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Contribuições do conceito de vulnerabilidade para os estudos sobre HIV/aids e mulheres: uma revisão de escopo da literatura nacional (Brasil)

Contributions of the concept of vulnerability to studies on HIV/AIDS and women: a scoping review of the national literature (Brazil)

Resumo

Introdução:

Introduzido nas interpretações sobre as perspectivas de expansão da epidemia de HIV/aids na década de 1990, o conceito de vulnerabilidade procura articular a dimensão individual de vulnerabilidade ao HIV aos contextos sociais e programáticos, muitas vezes marcados pela desigualdade e injustiça social.

Objetivo:

Analisar os usos da concepção multifatorial (individual, social, programática) da vulnerabilidade nos estudos sobre mulheres e HIV/aids, de 1990 a 2018, publicados no Scielo.

Método:

A partir da revisão de escopo da literatura nacional, 39 estudos selecionados foram classificados quanto ao uso do conceito de vulnerabilidade em: uso consistente, parcial ou inconsistente.

Resultados:

Os principais aspectos associados à vulnerabilidade das mulheres à aids foram: dificuldade de negociação do uso do preservativo, dimensão social e simbólica do casamento e da maternidade, significados diferenciados da sexualidade entre os gêneros e fragilidade dos direitos sexuais e reprodutivos. Observou-se lacunas quanto à articulação dos três componentes do conceito e a escassez de avaliações de intervenções orientadas pelo referencial da vulnerabilidade.

Conclusão:

Os achados indicam o potencial de contribuição do conceito na análise da sindemia entre HIV, desigualdades sociais, raciais, de gênero e demais problemas de saúde, como a pandemia de Covid-19.

Palavras-chave:
HIV; síndrome da imunodeficiência adquirida; vulnerabilidade em saúde; mulheres

Abstract

Background:

Being introduced in the interpretations on the perspectives of the expansion of the HIV/AIDS epidemic in the 1990s, the concept of vulnerability seeks to articulate the individual dimension of vulnerability to HIV to social and programmatic contexts, often marked by inequality and social injustice.

Objective:

The aim of this study was to analyze the uses of the multifactorial conception (individual, social, programmatic) of vulnerability in studies on women and HIV/AIDS, from 1990 to 2018, published in SciELO.

Methods:

From the scoping review of the national literature, 39 selected studies were classified as to the use of the concept of vulnerability in consistent, partial, or inconsistent use.

Results:

The main aspects associated with women's vulnerability to AIDS were difficulty in negotiating condom use, social and symbolic dimension of marriage and motherhood, differentiated meanings of sexuality between genders, and fragility of sexual and reproductive rights. We observed gaps regarding the articulation of the three components of the concept and a scarcity of evaluations of interventions guided by the referential of vulnerability.

Conclusion:

The findings indicate the potential contribution of the concept in the analysis of the syndemic between HIV, social, racial, gender inequalities, and other health problems such as the COVID-19 pandemic.

Keywords:
HIV; acquired immunodeficiency syndrome; health vulnerability; women

INTRODUÇÃO

O conceito de vulnerabilidade tem sido empregado nos estudos sobre assistência social, desastres e saúde pública. Seus usos têm em comum a importância da confluência dos aspectos individuais, sociais, econômicos e políticos na produção da vulnerabilidade. Partem de uma análise de caráter multifatorial, na qual diversos componentes, como fatores culturais, institucionais, geográficos e de acesso à informação são levados em consideração na análise da vulnerabilidade11 Watts MJ, Bohle HG. The space of vulnerability: the causal structure of hunger and famine. Progress in Human Geography. 1993;17(1):43-67. https://doi.org/10.1177/030913259301700103
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No campo sanitário, o conceito ganhou maior visibilidade a partir de seu uso na interpretação da disseminação da aids no contexto global durante a década de 1990. Mann et al.22 Mann J, Tarantola DJM, Netter W, editors. A aids no mundo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará; 1993. tiveram papel central na concepção e divulgação dessa perspectiva. O conceito de vulnerabilidade se contrapôs ao conceito epidemiológico de risco, que ocupou espaço importante nas respostas iniciais à epidemia e fundamentou medidas preventivas individualizantes, apoiadas na noção de "grupo de risco" ou "comportamento de risco". A proposição da análise das condições de vulnerabilidade ao HIV de diferentes grupos possibilitou um novo paradigma para se pensar e intervir nas diversas dimensões da epidemia de HIV/aids33 Delor F, Hubert M. Revisiting the concept of ‘vulnerability’. Soc Sci Med. 2000;50(11):1557-70. https://doi.org/10.1016/s0277-9536(99)00465-7
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Para avaliar a vulnerabilidade à infecção pelo HIV/aids, Mann et al.22 Mann J, Tarantola DJM, Netter W, editors. A aids no mundo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará; 1993. definiram três planos interdependentes: o comportamento pessoal (ou vulnerabilidade individual), o contexto social (ou vulnerabilidade social) e os programas de combate à aids (ou vulnerabilidade programática). Ayres et al.44 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ, Saletti Filho HC. Vulnerabilidade e prevenção em tempos de Aids. In: Barbosa RM, Parker RG, editors. Sexualidades pelo avesso: direitos, identidades e poder. São Paulo: 34; Rio de Janeiro: IMS/UERJ; 1999. p. 49-72., no Brasil, ampliaram o conceito de maneira que o aspecto individual não precedesse a dimensão coletiva da vulnerabilidade. Buscou-se, assim, estabelecer que a resposta à epidemia deve ser uma "resposta social", com preceitos baseados em valores solidários e participação ativa da sociedade. Reitera-se, ainda, a importância desse referencial no que tange a sua relação com a produção da cidadania e dos direitos humanos.

Nessa direção, cabe notar que, para além de análises acadêmicas, o conceito de vulnerabilidade foi incorporado em algumas diretrizes de políticas públicas de enfrentamento do HIV, como o Plano Integrado de Enfrentamento da Feminização do HIV/aids e outras DST (PIEFA). Lançado em 2007 pelo então Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais (DDAHV) do Ministério da Saúde, o PIEFA reconhece que as relações desiguais de poder entre homens e mulheres são aspectos fundamentais a serem considerados na análise das vulnerabilidades individual e social das mulheres.

