Open-access Masculinidades hegemônicas como contrarresistência no contexto universitário

Masculinidades hegemónicas como contrarresistencia en el contexto universitario

Resumo

O objetivo deste estudo foi analisar as facetas do exercício das masculinidades hegemônicas como meio de contrarresistência de jovens rapazes diante da ascensão de um coletivo feminista no contexto universitário. Para tanto, foi desenvolvido um estudo longitudinal, qualitativo e interpretativista, pautado em múltiplas fontes de dados, como entrevistas, documentos e artefatos organizacionais, que foram analisadas de modo indutivo, com base em codificação aberta, axial e seletiva. Como principais resultados da triangulação dos dados, destacam-se: i) as masculinidades hegemônicas são caracterizadas pela liderança em grupos estudantis, exaltação das masculinidades e classificação das mulheres como subordinadas aos interesses dos rapazes; ii) ocorre a resistência de coletivos feministas, marcada pelo combate a situações de machismo no contexto universitário; iii) há uma contrarresistência masculina, com a intensificação das ações contra as mulheres, por meio de assédio, agressões, vandalismos e composições de músicas sexistas. O artigo contribui para a discussão sobre gênero e resistência, especialmente no contexto organizacional.

Palavras-chave: Masculinidades hegemônicas; Resistência; Contrarresistência; Coletivo feminista; Contexto universitário

Resumen

El objetivo del artículo fue analizar las facetas del ejercicio de las masculinidades hegemónicas como medio de contrarresistencia de los jóvenes frente al auge del colectivo feminista en el contexto universitario. Se desarrolló un estudio longitudinal, cualitativo e interpretativo, a partir de múltiples fuentes de datos, como entrevistas, documentos y artefactos organizacionales, que fueron analizados inductivamente, a partir de una codificación abierta, axial y selectiva. Como principales resultados de la triangulación de los datos se destacan: (i) las masculinidades hegemónicas se caracterizan por el liderazgo en los grupos estudiantiles, exaltación de la masculinidad y clasificación de las mujeres como subordinadas a los intereses de los muchachos; (ii) hay una resistencia del colectivo feminista, marcada por la lucha contra situaciones de machismo en el contexto universitario; (iii) hay una contrarresistencia masculina, con la intensificación de las acciones contra las mujeres, a través del acoso, la agresión, el vandalismo y la composición de canciones sexistas. El artículo contribuye a la discusión sobre género y resistencia, especialmente en el contexto organizativo.

Palabras clave: Masculinidades hegemónicas; Resistencia; Contrarresistencia; Colectivo feminista; Contexto universitario

Abstract

This study analyzed the facets of the exercise of hegemonic masculinities as a means of counter-resistance of young men in the face of the rise of female groups in the university context. A longitudinal, qualitative, and interpretive study was developed based on multiple data sources, such as interviews, documents, and organizational artifacts, which were analyzed inductively based on open, axial, and selective coding. As main results of the triangulation of the data, the following stand out: (i) hegemonic masculinities are characterized by leadership in student groups, exaltation of masculinity, and classification of women as subordinate to boys’ interests; (ii) there is a resistance of a feminist collective, marked by the fight against situations of machismo in the university context; (iii) there is a male counter-resistance, with the intensification of actions against women, through harassment, aggression, vandalism, and compositions of sexist songs. The article contributes to the discussion about gender and resistance, especially in the organizational context.

Keywords: Hegemonic masculinities; Resistance; Counter resistance; Feminist collective; University context

INTRODUÇÃO

“Resistência pacífica, mas não passiva, contra as injustiças” (Mahatma Gandhi).

O novo sempre despertou perplexidade e resistência” (Sigmund Freud).

Os pensamentos de Gandhi e de Freud deixam clara a ideia de que a resistência está por toda a parte. É da natureza humana. Podemos pensar em resistir pacificamente ou em resistir contra o novo, do mesmo modo que podemos pensar em resistir de forma violenta ou em representarmos o novo, que resiste àqueles que se opõem a ele. O novo, para o contexto da instituição de ensino representada em nosso artigo, é a ascensão da mulher na luta contra a hegemonia masculina. Quanto à resistência pacífica, bem, esta não parece ilustrar da melhor forma os relatos que traremos em nosso estudo.

Da literatura sobre masculinidades hegemônicas e teorias de resistência notamos que enquanto parte dos homens tende a utilizar meios como agressão física e verbal, homofobia e sexismo (Connell & Messerschmidt, 2005; Hyde, Drennan, Howlett, & Brady, 2009) para a manutenção de sua prevalência sobre as mulheres, estas tendem a reagir por meio de denúncias, organização de coletivos feministas, ações afirmativas e, em determinados casos, também por meio de violência (Hercus, 1999; Selbin, 2010; Smith & Johnston, 2002). Esse processo de ação e reação, a que parte da literatura dá o nome de resistência e contrarresistência, parece ser acelerado no contexto universitário, especialmente em atividades recreativas entre jovens estudantes, o que inclui os jogos universitários, os trotes e as festas, em que, por vezes, são trazidas denúncias dos mais variados tipos de violência física e verbal contra as mulheres (Azevedo, 2016; Bandeira, 2017; Linhares & Laurenti, 2018; Martin, 2016).

O fenômeno da resistência tem sido recorrente na literatura em estudos organizacionais (Hollander & Einwohner, 2004; Medina, 2012; Mumby, 2005; Ratele, 2015; Scott, 2008; Selbin, 2010; Smith & Johnston, 2002). Apesar da força dessa temática, que começa a ganhar forma na academia a partir da década de 1980 e que cresce exponencialmente em importância nos últimos 20 anos, ainda são relativamente escassos os estudos que tratem do fenômeno da resistência no contexto educacional, como destacam Tildesley, Lombardo, e Verge (2022), Tucker e Govender (2017) e Verge, Ferrer-Fons, e González (2018). São ainda mais escassos os estudos que tratem, mesmo que de forma mais ampla, do fenômeno da contrarresistência (Tildesley et al., 2022). Conforme argumentam Kärreman e Alvesson (2009, p. 1120), “toda a resistência por si só pode ser resistida”, razão pela qual merecem ser investigados tanto o fenômeno da resistência quanto as reações de grupos contrários a ela, isto é, a contrarresistência (O’Connor, 2000).

Dentre os trabalhos escassos situa-se o estudo sobre contrarresistência de Tildesley et al. (2022), que identificou: i) as formas e os tipos de resistência que dificultam os esforços de reforma de gênero em instituições de ensino superior e ii) as estratégias de contrarresistência que buscam impulsionar a implementação e o alcance de mudanças institucionais. No caminho da resistência, os estudos de Tucker e Govender (2017) e de Verge et al. (2018) trazem importantes contribuições para a temática. O primeiro estudo parte do institucionalismo feminista para discutir reformas curriculares de ensino relacionadas com as questões de gênero, bem como o papel de grupos feministas nesse processo, que necessita de mudanças institucionais (Verge et al., 2018). O segundo estudo, por sua vez, parte da técnica etnográfica, ilustrando a construção e o posicionamento das masculinidades em espaços de conflito, mais particularmente, os recursos pessoais e sociais reproduzidos por meninos na busca por masculinidades ditas “desejáveis” (Tucker & Govender, 2017).

