Open-access Segregação planejada nos primórdios de Brasília: o caso da vila Amauri

Planned segregation in the early days of Brasília: the case of Vila Amauri

Resumo

O presente estudo problematiza a segregação planejada em Brasília durante a sua construção, tendo como base o caso da vila Amauri, uma ocupação informal de candangos que existiu entre 1959 e 1960, próxima ao Congresso Nacional, em uma região que posteriormente e de modo planejado seria inundada pelas águas do lago Paranoá. Utilizamos autores clássicos da sociologia urbana para debater as categorias sociológicas da cidade, resgatando, em segundo lugar, estudos a respeito da visão dualista e excludente de discursos que pregavam a modernização. Por último, desenvolvemos uma discussão acerca de Brasília e a segregação planejada nos seus primórdios, evidenciando, por meio de relatos orais, uma apropriação do espaço mais plural e destoante do que aquela apregoada pelos idealizadores do projeto da capital.

vila Amauri; Brasília; modernidade; modernização; segregação socioespacial

Abstract

This study discusses planned segregation in Brasília during its construction, focusing on the case of Vila Amauri, an informal settlement of candangos that existed from 1959 to 1960, near the National Congress, in a region that, subsequently and in a planned way, was flooded by the waters of Lake Paranoá. We used classic authors from the area of urban sociology to discuss the sociological categories of the city, and, in the second stage, we utilized studies about the dualistic and exclusionary perspective of narratives that defended the modernization of Brazil. Last but not least, we discuss Brasília and the planned segregation of the early days of the capital, based on oral reports which reveal that the appropriation of the space was plural and different from what had been announced by the creators of the city’s project.

vila Amauri; Brasília; modernity; modernization; sociospatial segregation

Introdução

Nossa pesquisa partiu do interesse de compreender a extrema desproporção que a memória da vila Amauri, vila de candangos que foi inundada durante o represamento do lago Paranoá, tem em relação àquela que a circunda: a memória de Brasília, capital planejada por meio do modernismo em sua apoteose, bastante influenciada pelos paradigmas do Ciam – Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna, mas também por diversas outras referências (Ficher e Palazzo, 2007; Ficher, 2006). O segundo ponto que nos faz acreditar na importância da vila Amauri nesse debate é que, da mesma forma que Engels usa Manchester para explicar a condição da classe trabalhadora na Inglaterra ou que Luiz Antônio Machado faz uso do ambiente do botequim para explicar as relações sociais do cotidiano de um contexto urbano brasileiro, entendemos que esse caso colabora com alguns estudos que buscam ampliar as discussões sobre a segregação socioespacial nos primórdios de Brasília. Ademais, a discussão a respeito da reminiscência da vila Amauri também enseja questões relativas aos discursos ideológicos da modernização, da modernidade, da segregação e da exclusão de ocupações chamadas de vilas, “invasões” ou favelas.

A vila Amauri foi formada por candangos – como eram chamados os trabalhadores migrantes e menos abastados que atuavam na construção de Brasília – próximo à vila Planalto durante o período de 1959 a 1960. De início, essa ocupação já se destaca das demais por ter sido fruto de um consenso momentâneo entre a Novacap1 e a população que ali se instalou, além de também ter sido fruto de uma ação clientelista, conforme sugerem alguns autores (Del’Isola e Boianovsky, 2013). Essa anuência da Novacap é permeada por ambiguidades, tanto do ponto de vista jurídico quanto do ponto de vista construtivo, concretamente resultando em uma ocupação elevada em densidade populacional e visível informalidade construtiva – uma autoconstrução com escassez de recursos. O que torna esse caso excêntrico é o fato de a vila ter sido permitida especificamente em uma localização que seria inundada posteriormente pelas águas do lago Paranoá, conforme já era sabido pelo governo e pelos dirigentes do projeto.

O esforço de construir uma imagem de modernidade atrelada à nova capital não é novidade, como demonstram diversos trabalhos, como os de Rodrigues (1990), Santos (2008), Ceballos (2005), Videsott (2009), dentre os quais destacamos o trabalho de Navarro (2017), que, por meio de uma análise iconográfica da obra de Marcel Gautherot, atesta a intencionalidade de determinados agentes em esconder imagens de Brasília que não refletissem aquele imaginário pretendido por eles. O fotógrafo, contratado para o empreendimento, acabou sendo impedido de publicar fotos que fugissem do registro típico modernista e monumental, como os que ele realizou, retratando o cotidiano da população pobre brasileira que migrou para o local. A respeito desse tipo de ação, podemos recorrer a Rossi (2010) que problematiza, em profundidade, uma certa coerção implicada no esquecimento, ou seja, aquele esquecimento provocado pelo apagamento intencional, pelos sumiços, pela censura, pela queima de arquivos; coerção esta que se fez presente em séculos anteriores, na contrarreforma da Igreja, por exemplo, e que não foi menos cruel no século XX. O autor também destaca a importância da memória na construção de uma identidade em momentos de revolta, bem como a importância do passado na construção de um futuro ou de um horizonte político.

Podemos dizer que, desde o início, o imaginário Brasília esteve ligado principalmente ao seu caráter monumental. Além de centro do poder político, a cidade também era fruto de uma disputa entre dois projetos diferentes – mudancistas e antimudancistas2–; e, por conta disso, era necessário construir, ao longo dessa disputa, uma representação que pudesse sobrepujar o outro lado (Moreira, 1998; Navarro, 2017). Assim como não podemos deixar de lado a batalha de propaganda que permeou esse período e foi significativa para a construção simbólica da capital, não podemos deixar de notar que a construção desse simbolismo também cumpriu outros papéis mais abrangentes, como a constituição da imagem de um país dito moderno. A organização do caos urbano foi um dos principais preceitos do modernismo, desde o início da sua maturação até o seu auge e declínio. Brasília, sendo o maior projeto modernista realizado até então, seria o símbolo maior da saída do País de seu atraso, meta-síntese do plano desenvolvimentista do presidente Juscelino Kubitschek (Kubitschek, 1955; Laner, 2018; Laner, Faria e Pescatori, 2021) ou do afastamento do “selvagem”, do colonial e de todos os seus fantasmas arcaicos que assombravam o seu imaginário (Berenstein e Lopes, 2017, p. 471).

Conforme demonstra Valladares (2005), essa ideia de modernidade, que tanto se buscava, foi subsídio muitas vezes para que se construíssem representações sociais que contribuíram para transpor para o outro lado do espectro, ou seja, oposto ao moderno, espaços como o do campo ou o do sertão. Essa dualidade, ainda segundo a autora, a partir do início do século XX, passa a ocorrer também em relação à favela. Não por acaso, o mito de origem da favela traz constantemente à tona a sua relação com o povoado de Canudos. Este, antes de chegar às vias de fato do seu massacre, foi constantemente atacado simbólica e ideologicamente pela recém-instituída República como uma população ora monarquista, ora de religiosos fanáticos, de selvagens, de comunistas, enfim, de opositores do progresso e antirrepublicanos.3 A favela, de forma muito similar, também era considerada algo alheio à cidade por parte do discurso político dominante, por representar a falta de progresso, de higiene e de “bons” hábitos (ibid.).

