Open-access Associação entre ingestão de energia e nutrientes e incontinência urinária em mulheres adultas

Association between energy and nutrient intake and urinary incontinence among adult women

Resumo

Objetivo  Avaliar a relação entre incontinência urinária e ingestão de energia e de nutrientes em mulheres adultas.

Método  Estudo transversal com 382 mulheres (≥ 18 anos) atendidas em uma Unidade de Atenção Primária à Saúde em Fortaleza, CE. A avaliação da IU foi realizada através do International Consultation on Incontinence Questionnaire – Short Form (ICIQ-SF) e a do consumo alimentar, através de um questionário de frequência alimentar (QFA). A ingestão de nutrientes foi ajustada pela ingestão total de energia, usando-se o método residual. Modelos de regressão logística foram utilizados para testar a associação entre IU e ingestão de energia e nutrientes.

Resultados  Mulheres com ingestão elevada de colesterol apresentaram maior razão de chance de desenvolver IU (quarto quartil vs. primeiro quartil: RC ajustada = 2,26; IC 95% = 1,19-4,29), independentemente de fatores sociais, demográficos e de saúde. Nenhuma associação foi observada entre a ingestão de energia, macronutrientes, frações lipídicas, sódio e fibra e IU, entretanto houve maior ingestão de proteínas e menor de sódio entre as mulheres com IU (p < 0,05).

Conclusão  Foi observado no presente estudo associação somente entre ingestão de colesterol e IU. Análises dos tipos de alimentos consumidos podem contribuir na avaliação da influência de fatores dietéticos na IU.

Palavras-chave:  incontinência urinária; mulheres; dieta

Abstract

Objective  To evaluate the relationship between urinary incontinence and energy and nutrient intake among adult women.

Method  A cross-sectional study was carried out with 382 women (≥ 18 years old) attended in a Primary Health Care Service in Fortaleza-CE. The evaluation of IU was performed using the International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form (ICIQ-SF) and food intake was estimated through a food frequency questionnaire (FFQ). Nutrient intake was adjusted for total energy consumption, using the residual method. Logistic regression models were used to test the association between the consumption of energy and nutrients, and IU.

Results  Greater cholesterol consumption was associated with UI (fourth quartile vs. first quartile: adjusted OR =2.26; IC 95%=1.19-4.29). No association was observed with the consumption of energy, macronutrients, lipid fractions, sodium and fiber, and UI, however there was a greater intake of protein and lower sodium intake among women with urinary incontinence (p <0.05).

Conclusion  This study found an association only between cholesterol intake and IU. Specific analysis of the types of food consumed should be developed to better assess the influence of dietary factors on UI.

Keywords:  urinary incontinence; women; diet

INTRODUÇÃO

A incontinência urinária compreende a queixa de perda involuntária de urina 1 . Encontrada em qualquer período da vida e em todas as faixas etárias, a IU é considerada um problema de saúde pública cujo risco aumenta com a idade, podendo determinar uma série de consequências físicas, econômicas, psicológicas e sociais, com interferência negativa na qualidade de vida 2,3 . Além disso, a IU acarreta altos custos para os sistemas de saúde. No Brasil, foram gastos em torno de 2,3 milhões de reais com tratamento cirúrgico da IU em 2011, sem considerar os investimentos com exames diagnósticos, medicamentos, fisioterapia ou custos das próprias pacientes 4 .

Estima-se que a prevalência de IU nas mulheres varie entre 25% e 45% em diferentes países do mundo, tendo como principais fatores de risco gravidez, parto, diabetes e índice de massa corporal elevado 5 . Sabe-se que fatores comportamentais possuem alguma influência no desenvolvimento da IU, os quais, por serem passíveis de mudança, devem ser melhor investigados com intuito de prevenir e melhorar os sintomas da IU 6 .

Há evidências recentes de que o perfil nutricional, incluindo estado nutricional e hábitos alimentares, influencia no desenvolvimento de sintomas do trato urinário 7 .