Diante desses importantes esforços de pesquisa e em decorrência da escassez de mais investigações, temos a oportunidade de analisar a contrarresistência no contexto educacional, razão pela qual fomos orientados pela seguinte questão de pesquisa: de que modo jovens universitários buscam exercer suas masculinidades hegemônicas como meio de contrarresistência diante da ascensão de coletivos feministas no contexto universitário? Por meio dessa pergunta de pesquisa, procuramos preencher uma lacuna na literatura apontada por Tildesley et al. (2022), ao propor estudos nos contextos universitários de diferentes países. A pesquisa dessas autoras foi realizada em instituições de ensino superior espanholas, e nela elas argumentam que são necessários estudos que incluam características universitárias de diferentes contextos para fornecer insights que ajudem a compreender fatores que levam os atores de grupos dominantes a resistir à igualdade de gênero e também a moldar a ação e a capacidade de atores feministas de diferentes maneiras. As autoras defendem que capturar as lutas de poder de gênero nas instituições de ensino superior, mapeando a resistência e a contrarresistência nesse contexto organizacional, torna-se ainda mais importante em tempos de crescente oposição global à igualdade de gênero e aos estudos de gênero (Tildesley et al., 2022).

Com o presente estudo, buscamos contribuir teoricamente ao darmos continuidade aos trabalhos de Connell e Messerschmidt (2005), que sugerem a reformulação do conceito de masculinidades hegemônicas por meio de um modelo mais complexo de hierarquia de gênero que enfatize a atuação das mulheres, com um tratamento mais específico sobre a incorporação em contextos de privilégio e poder, e à pesquisa de Kärreman e Alvesson (2009), que desenvolveram o conceito de contrarresistência para expandir a compreensão da dinâmica de resistência. Procuramos também trazer contribuição prática, por meio de relatos que podem servir como formas de denúncia válidas para que as organizações - em especial as instituições de ensino - reflitam sobre as lutas de poder de gênero e estejam preparadas para lidar com situações similares àquelas que serão expostas no artigo. Em especial, contribuímos para que mulheres e homens possam pensar e agir para que tenhamos maior igualdade entre os diferentes gêneros em nossas organizações e na sociedade como um todo.

AS MÚLTIPLAS FACETAS DAS MASCULINIDADES HEGEMÔNICAS

As pesquisas sobre masculinidades hegemônicas têm percorrido, desde a década de 1980, em que surgiram seus primeiros estudos (Carrigan, Connell, & Lee, 1987; Connell, 1982, 1987; Kessler, Ashenden, Connell, & Dowsett, 1982), uma extensa discussão no debate acadêmico em torno de seu significado e de seus modos de operacionalização, fazendo parte do diálogo de diferentes campos das ciências sociais e humanidades, como psicologia, sociologia, educação, estudos de gênero e estudos organizacionais (Connell & Messerschmidt, 2005; Donaldson, 1993).

Embora existam controvérsias sobre sua definição, o conceito de masculinidades hegemônicas pode ser delineado com base nas diferentes formas e estratégias de masculinidades exercidas pelos homens que possibilitam a perpetuação de sua dominação sobre as mulheres em nossa sociedade (Beasley, 2008; Connell, 2020; Connell & Messerschmidt, 2013; Demetriou, 2001; Messerschmidt, 2019; Moller, 2007; Nogueira & Miranda, 2017; Rodriguez, 2019). Um dos pressupostos centrais está na concepção de que o relacionamento de parte dos homens com as mulheres é opressivo e, consequentemente, estratégias específicas de dominação e de subordinação da mulher são utilizadas e institucionalizadas, por meio de diferentes meios e grupos sociais instituídos (Connell & Messerschmidt, 2005; Donaldson, 1993; Harrington, 2021; Kimmel, 1998; Silva, 2006; Sweet, 2019). Nesse aspecto, Carrigan et al. (1987, p. 92) definem masculinidade hegemônica da seguinte forma: “Uma questão de como grupos específicos de homens habitam posições de poder e prosperidade e como eles legitimam e reproduzem as relações sociais que geram seu domínio”. Nesse sentido, Connell (1995, p. 188) nos traz a seguinte explicação para o conceito de masculinidade:

O que se entende por ‘masculinidade’? Deixem-me oferecer uma definição breve, mas razoavelmente precisa. A masculinidade é uma configuração de prática em torno da posição dos homens na estrutura das relações de gênero. Existe, normalmente, mais de uma configuração desse tipo em qualquer ordem de gênero de uma sociedade. Em reconhecimento desse fato, tem-se tornado comum falar de ‘masculinidades’.

O termo “hegemonia”, presente no estudo de Gramsci (1971), é relevante para o entendimento desse arcabouço teórico, tendo em vista que a dominação masculina não se apresenta somente de modo pessoal e direto pelo uso da força ou da violência, tal como observado em estudos sobre masculinidades (Anderson & Umberson, 2001; Connell & Messerschmidt, 2005). Para além desses usos, a natureza hegemônica das masculinidades nem sempre é exercitada de forma direta e explícita (Beasley, 2008), pois está imbricada nas diferentes instituições e culturas de nossa sociedade (Connell & Messerschmidt, 2005) e, mais especificamente, em suas formas simbólicas de representação nas organizações (Collinson & Hearn, 1994). Esse cenário acaba por beneficiar parte dos homens de nossa sociedade, mesmo que muitos não pratiquem algum tipo de masculinidade hegemônica (Connell & Messerschmidt, 2005).

O exercício das masculinidades hegemônicas, de acordo com Donaldson (1993), se constitui, principalmente, por meio da manutenção do poder de determinados grupos sociais em detrimento de outros, em que o grupo dominante, direta ou indiretamente, define situações, moralidades, hábitos considerados certos e questões a serem discutidas. Tal persuasão acaba por se estender por diversos meios e atores sociais, como mídias e instituições de ensino, e pode até mesmo ser legitimada pelo poder público em suas diferentes esferas de governo (Donaldson, 1993). Para Connell e Messerschmidt (2005), esse processo é representado por meio das práticas de dominação dos homens sobre as mulheres, sejam elas coletivas ou individuais, nas quais o entendimento vai muito além dos distintos papéis ou identidades em nossa sociedade, mas de como tais práticas são efetivamente realizadas e representadas no fazer do cotidiano social.

A RESISTÊNCIA DIANTE DAS MASCULINIDADES HEGEMÔNICAS

Assim como as discussões sobre masculinidades hegemônicas, o conceito de resistência é empregado e entendido sob diversas lentes teóricas em diferentes campos do conhecimento, o que leva à pluralidade de perspectivas e concepções (Hollander & Einwohner, 2004). Em geral, a ideia de resistência está intimamente ligada à noção das relações de poder em nossa sociedade (Foucault, 1978). Conforme o entendimento até aqui construído, a resistência busca, de forma intencional ou não, coletivamente ou individualmente, desafiar e desconstruir as mais variadas formas dominantes de masculinidades presentes em nossa sociedade e que estão profundamente enraizadas nos sistemas de opressão existentes nas estruturas sociais (Medina, 2012).