Brasília constitui um caso paradigmático, principalmente no período entre meados da década de 1950 até alguns anos depois da sua inauguração oficial, por se configurar como um gigantesco canteiro de obras. Sua condição de obra imensa e com curto prazo de execução (apenas 5 anos) exigiu, inevitavelmente, um contingente igualmente monumental de trabalhadores. Consequentemente, também foi inevitável prover para essa população expedientes de moradia. Essa situação tão singular suscitou pesquisas e debates buscando abordar as mais diversas perspectivas a respeito da migração e da fixação de grandes contingentes de trabalhadores, assim como do desenvolvimento urbano segregado de uma cidade que se constitui, por um lado, como um grande canteiro de obras e, por outro, como um complexo de grandes vilas e acampamentos operários.

Aqui, partiremos de diversos estudos sobre a segregação social na construção da cidade e os movimentos de resistência, como os de Paviani (1991; 2003), Ribeiro (1991), Quinto Jr. e Iwakami (1991), Gouvêa (1991), Saads (2020), Lancellotti e Guinâncio (2022), e Barbosa e Derntl (2022). Tomaremos como ponto principal, no resgate da memória da vila Amauri, os relatos orais de moradores e conviventes da vila que compartilham seus testemunhos com Neiva (2017) e que estão presentes no documentário Brasília segundo Feldman (1979) de Eugene Feldman e Vladimir Carvalho. Portanto, por meio desse caminho, objetivamos, de maneira primordial, jogar luz sobre o caso da vila Amauri como maneira de aprofundar o conhecimento sobre os modos de segregação socioespacial em Brasília, configurados e, muitas vezes, planejados desde os seus primeiros anos de existência, bem como sobre a sua relação com os discursos que pregavam a remoção ou exclusão de espaços como vilas, favelas, invasões ou cortiços e que contrapuseram esses espaços à ideia de modernização.

A cidade enquanto categoria dependente e contextual

O desenvolvimento e a hipertrofia das cidades modernas no período subsequente à revolução industrial na Europa do século XIX ensejaram estudos sociológicos sobre as cidades e a relação desse fenômeno com a modernização e o desenvolvimento das forças produtivas naquele contexto. A esse respeito, Oliven (2010) sistematiza três perspectivas através das quais os principais expoentes das ciências sociais de então categorizaram a cidade: a cidade enquanto variável dependente, enquanto variável contextual e enquanto variável independente. Tendo como base as reflexões desse autor, podemos dizer que as duas primeiras não são necessariamente concorrentes ou excludentes entre si, enquanto a terceira propõe uma visão dissonante e não conciliável com as outras duas.

A primeira perspectiva sociológica, chamada pelo autor de “cidade como variável dependente”, enxerga a cidade como a objetivação de uma totalidade maior, composta por fatores políticos, econômicos, militares, religiosos, enfim, diversas esferas da vida social. A cidade seria, então, o produto da conjugação dessas diversas esferas fisicamente objetivadas em um espaço, e, portanto, seria necessário também compreender essas esferas para que se compreendesse a cidade enquanto tal: “a cidade não se autoexplica” (ibid., p. 8). Nessa categoria, podemos destacar os trabalhos de Marx e Weber, que, apesar de divergirem em outros aspectos, possuem lentes de análise similares quanto a esse tópico.

A segunda perspectiva sociológica que Oliven (ibid.) aborda compreende a cidade como uma variável contextual. Nesse caso, a cidade é um espaço no qual se desenrola um determinado processo ou o campo a partir do qual se pretende estudar uma determinada questão. Ela torna-se um importante locus para os estudos dessa natureza, uma vez que o poder passa a se deslocar cada vez mais do campo para si. Engels (1887) pode ser um exemplo dessa categoria, ao analisar a situação da classe trabalhadora de um país como um todo, a partir de um local específico: a cidade de Manchester, na Inglaterra.

A terceira perspectiva, essa antagônica às outras, enxerga a cidade enquanto variável independente. Isso quer dizer que ela constitui uma categoria em si, que possui o poder de se explicar assim como de explicar outros aspectos e lugares da vida social, e não o contrário. O grupo mais expoente dessa perspectiva, podemos citar, é o da Escola de Chicago, cujos autores mais conhecidos são: Wirth, Thomas e Park. Cabe, porém, ainda lembrar que estes capturam bastantes referências de Simmel (2005) e do antropólogo estadunidense Redfield – segundo o próprio Oliven (ibid.). Podemos definir essa escola como um agrupamento de pesquisadores, com origem na Universidade de Chicago, interessados em estudar a situação das cidades estadunidenses no início do século XX, quando o país passava por intensas ondas de migração e urbanização (Becker, 1996).

Na mesma medida, entretanto, que essa escola adota essa perspectiva que trata a cidade como um ente autoexplicativo, os seus expoentes acabam elaborando conceitos que fazem forte analogia com conceitos do campo biológico. Para citar alguns, Park (1967, pp. 25-26), por exemplo, usa termos como “processos vitais”, "habitat" ou “patologias”, o que contribui para a construção de uma noção de cidade enquanto um organismo que porta autonomia diante da vontade daqueles que, de fato, a constroem – as pessoas, assim como da sociedade que a engloba. Essa ideia também ajuda a consolidar uma certa noção de universalização da cidade, uma vez que é entendida como uma categoria de seres da mesma espécie, com diferenças desprezíveis. Corrobora isso, por exemplo, o texto de Wirth (1967), que tenta construir uma definição universal de cidade a partir do afastamento ou da aproximação de dois tipos ideais, sendo ambos estadunidenses e europeus ocidentais: a sociedade urbano-industrial ou a do tipo folk rural (ibid., p. 91).

O ponto crucial, conforme descrito por Oliven (2010), é que, a partir dessas formulações, os autores da escola de Chicago chegam a ideias como a de cultura urbana, ou seja, supõe-se que exista uma cultura própria “da” cidade, artigo definido, enquanto ente universal. Entretanto, em primeiro lugar, sabe-se muito bem que esta não é universal, antes um fenômeno influenciado por fatores políticos e culturais locais e nacionais, sendo complexo aceitar a tese de que essa cultura urbana exista de forma autônoma em relação a outros fatores e que ela paire por entre as cidades do mundo, formando subjetividades de maneira similar. Weber (1987) destoa nesse aspecto ao descrever o processo multifatorial e diverso, inclusive de maneira transnacional e transcultural, que pode dar origem às cidades ao longo do tempo, mesmo quando reduz sua lente de análise a somente àquelas cidades europeias fruto da economia de mercado capitalista.

