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Insegurança alimentar no Brasil segundo diferentes cenários sociodemográficos

Food insecurity in Brazil in accordance with different socio-demographic scenarios

Resumo

O objetivo deste artigo é apontar a prevalência de insegurança alimentar, assim como fatores associados, em diferentes cenários sociodemográficos no Brasil. Realizou-se revisão sistemática com metanálise de artigos publicados de 2004 a 2013 sobre Segurança Alimentar e Nutricional a partir da busca em bases de dados. Calculou-se a média ponderada da prevalência de insegurança alimentar e as Razões de Chances considerando a categorização dos artigos segundo a origem de suas amostras. A média ponderada da prevalência de insegurança alimentar para escolas/creches, serviços de saúde/beneficiários do Programa Bolsa Família e populações em iniquidades sociais foi, respectivamente, de 61,8%, 76,6% e 87,2%, com maiores Razões de Chances em relação aos estudos de base populacional e aos resultados da PNAD. A renda familiar, a quantidade de indivíduos no domicílio e o tipo de moradia foram as principais variáveis que apresentaram relação inversa significante com a insegurança alimentar. Os resultados evidenciam a determinação social da insegurança alimentar no Brasil.

Segurança alimentar e nutricional; Revisão sistemática; Pobreza

Abstract

The scope of this article is to determine the prevalence of food insecurity, as well as associated factors in different socio-demographic contexts in Brazil. A systematic review with meta-analysis of articles published from 2004 to 2013 on Food and Nutrition Security based on searches in databases. The articles were categorized in accordance with the origin of their samples, duly calculating the weighted average prevalence of food insecurity and odds ratios. The weighted averages of the prevalence of food insecurity for schools/daycares, health services/beneficiaries of the Bolsa Família Program and socially-challenged population groups were 1.8 %, 76.6 %, 87.2 % and 25.9 %, respectively, with higher odds ratios in relation to population-based studies and results of the National Household Sample Survey (PNAD). Family income, number of members in the household and the type of housing were the main variables that revealed a significant inverse relationship with food insecurity. The results show the social determinants of food insecurity in Brazil.

Food and Nutrition Security; Systematic review; Poverty

Introdução

O conceito de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) adotado no Brasil na Segunda Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional define a SAN como a “realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, econômica e socialmente sustentáveis”11. Brasil. II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional: A construção da Política Nacional de Segurança Alimentar. Relatório Final. 2004. [acessado: 2012 jul 20]. Disponível em: http://www.fomezero.gov.br
http://www.fomezero.gov.br...
. Assim, admite-se que a insegurança alimentar no Brasil esteja condicionada pela falta de acesso à alimentação, fator este que depende, predominantemente, da relação entre a renda e o preço dos alimentos22. Nascimento AL, Andrade SLLS. Segurança alimentar e nutricional: pressupostos para uma nova cidadania? Ciênc Cult 2010; 62(4):34-38..

A atenção permanente à importância da SAN, no Brasil e no mundo, nas interfaces nutrição – saúde - ciências sociais tornou relevante a busca por indicadores capazes de acompanhar a sua evolução, avaliar o impacto das intervenções e estabelecer comparações tempo-espacial33. Pereira RA, Santos LMP. A dimensão da insegurança alimentar. Rev Nutr 2008; 21(Supl):S7-S13.. No Brasil, pesquisadores de várias instituições validaram um método para a avaliação direta da SAN, denominada Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA)44. Pérez-Escamilla R, Segall-Corrêa AM. Food insecurity measurement and indicators. Rev Nutr 2008; 21(Supl.): 15-26.. A validação da EBIA possibilitou contemplar as especificidades e as diversidades nacionais, tornando-se um instrumento aplicável tanto nas zonas rurais como nas urbanas55. Segall-Corrêa AM, Marín-León L. Segurança Alimentar no Brasil: Proposição e Usos da Escala Brasileira de Medida da Insegurança Alimentar (EBIA) de 2003 a 2009. Segur Aliment e Nutr 2009; 16(2):1-19.. Essa escala tem sido reconhecida como indicador sensível para detectar famílias em risco de insegurança alimentar66. Nobre LN, Murta NMG, Souza MM, Ferreira NC, Cardoso LM, Hamacek FR. Segurança Alimentar em uma Comunidade Rural no Alto Vale do Jequitinhonha/MG. Segur Aliment e Nutr 2009; 16(1):18-31. e como um instrumento relevante para avaliar os efeitos das políticas públicas55. Segall-Corrêa AM, Marín-León L. Segurança Alimentar no Brasil: Proposição e Usos da Escala Brasileira de Medida da Insegurança Alimentar (EBIA) de 2003 a 2009. Segur Aliment e Nutr 2009; 16(2):1-19..

Apesar de estudos mostrarem associação da insegurança alimentar com as condições sociais e econômicas, sua prevalência no Brasil apresentou proporção maior em relação a outros problemas nutricionais como a desnutrição, com os quais podem não apresentar correlação77. Morais DC, Dutra LV, Franceschini SCC, Priore SE. Insegurança alimentar e indicadores antropométricos, dietéticos e sociais em estudos brasileiros: uma revisão sistemática. Cien Saude Colet 2014; 19(5):1475-1488.,88. Figueroa Pedraza D. Crescimento linear das crianças brasileiras: reflexões no contexto da equidade social. Rev Nutr 2016; 29(2):287-296.. Assim, a SAN deve ser considerada como medida importante para um melhor entendimento dos problemas de alimentação e nutrição que deve acompanhar a avaliação específica do estado nutricional99. Kepple AW, Segall-Corrêa AM. Conceituando e medindo segurança alimentar e nutricional. Cien Saude Colet 2011; 16(1):187-199..

Em virtude dos argumentos anteriores e das consequências da insegurança alimentar e nutricional, este estudo teve por objetivo apontar a prevalência de insegurança alimentar, assim como fatores associados, em diferentes cenários sociodemográficos no Brasil.

