Resumos
Este artigo apresenta resultados de um estudo realizado com mulheres de camadas populares em uma comunidade de baixa renda em Recife, Pernambuco, Brasil, procurando entender como são planejadas suas famílias. Tem como eixo orientador os aspectos da reprodução, especificamente as práticas de concepção e contracepção. Nesta análise, argumenta-se que as organizações que prestam serviços de planejamento familiar refletem a política chamada de "intervenção branca" no comportamento reprodutivo da população de camadas populares. Considera-se "intervenção branca" o transporte das decisões sobre ter ou não ter filhos, do âmbito doméstico para o consultório médico e a transferência gradativa do controle do Estado para o campo da saúde.
Reprodução; Planejamento Familiar; Gênero
This paper presents the results of a study on women from a low-income community in Recife, Pernambuco State, Brazil, focusing on how the women practice their family planning. The study is based on an analysis of reproductive practices by these women, specifically related to conception and contraception. The paper argues that the family planning care provided to these women involves a so-called "low-profile interventionist" policy, meaning that decisions concerning the number and spacing of children is shifted from the family domain to that of attending physicians, with a gradual transfer of control from the public sector to the health field.
Reproduction; Family Planning; Gender
ARTIGO/ARTICLE
Mulher, família e reprodução: um estudo de caso sobre o planejamento familiar em periferia do Recife, Pernambuco, Brasil
Women, family, and reproductive health: a case study on family planning on the outskirts of Recife, Pernambuco, Brazil
Magda Fernanda Medeiros Fernandes
Núcleo de Estudos Família, Gênero e Sexualidade, Universidade Federal de Pernambuco. Campus Universitário, CFCH, 13º andar, Recife, PE 50670-901, Brasil. batraquios@uol.com.br
RESUMO
Este artigo apresenta resultados de um estudo realizado com mulheres de camadas populares em uma comunidade de baixa renda em Recife, Pernambuco, Brasil, procurando entender como são planejadas suas famílias. Tem como eixo orientador os aspectos da reprodução, especificamente as práticas de concepção e contracepção. Nesta análise, argumenta-se que as organizações que prestam serviços de planejamento familiar refletem a política chamada de "intervenção branca" no comportamento reprodutivo da população de camadas populares. Considera-se "intervenção branca" o transporte das decisões sobre ter ou não ter filhos, do âmbito doméstico para o consultório médico e a transferência gradativa do controle do Estado para o campo da saúde.
Palavras-chave: Reprodução; Planejamento Familiar; Gênero
ABSTRACT
This paper presents the results of a study on women from a low-income community in Recife, Pernambuco State, Brazil, focusing on how the women practice their family planning. The study is based on an analysis of reproductive practices by these women, specifically related to conception and contraception. The paper argues that the family planning care provided to these women involves a so-called "low-profile interventionist" policy, meaning that decisions concerning the number and spacing of children is shifted from the family domain to that of attending physicians, with a gradual transfer of control from the public sector to the health field.
Key words: Reproduction; Family Planning; Gender
Introdução
Este estudo objetiva entender como são planejadas as famílias das mulheres de camadas populares em Pernambuco. Tem como eixo orientador os aspectos da reprodução, especificamente as práticas de concepção e contracepção. Nesta análise, argumenta-se que a regulação da fecundidade é um espaço de legitimação das relações de classe e gênero; que as políticas de reprodução, no Brasil, transferem gradativamente o controle do Estado para o campo da saúde, assumindo o caráter de "intervenção branca" e retirando as decisões de ter ou não ter filhos do âmbito doméstico; e que o direito de reproduzir, como direito de cidadania, ainda é algo a ser conquistado.
A fim de iniciar a abordagem em questão, é importante diferenciar três expressões, que embora freqüentemente confundidas, divergem fundamentalmente entre si: (1) controle de natalidade, (2) planejamento familiar e (3) direito reprodutivo (Barzelatto, 1998; Berquó, 1998).
(1) Controle de natalidade caracteriza-se pela intervenção autoritária e totalitária do Estado nas decisões reprodutivas da população, atendendo interesses econômicos e seguindo metas demográficas.
(2) Planejamento familiar, tal qual o controle de natalidade, teve enfoque econômico-demográfico. Sua proposta, no entanto, caracteriza-se por apresentar de forma mais branda (formalmente) a intervenção estatal nas decisões reprodutivas da população.
(3) Direitos reprodutivos estão associados à noção de cidadania e atrelados à premissa da indivisibilidade do direito básico à saúde, e devem ser exercidos exclusivamente pelos indivíduos, cabendo ao Estado a oferta dos meios para tanto.