Por conta desses apontamentos críticos, propomos, então, um movimento duplo: tanto uma análise que tome a cidade como uma variável dependente, já que, no caso de Brasília, ela é um espaço de objetivação de estratégias econômicas, políticas e também – porque não – militares, com projetos sociais tácitos; quanto uma análise que a tome como uma variável contextual, já que o caso de Brasília e o da vila Amauri ajudam a explicar, enquanto locus privilegiado de investigação, aspectos tais como: a segregação socioespacial brasileira, tendo como estudo de caso Brasília, a estrutura de classes no País e sua materialização no espaço urbano, assim como as trajetórias migratórias dessa população que flutua ao sabor das políticas de desenvolvimento dirigidas pelo Estado.

Modernização, modernidade e espaços de exclusão

Apesar de várias diferenças percebidas até aqui, em relação aos autores apresentados, existe uma grande convergência em reconhecer a cidade como fruto do processo de industrialização, com sua subsequente imposição de um modo de vida que fosse propício ao desenvolvimento das forças produtivas capitalistas. As cidades foram locais em que a burguesia primeiro conseguiu florescer, e não por acaso ela ganhou forte importância em dois momentos históricos: um primeiro, durante o final da Idade Média, com a burguesia sendo uma classe ascendente naquele momento; e um segundo período, durante a Revolução Industrial, com a conformação de um modo de produção capitalista e a sua consequente generalização e enraizamento (Oliven, 2010).

Weber (1987) faz uma diferenciação concisa nesse aspecto, com respeito às cidades da Antiguidade: enquanto nessa cidade (a pólis) o que caracterizava o direito de cidadão pleno era justamente a posse de um “kleros”, ou seja, uma “terra da qual vivia”, é justamente o contrário que ocorre na cidade moderna (p. 74). O cidadão moderno caracteriza-se precisamente pela separação do seu meio de vida anterior, o que torna o seu espaço local privilegiado de troca de capacidade de trabalho. Apesar de suas divergências em outros aspectos de suas respectivas teorias, Weber e Marx concordam que, na civilização ocidental, o mercado é um traço essencial da cidade moderna, ressaltando a aparição da divisão social do trabalho como precondição para a sua existência (Oliven, 2010). Por sua vez, Engels (1887) explora a ideia da cidade enquanto local de troca e repartição do excedente produzido, a partir da expropriação da classe trabalhadora, repartição que acontece por meio de querelas entre as classes capitalistas.

Os autores da escola de Chicago, apesar de colocarem a cidade em outra categoria sociológica, também reconhecem a importância da divisão social do trabalho e do processo contínuo de industrialização e especialização deste, como um elemento de grande influência na vida social urbana. Park (1967) reconhece logo no início de um de seus textos que a cidade não se caracteriza somente pelas suas características físicas ou geográficas, mas principalmente pela sua organização econômica baseada nesse aspecto. Por exemplo, a socialização na cidade passa, em grande medida, pela troca das relações primárias – aquelas regradas por uma moralidade compartilhada de maneira tácita e por uma relação direta entre os indivíduos, face a face – pelas relações secundárias – aquelas mediadas pelas organizações baseadas em leis positivas, detentoras de uma certa racionalidade (ibid.). Essa racionalidade está no cerne da lógica contábil das trocas mercantis. Wirth (1967) ressalta a interdependência dos habitantes da cidade entre si como pressuposto para a satisfação de suas necessidades básicas. Porém, essa relação se desenvolve como uma fração bem segmentária da esfera de vida do outro, reflexo da alta variabilidade do cardápio de consumo e especialização de serviços em que se desenrola a divisão social do trabalho. Nesses espaços, as relações de utilidade impõem-se de maneira cada vez mais crescente.

Percebemos, portanto, que todas essas transformações vão caracterizando a vida moderna, cujo local privilegiado de trocas se estabelece na cidade. Os processos de industrialização e de urbanização da sociedade, causa e efeito do desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo, vão moldando as relações sociais. A cidade vai se tornando esse espaço de concentração acirrada de exército de reserva, de força de trabalho e dos meios de produção; assim como vai transformando as relações sociais que dela dependem, impondo a racionalidade, a objetividade e a lógica contábil em detrimento de outras subjetividades precedentes; e também, por fim, substituindo todos os desfrutes por opções de consumo. Não demoraria muito para que surgissem propostas que visassem organizar a cidade em prol desses objetivos ou extirpar da cidade as consequências supostamente indesejáveis que derivaram disso.

No Brasil, as primeiras transformações urbanas ocorreram por meio de ações de melhoramento e embelezamento, incluindo melhoramentos em áreas centrais, obras de saneamento e circulação, bem como reformas e ampliações de portos marítimos e fluviais (Leme, 1999; Villaça, 1999). O próprio termo “embelezamento”, usado pela elite para denominar esses planos com uma base europeia, possuía um forte caráter ideológico, servindo para camuflar os seus reais interesses por meio de uma suposta finalidade estética. Concretamente, estes produziram mudanças profundas no tecido urbano e social das cidades (Leme, 1999), a exemplo do caso do Rio de Janeiro no início do século XX: a expulsão de camadas pobres da população do centro das cidades onde foram implementados esses projetos; a mudança na função do centro, servindo a interesses de consumo e deleite das camadas urbanas mais privilegiadas; o maior aproveitamento do capital imobiliário especulativo.

Villaça (1999) retoma o Iluminismo como uma “filosofia revolucionária” que serviu de base para desmantelar e substituir a ordem até então feudal, empecilho para a germinação e desenvolvimento da nova ordem capitalista. A razão e a ciência, vistas pela perspectiva da ideologia dominante como responsáveis pelo progresso passado e futuro da humanidade em diversos campos – como da felicidade, justiça, moralidade, por exemplo –, podem, por conseguinte, também ser vistas como entidades constituídas ideologicamente com a propriedade de existir em si e para si, e para as quais seria legítimo que o ser humano se submetesse. Ou seja, existe um elevado grau de importância atribuído pelas sociedades capitalistas ao que é chamado de conhecimento técnico e científico. Nessa medida, “o capitalismo se impôs, muito do conhecimento que produziu se transmudou em ideologia”, com a razão se descolando da realidade social (ibid., pp. 183-185). O autor ainda complementa:

[...] ideias como a de “plano diretor” ou “planejamento urbano” têm-se mantido e difundido com base em sua “lógica interna” e como adotam um discurso que propõe “formas racionais de organização social” (como a da Cidade-jardim ou a Cidade Satélite pregadas por Agache no Rio). Mais adiante Harvey nos ajuda a entender a sobrevivência, até nossos dias, daquilo que é a questão central desse texto, ou seja, a ideologia da supremacia da razão, base da tecnocracia e do planejamento urbano atual. (Ibid., p. 186)

Por fim, até onde nos interessa, Villaça (ibid., p. 187) complementa que todo o “pensamento urbanístico”, desde os tecnocratas até a Carta de Atenas e os socialistas utópicos, baseou-se nessa crença da supremacia da ciência e da técnica como solução dos problemas urbanos e que estas são as bases do planejamento urbano moderno. No início do século XX, quando as primeiras ideias de embelezamento começam a tomar forma tendo como local privilegiado de execução, no Brasil, a cidade do Rio de Janeiro, então capital do País, as favelas, marca das cidades brasileiras, não por acaso também têm o seu princípio. Valladares (2005) advoga a ideia de que foi exatamente nesse período, início do século XX, que se construíram as representações sociais que influenciaram as tomadas de ação e noções a respeito desse espaço, noções estas que persistem até a segunda metade do mesmo século.