Hollander e Einwohner (2004), ao revisarem a literatura sobre essa temática, pontuam algumas de suas características. A resistência pode se expressar por diferentes modos, materiais ou físicos, e envolver o uso de seus corpos ou de outros objetos materiais pelos resistentes. Alguns atos de resistência física relevam-se como comportamentos tão severos quanto a violência ou tão sutis quanto trabalhar devagar, fingir estar doente, usar certos tipos de roupa ou roubar do empregador (Scott, 2008). Pode também se manifestar em diferentes escalas, individuais ou coletivas, globais ou locais. Seus alvos podem ser indivíduos, grupos e, em contexto mais amplo, instituições e estruturas sociais. Suas direções podem ser no sentido de mudar as estruturas sociais ou locais vigentes ou evitar que determinadas mudanças ocorram. Embora haja tal pluralidade de aspectos, o fato comum a todas essas características é que toda resistência envolverá sempre o ato de agir em oposição a alguém ou alguma coisa (Hollander & Einwohner, 2004).

O conceito formulado por Scott (2008), “resistência cotidiana”, é utilizado para abranger um tipo diferente de resistência. Nesse conceito, a resistência não é tão dramática e visível como rebeliões, manifestações ou outras articulações de resistência organizadas, coletivas ou de confronto (Scott, 2008). Essa forma de resistência - a cotidiana - é silenciosa, disfarçada ou aparentemente invisível. Assim, Scott (2008) sugeriu uma categorização de resistência baseada em duas formas principais: a resistência pública e a resistência disfarçada. Essas duas formas de resistência relacionam-se com três formas de dominação (material, de status e ideológica), o que resulta em seis tipos de resistência. Na resistência declarada publicamente, temos as revoltas abertas, as petições, as manifestações e as invasões de terras, entre outras, que atuam contra: i) a dominação material; ii) a afirmação de valor ou profanação de símbolos de status contra a dominação de status; iii) ideologias de dominação ideológica. Na resistência disfarçada, temos aquelas que são discretas, não divulgadas, infrapolíticas, que são cotidianas - como a caça furtiva, a ocupação, a deserção, a evasão - e atuam contra: iv) a resistência direta por resistências disfarçadas contra a dominação material; v) as transcrições ocultas de raiva ou discursos disfarçados de dignidade contra a dominação de status; vi) as subculturas dissidentes, como a religião milenar, os heróis de classe e a dominação ideológica (Vinthagen & Johansson, 2013).

Desse modo, por não representar um locus específico de manifestação, a resistência também pode se originar e ser coordenada de várias maneiras, como por meio de revoluções e rebeliões (Selbin, 2010), movimentos sociais (Smith & Johnston, 2002), ativismo (Wapner, 1996), coletivos (Hercus, 1999) e formas de trabalho (Mumby, 2005) e também por intermédio da resistência do cotidiano, em que se expressa de forma ordinária, por causa dos poucos recursos que indivíduos e grupos costumam ter para resistir ao poder dominante (Scott, 2008).

Independentemente do modo como é articulada no contexto das masculinidades hegemônicas, a resistência se dá sempre em oposição às diferentes formas de masculinidades expressas nos mais variados contextos em que ela se manifesta (Beasley, 2008). Posto de outra forma, resistir nesse contexto está relacionado às com as ações contra o domínio e a subordinação da mulher em relação aos homens, ilustradas por fenômenos como agressão, violência, homofobia e sexismo, entre outras diversas masculinidades que estão internalizadas em nossa sociedade e que dificultam a implementação de políticas de gênero em organizações (Connell & Messerschmidt, 2005; Engeli & Mazur, 2018; Hyde et al., 2009; Mergaert & Lombardo, 2014; Verge & Lombardo, 2021). Apesar de não fazer parte do escopo de nosso artigo, podemos perceber, com base nos fenômenos ilustrados, que a resistência às masculinidades hegemônicas não está restrita às mulheres, do mesmo modo que os “alvos” de tais masculinidades podem ser tanto homens quanto mulheres, como nos casos de homofobia, por exemplo (Messerschmidt, 2019).

Tal desafio não se dá apenas na mudança coletiva e social, ou seja, no nível das instituições e das políticas globais e nacionais, posto que ele está fortemente enraizado na vida cotidiana da população, ou seja, no modo de vida ordinário e das práticas locais constituídas nas diferentes esferas da vida social. Não apenas pela força e intensidade com que as diferentes masculinidades estão cognitivamente marcadas nas estruturas sociais, mas, principalmente, quando se manifestam de maneira intencional pelos homens em níveis individuais ou em grupo (Hollander & Einwohner, 2004).

RESISTINDO À RESISTÊNCIA: AS RESPOSTAS DAS MASCULINIDADES HEGEMÔNICAS À RESISTÊNCIA

Um dos aspectos ainda pouco explorados pela literatura está na possibilidade de se investigarem os modos de dominação hegemônica de resistir às resistências, tal como enfatizado por Kärreman e Alvesson (2009, p. 1120), ao argumentarem que “toda a resistência por si só pode ser resistida”. Nesse sentido, as masculinidades hegemônicas podem exercer o que é chamado pelos autores de “contrarresistência”. Embora tal conceito tenha sido cunhado em um contexto mais amplo ao da discussão sobre masculinidades, seu entendimento pode ser facilmente transposto aos fenômenos aqui tratados, tendo em vista que tal noção “aponta e destaca o potencial de movimentos de resistência para evocar contramovimentos que os minam, contradizem e subvertem” (Kärreman & Alvesson, 2009, p. 1120).

Uma das lógicas centrais desse embate entre resistências reside no que Coles (2009) chama de “campo da masculinidade”. Baseado nos conceitos de habitus, capital e campos de Bourdieu (1977, 1984, 1990), o autor argumenta que as relações de poder existentes se dão em níveis de subcampos que se confrontam entre si, posto que as masculinidades não possuem o mesmo significado para os diferentes atores sociais, também por serem vividas e experimentadas de forma diferente na prática cotidiana. Tal antagonismo é ilustrado por Coles (2009, p. 40):

Os homens usam sua posição dominante no campo do gênero para manter a hegemonia masculina (ortodoxia) que privilegia os homens, enquanto as feministas procuram subversão e mudança (heterodoxia). Influenciado por uma variedade de outros campos (mais notavelmente o campo da produção econômica), o feminismo conseguiu fundar sua luta contra a hegemonia masculina e legitimar os direitos das mulheres e pressionar por um movimento em direção à igualdade em certas esferas sociais, tanto públicas como privadas. Por sua vez, os homens tentaram defender sua posição de dominância recorrendo a argumentos essencialistas que separam necessariamente homens de mulheres. Essa luta no campo do gênero influenciou as lutas no campo da masculinidade. O argumento essencialista cria instabilidade no campo da masculinidade à medida que os homens subordinados usam o argumento do essencialismo (ou seja, que os homens são geneticamente predispostos a comportamentos masculinos, como agressão, promiscuidade e risco) gerados no campo do gênero para subverter a masculinidade hegemônica.

As disputas aqui ilustradas não se dão apenas nas grandes discussões e embates no estabelecimento de um discurso dominante sobre masculinidades em nossa sociedade, mas também estão presentes nas práticas cotidianas em grupos socialmente localizados no espaço e no tempo. Se, por um lado, o mais comum em ambas as esferas seja a de investigar as diferentes formas de resistência em relação à dominação hegemônica, por outro, pouco ainda sabemos sobre como ocorre o inverso, isto é, sobre quais são as diferentes práticas e estratégias de contrarresistência existentes e como tais formas de resistir se manifestam contra diferentes grupos sociais.