Métodos

O estudo é uma revisão sistemática com metanálise de artigos científicos sobre SAN desenvolvidos no Brasil com a aplicação da EBIA. A identificação dos artigos de interesse foi realizada em 04 de janeiro de 2014, utilizando-se as bases de dados SciELO (Scientific Electronic Library Online), Lilacs (Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde) e PubMed (National Library of Medicine, Bethesda, MD), a partir da palavra-chave pré-definida “Segurança Alimentar e Nutricional”. No caso do Pubmed foi acrescida a palavra-chave “Brazil”. A busca foi realizada nos idiomas português, inglês e espanhol, considerando artigos publicados entre o período de 2004 a 2013. Optou-se por estudos realizados a partir de 2004, pois a partir deste ano a EBIA ganhou maior visibilidade ao ser incorporada à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), logo depois da sua validação neste mesmo ano.

Numa segunda etapa, foram aplicados os critérios de exclusão por meio da leitura dos títulos e resumos dos artigos, considerando inadequados para os objetivos propostos as pesquisas de avaliação de alimentos/sanitária, os estudos com animais, os artigos de revisão/reflexão/discussão teórica, aqueles que não utilizaram a EBIA e os que não descreveram a prevalência de insegurança alimentar.

As listas de referências dos estudos selecionados foram utilizadas com o intuito de localizar artigos que não tivessem sido encontrados nas bases de dados. Esses artigos foram submetidos da mesma maneira aos critérios de inclusão e exclusão.

Os artigos incluídos foram submetidos à leitura e à sistematização dos resultados e, em seguida, agrupados em quatro categorias conforme a natureza de obtenção de suas respectivas amostras: escolas/creches, serviços de saúde/beneficiários do Programa Bolsa Família, populações em iniquidades sociais (comunidades indígenas, clientela da Pastoral da Criança, áreas de vulnerabilidade socioeconômica) e, por fim, estudos de base populacional representativos de cidades, regiões ou estados brasileiros.

Foram calculadas para cada uma dessas quatro categorias a média ponderada da prevalência, com respectivas amplitudes, de insegurança alimentar, insegurança alimentar leve, insegurança alimentar moderada e insegurança alimentar grave pelos respectivos tamanhos amostrais. Calcularam-se, ainda, para os três primeiros cenários, a Razão de Chances (RC) dos desfechos anteriores para um intervalo de confiança de 95% (IC95%), assumindo como prevalências de referência as encontradas nos estudos representativos de cidades, regiões ou estados brasileiros e na PNAD de 20091010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Segurança Alimentar 2009. Rio de Janeiro: IBGE; 2009.. A significância das diferenças (p < 0,05) entre as frequências encontradas foi verificada por meio do teste Qui-quadrado.

Resultados

Foram identificados 546 estudos. Após a aplicação dos critérios de exclusão, 27 artigos foram selecionados. Foram acrescidos quatro artigos a partir das listas de referências, totalizando 31 que tiveram seus resultados sistematizados. Desses, quatro envolveram amostras obtidas em creches/escolas, seis foram com amostras procedentes de serviços de saúde/beneficiários do Programa Bolsa Família, quatro foram realizados com populações em iniquidade social e 17 foram classificados como de base populacional. O fluxo do número de estudos incluídos encontra-se na Figura 1.

Figura 1
Fluxograma utilizado para a sistematização de estudos sobre Segurança Alimentar e Nutricional realizados no Brasil com a utilização da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (2004-2013).

Nos estudos com amostras obtidas em escolas/creches1111. Figueroa Pedraza D, Queiroz D, Menezes TN. Segurança alimentar em famílias com crianças matriculadas em creches públicas do Estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2013; 26(5):517-527.

12. Ribeiro-Silva RC, Oliveira-Assis AM, Junqueira AB, Fiaccone RL, Santos SMC, Barreto ML, Jesus Pinto E, Silva LA, Rodrigues LC, Alcantara-Neves NM. Food insecurity. Food and nutrition insecurity: a marker of vulnerability to asthma symptoms. Public Health Nutr 2012; 20(1):1-6.

13. Souza MM, Figueroa Pedraza D, Menezes TN. Estado Nutricional de crianças assistidas em creches e situação de (in)segurança alimentar de suas famílias. Cien Saude Colet 2012; 17(12):3425-3436.
-1414. Vieira VL, Souza JMP, Cervato-Mancuso AM. Insegurança alimentar, vínculo mãe-filho e desnutrição infantil em área de alta vulnerabilidade social. Rev Bras Saúde Matern Infant 2010; 10(2):199-207., a insegurança alimentar (IA) oscilou de 46,6%1414. Vieira VL, Souza JMP, Cervato-Mancuso AM. Insegurança alimentar, vínculo mãe-filho e desnutrição infantil em área de alta vulnerabilidade social. Rev Bras Saúde Matern Infant 2010; 10(2):199-207. a 64,5%1212. Ribeiro-Silva RC, Oliveira-Assis AM, Junqueira AB, Fiaccone RL, Santos SMC, Barreto ML, Jesus Pinto E, Silva LA, Rodrigues LC, Alcantara-Neves NM. Food insecurity. Food and nutrition insecurity: a marker of vulnerability to asthma symptoms. Public Health Nutr 2012; 20(1):1-6. com média ponderada de 61,8%. A insegurança alimentar leve (IAL), a moderada (IAM) e a grave (IAG) apresentaram médias ponderadas de 39,5%, 16,2% e 7,5%, respectivamente. No que se refere aos estudos com amostras obtidas em serviços de saúde/beneficiários do Programa Bolsa Família1515. Souza NN, Dias MM, Sperandio N, Franceschini SCC, Priore SE. Perfil socioeconômico e insegurança alimentar e nutricional de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família no município de Viçosa, Estado de Minas Gerais, Brasil, em 2011: um estudo epidemiológico transversal. Epidemiol Serv Saúde 2012; 21(4):655-662.

