações estabelecidas entre essas ocupações, valores e objetivos não são claras.

Neste estudo, essa perspectiva explica um potencial desequilíbrio ocupacional no envolvimento com a escola pelos adolescentes. Para muitos adolescentes, o espaço escolar foi compreendido como um local de cumprimento de tarefas acadêmicas, sem o entrelaçamento de maiores significados para além da mera captação de conteúdo. Não obstante, concordando com Folha et al. (2018)Folha, D. R. S. C., Araújo, E. V., & Carmo, J. A. (2018). Incorpar e adolescer: o pulsar de um corpo em metamorfose e suas repercussões ocupacionais. Revista Interinstitucional Brasileira de Terapia Ocupacional, 2(2), 357-381., acreditamos na potencialidade do espaço escolar que, abarcando a aquisição de conhecimentos e a construção de habilidades, destina-se também ao enfrentamento das iniquidades vivenciadas para o desenvolvimento humano e o empoderamento cidadão de maneira integral.

Essa reflexão indica a necessidade de novas pesquisas que abordem os significados do envolvimento com a escola de forma mais aprofundada, a fim de compreender como este se relaciona (ou não) aos valores e objetivos pessoais dos adolescentes.

Continuando a reflexão à luz das perspectivas teóricas sobre o equilíbrio ocupacional, a revisão de literatura conduzida por Wada et al. (2010)Wada, M., Backman, C. L., & Forwell, S. J. (2010). Theoretical perspectives of balance and the influence of gender ideologies. Journal of Occupational Science, 17(2), 92-103. identificou estudos que relacionavam a percepção do equilíbrio ao atendimento competente das demandas das ocupações e papéis ocupacionais vivenciados no cotidiano. Nesse sentido, o equilíbrio se dá a partir da percepção do cumprimento de papéis e ocupações construídas no contexto em que se vive, ou seja, constrói-se na relação entre atender aos valores e necessidades pessoais e às demandas do ambiente.

A percepção de não atendimento das demandas e papéis ocupacionais e, consequentemente, a vivência de situações de desequilíbrio ocupacional, fez-se presente no discurso dos adolescentes, principalmente na construção das relações com os pais e em suas interfaces com as outras ocupações. Os adolescentes referem que muito do que fazem no cotidiano, por exemplo, as atividades escolares, não é qualificado pelos pais como suficiente para o que é esperado em relação ao papel de estudante. Tal aspecto está diretamente associado à presença de relações desiguais de poder com os adultos, conforme discutiremos posteriormente.

Por fim, a quarta perspectiva identificada na revisão de literatura de Wada et al. (2010)Wada, M., Backman, C. L., & Forwell, S. J. (2010). Theoretical perspectives of balance and the influence of gender ideologies. Journal of Occupational Science, 17(2), 92-103. entende o equilíbrio como a percepção de harmonia, compatibilidade e controle da participação nas ocupações de uma forma geral. O desequilíbrio se faz presente quando há impossibilidade ou limitações para compatibilizar as diferentes ocupações, considerando tanto os desejos e valores pessoais quanto as exigências contextuais (Wada et al., 2010Wada, M., Backman, C. L., & Forwell, S. J. (2010). Theoretical perspectives of balance and the influence of gender ideologies. Journal of Occupational Science, 17(2), 92-103.). Nesse sentido, os discursos dos adolescentes sobre as relações com os pais novamente denunciam que a falta do diálogo limita, muitas vezes, a possibilidade de construção da autonomia no cotidiano, produzindo assim situações de desequilíbrio ocupacional, por serem, algumas vezes, privados em se envolverem em atividades que são significativas para eles.

Para além de situações de desequilíbrio ocupacional, este estudo identificou vivências de privações ocupacionais, em um cenário de injustiça ocupacional. Por exemplo, analisamos restrições, e até mesmo impossibilidades, de acesso à alimentação de qualidade e ao envolvimento em atividades de lazer promotoras de bem-estar e saúde para os adolescentes. No entanto, as situações de desequilíbrio e privações ocupacionais aqui identificadas não podem ser analisadas de forma simplista, uma vez que envolvem tanto questões subjetivas quanto contextuais que condicionam as escolhas ocupacionais dos adolescentes no cotidiano.