Nesse sentido, O’Connor (2000, p. 218), ao investigar os tipos de resistência entre mulheres na academia irlandesa, identifica o exercício de contrarresistências variadas por parte dos homens, como a “estigmatização de qualquer iniciativa em favor das mulheres, a demonização de mulheres proeminentes, o estabelecimento de obstáculos organizacionais e a renderização de procedimentos conquistados com afinco, irrelevantes pela introdução de novos que contenham discriminação positiva implícita em favor dos homens”.

METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO: PROCEDIMENTOS DE COLETA E ANÁLISE DOS DADOS

Este estudo é um dos frutos de amplo projeto de pesquisa sobre gênero nas organizações, que teve seu início no ano de 2017. Partindo de uma abordagem qualitativa, o projeto de pesquisa como um todo apresenta uma perspectiva longitudinal. Com base nos preceitos de Hakim (1997) e Ruspini (2000), entendemos que os dados longitudinais possibilitam o reconhecimento de semelhanças ou mudanças nos diferentes períodos de investigação, o que vai ao encontro de nosso objetivo com este artigo, analisar as facetas do exercício das masculinidades hegemônicas como meio de contrarresistência de jovens rapazes diante da ascensão de coletivos feministas no contexto universitário. Entendemos, portanto, que a análise de processos que envolvem ação e reação de indivíduos, que é o caso de nosso estudo, pode ser aprofundada ao estabelecermos maior período para a investigação do fenômeno. No caso de nosso artigo, essa análise foi possível, por meio de registros, entre 2010 e 2019.

Este texto apresenta múltiplas fontes de dados, entre as quais destacamos: i) entrevistas em profundidade; ii) documentos que constam de repositórios de coletivos feministas; iii) relatos expressos em grupos no Facebook; iv) letras de músicas compostas por estudantes; v) vídeos publicados no YouTube; vi) diário de bateria estudantil; vii) artefatos presentes em instituição de ensino superior.

As entrevistas em profundidade (i) foram realizadas com 20 alunos de uma tradicional instituição de ensino superior brasileira, entre os anos de 2017 e 2018, com duração média de 81 minutos, totalizando 27 horas de entrevistas e 378 páginas de transcrições com espaçamento simples em fonte Times New Roman tamanho 12. Como principais critérios de seleção de respondentes cumulativos, ouvimos moças e rapazes que estudam ou estudaram nessa instituição e que fazem ou fizeram parte de grupos estudantis, como o coletivo feminista, o diretório acadêmico, a bateria e a atlética. Como nosso estudo é pautado em relatos sobre o exercício das masculinidades hegemônicas, ouvimos em especial nove moças que fazem parte da história do coletivo feminista, por ser este um grupo responsável pela coleta de denúncias de violência contra as mulheres no contexto da instituição de ensino da investigação, o que envolve, além do ambiente interno da instituição, festas, trotes e competições esportivas.

Ouvimos também seis moças que fazem parte de outros grupos universitários supracitados. Para estabelecermos pontos de concordância, discordância e complementaridade, em relação aos relatos trazidos pelas moças, ouvimos, seguindo os preceitos de Patton (2002), cinco rapazes que fazem parte de todos os grupos estudantis da instituição, com exceção, óbvio, do coletivo feminista. Os cinco rapazes convergiram, em geral, com os relatos trazidos pelas moças e, por encontrarmos um padrão de respostas nas entrevistas com os rapazes, concluímos a fase de entrevistas do estudo e procedemos à análise de outras fontes para a triangulação dos dados e o aumento da validade interna do estudo (Creswell, 2009; Leech & Onwuegbuzie, 2007; Lincoln & Guba, 1985). Nosso roteiro semiestruturado, utilizado tanto para as moças quanto para os rapazes, foi organizado em três categorias de perguntas: trajetória do aluno na IES, relatos de situação de violência de gênero no âmbito da IES e ações de resposta às situações de violência de gênero. O Quadro 1 traz uma síntese do perfil dos(as) entrevistados(as):

Quadro 1
Perfil dos(as) entrevistados(as)

Os documentos de repositório do coletivo feminista (ii), produzidos entre os anos de 2013 e 2019, também foram utilizados de forma complementar aos relatos das moças. Sobre essa fonte, selecionamos para este artigo o resultado de pesquisa feita pelas moças do coletivo e que teve o intuito de retratar situações de violência sexual, física e verbal contra mulheres no contexto de uma famosa festa universitária. Os dados constantes em grupos no Facebook (iii) tiveram o intuito de relatar as reações de moças e rapazes após a proibição, por parte da instituição de ensino, da execução de letras de músicas de cunho ofensivo compostas por alunos da bateria estudantil. Um dos autores deste artigo conseguiu acessar dois grupos privados, sendo o primeiro com 488 membros, organizado pelo coletivo feminista, e o segundo, de caráter mais amplo, composto por 9.496 alunos e ex-alunos da instituição de ensino superior. Apesar de serem grupos privados, o acesso, por parte de seus administradores, a membros externos que desejam participar do grupo é geralmente concedido, desse modo, pudemos coletar importantes evidências para nossa investigação.

Tivemos também acesso a 63 músicas compostas (iv) pelos rapazes da bateria estudantil entre os anos de 2010 e 2019 que, em conjunto com as entrevistas realizadas e após a transcrição destas na íntegra pelos autores deste artigo, geraram 346 citações que contemplaram 41 códigos de análise. As letras, por serem de autoria dos rapazes, são retratos valiosos sobre o exercício das masculinidades hegemônicas. Isso ocorre porque elas são fruto de práticas exercidas diretamente por eles e que ilustram a tentativa de perpetuidade da dominação dos homens sobre as mulheres (Beasley, 2008; Demetriou, 2001; Moller, 2007), conforme poderemos observar nas letras expostas em nossa seção de resultados. Adicionalmente, procedemos à análise de cinco vídeos (v) publicados no YouTube entre os anos de 2010 e 2015. Dois desses vídeos comprovam a execução das letras compostas pelos membros da bateria, com acompanhamento dos demais alunos da instituição, e três vídeos retratam situações de subordinação de moças por rapazes em gincanas dos trotes no âmbito da instituição de ensino.

Após entrevistarmos os rapazes que compõem a história da bateria estudantil, tivemos acesso a um importante documento, de cunho mais íntimo, elaborado por eles entre 2014 e 2017: trata-se do diário dos rapazes membros da bateria estudantil (vi), apresentado na forma de um caderno com cerca de 68 páginas válidas, posto que muitas páginas desse documento foram retiradas antes de nosso acesso. Esse material é fundamental por trazer um conteúdo que foi pensado de forma livre pelos rapazes, dado que, em um primeiro momento, teve caráter privado. Até os dias de hoje, há relatos de que os estudantes mantêm diários de sua autoria.