16. Silva CCS, Oliveira KBB, Alves AS, Neves JA, Modesto CAC, Vianna RRT. Associação entre consumo alimentar e (in)segurança alimentar e nutricional em São José dos Ramos-PB. Braz J Food Technol 2012; 15(nº esp.):23-30.

17. Dias MM, Machado HM, Ferreira CS, Oliveira VL, Gomes AP, Cantaluppi ETC. Situação de insegurança alimentar de famílias beneficiárias de programas de transferência de renda na Unidade de Saúde da Família Comunidade São João Baptista, Petropólis, Rio de Janeiro. Rev APS 2012; 15(2):199-205.

18. Anschau FR, Matshuo T, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar entre beneficiários de programas de transferência de renda. Rev Nutr 2012; 25(2):177-189.

19. Magrani LHA, Paula MELS, Coutinho BBP, Guerra DM, Tavares RM, Silveira MO. Insegurança alimentar e estado nutricional das famílias que recebem benefícios sociais na Unidade de Saúde da Família Vila Felipe – Petropólis – RJ. Rev APS 2012; 15(1):29-35.
-2020. Aires JS, Martins MC, Joventino ES, Ximenes LB. (In)segurança alimentar em famílias de pré-escolares de uma zona rural do Ceará. Acta Paul Enferm 2012; 25(1):102-108., a oscilação de IA foi de 72,0%1717. Dias MM, Machado HM, Ferreira CS, Oliveira VL, Gomes AP, Cantaluppi ETC. Situação de insegurança alimentar de famílias beneficiárias de programas de transferência de renda na Unidade de Saúde da Família Comunidade São João Baptista, Petropólis, Rio de Janeiro. Rev APS 2012; 15(2):199-205. a 88,0%2020. Aires JS, Martins MC, Joventino ES, Ximenes LB. (In)segurança alimentar em famílias de pré-escolares de uma zona rural do Ceará. Acta Paul Enferm 2012; 25(1):102-108. e média ponderada de 76,6%. Para os diferentes graus de IA as médias ponderadas foram de 45,0%, 20,3% e 11,3% para IAL, IAM e IAG, respectivamente (Tabela 1).

Tabela 1
Prevalências de insegurança alimentar, segundo estudos publicados no período de 2004-2013, envolvendo amostras obtidas em instituições (escolas/creches e serviços de saúde/beneficiários do Programa Bolsa Família), no Brasil.

Naqueles estudos com amostras obtidas em populações em iniquidades sociais2121. Oliveira JS, Lira PIC, Maia SR, Sequeira LAS, Amorim RCA, Batista Filho M. Insegurança alimentar e estado nutricional de crianças de Gameleira, zona da mata do Nordeste brasileiro. Rev Bras Saúde Matern Infant 2010; 10(2):237-245.

22. Oliveira JS, Lira PIC, Andrade ALLS, Sales AC, Maia SR, Batista Filho M. Insegurança alimentar e estado nutricional de crianças de São João do Tigre, no semi-árido do Nordeste. Rev Bras Epidemiol 2009; 12(3):413-423.

23. Fávaro T, Ribas DLB, Zorzatto JR, Segall-Corrêa AM, Panigassi G. Segurança alimentar em famílias indígenas Teréna, Mato Grosso do Sul, Brasil. Cad Saude Publica 2007; 23(4):785-793.
-2424. Pereira DA, Vieira VL, Fiore EG, Cervato-Mancurso AM. Insegurança alimentar em região de alta vulnerabilidade social da cidade São Paulo. Segur Aliment e Nutr 2006; 13(2):34-42., a maior prevalência de IA foi 88,2%2121. Oliveira JS, Lira PIC, Maia SR, Sequeira LAS, Amorim RCA, Batista Filho M. Insegurança alimentar e estado nutricional de crianças de Gameleira, zona da mata do Nordeste brasileiro. Rev Bras Saúde Matern Infant 2010; 10(2):237-245., em município de Pernambuco, e a menor de 75,5%2323. Fávaro T, Ribas DLB, Zorzatto JR, Segall-Corrêa AM, Panigassi G. Segurança alimentar em famílias indígenas Teréna, Mato Grosso do Sul, Brasil. Cad Saude Publica 2007; 23(4):785-793., em municípios de Mato Grosso do Sul. As médias ponderadas de IA, IAL, IAM e IAG foram de 87,2%, 23,2%, 35,8% e 28,1%, respectivamente (Tabela 2).

Tabela 2
Prevalências de insegurança alimentar, segundo estudos publicados no período de 2004-2013, envolvendo amostras obtidas em populações em iniquidades sociais, no Brasil.

Em relação aos estudos de base populacional representativos de cidades, regiões ou estados brasileiros2525. Lopes TS, Sichieri R, Salles-Costa R, Veiga GV, Pereira RA. Family food insecurity and nutritional risk in adolescents from a low-income area of Rio de Janeiro, Brazil. J Biosoc Sci 2013; 45(5):661-674.

26. Guerra LDS, Espinosa MM, Bezerra ACD, Guimarães LV, Lima-Lopes MA. Insegurança alimentar em domicílios da Amazônia Legal Brasileira: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2013; 29(2):335-348.

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28. Kac G, Schüssel MM, Pérez-Escamilla, Velásquez-Melendez G, Silva AAM. Household food insecurity is not associated with BMI for age or weighr for height among Brazilian children aged 0-60 months. Plos One 2012; 7:e45747.

29. Kac G, Velásquez-Meléndez G, Schlüssel MM, Segall-Corrêa AM, Silva AA, Pérez-Escamilla R. Severe food insecurity is associated with obesity among Brazilian adolescent females. Public Health Nutr. 2012; 15(10):1854-1860.

