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BIODIGESTÃO ANAERÓBICA: UMA ALTERNATIVA PARA USINAS DE LATICÍNIOS

ANAEROBIC DIGESTION: ONE ALTERNATIVE FOR MILK PLANTS

Resumos

RESUMO O objetivo deste trabalho foi mostrar a viabilidade da utilização de biodigestores anaeróbicos na redução do DQO e DBO nos resíduos de laticínios e como fonte de energia, através da produção de metano (CH4). O processo apresenta basicamente três estágios importantes na compreensão das fermentações anaeróbicas, devido aparecer inúmeros microrganismos interatuantes na degradação do substrato. A biodigestão anaeróbica é bastante sensível à variações ambientais, o que ocasiona um desequilíbrio nas populações bacterianas afetando o rendimento e a velocidade do processo. Entretanto, hoje é uma alternativa nobre para o tratamento de efluentes líquidos industriais e, principalmente, os de usinas de laticínios que geram efluentes com elevada carga orgânica.

biodigestores; biodigestão anaeróbica; produção de metano


SUMMARY The objective of this research was to study the feasibility of anaerobic biodigestors on the reduction of chemical and biological demand of oxigen of dairy plants residues and as a methane producers as energy resource. Basicaly there are three stages on the anaerobic fermentation due the presence of several microrganisms that interact during substrat degradation. Anaerobic digestion is sensitive to environmental variations that results in desiquilibrium on bacterial populations thus affecting the process rate. Nevertheless it is an alternative for treating organic liquid industrial residues from milk plants.

biodigestors; anaerobic digestion; methane productions


BIODIGESTÃO ANAERÓBICA: UMA ALTERNATIVA PARA USINAS DE LATICÍNIOS

ANAEROBIC DIGESTION: ONE ALTERNATIVE FOR MILK PLANTS

- REVISÃO BIBLIOGRÁFICA -

Melânia Palermo Manfron1 1 Farmacêutica-Bioquímica, Pós-Graduada em Ciência e Tecnologia de Alimentos. Departamento de Ciência e Tecnologia Agroindustrial-USP, Caixa Postal 9, 13:400 - Piracicaba - SP.

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi mostrar a viabilidade da utilização de biodigestores anaeróbicos na redução do DQO e DBO nos resíduos de laticínios e como fonte de energia, através da produção de metano (CH4). O processo apresenta basicamente três estágios importantes na compreensão das fermentações anaeróbicas, devido aparecer inúmeros microrganismos interatuantes na degradação do substrato. A biodigestão anaeróbica é bastante sensível à variações ambientais, o que ocasiona um desequilíbrio nas populações bacterianas afetando o rendimento e a velocidade do processo. Entretanto, hoje é uma alternativa nobre para o tratamento de efluentes líquidos industriais e, principalmente, os de usinas de laticínios que geram efluentes com elevada carga orgânica.

Palavras-chave: biodigestores, biodigestão anaeróbica, produção de metano.

SUMMARY

The objective of this research was to study the feasibility of anaerobic biodigestors on the reduction of chemical and biological demand of oxigen of dairy plants residues and as a methane producers as energy resource. Basicaly there are three stages on the anaerobic fermentation due the presence of several microrganisms that interact during substrat degradation. Anaerobic digestion is sensitive to environmental variations that results in desiquilibrium on bacterial populations thus affecting the process rate. Nevertheless it is an alternative for treating organic liquid industrial residues from milk plants.

Key Words: biodigestors, anaerobic digestion, methane productions.

INTRODUÇÃO

As reações químicas que ocorrem no meio ambiente, devido à adição de contaminantes por dejetos de resíduos industriais, constituem um sério problema em termos de poluição ambiental. Estas reações são fenômenos que individualmente apresentam causas e efeitos, um dualismo que freqüentemente passa despercebido.

A biodigestão anaeróbica é um dos métodos para tratamento de resíduos poluidores, de origem orgânica, que consiste na degradação de compostos orgânicos em substâncias mais simples como metano (CH4) e dióxido de carbono (CO2), através da interação de diferentes microrganismos que atuam na ausência de oxigênio (GONÇALVES, 1982).