Diante das contribuições trazidas pela concepção multifatorial (individual, social e programática) da vulnerabilidade ao HIV, presente há cerca de três décadas no campo acadêmico e político, este trabalho analisa os usos desse conceito na produção científica brasileira sobre mulheres e HIV/aids. Trata-se de uma revisão de escopo da literatura nacional que, ao abranger o período de 1990 a 2018, possibilita uma análise acerca das contribuições desse quadro conceitual. O exame dos usos do conceito de vulnerabilidade ao HIV pode igualmente fomentar reflexões sobre a pertinência desse referencial para a compreensão de outros problemas de saúde, como a pandemia de Covid-19.

MÉTODO

Dado que o conceito de vulnerabilidade pode ser utilizado em múltiplos campos disciplinares, a partir de diferentes concepções, optou-se por eleger uma perspectiva de vulnerabilidade como referencial de análise, funcionando como um conceito do tipo ideal, embasado na perspectiva weberiana. Para Weber et al.55 Weber M, Dutra W, Gerth HH, Mills CW, Cardoso FH. Ensaios de sociologia. Rio de Janeiro: LTC; 1982., o tipo ideal é um instrumento de análise da realidade, em que a subjetividade do sociólogo é levada em consideração na formulação do tipo ideal, orientando o pesquisador em suas análises66 Moraes LFR de, Maestro Filho AD, Dias DV. O paradigma weberiano da ação social: um ensaio sobre a compreensão do sentido, a criação de tipos ideais e suas aplicações na teoria organizacional. Rev Adm Contemp. 2003;7(2):57-71. https://doi.org/10.1590/S1415-65552003000200004
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Utilizamos a definição de conceito do tipo ideal de vulnerabilidade com base na descrição proposta por Mann et al.22 Mann J, Tarantola DJM, Netter W, editors. A aids no mundo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará; 1993., ampliada por Ayres et al.77 Ayres JRCM, França I, Junqueira G, Saletti HC. O conceito de vulnerabilidade e as práticas em Saúde. Novas perspectivas e desafios. In: Czeresnia D, Machado C, editors. Promoção da Saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2009. p. 121-43., caracterizado pela análise das dimensões individual, social e programática ao HIV. Segundo essa perspectiva, a vulnerabilidade individual ao HIV parte de três pressupostos: todo indivíduo, em um nível biológico, é, em algum grau, vulnerável à infecção pelo HIV se exposto ao vírus e, assim, está suscetível à morbidade, se lhe for negada a assistência adequada. Além do biológico, é necessário levar em consideração a comunidade, os indivíduos-chave (família, amigos), aspectos culturais e o fato de o comportamento individual não ser fixo, podendo variar durante a vida22 Mann J, Tarantola DJM, Netter W, editors. A aids no mundo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará; 1993.,88 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ. Saúde Reprodutiva em Tempos de AIDS (II Seminário). In: AIDS, vulnerabilidade e prevenção. Rio de Janeiro: ABIA; 1997. p. 32-34.,99 Bastos FI. A feminização da epidemia de AIDS no Brasil: determinantes estruturais e alternativas de enfrentamento. Coleção ABIA – Saúde Sexual e Reprodutiva. 2000;3:1-27..

A compreensão dos contextos de vulnerabilidade social engloba a análise do estigma e da violação de direitos humanos, dos fatores que contribuem para a manutenção das desigualdades socioeconômicas, étnico/raciais e entre os gêneros e reitera que o enfrentamento à epidemia não se restringe à adesão ao campo biomédico do tratamento88 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ. Saúde Reprodutiva em Tempos de AIDS (II Seminário). In: AIDS, vulnerabilidade e prevenção. Rio de Janeiro: ABIA; 1997. p. 32-34.,1010 Parker R, Galvão J, Pedrosa JS. A Aids no mundo. Rio de Janeiro: Abia; 1993.,1111 López LC. Uma Análise das Políticas de Enfrentamento ao HIV/Aids na Perspectiva da Interseccionalidade de Raça e Gênero. Saúde Soc. 2011;20(3):590-603. https://doi.org/10.1590/S0104-12902011000300006
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O plano programático da avaliação de vulnerabilidade diz respeito às políticas de enfrentamento ao HIV, observando as respostas às demandas de prevenção e tratamento, a conformidade da execução dos programas implementados, os recursos financeiros disponibilizados, entre outros. Atua como um aglutinador de informações e de recursos materiais e como um catalisador das necessidades e contradições socialmente postas88 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ. Saúde Reprodutiva em Tempos de AIDS (II Seminário). In: AIDS, vulnerabilidade e prevenção. Rio de Janeiro: ABIA; 1997. p. 32-34.,1212 Feliciano KV de O, Kovacs MH. Vulnerabilidade programática na prevenção da transmissão materno-fetal da AIDS. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2002;2(2):157-65. https://doi.org/10.1590/S1519-38292002000200008
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O conceito do tipo ideal de vulnerabilidade compreende que o modelo neoliberal de sociedade produz a precarização da vida, de maneira que não traz apenas a erosão material. Ao propor a ideia egoísta do consumo, dilui a identidade cultural dos povos e prega o individualismo, causando a deterioração das organizações coletivas e da solidariedade. Essa análise se alinha com as práticas e os saberes da saúde coletiva no continente latino-americano e com o pensamento brasileiro1313 Santos M. O território e o saber local: algumas categorias de análise. Cadernos IPPUR. 1999;13(2):15-26.1515 Breilh J, Ribeiro V, Castiel LD. Epidemiologia crítica ciência emancipadora e interculturalidade. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2006..

A análise da produção acadêmica sobre o uso do conceito de vulnerabilidade foi realizada a partir da revisão de escopo, que permite uma visão geral e abrangente da literatura disponível. Tal enfoque tem o propósito de mapear conceitos que sustentam determinada área de pesquisa, podendo identificar lacunas nos campos do conhecimento e elucidar conceitos-chave1616 Grant MJ, Booth A. A typology of reviews: an analysis of 14 review types and associated methodologies. Health Info Libr J. 2009;26(2):91-108. https://doi.org/10.1111/j.1471-1842.2009.00848.x
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,1717 Peters MDJ, Godfrey CM, Khalil H, McInerney P, Parker D, Soares CB. Guidance for conducting systematic scoping reviews. Int J Evid Based Healthc. 2015;13(3):141-6. https://doi.org/10.1097/xeb.0000000000000050
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O levantamento bibliográfico foi feito no portal Scielo, considerando que essa base de dados indexa grande parte da produção brasileira no campo da saúde. O recorte temporal foi definido de maneira automática pela busca, sendo 1990 a data do estudo mais antigo e 2018 a data final. A estratégia de busca incluiu trabalhos que tinham a palavra "vulnerabilidade" no título, no resumo e/ou no texto para abranger estudos que fizeram uso desse quadro teórico.