Como última fonte de dados, analisamos também artefatos presentes no interior da instituição de ensino superior (vii) entre os anos de 2017 e 2019. Tais artefatos incluem, principalmente, diversos cartazes colocados pelo coletivo feminista nas dependências da instituição, bem como sua adulteração e destruição por parte de rapazes, além de pichações feitas pelos jovens como forma de contrarresistência às moças que compõem o coletivo feminista. Uma dessas pichações foi localizada na cabine do banheiro masculino por um dos autores deste estudo.

Depois de realizar o tratamento dos dados coletados, passamos a analisá-los. As entrevistas e as análises das letras das músicas (fontes i e iv) foram feitas após detalhado controle de codificação, classificação e análise, seguindo os preceitos de Miles e Huberman (1994). Importamos as transcrições para o software Atlas TI, indicado para análise qualitativa (Friese, 2019), e realizamos a codificação linha a linha para encontrar os principais conceitos e códigos presentes nos dados (Strauss & Corbin, 1990).

Nossos dados foram analisados, predominantemente, de forma indutiva, ou seja, a coleta de dados ocorreu antes da análise da literatura sobre o tema, com base em codificação do tipo aberta, axial e seletiva. Com os dados em mãos e a organização dos códigos, aprofundamos o estudo da literatura sobre masculinidades hegemônicas e sobre a abordagem da resistência e da contrarresistência para o afinamento de nossas categorias de análise, seguindo os preceitos de Corbin e Strauss (2015) e Glaser (1994).

Depois de chegarmos às categorias de análise do estudo, que emergiram das entrevistas e das letras das músicas e que foram afinadas após a revisão da literatura do tema, retornamos às demais fontes de dados (ii, iii, v, vi e vii) para a seleção de mais evidências ilustrativas de nossas categorias de análise, com vistas à triangulação das fontes de dados e ao aumento da validade interna do estudo (Leech & Onwuegbuzie, 2007). Por tratar-se de um estudo longitudinal, organizamos a análise de categorias no tempo, divididas em três atos. A Figura 1 ilustra os fatos mais relevantes ocorridos em cada ato:

Figura 1
Principais eventos do estudo longitudinal

Apesar de trazermos informações da década de 1980 nessa linha do tempo, consideramos que nossa análise compreende substancialmente o período entre 2010 e 2019. Algumas datas foram suprimidas para proteger o anonimato dos participantes da pesquisa e da IES, bem como seus nomes, que foram substituídos por pseudônimos. Na seção seguinte, traremos das categorias que embasaram a análise de resultados, quais sejam: destacamos, no ato 1, a busca masculina por liderança, pela manutenção de poder e por prosperidade perante as mulheres; no ato 2, exploramos a formação do coletivo feminista, bem como seu propósito e combate ao machismo; no ato 3, aprofundamos nossa análise, com destaque para a visão dos rapazes sobre o coletivo feminista e ênfase nos ataques realizados contra esse movimento.

ATO 1: DA HEGEMONIA MASCULINA PELA LIDERANÇA EM GRUPOS ESTUDANTIS

Esse ato reflete a busca masculina por liderança para a manutenção de seu poder e prosperidade perante as mulheres. Os relatos aqui trazidos tratam de um tempo em que o coletivo feminista ainda não havia se consolidado na IES selecionada para o estudo. A liderança masculina ocorria de forma mais livre, em que o foco central dos rapazes membros dos diferentes grupos estudantis no âmbito da IES estava na exaltação de suas masculinidades e, ao mesmo tempo, envolvia a classificação das mulheres como sendo subordinadas aos interesses dos rapazes, que eram os então responsáveis por definir as regras e situações pertinentes ao contexto estudantil na IES.

Sobre os diálogos internos entre os membros, notamos que se referem às características de masculinidades, em que o mais forte e preparado sexualmente parece ser aquele que deve liderar. Essa disputa envolve aspectos das masculinidades e sexualidades, conforme imagem presente no diário dos membros da bateria:

Figura 2
Órgão genital masculino como aspecto de poder

Esse desenho foi realizado por rapazes da bateria com o intuito de retratar o órgão genital masculino de um dos seus líderes mais proeminentes. Tivemos que retirar alguns trechos do texto original, mas fica claro que o desenho busca reverenciar o poder desse líder, por meio da exposição de um órgão supostamente de masculinidade superior. O poder pela capacidade sexual também está presente nas letras das músicas deste período, conforme trecho de uma delas:

Assim vamô beber e trepar. Tem que trepar. Tem que meter. E liberar pra quem quiser comer. Eu tô fumando, eu tô bebendo, como eu sempre quis. Mas minha jeba é quem tá mais feliz (jeba refere-se ao órgão genital masculino). Lambuzei a boca das bixetes de toda cidade, depois nem beijei, nem peguei amizade. Fui desprezando tanto, ela gamou em mim (letra da música 1).

A exaltação das masculinidades passa também pela diminuição das mulheres (Connell & Messerschmidt, 2005). Isso pôde ser observado nos trotes da IES, conforme retrata Melissa: “No meu trote, a gente foi obrigada a comer sachê de comida para gato de quatro. Eles, veteranos, faziam a gente beber tequila em um pinto de borracha”. A fala de Elizabete vai no mesmo sentido: “Meu trote foi traumático. Uma amiga minha saiu com hipotermia porque jogaram muita cerveja nela; era julho e estava frio; ela foi levada de ambulância, e os caras ainda queriam se aproveitar dela”.

Essas falas retratam o que Donaldson (1993) define como a tentativa do grupo hegemônico de estabelecer os hábitos considerados certos, o que é facilmente ilustrado pelos tipos de gincanas consideradas adequadas pelos rapazes líderes dos grupos estudantis, mas que, na verdade, causavam violência e constrangimento para as moças. Carrigan et al. (1987), no mesmo sentido, destacam que manter o poder pode significar menosprezar outros grupos e determinar o que devem fazer, o que também é ilustrado pela fala de Ana sobre uma das festas e sobre a ocorrência do dia seguinte ao evento:

Tinha um evento que era tipo um concurso de beleza e elegia a aluna mais bonita. As meninas tinham que subir no palco e fazer algo para mostrar porque ela tinha que vencer o concurso. Eles diziam “eu te embebedo, não tem problema, você bebe bastante e você não vai nem perceber que está lá em cima”. Uma menina tirou a roupa e todos os meninos adoraram e incentivaram. O que me chocou foi que, no dia seguinte, na faculdade, todos a estavam chamando de puta (Melissa, 23 anos).

Observamos aqui um cenário de determinação de regras de conduta seguido de menosprezo. Melissa, Elizabete e Olívia relataram situações em que moças se submeteram a cenas de humilhação porque acreditavam que, assim, poderiam ter aprovação social perante os demais colegas. Foi possível confirmar esses relatos por meio de vídeos disponíveis no YouTube que mostram calouras em gincanas nos trotes da IES que, sob os gritos dos rapazes, são pressionadas a passar maionese no corpo de forma sensual, mostrar as partes íntimas e beijar outras garotas.