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38. Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marín-Léon L, Pérez-Escamilla R, Maranha LKA, Sampaio MFA. Insegurança alimentar intrafamiliar e perfil de consumo de alimentos. Rev Nutr 2008; 21(Supl):135-144.

39. Vianna RPT, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar das famílias residentes em municípios do interior do estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl):111-22.

40. Salles-Costa R, Pereira RA, Vasconcellos MTL, Veiga GV, Marins VMR, Jardim BC, Gomes FS, Sichieri R. Associação entre fatores socioeconômicos e insegurança alimentar: estudo de base populacional na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl.):99-109.
-4141. Marín-Léon L, Segall-Corrêa, Panigassi G, Maranha LK, Sampaio MFA, Pérez-Escamilla R. A percepção de insegurança alimentar em famílias com idosos em Campinas São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2005; 21(5):1433-1440. encontrou-se que a IA oscilou de 23,8%3030. Tsai AC, Hung KJ, Weiser SD. Is food insecurity with HIV risk? Cross-sectional evidence from sexually active women in Brazil. Plos Med. 2012; 9(4):e10001203. a 72,0%3535. Pimentel PG, Sicheri R, Salles-Costa R. Insegurança alimentar, condições socioeconômicas e indicadores antropométricos em crianças da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2009; 26(2):283-94.. As médias ponderadas nesta categoria foram de 25,9%, 12,9%, 8,6% e 4,2% para IA, IAL, IAM e IAG, respectivamente (Tabela 3).

Tabela 3
Prevalências de insegurança alimentar, segundo estudos publicados no período de 2004-2013, envolvendo amostras representativas de cidades, regiões ou estados no Brasil.

Em geral, diversas variáveis demográficas e socioeconômicas foram analisadas pelos pesquisadores nos seus estudos. Em termos proporcionais, considerando a relação entre a quantidade de estudos que consideraram uma determinada variável e os que indicaram associação com a insegurança alimentar, a pior situação relacionada à renda familiar foi a que apresentou maior proporção de associação (64,0% dos estudos), em 16 estudos1111. Figueroa Pedraza D, Queiroz D, Menezes TN. Segurança alimentar em famílias com crianças matriculadas em creches públicas do Estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2013; 26(5):517-527.,2020. Aires JS, Martins MC, Joventino ES, Ximenes LB. (In)segurança alimentar em famílias de pré-escolares de uma zona rural do Ceará. Acta Paul Enferm 2012; 25(1):102-108.,2323. Fávaro T, Ribas DLB, Zorzatto JR, Segall-Corrêa AM, Panigassi G. Segurança alimentar em famílias indígenas Teréna, Mato Grosso do Sul, Brasil. Cad Saude Publica 2007; 23(4):785-793.,2525. Lopes TS, Sichieri R, Salles-Costa R, Veiga GV, Pereira RA. Family food insecurity and nutritional risk in adolescents from a low-income area of Rio de Janeiro, Brazil. J Biosoc Sci 2013; 45(5):661-674.

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28. Kac G, Schüssel MM, Pérez-Escamilla, Velásquez-Melendez G, Silva AAM. Household food insecurity is not associated with BMI for age or weighr for height among Brazilian children aged 0-60 months. Plos One 2012; 7:e45747.
-2929. Kac G, Velásquez-Meléndez G, Schlüssel MM, Segall-Corrêa AM, Silva AA, Pérez-Escamilla R. Severe food insecurity is associated with obesity among Brazilian adolescent females. Public Health Nutr. 2012; 15(10):1854-1860.,3232. Velásquez-Meléndez G, Schlüssel MM, Brito AS, Silva AA, Lopes-Filho JD, Kac G. Mild but not light or severe food insecurity is associated with obesity among Brazilian women. J. Nutr. 2011; 141(5):898-902.,3333. Reis M. Food insecurity and the relationship between household income and children’s health and nutrition in Brazil. Health Econ. 2012; 21(4):405-427.,3535. Pimentel PG, Sicheri R, Salles-Costa R. Insegurança alimentar, condições socioeconômicas e indicadores antropométricos em crianças da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2009; 26(2):283-94.

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40. Salles-Costa R, Pereira RA, Vasconcellos MTL, Veiga GV, Marins VMR, Jardim BC, Gomes FS, Sichieri R. Associação entre fatores socioeconômicos e insegurança alimentar: estudo de base populacional na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl.):99-109.
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As proporções de estudos que encontraram associação à insegurança alimentar também foram relevantes para as variáveis: i) região geográfica, com pior situação para a zona rural, em quatro estudos2727. Rosa TEC, Mondini L, Gubert MB, Sato GS, Benício MHA. Segurança alimentar em domicílios chefiados por idosos, Brasil. Rev Bras Geriatr Gerontol 2012; 15(1):69-77.