A dieta é considerada fator importante que pode contribuir para adiposidade e, consequentemente, para IU 7 . Por outro lado, a melhora dos sintomas de incontinência urinária após perda de peso corporal pode ser, em parte, devida às mudanças na dieta, independentemente da perda de peso e do nível de atividade física 8 . Acredita-se que uma vez que os sistemas simpáticos e parassimpáticos controlam a micção e que a disfunção endotelial e a inflamação também estão envolvidas nos sintomas de incontinência urinária, a dieta deve possuir efeitos diretos sobre os sintomas urológicos 9-11 .

Assim, ingestão de energia 11 , ingestão elevada de gordura total 12 , de ácidos graxos saturados 11,12 e monoinsaturados 13 , alta relação entre ácidos graxos saturados e polinsaturados 14 e altas doses de vitamina C e cálcio 15 contribuem para maior incidência de IU, enquanto ingestão elevada de vitamina D 12 , proteína 11,12 e potássio 14 associa-se com menor risco de desenvolver IU. Apesar de haver alguns estudos investigando a relação entre dieta e IU, os achados ainda são limitados e resumem-se a amostras em países desenvolvidos, ressaltando a importância de se avaliar a dieta como um fator de risco independente para a incontinência urinária também no Brasil.

Compreender a relação entre dieta e IU pode contribuir no manejo dessa condição na prática clínica, além de permitir a elaboração de estratégias que previnam o desenvolvimento dessa patologia através da identificação precoce de fatores de risco possíveis de modificação. Assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar a relação entre ingestão de energia e de macro e micronutrientes e IU em mulheres adultas.

MÉTODO

Trata-se de um estudo transversal desenvolvido no período de dezembro de 2014 a junho de 2015, em um serviço de atenção primária da cidade de Fortaleza, Ceará.

A amostra foi estimada em 384 mulheres a partir do cálculo amostral realizado de acordo com os seguintes critérios: prevalência de incontinência urinária em mulheres de 50% (para maximizar o tamanho amostral), intervalo de confiança de 95%, erro amostral de 5% e com base na Fórmula 1 abaixo:

n = [ z α / 2 ² ( 1 P ) ] / ε r ² (1)

em que: z α/2 = valor crítico correspondente ao grau de confiança de 95%; P = prevalência amostral; εr = erro amostral.

Foram incluídas na pesquisa somente mulheres acima de 18 anos que concordaram em participar da pesquisa após leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foram entrevistadas 496 mulheres, no entanto mulheres grávidas, com doença renal, mulheres com qualquer tipo de câncer, com trauma do assoalho pélvico, com AVC (Acidente Vascular Cerebral) e mulheres que apresentaram dificuldades em responder o questionário e não concluíram o mesmo (n = 86) não foram incluídas na pesquisa, totalizando uma amostra final de 410 mulheres. Entretanto 28 mulheres foram excluídas por terem apresentado consumo pouco plausível (> 5.000 calorias), totalizando uma amostra de 383 mulheres.

A coleta de dados foi realizada por entrevistadores treinados com formulários padronizados e pré testados.

Para a avaliação da IU, foi utilizado o International Consultation on Incontinence Questionnaire (ICIQ-SF), previamente validado por Tamanini et al. 16 . O instrumento é composto por seis questões, incluindo data de nascimento (questão 1), sexo (questão 2) e questões relacionadas à frequência (questão 3), quantidade de urina que o indivíduo pensa que perde (questão 4), gravidade da perda urinária, o quanto a perda interfere na vida diária (questão 5) e quando a perda urinária ocorre (questão 6) ( Quadro 1 ). Uma escala de oito itens que possibilita avaliar as causas ou situações de perda urinária completa o questionário. Um escore parcial é atribuído para cada resposta às questões 3, 4 e 5 e o somatório desses escores, que pode variar de 0 a 21 pontos, foi utilizado para classificar a ocorrência de incontinência urinária nas mulheres. Foram consideradas incontinentes as mulheres que tiveram soma igual ou maior do que 3 17 .

Quadro 1
Perguntas da versão em português do International Consultation on Incontinence Questionnaire – Short Form (ICIQ-SF)

Os dados de consumo alimentar foram coletados por meio da aplicação de um Questionário de Frequência do Consumo Alimentar (QFA), semiquantitativo, com período de referência correspondendo aos últimos seis meses. A lista de alimentos foi determinada a partir dos alimentos mais consumidos pela população brasileira, com base no Estudo Nacional de Despesa Familiar (ENDEF) previamente validado por Sichieri e Everhart 18 para população adulta da área metropolitana do Rio de Janeiro e aprimorado e revalidado utilizando-se como método de referência a água duplamente marcada por Lopes 19 . Foi questionada, ainda, a quantidade de água frequentemente consumida pelas mulheres no período de um dia.