Assim como Villaça (1999), Valladares (ibid.) pactua com a ideia de que as reformas de Pereira Passos, entre 1903 e 1906, tiveram fundamental importância para a elitização do espaço central da capital da época, Rio de Janeiro, em especial na expulsão da população pobre desses locais. Diferentemente de outros períodos históricos no planejamento urbano do País, a hegemonia das elites era tamanha que tais projetos de “embelezamento” foram não somente executados em sua quase totalidade, como também foram anunciados e debatidos dentro do círculo de poder político e econômico (Villaça, 1999). Concomitantemente a essas ações, existiu uma grande gama de profissionais que se encarregou de estudar a pobreza urbana e levantar os primeiros dados, ligados à área da filantropia, jornalística e, principalmente, saúde, revelando, mais uma vez, que o discurso médico e higienista, além daquele discurso estético, criticado por Villaça (1999), também servia para encobrir e justificar a segregação socioespacial que se produzia com aquelas ações. A partir desses estudos, ou seja, a partir da história intelectual da favela, Valladares (2005) reconstitui um “mito de origem” desse espaço.

Vistas como um verdadeiro mundo rural dentro da cidade por aqueles que inicialmente as estudaram, as primeiras favelas no Rio de Janeiro guardam relação com as remoções de cortiços, ocasionadas em virtude das obras do centro da cidade, entre o final do século XIX e início do século XX: os primeiros relatos do morro da Providência ou morro da Favella, por exemplo, são escritos logo após algumas dessas ações. Esse morro, apesar de não ter sido o primeiro, entra para a história por ser a primeira favela a ganhar grande atenção da mídia, do Estado e dos estudiosos e, por isso, cede seu nome específico a uma categoria genérica, por volta da década de 1920. Sua origem tem forte relação com Canudos, já que muitos ocupantes do local eram ex-soldados que trabalharam na campanha e ali se instalaram com a intenção de pressionar o Estado para o pagamento de seus soldos (ibid.).

A relação simbólica entre a favela e Canudos, conforme descreve a autora, vai além, configurando um importante fator que localiza essa categoria em uma conjuntura histórica de preocupação com o futuro da república recém-instituída e uma pretensa “saúde” da sociedade. Ambos eram considerados espaços de transgressão da ordem social e moral, e a famosa obra de Euclides da Cunha, com a descrição física e detalhada de Canudos, estava viva no imaginário intelectual da época. Apesar de posterior à remoção do morro da Favella, a sua história contribuiu como vocabulário visual e instrumento para os primeiros relatos, em especial de jornalistas. Valladares (ibid.) apresenta esses relatos, demonstrando como o trajeto e a narrativa se assemelham à forma como Euclides da Cunha apresenta sua chegada a Canudos, quando essa semelhança não é apresentada literalmente. Nesse sentido, a associação de muitos autores de que o sertão da cidade já começaria às margens das avenidas.

Não somente o urbanismo, nessa época, incorporava vertentes sanitaristas, como a própria ação do Estado fazia-se por meio de campanhas dirigidas por médicos sanitaristas, a exemplo daquelas dirigidas por Oswaldo Cruz, que comparavam visualmente os moradores do morro com piolhos e associavam a higiene do ambiente diretamente com a mudança destes para outro local (ibid., p. 28). Ainda em 1905, temos outro exemplo da influência da área médica na ação urbanística, no início das reformas de Pereira Passos, quando foi criada uma comissão, cujo principal encarregado era o engenheiro Beckhauser, designada para elaborar estudos e apresentar uma análise a respeito das habitações populares na capital federal. Esses estudos enquadraram as habitações da favela no rol de “habitações anti-higiênicas”, determinando ações nesses locais.

Conforme argumenta Valladares (ibid.), engenheiros e médicos já ocupavam um local de destaque na política desde o Império, e, muitas vezes, a ação dos primeiros configurava uma modalidade “coletiva” da ação dos segundos. Esses profissionais possuíam uma visão positivista do papel social da ciência, fundada no pragmatismo da intervenção e do controle, e guiavam-se pela ideia de que era possível e, principalmente, desejável que a técnica fosse dissociada da política para se chegar ao progresso. Concretamente, porém, podemos dizer que, na realidade, esses profissionais serviram como elaboradores da base científica que justificaria a expulsão dessa camada pobre da população. Enfim, também é possível afirmar que estes contribuíram para a construção de uma representação social do espaço da favela como local de vícios e epidemias, representação esta que vai sendo subsídio para a visão que se constrói a respeito dos espaços da pobreza urbana no decorrer do século XX.

A fim e a cabo, a favela, na visão dessas vertentes, assim como na visão do planejamento urbano moderno, materializa o caos que se busca eliminar da cidade. A visão da favela enquanto o “mundo rural” da cidade nos induz às mesmas dualidades de outrora: moderno contra selvagem, civilização contra a barbárie e sertão contra o litoral. A favela seria a transgressão da ordem instituída, em um contexto de preocupação com a nova forma republicana ainda frágil. Importante notar, como veremos a seguir, que essa representação se alastra a quase todos os espaços da pobreza urbana – em muitos casos, em especial de Brasília, também migrantes – e que o próprio termo favela é usado pela elite política ou econômica para designar muitas ocupações e vilas de candangos.

Segregação planejada e a vila Amauri

Em primeiro lugar, faz-se necessário compreender a magnitude da situação que se tem ao empreender a construção de uma nova cidade que será o centro político e administrativo de um País de extensões continentais. Também vale recordar que nesse País, as cidades já demonstravam uma tendência de alto crescimento e concentração populacional – com padrões bem mais próximos dos estadunidenses do que dos europeus. Pensemos que nesses primeiros anos, tomando como base o governo de Juscelino Kubitschek (JK), a cidade seria mais um gigantesco canteiro de obras do que uma cidade, sem todas as funcionalidades, infraestrutura e serviços que se esperaria minimamente. Do canteiro de obras, por sua vez, espera-se um grande contingente de força de trabalho – é fundamentalmente disso que se trata.