Nesse sentido, os dados refletem ambiguidades na construção das escolhas ocupacionais realizadas pelos adolescentes, uma vez que identificamos “um saber” relacionado às formas de envolvimento ocupacional promotoras de saúde que não se materializam nas práticas cotidianas. Tal situação é exemplificada nas discussões sobre o uso excessivo do celular ou sobre a importância de dormir e se alimentar bem, associados a práticas contrárias a esses conhecimentos.

Dessa forma, Galvaan (2011)Galvaan, R. (2011). Occupational choice: the significance of socio-economic and political factores. In C. Hocking & G. E. Whiteford (Eds.), Occupational Science: Society, Inclusion, Participation (pp. 152-161). New Jersey: Wiley-Blackwell. destaca que as escolhas ocupacionais são uma situação sociocultural, uma vez que, mesmo acontecendo individualmente, são influenciadas por uma variedade de fatores contextuais. Essa autora, em pesquisa com adolescentes na África do Sul, identificou que muitos jovens reproduziam práticas familiares que se configuravam em contextos de injustiça ocupacional vivenciadas ao longo de sua história. É necessário considerar que as razões das escolhas – que são processuais e não pontuais, para além da subjetividade de cada pessoa – são moldadas pela historicidade do contexto de vivência das experiências cotidianas.

Assim, em relação às escolhas ocupacionais, muitos adolescentes podem construí-las atreladas a sua posição social. Embora exista um poder individual de escolha, essas opções podem não se materializar concretamente por causa das circunstâncias de vida (Galvaan, 2011Galvaan, R. (2011). Occupational choice: the significance of socio-economic and political factores. In C. Hocking & G. E. Whiteford (Eds.), Occupational Science: Society, Inclusion, Participation (pp. 152-161). New Jersey: Wiley-Blackwell.). Além disso, conforme também percebido este estudo, essa autora destaca que, em razão das limitações impostas pelas condições históricas, culturais, sociais e econômicas, muitos adolescentes tendem a não questionar pensamentos e decisões, o que os leva a fazer escolhas ocupacionais congruentes aos seus hábitos e realidades.

Essa reflexão aponta para a necessidade de ações educativas que promovam processos de conscientização sobre o envolvimento ocupacional. Segundo Correia (2021), aCorreia, R. L. (2021). Envolvimento ocupacional, analfabetismo urbanístico e interdisciplinaridade: A terapia ocupacional para as cidades pelas ideias da Erminia Maricato. Revista Políticas Públicas & Cidades, 10(1), 57-83. tomada de consciência crítica da vida cotidiana é um processo de tomada de reconhecimento do próprio envolvimento ocupacional, direcionado à construção da justiça ocupacional. Ramugondo et al. (2015)Ramugondo, E. L., Galvaan, R., & Duncan, E. (2015). Occupational Consciousness. Journal of Occupational Science, 22(4), 488-501. PMid:26549984. http://doi.org/10.1080/14427591.2015.1042516
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defendem que a consciência ocupacional possibilita que as pessoas consigam descrever, individual e coletivamente, o seu fazer cotidiano em meio a todas as situações de poder existentes. Neste estudo, identificamos diferentes situações de desigualdade de poder que impactam o envolvimento ocupacional e a percepção de saúde pelos adolescentes, com destaque para as questões de classe socioeconômica, idade e gênero.

O relato de vivências de desigualdade socioeconômicas transversalizou o envolvimento ocupacional como um todo. Em destaque, foi problematizado que a precariedade econômica limita a possibilidade de se ter uma boa alimentação, opções de lazer alternativas ao uso do celular e acesso à educação de qualidade.

Assim como Cassapian & Rechia (2014)Cassapian, M. R., & Rechia, S. (2014). Lazer para todos? Análise de acessibilidade de alguns parques de Curitiba, PR. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 22(1), 25-38., compreendemos que o direito ao lazer não se coloca somente em relação a disponibilidade de tempo para o engajamento, dependendo de outros aspectos como educação e condições de acessibilidade aos espaços públicos necessários para essa vivência.