Outras variáveis investigadas como possíveis fatores relacionados à IU foram: idade, raça (branca, não branca), renda média familiar, condições de saúde (diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica e constipação), antecedentes obstétricos e ginecológicos (realização de algum parto vaginal, presença de menopausa) e estilo de vida.

As perguntas sobre o estilo de vida incluíram hábito de fumar (nunca fumou, ex-fumante e fumante atual), consumo de bebida alcoólica (consome e não consome) e prática de atividade física (não realiza, atividade leve e moderada), realizadas com base nas perguntas utilizadas pelo Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL) 20 . O consumo de bebida alcoólica foi avaliado com base no consumo de quatro ou mais doses de bebida alcoólica em uma única ocasião, nos últimos 30 dias. Uma dose de bebida alcoólica corresponde a uma lata de cerveja, uma taça de vinho ou uma dose de cachaça, whisky ou qualquer outra bebida alcoólica destilada. E, para avaliação da prática de atividade física, considerou-se a prática de exercícios físicos nos últimos três meses, o tipo de exercício, a duração e a frequência semanal. Foi aplicada a mesma classificação utilizada pelo VIGITEL, que identifica praticantes de atividade física suficiente no lazer mulheres que praticam pelo menos 30 minutos diários de atividade física de intensidade leve ou moderada (caminhada, caminhada em esteira, musculação, hidroginástica, ginástica em geral, natação, artes marciais, ciclismo e voleibol) em cinco ou mais dias da semana ou ao menos 20 minutos diários de atividade física de intensidade vigorosa (corrida, corrida em esteira, ginástica aeróbica, futebol, basquetebol e tênis) em três ou mais dias da semana.

As medidas antropométricas avaliadas foram peso, altura e circunferência da cintura, aferidas de forma padronizada, seguindo-se os protocolos do Sistema Nacional de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) 21 . O IMC foi calculado através da razão entre peso (kg) e estatura ao quadrado (em metros).

As variáveis sociodemográficas, de estilo de vida e antropométricas (índice de massa corporal e circunferência da cintura) foram apresentadas para o total de mulheres e segundo presença de IU. Foram estimadas as médias (e desvios-padrão) para as variáveis numéricas (idade, renda familiar, IMC e circunferência da cintura) e as frequências para as variáveis categóricas (raça, presença de hipertensão, diabetes, constipação, ocorrência de menopausa, realização de algum parto vaginal, atividade física, tabagismo e consumo de bebida alcóolica). Diferenças nas frequências das variáveis categóricas entre mulheres com IU e mulheres sem IU foram testadas a partir do teste do Qui-Quadrado e as diferenças de médias das variáveis numéricas entre as mulheres com e sem IU foram avaliadas pelo teste t de Student.

Os nutrientes investigados no estudo incluem energia (kcal/dia), proteína (g/dia), carboidrato (g/dia), gordura total (g/dia), gordura saturada (g/dia), gordura moninsaturada (g/dia), gordura polinsaturada (g/dia), colesterol (mg/dia), sódio (mg/dia) e fibras (g/dia).

Para análise da ingestão desses nutrientes foi atribuído peso 1 para a frequência de consumo de 1 vez por dia e foram considerados pesos proporcionais para as demais respostas de frequência. Assim, a frequência de consumo para cada um dos itens alimentares incluídos no QFA foi transformada em frequência diária. Para o cálculo do valor nutritivo dos itens alimentares incluídos no QFA, as medidas caseiras ou unidades de consumo dos alimentos foram primeiramente convertidas em gramatura, com base na Tabela de medidas referidas para alimentos consumidos no Brasil 22 . Em seguida, os valores da frequência diária foram multiplicados pela quantidade em gramas para se estimar a quantidade diária consumida de cada item do QFA e a composição nutricional da quantidade ingerida foi estimada com base na Tabela de composição nutricional dos alimentos consumidos no Brasil 23 . Em seguida foi estimada a ingestão relativa de energia e nutrientes.