O Censo Experimental de Brasília de 19594 já mostrava o impacto de tal empreendimento, quando apresenta a evolução populacional: em 1956, a cidade possuía uma população estimada de seis mil habitantes, dobrando esse número em 1957. No início de 1958, o número já era próximo dos 28 mil habitantes e, em 1959, um ano antes da sua inauguração oficial, o censo registrou cerca de 64 mil pessoas. Há também um dado bem singular: a predominância do gênero masculino era tamanha que o número de homens era o dobro do número de mulheres, autêntica consequência do caráter de um canteiro de obras. O censo também registra uma proporção bem maior de mulheres casadas do que de homens casados. Simões e Alvim (2015) apontam que houve uma grande publicidade, por parte do governo, com o intuito de recrutar pessoas para migrar e trabalhar na construção da capital, que deveria ser minimamente erigida até a data de sua inauguração, ou seja, um período de aproximadamente três anos. Desde “agenciadores” que iam a zonas pobres do sertão buscar potenciais trabalhadores até proprietários de terra que recebiam ressarcimentos do governo para liberar a sua mão de obra: diversas foram as estratégias.

Essa conjuntura se refletiu em marcas espaciais bem fortes na configuração da cidade nesses primeiros anos, tendo como exemplo mais característico os acampamentos planejados pelas construtoras. Ribeiro (1991) usa como lente de análise para seu trabalho os estudos de imobilização de força de trabalho, noção que remete ao controle e a disciplina de populações por parte de um “sistema político-econômico que se expande e, para tanto, necessita recrutar, administrar e controlar, temporária ou permanentemente, populações humanas que lhe produzam consistentemente excedentes e riquezas” (p. 26). Essa noção abarca processos migratórios assim como de proletarização de uma população (ibid.), o que pode ser útil para o recorte temporal, se tivermos em vista que o Brasil, em termos geopolíticos, passava por um período de interiorização de processos e redes de produção e de expansão capitalista, e Brasília foi ponto fulcral nessa estratégia – verdadeira metassíntese (Kubitschek, 1955).

Nos acampamentos planejados pelas construtoras, existia um alto controle da força de trabalho, que ia para além das circunstâncias do seu regime. Ao mapear a organização espacial desses acampamentos, Ribeiro (1991) expõe a existência de equipamentos, tais como cinemas ou campos de futebol, destinados ao lazer dos operários, por exemplo. As cantinas coexistiam dentro dos mesmos acampamentos, como forma de melhor submeter os empregados ao regime de horário das refeições, assim como também manter o controle por parte da empresa. Aliás, esse espaço foi palco frequente de algumas revoltas, influenciando, inclusive, na sua localização dentro da configuração do acampamento.5 Além disso, nesse tipo de organização espacial, ficava evidente o reflexo do sistema de produção e de hierarquia típicos da construção civil. A configuração das moradias obedecia também aos cargos que cada um ocupava: por exemplo, os controladores de produção, trabalhadores mais qualificados, alojavam-se em unidades individuais e unifamiliares. Adiciona-se a isso que estes já haviam constituído famílias e possuíam maior poder de barganha para poder morar com seus membros dentro dos acampamentos. Em outra porção, porém, o autor mostra-se que os alojamentos coletivos eram mais comuns a solteiros e a trabalhadores menos qualificados, como pedreiros e serventes.

Podemos dizer, a partir da classificação de Brasília apontada por Patriota e Januzzi (2019), que esses acampamentos foram os primórdios de uma Brasília classificada. A estratificação de classes, segundo renda e status de posto de trabalho, materializava-se no espaço a partir de então e de forma planejada. Em suma, as empresas responsáveis pela construção de Brasília foram também responsáveis, em grande parte, pela organização, disciplina e controle formais da população candanga, ao ponto de Ribeiro (1991) interpretar os acampamentos planejados por elas como uma forma de instituição total.6 Não se tratava somente de moradias, mas também de disponibilizar “equipamentos ligados à reprodução da vida” (ibid., p. 31). Isso não foi o suficiente, no entanto, para barrar a existência de outras possibilidades que essa população acabou encontrando para se organizar socialmente no espaço. Algumas vilas, conforme citam alguns entrevistados por Neiva (2017), acabaram se conformando no entorno desses acampamentos.

Andrade Junior, por exemplo, um dos interlocutores de Neiva (ibid.), relata que havia sim construções, nos arredores dos acampamentos das empresas presentes na vila Planalto, e que, inclusive, ele vendia produtos lá. Assim como ele, “Soberana” e “Toninho”, moradores da vila Amauri entrevistados por Neiva (ibid.), contam, cada um ao seu modo, como a existência desses acampamentos influenciava na oportunidade de renda de autônomos e comerciantes, sendo bastante comum a venda de comida na porta desses complexos obra-acampamento, assim como a prestação de serviços, principalmente por parte das mulheres, de lavagem de roupas para os peões. A vila Amauri, cujas testemunhas são também os autores desses relatos, era próxima de um córrego e, aparentemente, acabava complementando essas demandas por também estar próxima da vila Planalto – onde havia muitos acampamentos de construtoras.

São muitos os autores que concordam que Brasília se tratava de uma cidade canteiro de obras nesses primeiros anos (Ribeiro, 1991; Quinto e Iwakami, 1991; Simões e Alvim, 2015), em consonância com o que apontavam os dados do censo de 1959: das cerca de 35 mil pessoas economicamente ativas, quase 20 mil eram da indústria da construção. Essa situação trouxe para primeiro plano, e em um primeiro momento, a necessidade de abrigar essa população, o que foi viabilizado por meio de acampamentos de construtoras, conforme já expusemos. Todavia, não era nessa categoria que a vila Amauri se enquadrava. Ela estava próxima desses acampamentos, mas não era de responsabilidade de nenhuma construtora. Sua morfologia espacial era mais orgânica e não seguia um plano cartesiano, rígido, típico de um planejamento urbano. A ocupação informal era erigida tendo como base materiais baratos e de duração efêmera, o que se assemelhava aos mesmos materiais usados em outras ocupações, como em favelas. Se, de um lado, tinha as marcas da clandestinidade, de outro, possuía o “generoso” aval da Novacap para ocupar aquela localização. A vila Amauri crescia de maneira espontânea, significando apenas que esse fenômeno era tolerado devido à sua localização. Isso só pôde ocorrer porque se sabia que, no futuro, aquela região daria lugar ao lago Paranoá (Del’Isola e Boianovsky, 2013).