Nessa mesma direção, Vendrami et al. (2021)Vendrami, L., Oliveira, F., & Tyeko Anami, K. (2021). A desigualdade social e a educação no Brasil: uma revisão de literatura. Metodologias e Aprendizado, 4, 390-398., em uma revisão de literatura relacionada à desigualdade social e seus reflexos no campo educacional, apontam que tanto as escolas públicas como as privadas ofertam vagas; entretanto, problematizam que as oportunidades de acesso educacional não necessariamente acontecem de maneira igualitária pelo fato de o aluno estar matriculado. Na realidade da escola pública no Brasil, é preciso discutir a qualidade do processo de ensino-aprendizado na garantia ao acesso escolar para diminuir o processo de evasão e favorecer a conclusão na faixa etária esperada (Pereira et al., 2021Pereira, B. P., Borba, P. L. O., & Lopes, R. E. (2021). Terapia ocupacional e educação: as proposições de terapeutas ocupacionais na e para a escola no Brasil. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 29, 1-24.).

Além das desigualdades de poder relacionadas à classe social, aquelas decorrentes da idade também se mostraram presentes na configuração das diferentes (im)possibilidades de envolvimento ocupacional, especialmente no que se refere às relações estabelecidas pelos adolescentes com pais, marcadas, na percepção dos participantes deste estudo, pela limitação ou mesmo ausência de diálogo.

Os adolescentes referem que, de uma forma geral, os adultos, especialmente os pais, acreditam que eles apresentam uma capacidade limitada para reflexão e crítica, e são assim seres menos dotados para a decisão, por não terem a experiência de vida dos adultos. É importante refletir que adolescentes apresentam especificidades desenvolvimentais que os colocam em uma situação de maior vulnerabilidade, portanto necessitando de cuidado por parte dos pais e outros adultos significativos no que se refere as suas decisões cotidianas. Os adolescentes desta pesquisa destacam a importância e o desejo por esse cuidado. No entanto, um cuidado que invalida a maior parte das percepções do adolescente se respalda na configuração da sociedade adultocêntrica.

De acordo com Quapper (2015), oQuapper, C. D. (2015). El adultocentrismo como paradigma y sistema de dominio: análisis de la reproducción de imaginarios en la investigación social chilena sobre lo juvenil. Barcelona: Universitat Autònoma de Barcelona. adultocentrismo configura relações de poder desiguais considerando as diferentes fases da vida, sendo que a fase adulta pauta as normativas sociais esperadas e que devem ser aceitas por outras gerações, colocando os adolescentes em uma posição de poder inferior em relação a vida. Essa situação invalida a capacidade para formar pensamentos e comportamentos dos adolescentes, limitando suas opiniões ou as restringindo a padrões socialmente aceitos, por receio da represália dos adultos (Quapper, 2015Quapper, C. D. (2015). El adultocentrismo como paradigma y sistema de dominio: análisis de la reproducción de imaginarios en la investigación social chilena sobre lo juvenil. Barcelona: Universitat Autònoma de Barcelona.; Cavalcante, 2021Cavalcante, E. B. T. (2021). O conceito de adultocentrismo na história: diálogos interdisciplinares. Fronteiras, 23(42), 196-215.).Os adolescentes participantes deste estudo ratificam que a influência dessas relações é algo constantemente presente, provocando conflitos, e diretamente repercutindo negativamente na percepção de sua saúde mental. Refletindo sobre esse aspecto, defendemos que o adolescente não pode ser compreendido somente como a pessoa que ainda virá a ser, abrindo mão da assunção da sua condição de sujeito histórico, tendo suas lutas e transformações negadas. Tal reflexão é corroborada pelas reflexões dos adolescentes sobre o rótulo de que “são o futuro do Brasil”, uma vez que compreendem que o futuro será construído por todas as pessoas, independentemente da idade. Os participantes questionaram o “peso da responsabilidade” atribuída a eles, que todos obriga a estar constantemente se preparando para o futuro.

Como proposto por Freire (2021a)Freire, P. (2021a). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra., enquanto seres humanos, os adolescentes precisam ter oportunidades para protagonizar sua vivência, dentro do seu contexto sociocultural, como produtores deste e de si, sendo assim compreendidos como seres inconclusos, inacabados e, a partir disso, vocacionados para serem mais.