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A escolaridade da mãe (quatro1515. Souza NN, Dias MM, Sperandio N, Franceschini SCC, Priore SE. Perfil socioeconômico e insegurança alimentar e nutricional de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família no município de Viçosa, Estado de Minas Gerais, Brasil, em 2011: um estudo epidemiológico transversal. Epidemiol Serv Saúde 2012; 21(4):655-662.,2323. Fávaro T, Ribas DLB, Zorzatto JR, Segall-Corrêa AM, Panigassi G. Segurança alimentar em famílias indígenas Teréna, Mato Grosso do Sul, Brasil. Cad Saude Publica 2007; 23(4):785-793.,2828. Kac G, Schüssel MM, Pérez-Escamilla, Velásquez-Melendez G, Silva AAM. Household food insecurity is not associated with BMI for age or weighr for height among Brazilian children aged 0-60 months. Plos One 2012; 7:e45747.,3232. Velásquez-Meléndez G, Schlüssel MM, Brito AS, Silva AA, Lopes-Filho JD, Kac G. Mild but not light or severe food insecurity is associated with obesity among Brazilian women. J. Nutr. 2011; 141(5):898-902. de 10 estudos1212. Ribeiro-Silva RC, Oliveira-Assis AM, Junqueira AB, Fiaccone RL, Santos SMC, Barreto ML, Jesus Pinto E, Silva LA, Rodrigues LC, Alcantara-Neves NM. Food insecurity. Food and nutrition insecurity: a marker of vulnerability to asthma symptoms. Public Health Nutr 2012; 20(1):1-6.,1414. Vieira VL, Souza JMP, Cervato-Mancuso AM. Insegurança alimentar, vínculo mãe-filho e desnutrição infantil em área de alta vulnerabilidade social. Rev Bras Saúde Matern Infant 2010; 10(2):199-207.,1515. Souza NN, Dias MM, Sperandio N, Franceschini SCC, Priore SE. Perfil socioeconômico e insegurança alimentar e nutricional de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família no município de Viçosa, Estado de Minas Gerais, Brasil, em 2011: um estudo epidemiológico transversal. Epidemiol Serv Saúde 2012; 21(4):655-662.,2121. Oliveira JS, Lira PIC, Maia SR, Sequeira LAS, Amorim RCA, Batista Filho M. Insegurança alimentar e estado nutricional de crianças de Gameleira, zona da mata do Nordeste brasileiro. Rev Bras Saúde Matern Infant 2010; 10(2):237-245.

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40. Salles-Costa R, Pereira RA, Vasconcellos MTL, Veiga GV, Marins VMR, Jardim BC, Gomes FS, Sichieri R. Associação entre fatores socioeconômicos e insegurança alimentar: estudo de base populacional na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl.):99-109.
-4141. Marín-Léon L, Segall-Corrêa, Panigassi G, Maranha LK, Sampaio MFA, Pérez-Escamilla R. A percepção de insegurança alimentar em famílias com idosos em Campinas São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2005; 21(5):1433-1440.) e o abastecimento de água no domicílio (um3939. Vianna RPT, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar das famílias residentes em municípios do interior do estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl):111-22. de nove estudos1515. Souza NN, Dias MM, Sperandio N, Franceschini SCC, Priore SE. Perfil socioeconômico e insegurança alimentar e nutricional de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família no município de Viçosa, Estado de Minas Gerais, Brasil, em 2011: um estudo epidemiológico transversal. Epidemiol Serv Saúde 2012; 21(4):655-662.

16. Silva CCS, Oliveira KBB, Alves AS, Neves JA, Modesto CAC, Vianna RRT. Associação entre consumo alimentar e (in)segurança alimentar e nutricional em São José dos Ramos-PB. Braz J Food Technol 2012; 15(nº esp.):23-30.
-1717. Dias MM, Machado HM, Ferreira CS, Oliveira VL, Gomes AP, Cantaluppi ETC. Situação de insegurança alimentar de famílias beneficiárias de programas de transferência de renda na Unidade de Saúde da Família Comunidade São João Baptista, Petropólis, Rio de Janeiro. Rev APS 2012; 15(2):199-205.,1919. Magrani LHA, Paula MELS, Coutinho BBP, Guerra DM, Tavares RM, Silveira MO. Insegurança alimentar e estado nutricional das famílias que recebem benefícios sociais na Unidade de Saúde da Família Vila Felipe – Petropólis – RJ. Rev APS 2012; 15(1):29-35.,2626. Guerra LDS, Espinosa MM, Bezerra ACD, Guimarães LV, Lima-Lopes MA. Insegurança alimentar em domicílios da Amazônia Legal Brasileira: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2013; 29(2):335-348.,3535. Pimentel PG, Sicheri R, Salles-Costa R. Insegurança alimentar, condições socioeconômicas e indicadores antropométricos em crianças da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2009; 26(2):283-94.,3939. Vianna RPT, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar das famílias residentes em municípios do interior do estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl):111-22.

40. Salles-Costa R, Pereira RA, Vasconcellos MTL, Veiga GV, Marins VMR, Jardim BC, Gomes FS, Sichieri R. Associação entre fatores socioeconômicos e insegurança alimentar: estudo de base populacional na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl.):99-109.
-4141. Marín-Léon L, Segall-Corrêa, Panigassi G, Maranha LK, Sampaio MFA, Pérez-Escamilla R. A percepção de insegurança alimentar em famílias com idosos em Campinas São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2005; 21(5):1433-1440.) foram outras variáveis que, também, mostraram-se associadas, nas análises bivariadas, à insegurança alimentar familiar.

O controle adequado das variáveis de confundimento foi conduzido em nove estudos1111. Figueroa Pedraza D, Queiroz D, Menezes TN. Segurança alimentar em famílias com crianças matriculadas em creches públicas do Estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2013; 26(5):517-527.,1818. Anschau FR, Matshuo T, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar entre beneficiários de programas de transferência de renda. Rev Nutr 2012; 25(2):177-189.,2626. Guerra LDS, Espinosa MM, Bezerra ACD, Guimarães LV, Lima-Lopes MA. Insegurança alimentar em domicílios da Amazônia Legal Brasileira: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2013; 29(2):335-348.,2828. Kac G, Schüssel MM, Pérez-Escamilla, Velásquez-Melendez G, Silva AAM. Household food insecurity is not associated with BMI for age or weighr for height among Brazilian children aged 0-60 months. Plos One 2012; 7:e45747.,3333. Reis M. Food insecurity and the relationship between household income and children’s health and nutrition in Brazil. Health Econ. 2012; 21(4):405-427.,3535. Pimentel PG, Sicheri R, Salles-Costa R. Insegurança alimentar, condições socioeconômicas e indicadores antropométricos em crianças da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2009; 26(2):283-94.,3737. Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marín-Léon L, Pérez-Escamilla R, Sampaio MFA, Maranha LKA. Insegurança alimentar como indicador de iniquidade: análise de inquérito populacional. Cad Saude Publica 2008; 24(10):2376-2384.

38. Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marín-Léon L, Pérez-Escamilla R, Maranha LKA, Sampaio MFA. Insegurança alimentar intrafamiliar e perfil de consumo de alimentos. Rev Nutr 2008; 21(Supl):135-144.
-3939. Vianna RPT, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar das famílias residentes em municípios do interior do estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl):111-22.. Considerando o conjunto desses estudos, a menor renda familiar1111. Figueroa Pedraza D, Queiroz D, Menezes TN. Segurança alimentar em famílias com crianças matriculadas em creches públicas do Estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2013; 26(5):517-527.,2626. Guerra LDS, Espinosa MM, Bezerra ACD, Guimarães LV, Lima-Lopes MA. Insegurança alimentar em domicílios da Amazônia Legal Brasileira: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2013; 29(2):335-348.,3535. Pimentel PG, Sicheri R, Salles-Costa R. Insegurança alimentar, condições socioeconômicas e indicadores antropométricos em crianças da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2009; 26(2):283-94.,3737. Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marín-Léon L, Pérez-Escamilla R, Sampaio MFA, Maranha LKA. Insegurança alimentar como indicador de iniquidade: análise de inquérito populacional. Cad Saude Publica 2008; 24(10):2376-2384.,3939. Vianna RPT, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar das famílias residentes em municípios do interior do estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl):111-22., a maior quantidade de indivíduos no domicílio1818. Anschau FR, Matshuo T, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar entre beneficiários de programas de transferência de renda. Rev Nutr 2012; 25(2):177-189.,3535. Pimentel PG, Sicheri R, Salles-Costa R. Insegurança alimentar, condições socioeconômicas e indicadores antropométricos em crianças da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2009; 26(2):283-94. e o tipo de moradia precária3737. Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marín-Léon L, Pérez-Escamilla R, Sampaio MFA, Maranha LKA. Insegurança alimentar como indicador de iniquidade: análise de inquérito populacional. Cad Saude Publica 2008; 24(10):2376-2384.,3939. Vianna RPT, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar das famílias residentes em municípios do interior do estado da Paraíba, Brasil. Rev Nutr 2008; 21(Supl):111-22. foram as condições que se associaram à insegurança alimentar familiar em no mínimo dois.

A Tabela 4 consolida os resultados encontrados para as categorias de investigações analisadas. Observa-se que a maior prevalência de IA foi encontrada entre as populações em iniquidades sociais (87,2%). Da mesma forma apresentam-se os resultados relativos aos graus mais severos de IA, com prevalência de 35,8% para a IAM e de 28,1% para a IAG ponderando as populações em iniquidades sociais. Assumindo-se a prevalência de IA observada a partir dos estudos de base populacional de cidades, regiões ou estados no Brasil (25,9%) como referência, verificou-se que a chance de uma família pertencente a populações em iniquidades sociais estar em situação de insegurança alimentar foi 18,67 vezes maior (IC95%: 8,68-42,89). Amostras provenientes de escolas/creches e de serviços de saúde/beneficiários do Programa Bolsa Família também apresentaram maiores chances de IA, com valores de 4,61 (IC95%: 2,44-8,88) e 9,40 (IC95%: 4,77-19,16), respectivamente. Resultado similar foi observado quando considerados como referência os resultados encontrados na PNAD.

Tabela 4
Razões de Chances e Intervalos de Confiança de 95% (IC95%) de Insegurança Alimentar segundo diferentes categorias de amostras baseadas em estudos sobre segurança alimentar realizados no Brasil, no período de 2004 a 2013, assumindo como prevalências de referência as encontradas nos estudos representativos de cidades, regiões ou estados brasileiros e na PNAD.

No que se refere aos graus mais severos de insegurança alimentar, observou-se que a chance de uma família pertencente a populações em iniquidades sociais estar em IAM foi 5,64 (IC95%: 2,45-14,26) e 8,72 vezes maior (IC95%: 3,39-26,82) quando comparadas às populações de base populacional de referência. Para os estudos de populações provenientes de serviços de saúde/beneficiários do Programa Bolsa Família também se encontraram maiores chances de IAM em relação às bases populacionais. Observou-se que a chance de populações em iniquidades sociais estarem em situação de IAG foi 9,24 vezes maior (IC95%: 3,04-37,86) quando comparadas às populações de base populacional de cidades, regiões ou estados no Brasil e 7,32 vezes maior (IC95%: 2,62-25,48) em relação aos resultados da PNAD.

Discussão

Nas últimas décadas, em várias partes do mundo, observou-se um aumento significativo das investigações sobre Segurança Alimentar, abordando tanto o diagnóstico das populações vulneráveis à fome como seus determinantes e consequências para a sua saúde e bem estar1818. Anschau FR, Matshuo T, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar entre beneficiários de programas de transferência de renda. Rev Nutr 2012; 25(2):177-189.. No Brasil, são vários os grupos de pesquisa que se preocupam com o tema. Dentre eles, destacam-se os que realizam estudos sobre a qualidade do alimento e sobre o estado nutricional de grupos populacionais. Entretanto, sugere-se ainda que as pesquisas sobre SAN no país precisam de maior dinamismo e integração entre os focos econômico e social4242. Prado SD, Gugelmin SA, Mattos RA, Silva JK, Olivares PSG. A pesquisa sobre segurança alimentar e nutricional no Brasil de 2000 a 2005: tendências e desafios. Cien Saude Colet 2010; 15(1):7-18..