Visando contemplar diferentes categorias identitárias de mulheres, na primeira etapa do levantamento foram realizadas seis buscas: HIV OR Aids AND Lésbicas AND Vulnerabilidade; HIV OR Aids AND Jovens AND Vulnerabilidade; HIV OR Aids AND Prostitutas AND Vulnerabilidade; HIV OR Aids AND Profissionais do sexo AND Vulnerabilidade; HIV OR Aids AND Gestantes AND Vulnerabilidade e HIV OR Aids AND Mulheres AND Vulnerabilidade.

Foram excluídos da amostra estudos que não se enquadravam nos seguintes critérios: não publicados no Brasil ou cujo campo da pesquisa não era no país (n=15); o HIV não era o objeto central, representando um resultado secundário (n=12); e com população apenas de homens (n=10), profissionais de saúde (n=6) ou mulheres trans (n=1). Embora o termo "mulheres" estivesse presente em todas as estratégias de busca, foram encontrados artigos que investigaram apenas homens. Dadas as especificidades das trajetórias das mulheres trans na conformação da transição de gênero e na vulnerabilidade ao HIV, essa população não foi incluída na revisão. Após a aplicação desses critérios, restaram 80 estudos para análise, não sendo necessária a definição de critérios de inclusão.

A segunda etapa consistiu na leitura integral dos 80 artigos e a classificação segundo população, local do estudo, ano de publicação, abordagem metodológica e temática. Tal leitura revelou que os estudos com mulheres e demais grupos populacionais (homens, jovens, idosos) não focalizavam a vulnerabilidade ao HIV e a condição feminina. Portanto, optou-se por selecionar os 39 artigos com a população apenas de mulheres.

Na terceira etapa foi feita a leitura sobre o uso do conceito de vulnerabilidade entre os 39 artigos, orientada pelas questões: como o conceito de vulnerabilidade foi descrito no texto? Quais autores são referidos para fundamentar a descrição conceitual? Quais das três dimensões de vulnerabilidade (individual, social e/ou programática) foram abordadas? Como se deu a operacionalização dessas dimensões? Como os autores explicaram a vulnerabilidade das mulheres? Partindo dessa análise, os estudos foram categorizados de acordo com os seguintes critérios:

  • Uso consistente: estudos nos quais no mínimo um dos três componentes (individual, social e programático) do quadro conceitual de vulnerabilidade foi utilizado como ferramenta analítica na interpretação dos resultados empíricos, de maneira coerente com o referencial do conceito do tipo ideal descrito;

  • Uso parcial: estudos que, embora conceituem a vulnerabilidade de maneira coerente, não utilizaram a vulnerabilidade como ferramenta analítica na análise de seus resultados. Também foi considerado como uso parcial aqueles estudos em que o conceito foi referido apenas como apoio teórico para construir a narrativa da epidemia ou para justificar a formulação de políticas de caráter focalizado;

  • Uso inconsistente: estudos que não diferenciaram a vulnerabilidade do conceito epidemiológico de risco; que citaram a palavra de maneira genérica, dissociada de uma definição conceitual; ou aqueles que aplicaram o conceito de maneira incoerente com o referencial teórico adotado neste trabalho.

As etapas da revisão são descritas no fluxograma da Figura 1.

Figura 1
Fluxograma do processo de busca, seleção e classificação dos resumos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Estudos com mulheres e demais grupos populacionais

No universo dos 80 artigos, foram classificadas 17 populações exclusivamente de mulheres, como: mulheres negras, quilombolas, prostitutas, usuárias de drogas, lésbicas; mulheres que fazem sexo com mulheres (MSM), idosas, gestantes, entre outras. No conjunto de artigos com população não exclusiva de mulheres, a maior parte (n=12) é composta por "adolescentes e/ou jovens", sugerindo a busca da apreensão da vulnerabilidade nesse segmento populacional.

Quanto às temáticas, foram identificadas 14 na produção científica com populações apenas de mulheres e 15 nos artigos que abrangeram as demais populações. Nota-se a relevância de temas sobre a dimensão social da vulnerabilidade, como as desigualdades de raça/gênero, estigma, pobreza/desigualdade, violência, direitos sexuais e reprodutivos, gênero e/ou sexualidade. No âmbito da dimensão programática, os temas foram escassos e enfatizavam a prevenção da transmissão vertical do HIV no âmbito das políticas de saúde da mulher. O componente individual não teve destaque entre as temáticas, embora esteja presente no escopo dos estudos que abordam as demais dimensões.

Em referência ao ano de publicação, observa-se um vazio de estudos sobre a temática HIV/aids e mulheres durante toda a década de 1990. A partir de 1999, nota-se um aumento na produção científica acerca desse assunto, que coincide com o período de deslocamento do olhar sobre a epidemia pela lógica dos "grupos de risco" e com a normatização da profilaxia da transmissão vertical do HIV, centrada na testagem das gestantes no pré-natal ou parto. Há um novo aumento a partir de 2007, ano de publicação do PIEFA1818 Brasil. Ministério da Saúde. Plano Integrado de Enfrentamento da Feminização da Epidemia de aids e outras DST. Brasília: Ministério da Saúde; 2007.,1919 Brasil. Ministério da Saúde. Plano Integrado de Enfrentamento da Feminização da Epidemia de aids e outras DST (versão revisada). Brasília: Ministério da Saúde; 2009..

Quanto aos métodos, foram utilizadas abordagens quantitativas (n=33) ou qualitativas (n=30), mas a maioria dos estudos exclusivos com mulheres usava entrevistas com roteiros semiestruturados. Nenhum trabalho foi realizado na região Norte; a maioria se concentra na região Nordeste (n=19) e Sudeste (n=25), que responde pela maior concentração de instituições de pesquisa e de ensino superior e de onde a epidemia de HIV se disseminou para o resto do país.