A efemeridade e a clandestinidade de ocupações tornam-se um princípio que norteia grande parte de assentamentos informais, como favelas e vilas, especialmente em relação aos seus aspectos construtivos (Fialho, 2019). A cortina de fumaça jurídica, aliada, evidentemente, à falta de recursos, norteia a construção por parte de seus agentes. Nessa conjuntura, aqueles que conviveram na Vila ressaltam que a maioria das construções era de madeira. Entretanto, “Soberana” conta com mais detalhes a respeito de outras técnicas, que se repetiam em vários assentamentos candangos:

O governo não dava nada. A maioria das casas era feita e coberta com aqueles tambores de óleo, umas latas, de um metal muito quente. Fazia as paredes e a coberturas (já tinha sauna e não sabia...). Os tambores eram abertos, sem o fundo, e viravam placas, e eram pregadas nas madeiras [...] E as revistas, lindas, viravam paredes. Tiraram tudo daquele primeiro acampamento. Levamos umas madeiras. Na Vila também foi assim. (Apud Neiva, 2017, p. 66)

Em alguns casos, os mesmos parâmetros de construção repetiam-se em outros locais que não conformavam um agrupamento tão povoado, mas apoiavam os canteiros de obra e os alojamentos de construtoras. A influência do aspecto cidade-canteiro é evidente nesse ponto, em que os materiais construtivos acabam sendo as sobras dos materiais da cidade formal e modernista. “Toninho” fala a respeito, por exemplo, da cantina que sua mãe montou próximo a um desses canteiros, no local da superquadra 507 sul: “a cantina era feita com sacos de cimento vazios; não tinha madeira; eram só as telhas de chapa de asfalto, de papelão e os sacos de cimento vazios, dobrados como escama de peixe” (apud ibid., p. 82). Sacos de cimento costumam ser feitos de um papelão ou espécie de papel pardo um pouco mais resistente ao esforço mecânico e principalmente à umidade, por conta da própria proteção à intempérie que o cimento exige. Em “Brasília segundo Feldman”7 um outro relato conta um caso curioso a respeito do uso desse material, que revela também um pouco da aura construída ao redor de Brasília como local de oportunidades e fonte de renda:

Um cearense, trabalhando na construção de Brasília, então resolve escrever uma carta para o Ceará, comunicando os pais como é que estava em Brasília e tudo. Então ele escreve: “meu pai aqui estou em Brasília, trabalhando e ganhando bem. Estou satisfeito aqui com as condições de trabalho. Fiz um barraco de duzentos sacos de cimento”. O pai recebe a carta no Ceará e então disse “Meu filho tá rico. Fez um barraco de duzentos sacos de cimento”. E se deslocou então do Ceará e veio cá. Quando chegou, ele estava na favela do Iapi [...]. Tinha realmente duzentos sacos de cimento, mas era a coberta do barraco do rapaz. Sacos vazios, e não saco de cimento que tivesse levantado a obra. Aí o velho teve uma tristeza, uma decepção, pensando que o filho estava rico. (Desconhecido apud Brasília..., 1979, 8:28-9:19)

É interessante notar, porém, que no próprio Censo Experimental (CCN, 1959, p. 47) já se percebia uma grande oposição à existência de favelas: “Brasília não terá ‘favelas’ – essa é uma das características da nova metrópole, cuja construção e sistema urbanístico não permitem esse tipo de moradia”. Nem mesmo o Núcleo Bandeirante, formação pioneira e autorizada em um primeiro momento, foi poupado de pretensas e potenciais remoções. A Cidade Livre, como era chamada, foi pensada como um entreposto comercial para atender às demandas iniciais da cidade. Por essa razão, inclusive, recebeu uma política de isenção de impostos para incentivar o comércio. Como o crescimento populacional da cidade foi acima do esperado, somado à falta de espaços de consumo e lazer destinados à população, esse setor, que deveria ser desativado em 1959, expandiu-se e criou laços com as outras regiões de Brasília além do previsto. Era comum que muitos trabalhadores fossem se divertir na Cidade Livre aos fins de semana (Simões e Alvim, 2015).

Anos depois, em 1961, o próprio Lúcio Costa pediu formalmente ao presidente – à época, João Goulart – “providências contra a legalização desses núcleos”, preocupado com a consolidação dos núcleos urbanos mais próximos do Plano Piloto. Sugere, o autor do projeto, que a Cidade Livre fosse “gradualmente sangrada”, estabelecendo estratégias para evitar a construção de equipamentos ou melhorias, assim como impedir novas invasões (Moreira, 1998, pp. 104-105). O desejo de remoção de “invasões” – nas palavras do próprio Lúcio Costa – próximas ao Plano Piloto não encontrou respaldo somente nas palavras de seu arquiteto, como também em laudos emitidos pelos técnicos da Novacap (Simões e Alvim, 2015). Apesar disso, a Cidade Livre conseguiu ficar, sobretudo por conta da intensa mobilização da sua população de comerciantes e moradores (Sousa, 1998) – sorte diferente de outras ocupações.

Esse caso é um exemplo da incongruência de Brasília na sua relação com as outras cidades desde os seus primórdios. O Plano Piloto, se observado de maneira isolada e ingênua, sem levar em consideração as outras cidades que hoje – e já naquela época – compõem o sistema urbano, pode passar a impressão de que Brasília de fato se consolidou como uma cidade sem as contradições das cidades grandes: muitas áreas verdes e de lazer, tráfego relativamente menos intenso ou lento, atividades supostamente facilitadas pela setorização, entre outras benesses. Porém, Quinto Jr. e Iwakami (1991, p. 57) chamam a atenção para o fato de que:

[...] a segregação ocorre na exata medida em que se pôde preservar este aspecto límpido do plano original conjuntamente com a formação e expansão das cidades-satélites, estas, sim, uma certa reprodução do que ocorre em todas as cidades, cidades-satélites relegadas até hoje a um certo abandono no que tange ao fornecimento de equipamentos coletivos urbanos e demais “benefícios” do “centro”.

O caso da vila Amauri é único por sua temporalidade prescrita, uma vila de trabalhadores com remoção programada que existiu por pouco mais de um ano, entre 1959 e 1960, e que jaz submersa no fundo do lago Paranoá. A Vila já foi objeto de alguns trabalhos, especialmente no campo da história e do planejamento urbano, mas raramente foi foco central desses trabalhos. Frequentemente, a ela aparece apenas como uma nota ou pequena parte relatando sua inundação e a remoção dos moradores para outras cidades-satélites. Como exemplo, destacamos o estudo de Graciete Costa (2011), que trata da configuração das regiões administrativas do DF e onde a vila Amauri aparece sempre como uma “invasão” cujos moradores foram transferidos para Sobradinho e Gama. No entanto, existem outras abordagens mais sensíveis, como o trabalho de Barroso (2006), que apresenta narrativas da cidade construídas a partir do cordel e dedica um capítulo aos cordelistas da vila Amauri. Já o trabalho de Neiva (2008), que constrói uma interpretação da cidade a partir de cartas recebidas por Juscelino Kubitschek, apresenta vários relatos sobre a vila Amauri, com destaque para várias passagens que tratavam da remoção de vila, inclusive com cartas de moradores reivindicando a permanência.

Nesse sentido, o presente artigo, focando na vila Amauri a partir dos seus poucos, mas valiosos vestígios, procura seguir a linha benjaminiana de construção da história, qual seja, uma história dos vencidos, daqueles que foram violentados e apagados da história, mas cujas reminiscências permitem narrar outros fatos, outros percursos e personagens que precisam fazer parte da história de Brasília.