A ingestão de nutrientes foi ajustada pela ingestão total de energia, usando-se o método do resíduo. No método residual, a ingestão de um nutriente, ajustado pela energia, corresponde ao resíduo decorrente do modelo de regressão, tendo a ingestão calórica como variável independente e a ingestão absoluta do nutriente como variável dependente. O método fornece a medida da ingestão do nutriente não correlacionada com a ingestão total de energia 24 .

Uma vez que a ingestão de energia e nutrientes apresentou distribuição assimétrica, as variáveis relacionadas ao consumo sofreram transformação logarítmica para serem utilizadas adequadamente nos modelos de regressão linear e, após ajuste pela energia, o exponencial do valor ajustado foi calculado para facilitar a interpretação dos dados.

As mulheres foram agrupadas em quartis de ingestão de cada nutriente ajustado. Modelos de regressão logística foram desenvolvidos para calcular a razão de chances da associação entre a ingestão de nutrientes em quartil e incontinência urinária, tendo como categoria de referência o primeiro quartil de ingestão dos nutrientes. Inicialmente, os modelos foram ajustados por idade e ingestão total de energia. Em seguida foram incluídas no modelo outras variáveis consideradas fatores de risco para IU estabelecidas em outros estudos 25,26: renda, número de gestações, IMC, circunferência da cintura, presença de diabetes mellitus, hipertensão arterial e constipação, ocorrência de menopausa, realização de parto vaginal, tabagismo e realização de atividade física. Os modelos com tipos de lipídios foram ajustados também pelos outros tipos de gordura.

Todos os testes estatísticos foram realizados no SAS versão 9.1, considerando significativo p-valor < 0,05.

Esta pesquisa seguiu os preceitos éticos e científicos estabelecidos pela resolução n. 466/12 do Conselho Nacional de Saúde sobre pesquisa envolvendo seres humanos, tendo sido aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade de Fortaleza (sob parecer 520.906).

RESULTADOS

Das 382 mulheres incluídas nas análises, 131 (34,3%) apresentaram ICIQ superior a 3 e portanto foram consideradas como com IU. A média do ICIQ entre essas mulheres foi de 8,7 (IC95%: 8,0-9,4). No que se refere à intensidade das perdas, a maioria das participantes (77,9%) mencionou ser em pequena quantidade. O impacto da IU na vida diária das mulheres, avaliado pela questão 5 do ICIQ-SF, revelou que 32 (24,4%) mulheres consideravam que a mesma interferia muito nas atividades diárias.

As mulheres com IU não apresentaram diferenças nos fatores sociodemográficos, obstétricos e de estilo de vida em relação às mulheres sem IU, com exceção da presença de constipação intestinal ( Tabela 1 ).

Tabela 1
Características sociais, demográficas e de saúde da população do estudo, total e segundo a presença de incontinência urinária (IU) – Fortaleza, 2015

Com relação às variáveis antropométricas avaliadas, tanto o IMC quanto a circunferência da cintura foram maiores nas mulheres com IU do que nas mulheres sem IU ( Tabela 1 ).

Quanto à ingestão de energia, nutrientes e fibra, observou-se uma ingestão maior de proteínas e colesterol nas mulheres com IU, porém uma menor ingestão de sódio ( Tabela 2 ). No entanto, a chance de desenvolver IU não se modificou segundo os quartis de ingestão das variáveis dietéticas, com exceção do colesterol ( Tabela 3 ).

Tabela 2
Média de ingestão de energia, nutrientes e fibras, total e segundo a presença de incontinência urinária (IU) – Fortaleza, 2015
Tabela 3
Razão de chances e intervalo de 95% de confiança para incontinência urinária segundo quartis de ingestão de energia, nutrientes e fibras – Fortaleza, 2015

DISCUSSÃO

No presente estudo, mulheres que apresentaram maior ingestão de colesterol tiveram maior chance de incontinência urinária, mas não se observou associação entre ingestão de energia, carboidratos, proteína, gordura total, saturadas, monoinsaturadas, polinsaturadas, sódio e fibras e incontinência urinária, diferindo assim de estudos que apontam uma associação positiva entre a ingestão de gordura saturada e IU 22 . O consumo relativo de gorduras saturadas sobre as poli-insaturadas e incontinência pode ocasionar alterações vasculares e inflamatórias que resultam em disfunção endotelial relevante para sintomas urológicos, mediada pelo aumento dos níveis de proteína C-reativa 11 . É possível que a relação com colesterol também seja medida por esses mecanismos.