Segundo HUGHES (1980) e COSTA (1986), a biodigestão anaeróbica apresenta três aspectos importantes nos tratamentos biológicos de resíduos: diminuição da poluição, através da estabilização do material orgânico pela degradação das moléculas; produção de biogás, fonte alternativa de energia, pela metabolização do substrato e produção de biofertilizantes.

O objetivo deste trabalho foi mostrar a viabilidade da utilização de biodigestores anaeróbicos na redução de DQO e DBO nos resíduos de laticínios e como fonte de energia, através da produção de metano (CH4).

Princípios da Fermentação Metânica

Em 1934, foi sugerida a teoria da "redução do dióxido de carbono", como aplicável à produção de metano de compostos orgânicos. O principal suporte dessa teoria foi a demonstração realizada em 1910 por SOHNGEN a respeito da fermentação do hidrogênio, na presença de CO2 para metano: 4 H2 + CO2 ------ CH4 + 2 H2O.

Diversas teorias têm sido propostas para elucidar o fenômeno fermentativo da biodigestão anaeróbica (BUSWELL & SOLLO, 1948, BUSWELL & MUELLER, 1952; BARKER, 1956; BRYANT, 1979; McINERNEY & BRYANT, 1980). Em todos os processos fermentativos existe uma complexa mistura de espécies microbianas distintas, porém sintroficamente arranjadas, e com alta especificidade por substratos definidos gerando, em contrapartida, produtos específicos e intercomplementares (BUSWELL & SOLLO, 1948; BUSWELL & MUELLER, 1952; BARKER, 1956; TOERIEN et al, 1967; PERES, 1982; HUNGATE, 1982).

Por muitos anos, a digestão anaeróbica foi descrita como sendo um processo fermentativo de dois estágios (Figura 1): um de formação de ácidos orgânicos e outro de produção de gases, principalmente de metano e gás carbônico (CRAVEIRO, 1982; PERES, 1982; SOUZA, 1982). O primeiro estágio envolve bactérias fermentativas não metanogênicas na formação de ácidos, as quais obtém energia para o seu crescimento através da hidrólise dos polímeros, que compõem a matéria orgânica, fermentando os produtos desta hidrólise a ácidos orgânicos, alcoóis, gás carbônico , hidrogênio, amônia e sulfetos. O segundo estágio envolve várias espécies de bactérias metanogênicas na formação de metano (CH4), as quais obtêm energia para o seu crescimento catabolizando os produtos do primeiro estágio a gás carbônico e metano, segundo BRYANT (1979).


Os vários estudos sobre as interações metabólicas entre as bactérias fermentativas e entre estas e as metanobactérias, além das evidências de que estas bactérias não catabolizam ácidos orgânicos, exceto o fórmico e o acético, aliadas ainda a descoberta da importância da produção de H2 na fermentação metanogênica, reforçaram a tese de que a proposição anterior de dois estágios não é satisfatória (McINERNEY & BRYANT, 1980).

BRYANT (1979) e DITCHFIELD (1986) citam que o hidrogênio molecular (H2) é produzido a partir dos álcoois formados no primeiro estágio, e são oxidados a acetato ou outros ácidos carboxílicos. Os ácidos graxos de número par de átomos de carbono são oxidados através da oxidação a acetato e hidrogênio molecular (H2), enquanto que os ácidos graxos de número impar de átomos de carbono formam acetato, propionato e hidrogênio molecular. Os microrganismos deste processo são os responsáveis pela redução de prótons e descarboxilam o propionato a acetato, gás carbônico e hidrogênio molecular (BRYANT, 1979; McINERNEY & BRYANT, 1980). Entretanto, os ácidos graxos de cadeia carbônica maior do que o acético, particularmente o propionato e o butirato, são muito mais importantes que o lactato e o etanol como intermediários na biodigestão anaeróbica (PERES, 1982).

O terceiro estágio, apresentado na figura 2, mostra o envolvimento das bactérias metanogênicas, as quais utilizam os produtos do primeiro e do segundo estágios, principalmente o hidrogênio molecular, o gás carbônico e/ou acetato, na produção de metano e gás carbônico (WOLFE, 1981; KUBIAK & DUBUIS, 1985). Contudo, os álcoois e ácidos orgânicos de cadeia carbônica maior do que do acético não são catabolizados por metano-bactérias (BRYANT, 1979).


