Dietas naturais na criação de Chrysomya albiceps (Wiedemann, 1819; Diptera: Calliphoridae): estudo comparado

Natural diets to rear Chrysomya albiceps (Wiedemann, 1819; Diptera: Calliphoridae): a comparative study

DIETAS NATURAIS NA CRIAÇÃO DE Chrysomya albiceps (WIEDEMANN, 1819; DIPTERA: CALLIPHORIDAE): ESTUDO COMPARADO

NATURAL DIETS TO REAR Chrysomya albiceps (WIEDEMANN, 1819; DIPTERA: CALLIPHORIDAE): A COMPARATIVE STUDY

Rosemary Cardoso Ribeiro¹ Eliane Maria Vieira Milward-de-Azevedo²

RESUMO

Procurou-se observar o desenvolvimento pós-embrionário de Chrysomya albiceps, testando-se, comparativamente, dietas à base de sardinha e carne eqüina. Os substratos frescos foram previamente mantidos a 30°C de temperatura durante duas horas. Foram inoculadas 50 neolarvas em 100g de dieta por repetição. Utilizaram-se quatro repetições por tratamento. O experimento foi conduzido em condições de laboratório. O peso médio das larvas após o abandono espontâneo das dietas foi de 91,19mg, no substrato à base de carne eqüina e 76,01mg, no substrato à base de sardinha, a diferença foi, portanto, significativa. A taxa de sobrevivência larval registrada foi superior a 80%, enquanto a taxa de sobrevivência pupal foi próxima a 100%. A razão sexual foi próxima a 0,5. A dieta à base de carne eqüina mostrou-se mais adequada ao desenvolvimento de C. albiceps, pois as larvas mantidas neste substrato apresentaram-se mais pesadas, o que potencializa a capacidade reprodutiva do adulto.

Palavras-chave: Chrysoma albiceps, dietética, mosca varejeira, necrofagia.

SUMMARY

The objective of the present study was to observe the postembryonic development of Chrysomya albiceps reared on sardines or horse meat and to compare the results. Fresh substratos were maintened m an oven ai 30°C for 2 hours. Fifty newly emerged larvas were inoculated into 100g diel per reptication. Four replications per treatment were used. The experiment was conducted under laboratory conditions. The mean weight of postfeeding larvas was 91.19mg for especimens reared on horse meat and 76.01mg for especimens reared on sardines, with a marked difference between diets. Larval viability was more than 80% for the two diets, while pupal viability was dose to 100%. The sex ratio was about 0.5. The horse meat diet proved to be more adequate for the development of C. albiceps since the larvas weighed more, with consequent potentiations of adult reproductive abilily.

Key words: Chrysomya albiceps, blowfly, dietetics. necrophagy.

INTRODUÇÃO

A carne eqüina, utilizada como dieta alimentar para larvas de dípteros necrófagos, em laboratório (QUEIROZ & MILWARD-DE-AZEVE-DO, 1991), tem permitido a criação ininterrupta de Chrysomya albiceps (Wiedemann). ULLYET (1950) deu preferência à carne bovina para a manutenção de estoques; este também foi o substrato usado por MARCKENKO (1985).

Por outro lado, a ocorrência e a abundância desse muscóide, na América do Sul, tem sido rotineiramente monitoradas através da utilização de armadilhas iscadas com sardinha (BAUMGARTNER & GREENBERG, 1985; D' ALMEIDA, 1994; LOMÔNACO & ALMEIDA, 1995; CARRARO, 1995). Especulou-se, assim, que este substrato poderia representar, em criações de laboratório, um recurso dietético alternativo. É um meio de fácil aquisição no mercado e o seu custo, reduzido. Conseqüentemente, procurou-se, neste trabalho, comparar o desenvolvimento pós-embrionário de C. albiceps mantida, durante o estágio larval, em dietas à base de sardinha e carne eqüina, em início de putrefação.