Outro achado contraditório é que a maior ingestão de energia não aumentou a chance de incontinência urinária. Maserejian et al. 11 encontraram uma razão de chance quase três vezes maior para o desenvolvimento de IU nas mulheres com maior ingestão de energia quando comparadas com as mulheres de menor ingestão (RC = 2,86, 95% de intervalo de confiança = 1,56-5,23). Sabe-se que a ingestão de energia se relaciona ao tamanho corporal e atividade física, mas em análises separadas segundo estado nutricional também não houve relação entre ingestão calórica e IU (dados não mostrados). Apesar desse achado contraditório, modificações comportamentais e de estilo de vida, incluindo perda de peso, continuam a ser a primeira opção de tratamento para a maioria dos pacientes com incontinência urinária 11 . Numerosos estudos forneceram evidências de que a diminuição da obesidade abdominal e aumento da atividade física podem melhorar os sintomas da incontinência urinária, particularmente em mulheres 27 .

Apesar da razão chance de desenvolver IU não ter sido alterada de acordo com os quartis de consumo de proteína, a média de ingestão foi maior nos indivíduos sem IU. Em homens, Maserejian et al. 11 encontraram que o maior consumo de proteína está associado a menor chance de sintomas de vazamento do trato urinário baixo, mas essa relação ainda é contraditória 13,15 .

A ingestão de sódio foi maior nas mulheres com IU, apesar de não ter alterado a razão de chance de sua ocorrência. Sabe-se que a ingestão elevada de sódio está relacionada com o desenvolvimento de hipertensão e que a hipertensão favorece o desenvolvimento de IU, no entanto a ingestão de sódio é relativamente difícil de ser capturada usando-se o QFA 11 .

Neste estudo não houve diferença na quantidade de água consumida entres as mulheres com e sem IU, contudo a ingestão de líquidos é conhecida por ter um impacto significativo nos sintomas do trato urinário 28 . Destaca-se que neste estudo não foi avaliado o consumo total de líquidos, o que pode ter contribuído para ausência de associação com a incontinência urinária.

Outra limitação deste estudo refere-se ao método de classificação da IU, que se baseou na autorreferência da perda de urina e não em um diagnóstico clínico. O diagnóstico da IU através de um exame clínico permitiria identificar mulheres que se sentem constrangidas em afirmar que perdem urina e ainda identificar situações de perda de força na musculatura do assoalho pélvico mesmo antes da manifestação da perda urinária ser perceptível pela mulher 29 .

Destaca-se ainda que a natureza observacional e transversal deste estudo limita conclusões de inferências causais e pode ter contribuído para os achados contraditórios. Apesar de transversal, acredita-se que as mulheres não tenham sido orientadas a mudar a dieta e, portanto, não mudaram seu consumo por conta de diagnóstico de IU.

A utilização do QFA para avaliação do consumo de nutrientes também deve ser vista com cautela, uma vez que o mesmo foi validado em outra população e não permite conhecer a ingestão absoluta de nutrientes 24 . No entanto, uma análise do Inquérito Nacional de Alimentação realizado em 2008-2009 em uma amostra representativa das cinco regiões brasileiras demonstrou que os alimentos mais consumidos pela população da região Nordeste coincidem com a lista de alimentos do QFA utilizado.

Em síntese, os resultados deste estudo demostram que existe uma associação entre a ingestão de colesterol e IU, no entanto não houve uma associação significativa entre a ingestão de energia, carboidratos, proteína, gordura total, saturadas, monoinsaturadas, polinsaturadas, sódio e fibras com IU. Pesquisas adicionais devem envolver desenhos prospectivos e instrumentos de avaliação do consumo alimentar que permitam acessar com mais detalhes os tipos e as quantidades de alimentos consumidos.

  • Trabalho realizado em uma Unidade de Atenção Primária à Saúde – Fortaleza (CE), Brasil.
  • Fonte de financiamento: nenhuma.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    03 Maio 2017
  • Aceito
    13 Abr 2018
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