Usos do conceito de vulnerabilidade

Em relação à identificação do uso do conceito de vulnerabilidade entre os 39 artigos com população apenas de mulheres, 8 foram classificados como uso inconsistente. São trabalhos mais antigos — 5 publicados entre 1999 e 2003 —, nos quais prevalece a noção de comportamentos de risco. O conceito de vulnerabilidade aparece vazio do sentido aqui referenciado e do seu potencial para a interpretação da epidemia de aids. Dois estudos2020 Silveira MF, Béria JU, Horta BL, Tomasi E. Autopercepção de vulnerabilidade às doenças sexualmente transmissíveis e Aids em mulheres. Rev Saúde Pública. 2002;36(6):670-7. https://doi.org/10.1590/S0034-89102002000700003
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,2121 Alves RN, Kovács MJ, Stall R, Paiva V. Fatores psicossociais e a infecção por HIV em mulheres, Maringá, PR. Rev Saúde Pública. 2002;36(4 Suppl.):32-9. https://doi.org/10.1590/S0034-89102002000500006
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datam de 2002 e não diferenciam a concepção de vulnerabilidade do conceito epidemiológico de risco. Convém reconhecer que a apropriação de novos conceitos requer tempo para se fazer presente de maneira consistente ou mesmo crítica.

Nove artigos usaram de forma parcial o conceito de vulnerabilidade. Em alguns casos, a intenção dos autores foi utilizar o aporte teórico da concepção de vulnerabilidade para contextualizar e embasar suas pesquisas, com o propósito de avançar na compreensão da epidemia, diante do reducionismo das noções de grupo/comportamento de risco. Nesses estudos o objetivo não era a compreensão da vulnerabilidade — o que não invalida o reconhecimento da relevância do referencial teórico-metodológico. Por tal enfoque não priorizar a vulnerabilidade na interpretação dos resultados, o uso do conceito foi considerado parcial. Por exemplo, cinco artigos2222 Mora CM, Monteiro S. Homoerotismo feminino, juventude e vulnerabilidade às DSTs/Aids. Rev Estud Fem. 2013;21(3):905-26. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2013000300008
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2626 Feliciano KV de O, Kovacs MH. As necessidades comunicacionais das práticas educativas na prevenção da transmissão materno-fetal do HIV. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2003;3(4):393-400. https://doi.org/10.1590/S1519-38292003000400004
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abordam o poder desigual entre homens e mulheres como: a imposição da heterossexualidade reprodutiva; o papel social do amor romântico na modernidade; e a dificuldade de negociação do uso do preservativo por parte das mulheres. A despeito de procurar compreender a interação entre o sujeito e o contexto, refletindo acerca dos fatores imbricados na constituição do sistema de desigualdades de gênero como facilitadores da exposição das mulheres ao HIV, esses trabalhos não estabelecem uma relação com o conceito de vulnerabilidade em si na análise dos resultados.

Ainda entre os estudos classificados como uso parcial, foi identificada uma apropriação do conceito para justificar a criação de políticas focalizadas para segmentos populacionais definidos como vulneráveis ao HIV2727 Silva CM da, Alves R de S, Santos TS dos, Bragagnollo GR, Tavares CM, Santos AAP dos. Epidemiological overview of HIV/AIDS in pregnant women from a state of northeastern Brazil. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl. 1):568-76. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0495
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,2828 Trigueiro DRSG, Almeida SA de, Monroe AA, Costa GPO, Bezerra VP, Nogueira J de A. AIDS and jail: social representations of women in freedom deprivation situations. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(4):554-61. https://doi.org/10.1590/S0080-623420160000500003
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. Na perspectiva do tipo ideal do conceito, o exame das condições de vulnerabilidade deve envolver a construção de práticas e políticas públicas e sociais que caminhem na direção da emancipação dos sujeitos e na construção de mudanças estruturais.

Dos 39 artigos, 22 utilizaram de modo consistente o conceito de vulnerabilidade, todos a partir de 2007. Parte desse grupo não definiu de maneira expressa o conceito de vulnerabilidade, mas seu aporte teórico foi acionado de forma consistente como ferramenta analítica. Tal enfoque se faz presente na caracterização dos contextos sociais nos quais os sujeitos estão inseridos e na interpretação do material empírico acerca das trajetórias sociais dos indivíduos e suas interações. Foram consideradas as dimensões de gênero, cor/raça, classe e orientação sexual, entre outros aspectos, como contextos de violência e divisão sexual do trabalho. A Tabela 1 sintetiza os dados dos 22 artigos.

Tabela 1
Descrição dos 22 artigos analisados como consistentes quanto a título, autor(es), periódico, ano de publicação, população estudada e categoria temática. Brasil, 2021.

Nos 22 artigos, foi observado que os autores acionaram os fundamentos teóricos do conceito de vulnerabilidade de maneiras diversas. Parte dos estudos, em uma contextualização histórica, apontam que inicialmente utilizava-se a perspectiva estigmatizante de grupos e comportamentos de risco e, posteriormente, buscou-se atualizar a interpretação ao incorporar o quadro conceitual de vulnerabilidade. Outros estudos justificaram as vantagens do uso do conceito ao considerar a interação entre os comportamentos dos sujeitos com o contexto social. O caráter multidimensional do conceito, que se propõe a compreender a evolução da aids por ângulos diversos, considerando as várias possibilidades de interação com os fatores socioeconômicos, culturais, institucionais, geográficos e de acesso à informação, foi outro aspecto apontado.