MATERIAIS E MÉTODOS

O experimento foi conduzido sob condições de laboratório. A temperatura e a UR oscilaram entre 19 e 27°C e entre 60 e 80%, respectivamente. Não houve controle de luz.

O estabelecimento da colônia de C. albiceps e a metodologia empregada durante a etapa experimental seguiram a orientação proposta por QUEIROZ & MILWARD-DE-AZEVEDO (1991).

As larvas, pertencentes à segunda geração, foram criadas em duas dietas naturais: carne eqüina e sardinha. Os substratos previamente frescos e submetidos a baixa temperatura (-15°C) foram posteriormente transferidos para um refrigerador, durante o intervalo de 24 horas, visando seu descongelamento. Em seguida, foram aquecidos em estufa regulada a 30°C de temperatura, durante duas horas.

Utilizaram-se quatro parcelas por tratamento. Cada parcela constou de 50 neolarvas alceadas em 100g de dieta. As observações foram diárias. Foram monitoradas as seguintes variáveis: duração do desenvolvimento e taxas de sobrevivência dos estágios larval e pupal e massa corporal das larvas maduras. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado. As médias foram comparadas pelo teste "t" de Student. A razão sexual registrada em cada tratamento foi contrastada com a razão sexual esperada para a espécie (=0,50), através da utilização do teste de X².

RESULTADOS

A duração média do estágio larval de C. albiceps, não diferiu, significativamente, entre os tratamentos; o desenvolvimento, nesta fase, ocorreu em cerca de 7 dias. As larvas criadas na dieta à base de carne eqüina apresentaram-se, em média, significativamente mais pesadas: 91,2mg. As larvas maduras oriundas da dieta à base de sardinha pesaram, em média, 76,0mg (Tabela 1). A Figura 1 ilustra o percentual de larvas observado em função das massas corporais, incluídas em intervalos regulares (de 10mg), e do dia do abandono espontâneo dos especimens das dietas. Todas as larvas maduras oriundas da dieta à base de sardinha e que apresentaram mais de 100mg de peso corporal pupariaram 8 dias após a inoculação das neolarvas no substrato. O tipo de dieta utilizada não influenciou a taxa de sobrevivência das larvas. Aproximadamente, 85% das larvas oriundas das duas dietas, pupariaram (Tabela 1).

A duração do estágio pupal ocorreu em cerca de 6 dias, nos dois tratamentos. A taxa média de sobrevivência, nesta fase de desenvolvimento, foi otimizada, oscilando entre 97,0 e 99,5% (Tabela 2).

Os adultos provenientes de larvas criadas na dieta à base de carne eqüina apresentaram-se mais precoces; neste tratamento, a emergência ocorreu do 13° ao 14° dia após a inoculação das neolarvas no substrato. Na amostra onde utilizou-se sardinha como dieta, obteve-se imagos entre o 13° e o 15° dia (Figura 2). A razão sexual registrada foi próxima à esperada (=0,50), nos dois tratamentos (Tabela 2).

DISCUSSÃO

As larvas de C. albiceps criadas na dieta à base de carne equina não apenas apresentaram uma taxa de velocidade de desenvolvimento mais rápida, como, possivelmente, uma maior taxa de assimilação de nutrientes, refletida pelo maior ganho de peso obtido. O incremento da massa corporal, até determi-nados limites, potencializa a capacidade reprodutiva emigratória dos adultos (SLANSKY & SCRIBER, 1985). Entretanto, embora o desempenho médio mostrado pelas larvas criadas em dieta à base de sardinha tenha sido mais insatisfatório, todas as larvas apresentaram peso superior a 60mg. QUEIROZ & MILWARD-DE-AZEVEDO (1991), trabalhando sob condições controladas, observaram que apenas as larvas desta espécie que apresentaram mais de 42mg de peso, originaram adultos.