A insegurança alimentar tem sido considerada como um problema de saúde mundial2626. Guerra LDS, Espinosa MM, Bezerra ACD, Guimarães LV, Lima-Lopes MA. Insegurança alimentar em domicílios da Amazônia Legal Brasileira: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2013; 29(2):335-348.. Nos Estados Unidos, uma pesquisa envolvendo crianças e famílias de baixa renda, encontrou 30,7% de insegurança alimentar4343. Mettalinos-Katsaras E, Sherry B, Kallio J. Food insecurity is associated with owerweight in children younger than 5 years of age. J Am Diet Assoc. 2009; 109(10):1790-4.. Na Colômbia, um estudo também conduzido com famílias de baixa renda observou 51,8% de insegurança alimentar4444. Hackett M, Melgar-Quinonez H, Taylor CA, Uribe MCA. Factors associated with household food security of participants of the MANA food supplement program in Colombia. Arch Latinoam Nutr 2010; (60)1:42-47.. Em estudo realizado envolvendo famílias com crianças de Quebec, no Canadá, e da Jamaica observaram-se prevalências de insegurança alimentar de 9,0% e 26,0%, respectivamente4545. Dubois L, Francis D, Burnier D, Tatone-Tokuda F, Girard M, Gordon-Strachan G, Fox K, Wilks R. Household food insecurity and childhood overweight in Jamaica and Québec: a gender-based analysis. BMC Public Health 2011; 11(199):1-10.. No Brasil, a PNAD1010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Segurança Alimentar 2009. Rio de Janeiro: IBGE; 2009. identificou que 30,2% da população apresentava algum grau de insegurança alimentar. Por meio dos resultados sistematizados no presente trabalho, ressalta-se que a condição das famílias de amostras provenientes de escolas/creches, de serviços de saúde/beneficiários do Programa Bolsa Família e de caracterização em iniquidade social é pior à de outros países4343. Mettalinos-Katsaras E, Sherry B, Kallio J. Food insecurity is associated with owerweight in children younger than 5 years of age. J Am Diet Assoc. 2009; 109(10):1790-4.

44. Hackett M, Melgar-Quinonez H, Taylor CA, Uribe MCA. Factors associated with household food security of participants of the MANA food supplement program in Colombia. Arch Latinoam Nutr 2010; (60)1:42-47.
-4545. Dubois L, Francis D, Burnier D, Tatone-Tokuda F, Girard M, Gordon-Strachan G, Fox K, Wilks R. Household food insecurity and childhood overweight in Jamaica and Québec: a gender-based analysis. BMC Public Health 2011; 11(199):1-10. e do Brasil1010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Segurança Alimentar 2009. Rio de Janeiro: IBGE; 2009.. Esses achados são alarmantes e evidenciam que, apesar dos avanços observados na diminuição das desigualdades no Brasil, ainda é grande o contingente de pessoas que vivem em situação de insegurança alimentar, com desigualdades regionais e de outras índoles como de cor/raça, faixa etária, faixa de renda e localização urbano vs. rural, que implicam em importantes desafios4646. Kepple AW. O estado da segurança alimentar e nutricional no Brasil: Um retrato multidimensional: Relatório 2014. Brasília: FAO; 2014..

Na linha de pensamento anterior, tomando como exemplo a média ponderada de insegurança alimentar para os estudos com amostras obtidas em populações em iniquidades sociais (87,2%), que podemos considerar muito alta, deve ser reforçada a questão do acesso inadequado e insuficiente aos alimentos como consequência, principalmente, das desigualdades socioeconômicas existentes na sociedade brasileira1515. Souza NN, Dias MM, Sperandio N, Franceschini SCC, Priore SE. Perfil socioeconômico e insegurança alimentar e nutricional de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família no município de Viçosa, Estado de Minas Gerais, Brasil, em 2011: um estudo epidemiológico transversal. Epidemiol Serv Saúde 2012; 21(4):655-662.. Análise similar deriva das outras categorias consideradas que, também, podem ser caracterizadas pela vulnerabilidade socioeconômica ao considerar que tanto os beneficiários de escolas/creches públicas2020. Aires JS, Martins MC, Joventino ES, Ximenes LB. (In)segurança alimentar em famílias de pré-escolares de uma zona rural do Ceará. Acta Paul Enferm 2012; 25(1):102-108. quanto os dos serviços públicos de saúde/Programa Bolsa Família4747. Traldi DRC, Almeida LLMC. Políticas públicas de transferência de renda e a questão da segurança alimentar dos beneficiários: efetividades e entraves do Programa Bolsa Família. Política & Sociedades 2012; 11(21):137-171. representam classes sociais inferiores. No sentido específico dos programas de transferência de renda, revisão recente da literatura destacou a impossibilidade desses programas, apenas com as suas ações, resolverem o problema da pobreza e da insegurança alimentar4848. Cotta RMM, Machado JC. Programa Bolsa Família e segurança alimentar e nutricional no Brasil: revisão crítica da literatura. Rev Panam Salud Pública 2013; 33(1):54-60..

As populações em iniquidades sociais do presente estudo, assumidas como as de maior grau de pobreza, apresentaram maiores chances de insegurança alimentar moderada e grave, justificando o contexto de vulnerabilidades do ponto de vista da segurança alimentar e nutricional (acesso a terra, água, bens e serviços públicos, condições dignas de moradia e consumo de alimentos) associado à pobreza4747. Traldi DRC, Almeida LLMC. Políticas públicas de transferência de renda e a questão da segurança alimentar dos beneficiários: efetividades e entraves do Programa Bolsa Família. Política & Sociedades 2012; 11(21):137-171.. Estudos de abrangência nacional1010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Segurança Alimentar 2009. Rio de Janeiro: IBGE; 2009.,4949. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Mulher-PNDS: 2006: dimensões do processo reprodutivo e da Saúde da Criança. Brasília: MS; 2009., semelhantemente, têm indicado maior prevalência de insegurança alimentar moderada e grave entre as famílias mais pobres.