Os referenciais teóricos mobilizados para alicerçar as definições do conceito de vulnerabilidade apresentaram poucas variações em termos de citações bibliográficas. Predominaram referências à produção tanto de pesquisadores brasileiros, como José Ricardo Ayres e colaboradores, quanto internacionais, como Jonathan Mann. Tais achados sugerem que o campo científico nacional tem se apoiado nas reflexões do conceito do tipo ideal de vulnerabilidade para interpretar dados da realidade sobre HIV/aids. Segundo Ayres et al.2929 Ayres JR, Castellanos MEP, Baptista TW de F. Entrevista com José Ricardo Ayres. Saúde Soc. 2018;27(1):51-60. https://doi.org/10.1590/S0104-12902018000002
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, ao ser desenvolvido no Brasil, o conceito foi atualizado, incorporando peculiaridades da conjuntura local e da tradição crítica dentro do campo da saúde coletiva, relativo ao contexto político de redemocratização, favorecedor de uma ampla mobilização social. Compreender a produção de situações de vulnerabilidade por meio das relações — considerando que a estrutura está incutida na ação social, e não sob a lógica de que há pessoas que são "naturalmente" negligenciadas — é tornar relevante a capacidade de permeabilidade que o quadro conceitual em questão propõe, para o entendimento das demandas de saúde, ressaltando que não são contextos cristalizados.

Na produção analisada, as três dimensões da vulnerabilidade (individual, programática e social) assumiram destaques e aprofundamentos variados. Alguns estudos3030 Almeida G. Argumentos em torno da possibilidade de infecção por DST e Aids entre mulheres que se autodefinem como lésbicas. Physis. 2009;19(2):301-31. https://doi.org/10.1590/S0103-73312009000200004
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3535 Oliveira JF de, Paiva MS. Vulnerabilidade de mulheres usuárias de drogas ao HIV/AIDS em uma perspectiva de gênero. Esc Anna Nery. 2007;11(4):625-31. https://doi.org/10.1590/S1414-81452007000400011
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ressaltaram determinadas características biológicas para explicar a maior vulnerabilidade individual das mulheres ao HIV. Nessa direção, foram referidos: infecções genitais assintomáticas mais comuns entre mulheres; e o fato de a anatomia feminina ser mais propensa à infecção e de a carga viral presente no esperma ser maior, quando comparada ao líquido vaginal. Tais aspectos foram correlacionados a fatores de ordem comportamental e social, tais como: a troca de fluidos corporais e o contato com sangue menstrual sem proteção entre lésbicas/MSM; o não uso do preservativo; a multiplicidade de parceiros; as práticas sexuais inseguras, devido ao uso de drogas ou à baixa autopercepção de vulnerabilidade. A articulação entre fatores biológicos, comportamentais e sociais aponta para o uso do caráter multidimensional do conceito de vulnerabilidade.

As abordagens acerca do componente da vulnerabilidade programática da população feminina ao HIV evidenciaram problemas relacionados ao serviço, como o tratamento diferenciado dado às mulheres negras em comparação às brancas e a não incorporação de demandas socioculturais pelo serviço de saúde. O racismo institucional foi igualmente evidenciado como produtor de vulnerabilidade, reiterando a necessidade de mudanças estruturais no enfrentamento da epidemia, sem abandonar o horizonte dos direitos humanos3232 Santos NJS. Mulher e negra: dupla vulnerabilidade às DST/HIV/aids. Saúde Soc. 2016;25(3):602-18. https://doi.org/10.1590/S0104-129020162627
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,3434 Albuquerque VS, Moço ET-SM, Batista CS. Mulheres Negras e HIV: determinantes de vulnerabilidade na região serrana do estado do Rio de Janeiro. Saúde Soc. 2010;19(suppl. 2):63-74. https://doi.org/10.1590/S0104-12902010000600007
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,3636 Riscado JL de S, Oliveira MAB de, Brito ÂMBB de. Vivenciando o racismo e a violência: um estudo sobre as vulnerabilidades da mulher negra e a busca de prevenção do HIV/aids em comunidades remanescentes de Quilombos, em Alagoas. Saúde Soc. 2010;19(suppl. 2):96-108. https://doi.org/10.1590/S0104-12902010000600010
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. Foram referidos os limites das políticas de saúde para as mulheres, centradas na prevenção da transmissão vertical do HIV, por meio da testagem durante o pré-natal e o parto, explicitando lacunas quanto ao debate dos direitos sexuais e reprodutivos no contexto da aids3030 Almeida G. Argumentos em torno da possibilidade de infecção por DST e Aids entre mulheres que se autodefinem como lésbicas. Physis. 2009;19(2):301-31. https://doi.org/10.1590/S0103-73312009000200004
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,3131 Taquette SR, Rodrigues A de O, Bortolotti LR. Infecção pelo HIV em adolescentes do sexo feminino: um estudo qualitativo. Rev Panam Salud Publica. 2015;37(4-5):324-9.,3737 Leite GS, Murray L, Lenz F. The Peer and Non-peer: the potential of risk management for HIV prevention in contexts of prostitution. Rev Bras Epidemiol. 2015;18(suppl. 1):7-25. https://doi.org/10.1590/1809-4503201500050003
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. Outro desafio de ordem programática apontado diz respeito à formação dos profissionais de saúde, orientada por aspectos biomédicos. Isso se reflete na ausência do debate sobre a sexualidade das mulheres nas ações e nos serviços de saúde, principalmente quando se trata de idosas e de lésbicas/MSM3838 Botti ML, Waidman MAP, Marcon SS, Scochi MJ. Conflitos e sentimentos de mulheres portadoras de HIV/AIDS: um estudo bibliográfico. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(1):79-86. https://doi.org/10.1590/S0080-62342009000100010
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.

O componente social da vulnerabilidade foi acionado em quase todos os 22 artigos, por vezes em associação com os componentes individual e/ou programático. Esse dado revela a insuficiência dos aspectos individuais para justificar a disseminação da aids entre as mulheres. Como tendência, esse grupo de estudos argumenta que a vulnerabilidade das mulheres ao HIV/aids é resultado de condições suscitadas pelas desigualdades sociais e de gênero. Como aspectos sociais amplamente acionados para justificar a vulnerabilidade das mulheres foram referidos: a dificuldade de negociação do uso do preservativo com o parceiro; o peso do valor social do casamento e da maternidade; e a função social do amor e da concepção de família. Tais aspectos, por vezes, são articulados aos contextos de violência, de relações precárias de trabalho, pobreza, estigma do HIV e racismo, assim como a fatores programáticos, como a testagem anti-HIV centrada no pré-natal.