De modo alternativo, há relatos que trazem a busca pela manutenção de hegemonia por meio de desprezo destinado especificamente às mulheres que estudam em outras instituições de ensino, conforme trecho da música 3: “Sei que você me quer, bom pra mim. Se quiser trabalhar, só me ligar. Minha empregada vai se demitir. Pra que cês vão tentar? Mais uma vez, vamos enrabar. As alunas da (IES concorrente) e toda vaca que cruzar”. No mesmo sentido, argumenta trecho da música 4:

Tento ver a sua vagina. Não quero não baia nem divisão. Só minissaia bem curtinha. E pouco a pouco vasculhar o seu popozão. A diferença é que eu fiz (IES). Vou trabalhar no alto escalão. E pro xérox você vai descer. Vou catarrar e você limpa o chão. Fazer café, até quando eu quiser.

Fundado com o propósito de resistência ao exercício dessa hegemonia masculina, ascende, no contexto da IES investigada, o coletivo feminista presente no próximo ato.

ATO 2: DA RESISTÊNCIA FEMININA PELA ASCENSÃO DO COLETIVO FEMINISTA

As primeiras conversas entre as alunas para a organização de um coletivo feminista no âmbito da IES ocorreram em 2013. No entanto, foi no ano de 2014 que o grupo passou a ser mais atuante, especialmente após combater letras ofensivas de músicas compostas pelos rapazes da bateria estudantil. A Figura 3 traz o registro de uma das primeiras reuniões do grupo, em que as fundadoras definiram seus principais propósitos:

Figura 3
Registro de reunião do coletivo feminista no início do grupo

As moças do coletivo tinham o propósito central de combater situações de machismo presentes no meio acadêmico em que viviam, que pareciam se aflorar ainda mais em festas, trotes e eventos esportivos universitários. Segundo Hollander e Einwohner (2004), esse movimento das alunas caracteriza-se como um tipo de resistência aberta, em que os atos coletivos, como movimentos sociais e revoluções, tornam-se visíveis e prontamente caracterizados como resistência e que buscam ser reconhecidos como tal.

Jaciara foi uma das fundadoras do coletivo, tendo iniciado, portanto, uma discussão formal sobre igualdade de gênero na IES. A influência de professoras e situações vividas foi a principal razão que levou ao surgimento do grupo, conforme relata: “Tive professoras que abordavam o feminismo, mas o que me fez criar o coletivo foram situações que vivi na universidade e que me fizeram notar o machismo e a violência. Percebi que ninguém debatia questões de gênero, e achei importante discuti-las”.

Hollander e Einwohner (2004) destacam que, se houver hegemonia de um grupo sobre outros indivíduos, é comum que haja resistência, que pode ocorrer individualmente ou de forma coletiva, sendo esta mais frequente pela força que traz consigo e, de acordo com Scott (2008), pela necessidade de unir forças diante de um grupo que tem poder dominante em relação a outro em diversos aspectos. É nesse sentido que começa a atuação do coletivo feminista, em busca de mudanças diante da estrutura social existente e em oposição ao exercício da hegemonia masculina.

Autores como Hercus (1999), Smith e Johnston (2002), e Wapner (1996) destacam que a articulação de movimentos sociais, a formação de grupos e o ativismo são características intrínsecas ao ato de resistir coletivamente. Este parece ser o caso da história da formação do coletivo feminista em questão. A ideia de busca de ativismo para uma mudança de estrutura social fica clara na fala de Melissa, uma das fundadoras do coletivo: “Não queremos acabar com festas; podemos fazer competições para ver quem dança bem, mas não precisa ser quem tira a roupa mais rápido e passa maionese no mamilo para depois ser vista como puta na universidade no dia seguinte”.

A atuação de resistência do coletivo também passou pela tentativa de conscientização das estudantes. Em um primeiro momento, o coletivo realizou uma pesquisa (que acessamos por meio do repositório do coletivo feminista) sobre situações de agressão contra alunas em uma famosa festa universitária. Como resultado, das 212 alunas da IES que responderam ao questionário, 148 afirmaram terem sido abordadas ou assediadas de maneira agressiva em algum momento da festa por algum aluno. Na descrição sobre as formas de abordagem ou assédio, uma das alunas relatou: “Os homens ficavam insistindo em me beijar, e quando eu dizia não, eles continuavam tentando me forçar. Tinha que me afastar à força ou correr para algum amigo meu”. Com esses resultados em mãos, o coletivo feminista fixou cartazes de conscientização nas dependências da IES com a frase “Não seja esse cara nas festas”, seguido de relatos de assédio sofrido pelas moças respondentes da pesquisa.

A ascensão do coletivo feminista seguiu pelos semestres depois da festa e passou a ser acelerada quando uma aluna da IES, Adriana, assumiu a Presidência do Diretório Acadêmico, não sem dificuldades, conforme relatado por ela: “No começo, era muito difícil atuar na Presidência do Diretório Acadêmico, porque eu era a presidente, só que metade da equipe era composta por homens e a outra metade era de mulheres que não eram proativas quanto ao feminismo”. Mesmo diante das dificuldades, Adriana passou a se envolver cada vez mais com o grupo do coletivo feminista e conseguiu avanços importantes nas ações de resistência das moças, como a proibição da execução de músicas ofensivas compostas pelos rapazes da bateria estudantil.

Autores como Connell e Messerschmidt (2005) e Hyde et al. (2009) argumentam que resistir, nesse contexto, significa realizar ações contra a subordinação da mulher em relação às masculinidades internalizadas em diferentes esferas de nossa sociedade. No caso em análise, a ação conquistada foi a proibição da execução das músicas e, portanto, a quebra de uma situação internalizada: a de ser considerada normal - ou pelo menos permitida até o momento - a adoção de discurso verbal e escrito com claras intenções de exercício das masculinidades hegemônicas, nesse caso representado pelo discurso das letras das músicas. Os resultados conquistados na gestão de Adriana foram tão expressivos que a IES, de modo oficial, emitiu comunicado em que se posicionou “contra o comportamento que ofende, diminui e deprecia outras pessoas em relação à sua classe, etnia e gênero, reforçando a importância de respeitar o código de ética da instituição”, conforme documento que consta em um dos grupos de Facebook analisados, publicado em 2015.

As ações de resposta dos rapazes diante da ampla resistência exercida pelo coletivo feminista, agora consolidado, viriam com força e intensidade cada vez maiores, conforme apresentaremos no ato 3, da contrarresistência.

ATO 3: DA CONTRARRESISTÊNCIA MASCULINA PELA INTENSIFICAÇÃO DE AÇÕES CONTRA AS MULHERES

Kärreman e Alvesson (2009) destaca que o fenômeno da contrarresistência é frequente enquanto forma de reagir a ações de determinado grupo que se sente dominado por outro. Em nosso estudo, a resistência é exercida, em especial, pelo coletivo feminista da IES, e a contrarresistência, pelos rapazes atuantes nos grupos estudantis. Assim como destacado por Connell e Messerschmidt (2005), a contrarresistência pode significar uma exacerbação de conflitos que já existiam anteriormente entre os grupos; nesse caso, esse agravamento é marcado pela intensificação de conflitos no ambiente universitário da IES analisada.

Jaciara comenta que os estudantes tinham um pensamento negativo sobre o feminismo, que se agravou após a proibição da execução das músicas dos rapazes: “Lembro de ir a um bar e os alunos não me emprestarem um isqueiro porque eu era feminista, e de sair briga no bar por causa disso. Era muito tenso”. Ângela traz um relato sobre o que ouvia de rapazes: “[...] o coletivo feminista se opõe às letras das músicas. Deixa a gente cantar! Vocês estão acabando com tudo”. Ângela também relata o seguinte: “Teve um cara que me mandou tomar no cuu por mensagem. Ele disse que, na festa, cantaria no microfone as músicas ofensivas usando meu nome”.