Segundo PERES (1982), a partir da presença de uma quarta população microbiana em biodigestores, inúmeros estudos têm sido realizados, com o objetivo de caracterizar outros microrganismos, bem como elucidar o seu papel na seqüência de reações da degradação anaeróbica da matéria orgânica. A inclusão de mais um estágio no esquema de biodigestão anaeróbica (Figura 3), além dos três estágios postulados por BRYANT (1979), e proposta por vários autores (TOERIEN et al, 1967; McINERNEY & BRYANT, 1980; Zeikus apud PERES, 1982) a partir da constatação de que são obtidos rendimentos em metano, de 4 a 6% superiores ao rendimento teórico, quando se determina a quantidade de metano oriunda do acetato. Este novo estágio seria caracterizado por organismos que, a partir da reação CO2 + H2, seriam capazes de gerar acetatos, denominados homoacetogênicos (McINERNEY & BRYANT, 1980). Segundo PERES (1982) os gêneros Clostridium e Acetobacterium têm sido os únicos reconhecidos, que se enquadram no grupo; apresentam um metabolismo mixotrófico e catabolizam tanto H2/CO2 como compostos de vários carbonos.


Segundo Zeikus apud LACERDA (1988) foram encontrados em biodigestores, bactérias hidrolíticas total (108- 109/ml; a maioria bastonetes Gram negativos); bactérias proteolíticas (10/ml; principalmente o gênero Eubactérium); bactérias acetogênicas produtoras de hidrogênio (106/ml; foram identificados bastonetes Gram negativos); bactérias homoacetogênicas (105 - 106/ml; os gêneros Clostridiume Acetobacterium); e as bactérias metanogênicas (106 - 108/ml; principalmente Methanobacterium, Methanospirillum, Methanosarcina e Methanothrix").

O que se pode deprender de tudo o que foi exposto, é que o estudo detalhado dos microrganismos interatuantes na degradação do substrato, apresenta grande valia para a compreensão e otimização de qualquer processo, bem como para o estudo analítico de alguns componentes das fermentações anaeróbicas (MANFRON, 1990).

Parâmetros Que Afetam a Biodigestão Anaeróbica

A biodigestão anaeróbica é bastante sensível à variações ambientais, qualquer alteração no processo causa desequilíbrio entre as populações bacterianas afetando diretamente o rendimento e a velocidade do processo (SOUZA, 1982; MANFRON, 1990).

DITCHFIELD (1986) relata que dos grupos de microrganismos encontrados nos biodigestores, as bactérias metanogênicas são realmente as mais susceptíveis às variações ambientais e as que possuem menores velocidades de crescimento. Entretanto, PERES (1982) cita ser extremamente difícil analisar os efeitos químicos e físicos em qualquer sistema biológico e em um biodigestor os principais parâmetros que devem ser constantemente analizados são: temperatura, pH, composição da matéria orgânica, taxa de alimentação e composição inorgânica do substrato. MANFRON (1990) chama a atenção para os fatores temperatura, pH, e taxa de alimentação como sendo extremamente importantes para o bom desempenho das bactérias metanogênicas em biodigestores anaeróbicos.

A biodigestão anaeróbica pode se dar em temperaturas superiores a 10°C e inferiores a 65°C. Nessas condições, a produção de metano tem duas situações ótimas, uma em fase mesofílica em torno de 40°C, a outra em zona termofílica em torno de 50-55°C (KUBIAK & DUBUIS,1985). De um modo geral, CAEEB (1981) cita como temperatura ótima para o processo de biodigestão anaeróbica 35°C, para uma amplitude térmica de 30°C a 37°C.