O potencial para ser mais foi expresso pelos adolescentes no processo desta pesquisa, na qual os mesmos abandonaram uma postura inicial de passividade e iniciaram um processo de reflexão mais crítica sobre as atitudes dos adultos. Nesse sentido, houve o reconhecimento de que os responsáveis também erram, que também viveram a adolescência, muitas vezes, com experiências semelhantes à deles, mas em contextos históricos e culturais diversos. Tal percepção abre espaço para a construção do diálogo entre os adolescentes e seus pais enquanto estratégia de enfrentamento do adultocentrismo e, consequentemente, da potencialização do vínculo.

No entanto, a reflexão sobre a carência de diálogo entre adolescentes e pais também precisa considerar que as dificuldades apresentadas pelos pais não podem ser compreendidas de forma descontextualizada das suas próprias histórias de vida. De forma geral, os adolescentes participantes do estudo vivenciam situações de vulnerabilidade social que demarcam a historicidade de suas famílias. Assim, estudos discutem que as relações desenvolvidas entre pais e filhos refletem as relações existentes em consequência de fatores sociais, econômicos, culturais e políticos, entre outros aspectos, que inviabilizam o papel de cuidado dos pais pela existência dessas situações de vulnerabilidade vivenciadas (Brasil, 2017Brasil. (2017). Política Nacional de Promoção da Saúde: PNPS: Anexo I da Portaria de Consolidação nº 2, de 28 de setembro de 2017, que consolida as normas sobre as políticas nacionais de saúde do SUS. Brasília: Ministério da Saúde. Recuperado em 15 de novembro de 2023, de https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_promocao_saude.pdf.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
; Souza et al., 2019Souza, L. B., Panúncio-Pinto, M. P., & Fiorati, R. C. (2019). Crianças e adolescentes em vulnerabilidade social: bem-estar, saúde mental e participação em educação. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 27(2), 251-269. http://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoao1812.
http://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoao18...
; Valério et al., 2020Valério, D. O. S., Oliveira, S. R. P. S., Facundes, V. L. D., Oliveira, M. P. C. A., Silva, V. B. F., & Gontijo, D. T. (2020). O pessoal deveria escutar mais a gente”: relações entre ocupações e saúde na Adolescência. Research. Social Development, 9(10), 1-27.).

Considerando esses aspectos, defendemos o desenvolvimento de ações de educação em saúde que potencializem a construção de espaços dialógicos entre os adolescentes e seus cuidadores. Espaços que, na terapia ocupacional, podem ser mediados por atividades e recursos nos quais pais e filhos se envolvam em ocupações de forma conjunta, que problematizem a realidades por eles vivenciadas em busca não somente de soluções para os problemas e conflitos cotidianos, mas também da potencialização do vínculo, da valorização mútua, do pertencimento familiar, do fazer junto e da criação de “memórias afetivas” que possam contribuir para a percepção de saúde, especialmente a saúde mental.

Por fim, as desigualdades de poder relacionadas ao gênero também se mostraram presentes nas discussões dos grupos, especialmente ao analisar o envolvimento em ocupações relacionadas ao cuidado doméstico, brincar e lazer. Embora de forma menos aprofundada nos discursos, também foi abordada a construção das relações afetivas. Nas problematizações, é mencionado que as meninas recebem maiores atribuições domésticas, enquanto para os meninos têm maior a permissão para sair à rua, onde brincam. Conforme discutem Monteiro et al. (2018)Monteiro, R. J. S., Oliveira, M. P. C. A., Belian, R. B., de Lima, L. S., Santiago, M. E., & Gontijo, D. T. (2018). DECIDIX: encontro da pedagogia Paulo Freire com os serious games no campo da educação em saúde com adolescentes. Ciencia & Saude Coletiva, 23(9), 2951-2962., essas concepções atribuem ao masculino e ao feminino diferentes possibilidades de envolvimento em ocupações, refletindo padrões hegemônicos das relações de gênero em nossa sociedade.