Os ataques ao movimento feminista não ficaram somente no âmbito do discurso. A campanha intitulada “Não seja esse cara nas festas” causou grande conflito entre os alunos da IES e foi boicotada por parte dos estudantes, que rasgaram os cartazes colocados nas dependências da instituição, em sinal de negação ao seu conteúdo (Figura 4). Patrícia relata que foi possível identificar quem rasgou os cartazes, pois o elevador tem câmera. Os rapazes envolvidos na situação não quiseram comentar o motivo de tal comportamento e, segundo Patrícia, eram estudantes que não tinham histórico de problemas relacionados com mau comportamento na IES.

Figura 4
Cartazes da campanha do coletivo feminista antes e depois da depredação

Os ataques também passaram a ocorrer durante os trajetos feitos para os jogos universitários, especialmente nos ônibus que transportavam os alunos participantes. O grau de ofensa ao coletivo se agravou, com novas músicas que expressavam o seguinte: “Você é uma puta sem valor, eu sou diferente, eu vou ser presidente, você, secretária, minha faxineira”. As músicas eram acompanhadas por gritos ofensivos como: “Foda-se o coletivo feminista”; “feminista é tudo gorda”; “feminazis mal comidas”. Enquanto cantavam esses trechos em provocação às integrantes do coletivo, alguns alunos desenhavam nas janelas do ônibus o nome do coletivo feminista acompanhado do símbolo do nazismo. Jaciara relata esse momento:

Estava no ônibus indo, com os colegas da faculdade, para os jogos universitários. [...] todo mundo sabia que a gente era do coletivo feminista e começou a nos provocar. Cantaram a música que eu considero a pior, que ofende as mulheres. Cantaram umas mil vezes. Um menino começou a falar que o coletivo feminista era nazista. Desenhou na janela do ônibus o símbolo do coletivo associado ao símbolo do nazismo. Eu fiquei olhando e pensei: “Meu Deus, o que acontece para isso fazer sentido na cabeça de alguém?”

O termo “feminazi” é usado pejorativamente para descrever indivíduos que são percebidos com opiniões extremas ou radicais, e a construção da expressão é uma associação do coletivo feminista ao nazismo, ideologia responsável por um dos maiores massacres da humanidade no período da Segunda Guerra Mundial. A Figura 5 traz nova menção a essa associação:

Figura 5
Frase ofensiva destinada às moças do coletivo feminista da IES

A frase escrita na porta de uma das cabines do banheiro revela que o termo “feminazi” ainda é utilizado para se referir às integrantes do coletivo feminista, e seu conteúdo indica sentimentos negativos nutridos contra elas durante todo esse tempo. Essa demonização de mulheres proeminentes é uma das formas de contrarresistência identificadas pela pesquisa de O’Connor (2000).

Outra forma de contrarresistência segundo O’Connor (2000) é a estigmatização de qualquer iniciativa em favor das mulheres. As expressões utilizadas pelo coletivo feminista, como “machismo” e “opressão”, passaram a ser usadas pelos rapazes em situações fora de contexto, de forma a diminuí-las, como em frases do tipo “o busão está me oprimindo” ou “achei essa tapioca muito machista”. Dessa forma, eles rotulam situações negativas vivenciadas pelas mulheres como sendo situações banais.

O uso da força ou da violência física também foi relatado como forma de contrarresistência por parte dos rapazes, situação prevista pelos estudos de Anderson e Connell e Messerschmidt (2005) e Umberson (2001). Patrícia foi vítima de agressões físicas por causa de sua atuação no coletivo feminista, conforme relata: “Fiquei conhecida como o rosto do feminismo na faculdade. Por um lado, era legal, pois me procuravam pedindo ajuda, mas todos os que eram contra o feminismo brigavam comigo. Uma vez, jogaram cerveja na minha cara em uma festa da faculdade”. Izis, outra atuante, relata agressões dessa época: “[...] já teve caras que morderam, que arranharam, que bateram nas meninas”.

A luta pelo fim das letras das músicas foi um longo período de conflitos, inclusive no ambiente virtual, posto que parte dos estudantes não conseguia compreender o problema em torno das letras e do comportamento machista durante os eventos promovidos pela associação atlética e o Diretório Acadêmico. Jaciara relembra que havia muita discussão em grupos do Facebook após o comunicado emitido pela IES com a proibição da execução das músicas ofensivas. Em um post curtido por 166 pessoas e com 684 comentários, uma ex-aluna afirmou: “Nunca me senti ofendida com nenhuma música. O pessoal está se preocupando com coisa pequena. Triste acabar com uma tradição de anos”.

Como forma de contrarresistência, mesmo após a proibição, a bateria não reformulou as letras das músicas, apenas deixava de cantar as partes que foram consideradas machistas e ofensivas, mas estimulava o público a continuar cantando esses trechos das músicas. Mariana conta que “quando chegava às festas, na parte problemática das letras, a bateria direcionava o microfone para o público cantar e dizia que era o público que queria cantar música machista, e não a bateria”. Os membros da bateria chegaram a trocar trechos proibidos por “IES censura”, incentivando os estudantes a reagirem contra as integrantes do coletivo que, imediatamente, eram agredidas com copos de cerveja na cabeça.

Um dos principais resultados deste estudo foi evidenciar a força dos movimentos de contrarresistência. Ao declarar que “onde há poder, há resistência”, Foucault (1978, p. 95) nos traz um importante argumento de reflexão. O caso exposto neste texto mostra que o poder por parte do coletivo feminista da IES foi acompanhado por forte resistência dos rapazes dos grupos estudantis da IES como forma de manter seu poder hegemônico. É com esse olhar de contrarresistência que um dos principais membros dos grupos estudantis destacou: “Quando você tá com gente daquela época, quando você tá bebendo com amigos que viram aquilo e que viram todo o processo de proibir aquilo, você sempre acaba cantando como uma forma de protesto pessoal, digamos assim” (César). Notamos que resistência e contrarresistência persistem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo teve o objetivo de analisar as facetas do exercício das masculinidades hegemônicas como meio de contrarresistência de jovens rapazes diante da ascensão de coletivo feminista no contexto universitário. Para atingir esse objetivo, partimos de uma abordagem qualitativa e interpretativista, com uma perspectiva longitudinal por meio de registros entre 2010 e 2019, com o auxílio de uma análise de dados composta por três atos (hegemonia masculina, resistência feminina e contrarresistência masculina).