O conceito de vulnerabilidade dialoga com o de interseccionalidade, visto que ambos compartilham o caráter multidimensional de análise na compreensão das práticas sociais. Inicialmente cunhada por Crenshaw3939 Crenshaw K. Demarginalizing the Intersection of Race and Sex: A Black Feminist Critique of Antidiscrimination Doctrine, Feminist Theory, and Antiracist Politics. Chicago: University of Chicago Legal Forum; 1989., a concepção de interseccionalidade procura analisar os efeitos da interação de múltiplas estruturas e sistemas de opressão, associadas às hierarquias sociais, raciais, de gênero, entre outras, no delineamento das trajetórias dos indivíduos.

A proposta de refletir sobre a multiplicidade de fatores que permeiam o social, presente na interseccionalidade1111 López LC. Uma Análise das Políticas de Enfrentamento ao HIV/Aids na Perspectiva da Interseccionalidade de Raça e Gênero. Saúde Soc. 2011;20(3):590-603. https://doi.org/10.1590/S0104-12902011000300006
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, converge com o exame das condições de vulnerabilidade ao HIV informado pelo entrecruzamento de diversos eixos de opressão. Tal enfoque é identificado em alguns estudos3232 Santos NJS. Mulher e negra: dupla vulnerabilidade às DST/HIV/aids. Saúde Soc. 2016;25(3):602-18. https://doi.org/10.1590/S0104-129020162627
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,3434 Albuquerque VS, Moço ET-SM, Batista CS. Mulheres Negras e HIV: determinantes de vulnerabilidade na região serrana do estado do Rio de Janeiro. Saúde Soc. 2010;19(suppl. 2):63-74. https://doi.org/10.1590/S0104-12902010000600007
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,3636 Riscado JL de S, Oliveira MAB de, Brito ÂMBB de. Vivenciando o racismo e a violência: um estudo sobre as vulnerabilidades da mulher negra e a busca de prevenção do HIV/aids em comunidades remanescentes de Quilombos, em Alagoas. Saúde Soc. 2010;19(suppl. 2):96-108. https://doi.org/10.1590/S0104-12902010000600010
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,4040 Pinho A de A, Cabral C da S, Barbosa RM. Diferenças e similaridades entre mulheres que vivem e não vivem com HIV: aportes do estudo GENIH para a atenção à saúde sexual e reprodutiva. Cad Saúde Pública. 2017;33(12):e00057916. https://doi.org/10.1590/0102-311X00057916
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,4141 Carvalhaes FF de, Teixeira Filho FS. Histórias de vida de mulheres HIV+ ativistas: mudanças e permanências. Rev Estud Fem. 2012;20(2):377-98. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2012000200003
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, que relataram contextos de violência como ponto relevante na constituição de uma situação de vulnerabilidade. A violência pode ser física ou simbólica, atrelada ao gênero e ao recorte social, sendo em todos os casos um fator que localiza os sujeitos em situação de desvantagem. Três desses estudos3232 Santos NJS. Mulher e negra: dupla vulnerabilidade às DST/HIV/aids. Saúde Soc. 2016;25(3):602-18. https://doi.org/10.1590/S0104-129020162627
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,3434 Albuquerque VS, Moço ET-SM, Batista CS. Mulheres Negras e HIV: determinantes de vulnerabilidade na região serrana do estado do Rio de Janeiro. Saúde Soc. 2010;19(suppl. 2):63-74. https://doi.org/10.1590/S0104-12902010000600007
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,3636 Riscado JL de S, Oliveira MAB de, Brito ÂMBB de. Vivenciando o racismo e a violência: um estudo sobre as vulnerabilidades da mulher negra e a busca de prevenção do HIV/aids em comunidades remanescentes de Quilombos, em Alagoas. Saúde Soc. 2010;19(suppl. 2):96-108. https://doi.org/10.1590/S0104-12902010000600010
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abordam a temática do racismo e das desigualdades étnico-raciais especificamente de mulheres negras, evidenciando o entrelaçamento entre os fatores raciais e de gênero, que produzem um acúmulo de desvantagens sociais3232 Santos NJS. Mulher e negra: dupla vulnerabilidade às DST/HIV/aids. Saúde Soc. 2016;25(3):602-18. https://doi.org/10.1590/S0104-129020162627
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.

Uma justificativa recorrente da vulnerabilidade das mulheres ao HIV refere-se às diferenças dos papéis sociais de gênero e sexualidade entre homens e mulheres e o recorte geracional4242 Silva CM, Lopes FM do VM, Vargens OM da C. A vulnerabilidade da mulher idosa em relação à AIDS. Rev Gaúcha Enferm. 2010;31(3):450-7. https://doi.org/10.1590/S1983-14472010000300007
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4444 Sousa M da CP de, Espírito Santo ACG do, Motta SKA. Gênero, vulnerabilidade das mulheres ao HIV/Aids e ações de prevenção em bairro da periferia de Teresina, Piauí, Brasil. Saúde Soc. 2008;17(2):58-68. https://doi.org/10.1590/S0104-12902008000200007
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. Estes se cruzam com a ausência de direitos sexuais e reprodutivos e com as políticas preventivas focalizadas na função reprodutiva. Assim, é demonstrado como a sexualidade das mulheres é reduzida à função reprodutiva, enquanto entre os homens o lugar da sexualidade é vinculado ao poder e reafirmação da masculinidade.

Alguns autores3030 Almeida G. Argumentos em torno da possibilidade de infecção por DST e Aids entre mulheres que se autodefinem como lésbicas. Physis. 2009;19(2):301-31. https://doi.org/10.1590/S0103-73312009000200004
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,4242 Silva CM, Lopes FM do VM, Vargens OM da C. A vulnerabilidade da mulher idosa em relação à AIDS. Rev Gaúcha Enferm. 2010;31(3):450-7. https://doi.org/10.1590/S1983-14472010000300007
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,4444 Sousa M da CP de, Espírito Santo ACG do, Motta SKA. Gênero, vulnerabilidade das mulheres ao HIV/Aids e ações de prevenção em bairro da periferia de Teresina, Piauí, Brasil. Saúde Soc. 2008;17(2):58-68. https://doi.org/10.1590/S0104-12902008000200007
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relacionam o incremento da vulnerabilidade feminina ao fato de as políticas de saúde das mulheres serem centradas na reprodução, excluindo a abordagem da dimensão sociocultural da sexualidade entre os diferentes segmentos populacionais de mulheres. Ainda que tenham ocorrido avanços para se considerar aspectos sócio-históricos na compreensão das necessidades de saúde das mulheres, como o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), em 1983, seus objetivos permaneceram concentrados nos problemas de saúde decorrentes da atividade sexual e reprodutiva da mulher4545 Osis MJMD. Paism: um marco na abordagem da saúde reprodutiva no Brasil. Cad Saúde Pública. 1998;14(suppl. 1):S25-32. https://doi.org/10.1590/S0102-311X1998000500011
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.