É importante destacar, entretanto, que o efeito materno determinado por matrizes oriundas de larvas criadas em dieta à base de carne eqüina putrefata, não deve se desprezado (BOLLER, 1972; SMITH & CORNEL, 1979). Este efeito pode ter influenciado a utilização e o consumo da dieta à base de sardinha pelas larvas, ocasionando uma redução em seu peso. Sugere-se, assim, a realização de ensaios que minimizem esta variável, assumindo a manutenção de estoques que incluam, rotineiramente, a utilização das dietas específicas.

CONCLUSÃO

Considerando-se a metodologia empregada, a carne eqüina apresenta-se, potencialmente, como uma fonte alimentar mais satisfatória do que a sardinha, ao visar-se a manutenção de estoques de C. albiceps. Entretanto, a disponibilidade de recursos alimentares, nos locais de trabalho, deverá orientar as decisões, pois a sardinha pode ser assumida como uma fonte alimentar alternativa.

² Médico Veterinário, Bolsista de Pesquisa do CNPq, Departamento de Parasitologia Animal, Instituto de Biologia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 23851-970 - SEROPÉDICA - RJ, E-mail: [e-mail]. Autor para correspondência.

Recebido para publicação em 03.07.96. Aprovado em 23.04.97

• BAUMGARTNER, D.L., GREENBERG, B. Distribution and medical ecology of the blow files (Diptera: Calliphoridae) of Peru. Ann Ent Soe Amer, v. 78, n. 5, p. 565-587, 1985.
• BOLLER, E. Behavioral aspects of mass-rearing of insects. Entomophaga, v. 17, n. l, p. 9-15, 1972.
• CARRARO, V.M. Descrição quantitativa de Chrysomya megacephala, Chrysomya albiceps e Cochliomyia macellaria (Diptera: Calliphoridae), no Campus da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, em função da utilização da isca à base de sardinha III p. Tese (Mestrado em Parasitologia Veterinária) - Curso de Pós-graduação em Medicina Veterinária - Parasitologia Animal, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 1995.
• D' ALMEIDA, J.M. Substratos de criação de dípteros caliptratos (Calliphoridae, Fanniidae, Muscidae e Sarcophagidae) em condições naturais e de laboratório 236 p. Tese (Doutorado em Biologia Parasitária) - Curso de Pós-graduação em Biologia Parasitária, Instituto Oswaldo Cruz, 1994.
• LOMÔNACO, C., ALMEIDA, J.R. Sazonalidade e uso de recursos para alimentação e oviposição de dípteros muscóides na Restinga de Jacarepaguá, Rio de Janeiro, Brasil. Revta bras Ent, v. 39, n. 4, p. 883-890, 1995.
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• QUEIROZ, M.M.C., MILWARD-DE-AZEVEDO, E.M.V. Técnicas de criação e alguns aspectos da biologia de Chrysomya albiceps (Wiedemann) (Diptera, Calliphoridae), em condições de laboratório. Revta bras Zool, v. 8, n. 1-4, p. 75-84, 1991.
• SLANSKY, F., SCRIBER, J.M. Food consumption and utilization. In: KERKUT, A.A., GILBERT, L.I. Eds. Comprehensive Insect Physiology, Biochemistry and Pharmacology Oxford: Pergamon Press, 1985. Cap. l. p. 87-163.
• SMITH, M.A., CORNELL, H.V. Hopkins host-selection in Nasonia vitripennis and its implications for sympatrics peciation. Anim Behav, v. 27, p. 365-370, 1979.
• ULLYETT, G.C. Competition for food and allied phenomena insheep-blowfly populations. Phil trans R Soc Lond, v. 234, p. 77-174, 1950.

¹

Biólogo, Bolsista de Aperfeiçoamento do CNPq, Departamento de Parasitologia Animal, Instituto de Biologia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 23851-970 - SEROPÉDICA, RJ.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  14 Maio 2008
• Data do Fascículo
  Dez 1997

Histórico

• Aceito
  23 Abr 1997
• Recebido
  03 Jul 1996