Nossas evidências estão explicadas pelos conceitos de hegemonia masculina, resistência e contrarresistência presentes na literatura sobre gênero. De acordo com Hollander e Einwohner (2004) e Scott (2008), a hegemonia dentro de um grupo - nesse caso, a hegemonia dos alunos sobre as alunas - levou à criação de um grupo de resistência que deseja obter força contra o grupo dominante e modificar uma estrutura social atual que considera injusta. No caso do nosso estudo, o grupo de resistência é o coletivo feminista e o grupo dominante é representado pelos alunos, que exercem masculinidades hegemônicas. Esta, por sua vez, resiste à resistência do coletivo feminista (Kärreman & Alvesson, 2009; Tildesley et al., 2022), o que chamamos de contrarresistência. Esse movimento de contrarresistência dos alunos foi marcado por fortes atos de violência cometidos em resposta à criação do coletivo feminista e posterior proibição das músicas, o que nos leva ao entendimento de que esses atos de força por parte de mulheres também serviram como catalisadores da violência contra elas. Tal fenômeno é ilustrado pela fala de Patrícia, que cita a agressão recebida (ver o relato do comportamento hostil e violento dos alunos) por causa de sua atuação no coletivo feminista. A violência, nessa situação, é motivada não pela fraqueza dessas alunas, mas por sua força e porque, possivelmente, os alunos não estão dispostos a compartilhar poderes e direitos equânimes com as alunas; em vez disso, as enxergam como ameaça aos seus desejos de poder e exercício de masculinidades.

No contexto de nosso estudo, esses jovens, por vezes, banalizam a violência que cometem contra as alunas. A filósofa contemporânea Hannah Arendt (1906-1975), grande expoente da discussão sobre a banalidade do mal, postula que existe o mal radical (presente nas pessoas do topo que perpetram o mal, simbolizado pelo grupo hegemônico de líderes nazistas no contexto da Segunda Guerra Mundial) e o mal banal. Esse último é o grande responsável pela manutenção e o fortalecimento do primeiro e constitui uma massa que fecha os olhos e aceita o mal radical (segundo a filósofa, o mal banal está presente em uma parcela da população alemã no contexto dos campos de concentração da Segunda Guerra Mundial). Ao atribuir tal visão ao nosso estudo - com o cuidado de manter o grau e o alcance da violência em suas devidas proporções -, os jovens parecem apresentar um comportamento de alienação de grupo que talvez interfira no julgamento de suas ações (ver Arendt & Kroh, 1964, sobre a perda de capacidade de julgamento). Nessa perspectiva, a violência pode ser vista como um privilégio coletivo, e não como uma aberração individual (Connell, 2005).

Com base no aprofundamento de cada ato, este artigo apresenta três contribuições centrais. A primeira, de nível teórico, destina-se à literatura sobre resistência e contrarresistência, pela investigação desse fenômeno no contexto educacional, considerando as interações que ocorrem entre indivíduos de mesmo nível hierárquico, ou seja, alunos de graduação do sexo masculino e feminino. A investigação contribuiu para a literatura de gestão no campo da administração ao evidenciar de que forma a opressão é operada dentro de espaços organizacionais, por meio de seus atores e estrutura, bem como destacar a ainda persistente divisão sexual do trabalho utilizada para ratificar a opressão exercida contra as mulheres na sociedade em diversas esferas, ao associar os termos “secretária”, “faxineira”, “puta” e “sem valor” no trecho de letra de música: “Você é uma puta sem valor, eu sou diferente, eu vou ser presidente, você, secretária, minha faxineira”.

A segunda contribuição, de nível institucional, apresenta relatos que podem servir como forma de denúncia para que gestores de IES (e de outros tipos de organização) reflitam sobre a importância de promover estratégias para lidar com situações similares ao que foi relatado no artigo. No estudo de Tildesley et al. (2022), os entrevistados afirmaram que as equipes de gestão do campus têm sido fundamentais para tornar visíveis as políticas de gênero e divulgar protocolos contra práticas de violência. As autoras defendem que a descentralização da implementação de políticas de igualdade de gênero contribuiu para amenizar a resistência institucional ou a não ação dos órgãos centrais da universidade ou das equipes de governo. Os departamentos considerados mais abertos às questões de gênero, como sociologia e comunicação, atuaram como modelos e demonstraram à equipe de governo e à universidade em geral que a política de igualdade de gênero pode ser ampliada. No entanto, mesmo as IES ou os departamentos que permanecem altamente masculinizados também podem desempenhar um papel instrucional como pioneiros, estabelecendo, assim, um precedente de grande legitimidade, abrindo, inclusive, caminho para essa difusão em outras IES. Ao proibir o hino da bateria, a IES de nosso artigo abriu um precedente importante no combate à violência contra as alunas. Esses espaços mais acolhedores proporcionam reconhecimento mútuo e empoderamento coletivo. Como citado por entrevistado no estudo de Tildesley et al. (2022, p. 25): “nesse contexto de ‘ideologia de gênero’, é importante trabalhar em alianças que reconhecemos, reconhecendo também uns aos outros”. Podemos perceber, portanto, que os atores que integram esse espaço formal da gestão educacional devem se unir para transformar seu local de trabalho e estudo.

A terceira contribuição do artigo, de âmbito individual, provoca reflexão para a construção de equidade de gênero em nossas organizações e sociedade como um todo. Tornar público o contexto de nosso estudo ajuda as alunas a perceberem que não estão sozinhas nessa luta, para que se sintam mais fortes, além de capacitá-las a realizar um trabalho, nem sempre visível, que as ajude a promover uma cultura mais receptiva às políticas de equidade de gênero, constituindo um fator crucial no combate a diferentes tipos de desigualdade e violência de gênero advindas do exercício das masculinidades hegemônicas. Como exemplo dessa contribuição, ao reconhecer essas práticas, os diferentes atores envolvidos (como alunas, alunos, professores, pais, familiares e amigos) podem alertar as IES sobre essa situação, permitindo, assim, uma ação mais efetiva e pontual.

Apesar de alcançarmos essas três contribuições, entendemos que a restrição de nossa análise a somente uma instituição de ensino pode, em algum grau, ser destacada como limitação do estudo, por possivelmente restringir a aplicabilidade de nossas análises a outros contextos organizacionais, ainda que seja defensável a ideia de que diversas outras instituições podem apresentar situações similares àquelas que foram trazidas em nossos resultados.

Em nosso artigo, investigamos o fenômeno das masculinidades hegemônicas e da contrarresistência, com base na percepção de moças e rapazes que vivenciam ou vivenciaram recentemente o contexto do ensino superior e em uma série de documentos. Embora este não tenha sido o propósito de nosso artigo, entendemos que existem possibilidades para estudos futuros que partam da percepção de outros atores sociais que interagem com instituições de ensino e com seus alunos, como professores e gestores de IES. De forma específica, sugerimos pesquisas futuras que tratem do fenômeno da resistência e da contrarresistência entre indivíduos de diferentes níveis hierárquicos, posto que, em nosso estudo, analisamos o fenômeno sob uma ótica não hierarquizada ao trabalharmos exclusivamente com percepções e realidades de estudantes de uma mesma IES. Entendemos, portanto, que a presença de hierarquia tende a mudar a dinâmica dos fenômenos de resistência e contrarresistência no contexto de gênero. Em complemento, sugerimos estudos que partam das categorias de análise que encontramos em nossa investigação, como: i) a busca masculina por liderança e manutenção de poder, além da necessidade de prosperidade perante as mulheres; ii) a formação, o propósito e as formas de combate de coletivos feministas em diferentes organizações e iii) os ataques sofridos por coletivos feministas em decorrência da imagem criada em torno deles.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    18 Abr 2022
  • Aceito
    18 Nov 2022
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