No atual estágio da pesquisa, para delimitarmos um material, preferimos nos ater às fontes primárias já disponibilizadas por Neiva (2017) e Feldman e Carvalho (Brasília..., 1979). Pretendemos, futuramente, imergir nos documentos presentes no Arquivo Público do Distrito Federal, em especial o projeto “História Oral”, assim como também investigar publicações de jornais da época, como o DC-Brasília. Esperamos que, assim, possamos trazer maior polifonia para a memória da capital, trazendo à superfície a vivência da vila Amauri, e contribuir para um melhor entendimento, do complexo contexto de uma cidade, capital modernista e centro político, também enquanto canteiro de obras.

Apesar da sua remoção programada, seus moradores protagonizaram resistência. Conforme é relatado em “Brasília segundo Feldman”, após o fechamento das comportas do lago Paranoá, à medida que a água subia, foram organizadas comissões para fazer interlocução com Israel Pinheiro, então diretor da Novacap:

Pessoal da Vila Amauri ficou apavorado. Fez duas comissão, mas tinha que falar com Israel Pinheiro, que era o presidente da Novacap. E o Israel Pinheiro não deu atenção. Disse: “Não. A água vai subir mesmo, e as comportas estão fechadas. Vocês se vira pra mudar. Agora o certo é que a água vai subir”. E a água vinha subindo, nos primeiros barracos e já estavam na beira do riacho. E aquilo era cobra, era lagarto, era sapo. E a água chegou a inundar muitos barracos de ficar até pelo joelho. Teve noite de família acordar com água já na cama. (Brasília..., 1979, 13:06-13:43)

As vilas, incluindo a vila Amauri, eram destinadas principalmente para aqueles que traziam suas famílias dos seus locais de origem ou que constituíam família depois que chegavam, já que, nos acampamentos das construtoras, em linha geral, não eram permitidos homens casados (Neiva, 2017; Ribeiro, 1991). Um relato comum de muitas testemunhas da vila Amauri entrevistadas por Neiva (2017) era de que a Vila era repleta de crianças – em decorrência de ter muitas famílias – e tinha uma pulsante atmosfera de lazer. Todos os testemunhos se cruzam nesse ponto, o que tornava a vila Amauri um local com características bem dissonantes de um aspecto mais global de Brasília e principalmente dos acampamentos. A maior parte dos sujeitos desses testemunhos, à época, era criança ou adolescente; e eles recordam, com uma certa nostalgia, esse ambiente – quando não tinham que trabalhar desde muito novos. A exemplo do que conta Elizabeth Fernandes (ibid., p. 88): “Lembro da liberdade [...] Eu era criança e brincava muito. Não sabíamos de violência por lá”. Em outro trecho, a mesma interlocutora diz que “tinha lembrança boa da Vila Amauri”, pois “era criança, tudo era bom”.

Conta-se que os comércios eram simples, mas com uma alta variedade, sendo fácil achar a maior parte dos produtos que se demandava, além de que havia muitos bares e forrós como opções de lazer (ibid.). Com relação à disposição urbana da Vila, o mergulhador José Ricardo Silva disse que parecia seguir, de maneira geral, um partido longitudinal na sua mancha urbana: “as casas, possivelmente seguiam as margens do rio Paranoá. Era estreita e comprida, deveria ter 60 metros de largura, por um quilômetro de comprimento”. Segundo ainda relatam os mesmos entrevistados, provavelmente uma rua central e comprida era o local onde se abrigava a maior parte dos comércios. Um deles chega a comparar essa rua à avenida central da cidade-satélite do Paranoá hoje: uma via comprida, linear, com opções diversas de pequenos comércios e lazeres, fonte de renda dos próprios moradores.

Lá era o melhor lugar para passar os finais de semana e para comer. Eu comia no restaurante da dona Osana. A vila Amauri era o point dos finais de semana nossos. Lá tinha uma avenida principal, bem grande, com botecos dos dois lados. Essa avenida era quase toda de comércio, tinha poucas residências. As residências ficavam mais nas ruas pequenas. O comércio da vila Amaury tinha de tudo, fruta, verdura, fazenda [...]. (L. R. F., apud ibid., p. 42)

A apropriação do espaço pela população era evidente, contrastando fortemente com os aspectos dos acampamentos planejados pelas construtoras, que já vimos anteriormente. Enquanto nesse último existia um rígido controle espacial formal, assim como uma rígida divisão hierárquica e de composição familiar, a Vila é relatada sempre como um espaço de grande comunhão, interação social no espaço público, nas ruas, e de certo desprezo até mesmo pela proteção da propriedade privada por cercas e muros. A setorização, tão característica da cidade moderna, era completamente inexistente. Toninho diz que a vila Amauri:

Comparando com um lugar de agora, era como a vila Buritis, em Planaltina. Muita gente circulando pela cidade, armazém, tudo misturado, não havia nada organizado. Eram barracos de madeira. Em frente à casa da minha mãe, tinha uma empresa que vendia bananas. [...] Tinha muito quintal na Vila. Naquela época a gente brincava na rua... Se você já foi no Buritis, vê que as pessoas andam pela rua. Cachorro, galinha, tudo solto. Lá na vila Amauri também: não tinha cerca, era uma casa do lado da outra, sem cerca. (Apud ibid., p. 83)

O trabalho de historicização da vila Amauri ainda possui um caminho a percorrer, mas desde já podemos concordar, ao menos, com Del’Isola e Boianovsky (2013, p. 383), quando enfatizam que esse foi um momento no qual “a utopia e o mito tiveram de negociar com a história e com o povo de Brasília”; em outras palavras, “tiveram de enfrentar o mundo real [...] que, na retórica modernista, não foi jamais considerado”. Brasília e sua história precisam lidar com o fato de que a sua população mais pobre foi continuamente removida do centro, processo bem similar ao de outras cidades, porém com um agravante: o planejamento e o controle bem mais meticuloso do Estado para exercer tal política. As vilas destruídas e removidas, como a vila Matias, vila Iapi, Morro do Urubu, Morro do Querosene, vila Bernardo Sayão, vila Tenório, vila Esperança, vila Sarah Kubitschek, Sacolândia, vila Paranoá, a própria vila Amauri e muitas outras, representam oportunidades desperdiçadas de se fazer uma outra política urbana, baseada em um outro planejamento, em outros urbanismos que realmente estivessem comprometidos com a qualidade de vida na cidade e com a equidade social. Sintoma disso é a atuação da Terracap, um “banco de terras” que possuía, à época, o controle da maioria das terras do Distrito Federal (Quinto Jr. e Iwakami, 1991, p. 56). Ceilândia, uma das regiões administrativas mais populosas atualmente, foi fruto dessas remoções, quando se expulsou a população da vila Iapi, em 1971 (ibid.).

Considerações finais

O desenvolvimento das cidades durante as transformações estruturais capitalistas que ocorreram nos períodos subsequentes ao processo de industrialização, com seu início na Europa no século XIX, ensejou debates acerca da categoria sociológica da cidade, nos estudos das ciências sociais. Tendo esse debate como ponto de partida, escolhemos abordar a cidade dentro de categorias que a enxergassem como variável dependente e contextual, ou seja, como locus privilegiado de análise de uma situação mais abrangente de transformações e como local de realização das condições (geo)políticas, econômicas e sociais. A partir dessa premissa, analisamos as bases ideológicas, dirigidas pela razão e pela ciência, sobre as quais se desenvolveram os discursos de modernização das grandes cidades como forma de extinguir os problemas urbanos apontados. O planejamento urbano moderno seria uma das ferramentas que resultam desse processo.