Apenas em 2004, com a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PNAISM), buscou-se avançar nas demandas da população feminina, sendo incluídas as contribuições dos movimentos de mulheres, de mulheres negras, trabalhadoras rurais, entre outras. A PNAISM destaca que as principais propostas para a saúde da mulher estão centradas nos aspectos sexuais e reprodutivos em detrimento de outros fatores constituintes do cotidiano das mulheres, como a violência doméstica e a maior participação no mercado de trabalho4646 Souto KMB. A Política de Atenção Integral à Saúde da Mulher: uma análise de integralidade e gênero. SER Social. 2008;10(22):161-82. https://doi.org/10.26512/ser_social.v10i22.12950
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. O PIEFA resgatou parte dessas reivindicações ao propor ações estratégicas voltadas aos fatores e contextos mais importantes de produção e de superação de vulnerabilidades, como as Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), a violência doméstica e sexual, as desigualdades étnico-raciais, a epidemia de HIV entre jovens, a pobreza, o abuso de drogas e o estigma e a violação de direitos1818 Brasil. Ministério da Saúde. Plano Integrado de Enfrentamento da Feminização da Epidemia de aids e outras DST. Brasília: Ministério da Saúde; 2007.,1919 Brasil. Ministério da Saúde. Plano Integrado de Enfrentamento da Feminização da Epidemia de aids e outras DST (versão revisada). Brasília: Ministério da Saúde; 2009..

Os papéis desempenhados pelo amor romântico e pelo casamento na modernidade também são constituintes da desigualdade de gênero e funcionam como componentes da vulnerabilidade das mulheres ao HIV, conforme apontado pelos estudos. Embora o estigma atrelado à epidemia perpetue um imaginário social, que relaciona múltiplas parcerias ao HIV, a função protetiva conferida ao casamento e à monogamia maculam a autopercepção de vulnerabilidade e dificultam a adoção de práticas preventivas entre casais4747 Sousa RMRB, Frota MMA, Castro C, Sousa FB, Kendall BC, Kerr LRFS. Prostituição, HIV/Aids e vulnerabilidades: a "cama da casa" e a "cama da rua". Cad Saúde Coletiva. 2017;25(4):423-8. https://doi.org/10.1590/1414-462X201700040242
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.

Frente às importantes desigualdades sociais no Brasil, aspectos de ordem econômica e fatores sobre relações de trabalho foram apontados como elementos explicativos da constituição da vulnerabilidade das mulheres ao HIV3131 Taquette SR, Rodrigues A de O, Bortolotti LR. Infecção pelo HIV em adolescentes do sexo feminino: um estudo qualitativo. Rev Panam Salud Publica. 2015;37(4-5):324-9.,4141 Carvalhaes FF de, Teixeira Filho FS. Histórias de vida de mulheres HIV+ ativistas: mudanças e permanências. Rev Estud Fem. 2012;20(2):377-98. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2012000200003
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,4848 Miranda-Ribeiro P, Simão AB, Caetano AJ, Lacerda MA, Torres ME de A e. Perfis de Vulnerabilidade Feminina ao HIV/aids em Belo Horizonte e Recife: comparando brancas e negras. Saúde Soc. 2010;19(suppl. 2):21-35. https://doi.org/10.1590/S0104-12902010000600004
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. O avanço de políticas neoliberais, que agudizam as disparidades econômicas e sociais, impacta de modo desproporcional a vida das mulheres, contribuindo para a feminização da pobreza. Há uma conexão entre pobreza e vulnerabilidade à aids, pois tais contextos contribuem para movimentos migratórios, troca de trabalho sexual por dinheiro e falta de acesso a serviços e insumos de prevenção, perfazendo situações que impulsionam a epidemia4949 Parker R, Camargo Jr. KR de. Pobreza e HIV/AIDS: aspectos antropológicos e sociológicos. Cad Saúde Pública. 2000;16(suppl. 1):S89-102. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2000000700008
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.

Além de aspectos relacionados à renda, não é possível debater contextos de vulnerabilidade sem considerar relações de trabalho, dado o modelo capitalista que molda as relações sociais, inclusive as relações de gênero. Leite et al.3737 Leite GS, Murray L, Lenz F. The Peer and Non-peer: the potential of risk management for HIV prevention in contexts of prostitution. Rev Bras Epidemiol. 2015;18(suppl. 1):7-25. https://doi.org/10.1590/1809-4503201500050003
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abordam essa temática a partir da ausência de proteção trabalhista conferida às prostitutas. Oliveira5050 Oliveira IBN. Acesso universal? Obstáculos ao acesso, continuidade do uso e gênero em um serviço especializado em HIV/AIDS em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saúde Pública. 2009;25(suppl. 2):s259-68. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2009001400008
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salienta a divisão sexual do trabalho como um produtor de vulnerabilidade. Situações de informalidade e precarização da atividade ocupacional, associada à responsabilidade pelo trabalho doméstico e cuidado dos filhos, impactam no autocuidado e no acesso aos meios de prevenção. No caso das mulheres trabalhadoras do sexo, a não garantia dos direitos trabalhistas, somada a situações de violência física e/ou sexual, amplia a vulnerabilidade ao HIV.