A insegurança alimentar é reconhecida como um fenômeno complexo e multidimensional de determinação multicausal3636. Gubert MB, Santos LMP. Determinantes da insegurança alimentar no Distrito Federal. Comun Ciênc Saúde 2009; 20(2):143-50.,5050. Melgar-Quinonez H, Hackett M. Measuring household food security: the global experience. Rev Nutr 2008; 21(Supl.):27-37.,5151. Albuquerque MFM. A segurança alimentar e nutricional e o uso da abordagem de direitos humanos no desenho das políticas públicas para combater a fome e a pobreza. Rev Nutr 2009; 22(6):895-903.. Nesse sentido, os fatores que determinam a situação alimentar de uma população apresentam naturezas distintas, entre as quais a econômica, a psicossocial, a ética, a política e a cultural5252. Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH). O direito humano à alimentação adequada e o sistema nacional de segurança alimentar e nutricional. Brasília: ABRANDH; 2013.. No presente trabalho, a renda familiar foi a variável que se apresentou em maior quantidade de vezes associada significativamente à insegurança alimentar entre os estudos analisados. De maneira coerente, os resultados da PNAD1010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Segurança Alimentar 2009. Rio de Janeiro: IBGE; 2009. evidenciaram que quanto menor for o rendimento mensal domiciliar per capita, maior a proporção de domicílios com insegurança alimentar. Esses resultados apresentam ainda maior relevância apreciando as evidências sobre a proporção significativa da renda total que é utilizada para a alimentação5353. Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase). Repercussões do Programa Bolsa Família na segurança alimentar e nutricional das famílias beneficiadas. Rio de Janeiro: Ibase; 2008.. Do ponto de vista metodológico, esses achados também são relevantes, pois destacam a utilidade da medição da insegurança alimentar por meio da EBIA para o monitoramento da iniquidade, podendo complementar um conjunto de indicadores sociais ou, mesmo de forma isolada, identificar grupos com vulnerabilidade social, como relatado anteriomente3737. Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marín-Léon L, Pérez-Escamilla R, Sampaio MFA, Maranha LKA. Insegurança alimentar como indicador de iniquidade: análise de inquérito populacional. Cad Saude Publica 2008; 24(10):2376-2384..

A contribuição da quantidade de indivíduos no domicílio na insegurança alimentar explicada em estudos brasileiros de âmbito nacional88. Figueroa Pedraza D. Crescimento linear das crianças brasileiras: reflexões no contexto da equidade social. Rev Nutr 2016; 29(2):287-296.,5454. Hoffman R. Determinantes da Insegurança Alimentar no Brasil: Análise dos Dados da PNAD de 2004. Segur Aliment e Nutr 2008; 15(1):49-61. foi, igualmente, sistematizada no presente trabalho. Essa relação pode ser explicada pelo fato de famílias grandes necessitarem de mais recursos para a compra de alimentos, o que normalmente não acompanha o crescimento familiar1818. Anschau FR, Matshuo T, Segall-Corrêa AM. Insegurança alimentar entre beneficiários de programas de transferência de renda. Rev Nutr 2012; 25(2):177-189..

Entre os estudos analisados, o tipo de moradia foi a outra condição que mostrou com maior força sua importância na determinação da insegurança alimentar, o que pode estar atrelado aos fatores socioeconômicos e aos determinantes demográficos que influenciam esta condição3737. Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marín-Léon L, Pérez-Escamilla R, Sampaio MFA, Maranha LKA. Insegurança alimentar como indicador de iniquidade: análise de inquérito populacional. Cad Saude Publica 2008; 24(10):2376-2384.. Neste sentido, deve-se ressaltar, ainda, que as moradias inacabadas proporcionam condições de insalubridade aos seus ocupantes e favorecem o surgimento de doenças entre os indivíduos mais vulneráveis5555. Burity V, Franceschini T, Valente F, Recine E, Leão M, Carvalho MF. Direito Humano à Alimentação Adequada no Contexto da Segurança Alimentar e Nutricional. Brasília: ABRANDH; 2010.. A qualidade da habitação relaciona-se com a segurança alimentar na medida em que contribui para o aproveitamento biológico do alimento, evitando a proliferação de inúmeras doenças5656. Carvalho Filho EV, Aquino JS, Vianna RPT. Insegurança e Consumo Alimentar no Município de Princesa Isabel - Paraíba – Brasil. Rev Brasileira de Ciências da Saúde 2006; 10(3):277-286..

Os resultados do presente estudo somam-se aos de revisão anterior que sistematizou a relação da insegurança alimentar com indicadores sociais, como menor renda e escolaridade, ausência de vínculo empregatício e saneamento básico77. Morais DC, Dutra LV, Franceschini SCC, Priore SE. Insegurança alimentar e indicadores antropométricos, dietéticos e sociais em estudos brasileiros: uma revisão sistemática. Cien Saude Colet 2014; 19(5):1475-1488.. Esses fatores representam, também, as principais condições relacionadas com problemas de crescimento linear entre as crianças brasileiras menores de cinco anos, numa conjuntura na qual esses dois eventos, apesar de distintos, apresentam-se associados e com determinação social88. Figueroa Pedraza D. Crescimento linear das crianças brasileiras: reflexões no contexto da equidade social. Rev Nutr 2016; 29(2):287-296..

Com base nos dados aqui analisados, considerando tanto as frequências de insegurança alimentar nos diferentes cenários sociodemográficos analisados, quanto os fatores associados, evidencia-se, claramente, a determinação social da insegurança alimentar no Brasil. Devido à composição da insegurança alimentar como problema de grave significância populacional e de conotação socioeconômica, reforça-se a atenção prioritária que deve merecer por parte das diferentes instâncias governamentais do país, com a efetivação de políticas públicas de combate à fome e à miséria.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2017

Histórico

  • Recebido
    23 Jul 2015
  • Revisado
    13 Jan 2016
  • Aceito
    15 Jan 2016
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