No Brasil, no final do século XIX e início do século XX, esses discursos estigmatizam espaços populares como favelas e cortiços, para justificar e construir apoio político para as remoções e expulsão de sua população. O modo dualista de enxergar a favela como um lugar de oposição ao que é considerado moderno prevaleceu no tempo, carregando esse simbolismo até a construção da nova capital, Brasília, apogeu da realização do planejamento urbano moderno. Entretanto, é importante ressaltar que a capital cumpriu muito mais funções para além de concretizar os anseios do movimento modernista, sendo também parte de uma estratégia econômica e geopolítica de interiorização das redes de produção capitalista do País (Laner, 2018). De uma forma ou de outra, a mesma conduta de segregação socioespacial presente de forma estrutural nas cidades brasileiras é aplicada em Brasília, com o agravante de essa segregação ser planejada de forma mais ampla pelo Estado. Exemplos dessa segregação planejada são os acampamentos de construtoras que buscaram disciplinar a força de trabalho, inclusive espacialmente, por meio do controle de todos os âmbitos de sua vida, dentro e fora da esfera produtiva.

Cabe falar que prática e discurso se alinham durante o período em que a cidade foi um grande canteiro de obras na tentativa de afastar de forma sistemática as populações migrantes mais pobres. Já existia, desde então, uma forte marca de delimitação espacial de classes, no sentido da renda e status de seu cargo. Essa aversão a assentamentos denominados “favelas”, “invasões” ou “vilas”, principalmente aqueles próximos do Plano Piloto, está presente tanto nas falas dos autores dos projetos, como em documentos da própria Comissão Censitária Nacional. Entretanto, a população candanga sempre encontrou sua forma de resistência à essa segregação e reinventou à sua forma a reprodução de sua vida social no espaço. Temos, como exemplo, tanto a Cidade Livre como as ocupações que se formavam no entorno dos espaços dos canteiros de obras.

A vila Amauri, fruto de clientelismo político e de uma cessão temporária da Novacap, teve uma vida curta, mas há marcas ainda muito presentes naqueles que a testemunharam. Durante esse período de pouco mais de um ano, foi possível à população candanga, apesar de toda precarização espacial e estrutural, experimentar um modo de viver bem distinto daquele preconizado pelo ideário modernista. A mistura e a informalidade eram características marcantes, segundo muitos relatos a respeito dessa ocupação que “des-setorizava” a vida da população conforme os seus interesses. O lazer e a liberdade das crianças soltas para brincar na rua misturavam-se com um comércio diversificado, que vendia desde bananas até cachaça, um dos melhores locais para os candangos adultos se divertirem e namorarem aos fins de semana. O córrego do Paranoá era o local para as lavadeiras juntas cantarem, enquanto também desempenhava a função de parque para as crianças.

A Vila está presente não somente na memória daqueles que moraram lá, mas também na vida daqueles que a vivenciaram de forma ampla, da sua conexão forte com os canteiros da vila Planalto, assim como também na curiosidade que instiga até hoje mergulhadores do lago Paranoá. No entanto, os relatos não apagam o fato de que a efemeridade dessa experiência produziu uma vida bastante precária no sentido material, escancarada pelos seus aspectos construtivos e pela ausência de infraestrutura. Tratava-se de uma vila densamente povoada e a sua terra firme era um chão batido que assentava barracos de madeira, latões de metal e sacos de cimento – vazios. Ademais, as próprias circunstâncias em que essa Vila se fez possível, tão próxima dos palácios e do Congresso Nacional, porém dentro do lago Paranoá, demarcam o lugar que a população candanga ocupou no planejamento e na memória da capital.

Figura 1
– Barraco na vila Amauri composto por sacos vazios de cimento, região da Sacolândia, como era chamada a ocupação quando as primeiras moradias ali deram lugar

Figura 2
– Mulheres trabalhando na vila Amauri, região da Sacolândia, em meio à materialidade de uma vila da cidade canteiro

Figura 3
– Registro de uma criança na vila Amauri

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  • WIRTH, L. (1967). “O urbanismo como modo de vida”. In: VELHO, O. G. (org.). O fenômeno urbano. Rio de Janeiro, Guanabara.

Notas

  • 1
    Companhia Urbanizadora da Nova Capital, instituída em 1956 por meio da lei n. 2.874 (19 de setembro), com a finalidade de planejar, executar, construir e urbanizar Brasília.
  • 2
    Moreira (1998, pp. 44-47) dedica um capítulo para dissertar sobre a disputa que aconteceu no congresso entre as correntes e os partidos que apoiavam a mudança da capital, mudancistas, e os que não apoiavam, antimudancistas. Assim como no congresso, essa polarização também fica evidente em outros meios, como o jornalístico, e exerce forte influência na propaganda do governo de Juscelino e na construção, simbólica e física, da nova capital.
  • 3
    Os professores Pedro Lima Vasconcellos, professor associado da Universidade Federal de Alagoas, e Walnice Nogueira Galvão, professora Emérita aposentada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, debatem a respeito das caricaturas construídas pela mídia e defensores da República acerca de Antônio Conselheiro e os povos de Canudos no programa “Sertões: histórias de Canudos”, episódios 1 e 2. Disponível em: <https://open.spotify.com/episode/37af732x6kWqYvsA1t64Qq?si=d48ee277bbeb46d7>. Acesso em: 4/10/2022.
  • 4
    Planejado e supervisionado pela Comissão Censitária Nacional (CCN), cuja publicação foi organizada pelo Núcleo de Planejamento Censitário, em 1959.
  • 5
    ”[...] A cantina talvez seja o único local onde, no cotidiano, o operariado se encontra, se visualiza como coletivo, sentindo latentemente o seu poder de ação conjunta” (Ribeiro, 1991, p, p. 39).
  • 6
    O autor utiliza Goffman para definir essas instituições, cujas características centrais são: (1) “todos os aspectos da vida são realizados no mesmo local e sob uma única autoridade”; (2) “cada fase da atividade diária do participante é realizada na companhia imediata de um grupo relativamente grande de outras pessoas, todas elas tratadas da mesma forma e obrigadas a fazer a mesma coisa em conjunto [...]”; (3) “todas as atividades diárias são rigorosamente estabelecidas em horários [...]” e (4) aquelas obrigatórias são “reunidas num plano racional único, supostamente planejadas para atender aos objetivos oficiais da instituição” (Ribeiro, 1991, p, pp. 46-47).
  • 7
    Ver Brasília... (1979).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Set 2023
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    04 Out 2022
  • Aceito
    15 Mar 2023
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