Por fim, convém salientar que a ausência da revisão documental sobre os usos do conceito de vulnerabilidade ao HIV nas diretrizes políticas de enfrentamento à aids no Brasil é uma das limitações deste estudo. Tal revisão poderia elucidar de que modo(s) o conceito de vulnerabilidade foi incorporado no âmbito das diretrizes programáticas e auxiliar na compreensão de como o campo científico orienta a formulação de políticas públicas de saúde, sendo igualmente influenciado por elas. A opção por utilizar apenas as publicações brasileiras da base Scielo e a não inclusão de livros, dissertações e teses também reduz o alcance dos resultados. Por outro lado, tal recorte promove um balanço do uso do conceito de vulnerabilidade nas publicações acadêmicas nacionais de ampla divulgação. Seus resultados possibilitam aprofundar as implicações da alteração do contexto social no que tange às políticas de saúde e de seguridade social no Brasil e das modificações em curso sobre as diretrizes de enfrentamento à aids5656 Monteiro SS, Brigeiro M, Vilella WV, Mora C, Parker R. Desafios do tratamento como prevenção do HIV no Brasil: uma análise a partir da literatura sobre testagem. Ciênc Saúde Colet. 2019;24(5):1793-807. https://doi.org/10.1590/1413-81232018245.16512017
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. Ademais, a presente revisão pode ser comparada com futuras revisões que contemplem a análise das dimensões da vulnerabilidade na literatura internacional.

CONCLUSÕES

O conceito de vulnerabilidade, formulado por Mann et al.22 Mann J, Tarantola DJM, Netter W, editors. A aids no mundo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará; 1993. nos anos 1990 e incorporado ao contexto brasileiro por Ayres et al.44 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ, Saletti Filho HC. Vulnerabilidade e prevenção em tempos de Aids. In: Barbosa RM, Parker RG, editors. Sexualidades pelo avesso: direitos, identidades e poder. São Paulo: 34; Rio de Janeiro: IMS/UERJ; 1999. p. 49-72., ganhou visibilidade e relevância na trajetória e interpretação da dinâmica da epidemia de HIV/aids. Dada a importância da sua incorporação nos estudos sobre aids, este artigo analisou o seu uso na produção científica nacional sobre HIV/aids e mulheres no período de 1990 a 2018.

Tal análise revelou a diversidade das populações estudadas, mostrando o caráter não homogêneo e as especificidades dos segmentos populacionais da categoria mulher. Foi constatado que assuntos relacionados à dimensão social da vulnerabilidade foram privilegiados, como as desigualdades sociais, raciais e de gênero, a violência e o estigma, bem como a ausência de políticas sobre direitos sexuais e reprodutivos. Outra dimensão explorada refere-se às implicações da ausência do debate sobre sexualidade feminina e a associação do preservativo à contracepção. O contexto laboral igualmente foi destacado como um fator da vulnerabilidade ao HIV. Situações de informalidade e precarização da atividade ocupacional, associada ao trabalho doméstico, ao cuidado dos filhos ou ao trabalho sexual, impactam no autocuidado e no acesso aos meios de prevenção. Esses achados revelam que o conceito foi apropriado por pesquisadores do campo da saúde coletiva, adequando-se aos estudos sobre aids já em curso, na perspectiva das desigualdades sociais.

Em suma, os achados destacam a importância da contribuição do caráter multidimensional do conceito de vulnerabilidade, uma vez que possibilita a análise das relações intersubjetivas em interação com o contexto social. Nessa direção, alguns artigos assinalaram as relações entre a precarização do Sistema Único de Saúde (SUS) e as condições de vulnerabilidade ao HIV. Embora se trate de um sistema de saúde universal, a sua não consolidação plena impacta no acesso desigual da população aos seus dispositivos materiais e simbólicos.

Vale reiterar que a incorporação do conceito de vulnerabilidade nas políticas e diretrizes sobre aids significou um avanço, haja vista sua constituição alinhada aos princípios dos direitos humanos e da solidariedade. Entretanto, em anos recentes esse quadro conceitual vem perdendo protagonismo nas políticas de aids. As atuais diretrizes de enfrentamento à epidemia no Brasil têm priorizado a oferta de testes e medicamentos em detrimento de investimentos nas mudanças estruturais e nos princípios solidários que construíram a resposta brasileira. Segundo Seffner e Parker5757 Seffner F, Parker R. Desperdício da experiência e precarização da vida: momento político contemporâneo da resposta brasileira à aids. Interface. 2016;20(57):293-304. https://doi.org/10.1590/1807-57622015.0459
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, isso significa o desperdício da histórica experiência nas respostas à aids, construídas pelo governo e pela sociedade civil organizada; marcada pelo esforço de pensar sob a luz da determinação social do processo saúde-doença, que implicou em discursos e práticas sobre homossexualidade, prostituição, direitos humanos, legislação de patentes e defesa do SUS.

Os princípios dos direitos humanos, justiça social e solidariedade, que fundamentaram o uso do conceito de vulnerabilidade no campo dos estudos de aids, produziram respostas eficazes para o enfrentamento da epidemia no Brasil, considerando as dimensões da vulnerabilidade individual, programática e social/estrutural. Esses princípios deveriam ser resgatados na análise da sindemia entre HIV, desigualdades sociais, raciais e de gênero e demais problemas de saúde, como a recente pandemia de Covid-19.

Como salientado por Brown et al.5858 Brown K, Ecclestone K, Emmel N. The Many Faces of Vulnerability. Social Policy and Society. 2017;16(3):497-510. https://doi.org/10.1017/S1474746416000610
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, o conceito de vulnerabilidade se tornou uma ferramenta analítica-chave na formulação de políticas de proteção social, mas existe a possibilidade de essas políticas servirem apenas para atenuar o problema, sem promover mudanças estruturais e a emancipação dos sujeitos. Na sua visão, estar vulnerável pode ser contraditório e desconfortável, haja vista o sistema político neoliberal vigente que produz vulnerabilidades, mas celebra o individualismo dos sujeitos enquanto eles são "dependentes" de políticas do Estado. A condição vulnerável poderia ser naturalizada como uma característica própria ou imutável de determinados grupos, atribuindo-lhes o lugar de vítimas e sujeitando-os aos dispositivos de controle do Estado, sob o "disfarce" de assistência e proteção social.

Portanto, para escapar dos essencialismos, é imprescindível resgatar características constitutivas do próprio constructo de vulnerabilidade, como seu caráter relacional e dinâmico. Relembrar que a vulnerabilidade não é atributo imutável. Tal condição está circunscrita no tempo histórico e no espaço e sua compreensão e enfrentamento envolvem aspectos de corporalidade, adversidade, diversidade, agência, capacidades e direitos, fundamentais para contextualizar a relação entre mulheres e aids, superando qualquer narrativa essencialista que represente as mulheres como sujeito vulnerável.

  • Fonte de financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    18 Mar 2021
  • Aceito
    11 Ago 2021
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