Wada et al. (2010)Wada, M., Backman, C. L., & Forwell, S. J. (2010). Theoretical perspectives of balance and the influence of gender ideologies. Journal of Occupational Science, 17(2), 92-103. discutem as implicações das desigualdades nas relações de gênero para a vivência de situações de desequilíbrio ocupacional considerando as diferentes perspectivas anteriormente apresentadas. Assim, as relações de gênero, que sustentam a construção de papéis socialmente construídos, influenciam tanto a alocação de tempo nas diferentes ocupações quanto a congruência entre estas e os valores pessoais.

As reflexões trazidas aqui destacam a importância de analisar o envolvimento ocupacional e suas relações com a saúde, considerando a realidade vivenciada pelos sujeitos. Essa realidade, muitas vezes marcada pela desigualdade de poder, deve ser abordada no processo de enfrentamento, integrando as ações profissionais voltadas ao público adolescente. Conforme destacam diferentes autores, é necessário compreender que incapacidades e limitações podem surgir por conta da privação de oportunidades ou restrições no engajamento ocupacional desejado, resultantes das barreiras à participação (Hammell, 2017Hammell, K. W. (2017). Critical reflections on occupational justice: toward a rights-based approach to occupational opportunities. Canadian Journal of Occupational Therapy, 84(1), 47-57.). Nesse sentido, a garantia de direitos sociais básicos é primordial para ampliar o repertório disponível para o envolvimento em ocupações como lazer, alimentação, esportes, educação, entre outras que compõem a vida do adolescente.

Considerações Finais

Este estudo possibilitou compreender as inter-relações entre o envolvimento ocupacional e a percepção de saúde na perspectiva de adolescentes. A análise dos dados permitiu identificar o envolvimento dos adolescentes em diferentes ocupações, destacando, pelo impacto na percepção de saúde, as relações com os pais e o uso do celular. Na análise desse envolvimento, foram identificadas situações de desequilíbrio e injustiça ocupacional, associadas a percepções de sofrimento mental relacionadas ao envolvimento ocupacional. Tais situações se configuram no contexto das escolhas ocupacionais feitas pelos adolescentes, que se constroem na intersecção de aspectos subjetivos e na concretude das possibilidades que se materializam (ou não) no cotidiano. Nesse sentido, os dados permitem afirmar que as desigualdades nas relações de poder (classe, idade e gênero) atravessam o viver dos adolescentes com implicações nas percepções de saúde.

No processo de pesquisa, identificamos, como limitação, a ausência de dados quantitativos que possibilitassem a construção de um perfil sociodemográfico mais detalhado dos participantes. No entanto, os relatos dos adolescentes possibilitaram identificar diferentes situações de vulnerabilidade social e injustiça ocupacional, conforme discutido ao longo do texto. Nesse sentido, sugere-se novas pesquisas que se dediquem a aprofundar como as diferentes situações de inequidades de poder se relacionam e se entrecruzam na configuração das possibilidades e impossibilidades para o envolvimento ocupacional no cotidiano da adolescência. Além disso, recomenda-se a ampliação dessas discussões com a inclusão de outros marcadores sociais de diferença como raça/etnia, sexualidade e presença de deficiências.

Assim, com base na experiência vivenciada nesta pesquisa, defendemos a necessidade da construção de uma prática participativa de educação em saúde que garanta o direito à voz e à vez aos adolescentes, e que caminhe na construção de uma consciência crítica sobre o envolvimento ocupacional e as condições de vida vivenciadas, com vistas a favorecer não somente a saúde e o bem-estar, mas também a garantia de direitos, a cidadania e participação social.

  • Como citar:

    Marinho, M. T., Rosas, M. A., Correia, R. L., & Gontijo, D. T. (2024). Inter-relações entre envolvimento ocupacional e percepção de saúde na perspectiva de adolescentes. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 32, e3684. https://doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAO283136841
  • Fonte de Financiamento

    Chamada Universal MCTIC/CNPq n. 28/2018 e Edital n. 08/2021 – Edital PIBEXC de Apoio Financeiro a Programas e Projetos de Extensão da Universidade Federal de Pernambuco.

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Editado por

Editora de seção

Profa. Dra. Adriana Miranda Pimentel

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    15 Nov 2023
  • Revisado
    21 Nov 2023
  • Aceito
    16 Maio 2024
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