A faixa de pH ótima para o crescimento de muitos microrganismos se encontra entre 6,4 a 7,2. Uma diminuição do pH pode resultar em uma elevação na concentração de ácidos graxos voláteis e , portanto, ocorrer inibição da metanogênese. Para valores de pH elevados, acima de 8,0, existe uma acentuada redução da concentração de dióxido de carbono livre no meio e uma maior formação de hidrogênio e amônia (BARKER, 1956). KEENAN & LA GREGA (1976) relatam que a alcalinidade em um biodigestor anaeróbico representa a expressão do poder tampão deste meio, através do qual são neutralizados os aumentos excessivos dos ácidos voláteis. SOUZA (1982) considera que, um biodigestor anaeróbico apresenta como maior problema a queda do pH a valores inferiores a 6,8. O equilíbrio do pH e importante e, segundo KUBIAK & DUBUIS (1985), pode ser assegurado através dos bicarbonatos dissolvidos se a sua concentração for igual ou maior que 1500mg/l o que garante níveis adequados para a biodigestão. Entretanto, MANFRON (1990) lembra que, o uso de determinadas técnicas podem inviabilizar a utilização de biodigestores pelas indústrias de laticínios, pela elevação dos custos.

A necessidade nutricional das bactérias metanogênicas é satisfeita por praticamente qualquer substrato orgânico e isto porque, ao ser degradado, este compõem-se de carboidratos, lipídeos e proteínas. A maioria destes microrganismos requerem somente alguns sais, CO2 e amônia como fonte de nitrogênio, e sulfeto como fonte de enxôfre. A amônia é essencial ao crescimento destes microrganismos, sendo que nenhuma das espécies conhecidas utiliza-se de aminoácidos ou peptídeos. Além de sulfetos, algumas espécies metabolizam também cisteína (PERES, 1982). As bactérias acidogênicas apresentam uma flexibilidade bem maior do que a das bactérias metanogênicas, quanto à utilização de nutrientes (COSTA, 1986). As bactérias metanogênicas necessitam para uma biodigestão anaeróbica perfeita, em termos de estabilização e produção de gás, basicamente, nitrogênio e fósforo (BRYANT, 1979; HUNGATE, 1982; PERES, 1982) e baixas concentrações de nutrientes como: o cálcio, o magnésio, o potássio, o zinco, o ferro e o cobalto. Heynell apud LACERDA (1988).

Segundo MANFRON (1990), além de todos os fatores relatados anteriormente, cabe destacar alguns aspectos importantes na produção de gás metano, tanto em escala laboratorial como em escala industrial, que são: o tempo de retenção hidráulica (TR) parâmetro utilizado para expressar a velocidade do processo, definido como sendo o volume do biodigestor/vazão do resíduo; tipo de biodigestor a ser utilizado e o modo de alimentação. Em resumo, a definição dos objetivos que se têm em mente quando se pretende empregar algum método, seja visando a redução de carga poluente ou a geração de energia pelo processo. Este autor utilizou biodigestores anaeróbicos com o sistema de alimentação diária semicontínuo, utilizando, para tanto, o subproduto da produção de queijo, o soro.

Os processes anaeróbicos são hoje uma alternativa nobre para o tratamento direto de efluentes líquidos industriais e, principalmente, os de usinas de laticínios que geram efluentes com elevada carga orgânica (MANFRON, 1990).

Basicamente, as características de um resíduo industrial considerados na viabilidade técnica e econômica do processo anaeróbico são: grau de biodegradabilidade, concentração de nutrientes, pH e concentração de compostos tóxicos (SOUZA, 1982). Em relação ao grau de biodegradabilidade, em resíduo pode ser considerado biodegradável quando suas demandas químicas e biológicas de oxigênio obedecem a relação DQO/DBO = 2 a 3. No caso do soro de queijo a relação se encontra na faixa de 2 a 3, com isso evidentemente mais fácil e eficiente será seu tratamento por processes biológicos (DBO = 30 a 40gDBO/l de soro, DQO = 60 a 80gDQO/l de soro) (BYLUND, 1975; SOUZA, 1982).

AGRADECIMENTO

O autor agradece ao professor Dr. CLAUDIO LOVATO, pela versão inglesa do resumo.

Aprovado para publicação em 12.06.91.

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  • 1
    Farmacêutica-Bioquímica, Pós-Graduada em Ciência e Tecnologia de Alimentos. Departamento de Ciência e Tecnologia Agroindustrial-USP, Caixa Postal 9, 13:400 - Piracicaba - SP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Set 2014
    • Data do Fascículo
      Abr 1991

    Histórico

    • Aceito
      12 Jun 1991
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