Com base no exposto acima e reportando-se ao contexto brasileiro, pode-se afirmar que a política populacional do país nunca se utilizou do controle de natalidade, ou seja, nunca impôs leis ou estímulos diretos para a redução populacional, assim como nunca garantiu o exercício dos direitos reprodutivos de sua população. Basicamente, as políticas de reprodução no Brasil foram marcadas pela omissão de ações explícitas do governo. Tal prática permitiu que propostas não-oficiais de planejamento familiar fossem amplamente disseminadas e atuassem na propagação do uso de contraceptivos, contribuindo para a redução das taxas de fecundidade no país.
Segundo a Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde (DHS/BEMFAM, 1997), a taxa de fecundidade no Brasil é de 2,5 filhos por mulher e vem decrescendo nos últimos anos, oscilando sobre os diferenciais regionais e sobre as localidades rural e urbana. No decênio de 1986/1996, a taxa de fecundidade do Nordeste caiu aproximadamente 40%, passando de 5,2 filhos por mulher para 3,1 filhos, apesar de ainda contemplar a mais alta taxa de fecundidade do país. Um dos elementos que desempenhou papel importante para a queda da fecundidade no Nordeste foi a democratização do uso de métodos contraceptivos. Do total de mulheres atualmente unidas, 76,7% usam algum método contraceptivo. A diferença da prevalência de métodos contraceptivos em mulheres unidas encontrada no decênio 1986/1996, indica um aumento de aproximadamente 24%, devendo esse crescimento, substancialmente, ao aumento da esterilização e uso da pílula.
Em Pernambuco, nos últimos cinco anos, a taxa de fecundidade total caiu acentuadamente cerca de 23%, distanciando-se da taxa de fecundidade do Nordeste e aproximando-se mais à taxa brasileira. A taxa de fecundidade total pernambucana variou dos 3,5 filhos por mulher, em 1991, a 2,7 filhos por mulher, em 1996 (IBGE, 1996). Por outro lado, a prevalência dos métodos anticoncepcionais em Pernambuco assemelha-se à prevalência nordestina. Em ambos, a esterilização feminina e o uso da pílula constituem significativamente as opções contraceptivas das mulheres unidas.
Tendo em vista tal realidade, este trabalho é guiado pelas seguintes hipóteses:
Os serviços de planejamento familiar atuam considerando que certas funções da vida reprodutiva constituem responsabilidade exclusivamente feminina e prioridade social.
As opções contraceptivas mais utilizadas pelas mulheres são sugeridas pelos serviços de planejamento familiar e requerem desenvolvimento tecnológico e monitoramento médico, consolidando o processo de medicalização do planejamento familiar.
Tais opções contraceptivas são indicadas genericamente e não são necessariamente adequadas à concepção reprodutiva da população, dado que desconsideram sua diversidade cultural.
Para tanto, os aspectos aqui tratados têm como base dados primários, de natureza estatística e de corte transversal, coletados em pesquisa realizada na Várzea, bairro periférico de Recife, em Pernambuco. A Várzea foi a área de investigação escolhida por apresentar características comuns aos bairros de periferia e compor um bom exemplo de bairro popular. A população estudada foi constituída por mulheres, em idade reprodutiva de 15 a 49 anos, tendo a nupcialidade como referencial para ingresso na fase reprodutiva. A amostra totalizou 400 entrevistadas e o questionário foi o instrumento de coleta de dados. O questionário contou com 62 questões, sendo 15 proposições subjetivas e abertas, e 47 objetivas e fechadas ou semi-abertas. A maioria das perguntas abertas versava sobre a justificativa adotada pela entrevistada para determinado comportamento reprodutivo, prática anticonceptiva, ou opinião sobre temas como casamento, casa, marido e sexo.
A utilização desses dados possibilitou aprofundar informações sobre o comportamento reprodutivo da população, nas fases de formação de famílias, espaçamento de filhos e esterilidade; comparar o comportamento reprodutivo das mulheres segundo elementos de ordem social, econômica e cultural; e identificar possíveis intervenções em suas decisões reprodutivas.
Reprodução: espaço de legitimação das relações de gênero
O ponto de partida desta reflexão baseia-se nas transformações ocorridas na família brasileira. Autores como Goldani (1993, 1994) e Cioffi (1998) percebem a sistemática diminuição do tamanho das famílias e a fragmentação e reestruturação do arranjo familiar predominante de casal com filhos. A constatação destas transformações tem paralelamente suscitado questões que envolvem o sistema de sexo-gênero vigente, particularmente no que toca à mulher. Segundo Rubin (1993:2), sistemas de sexo-gênero são "conjunto de arranjos através dos quais uma sociedade transforma a sexualidade biológica em produto da atividade humana, e na qual estas necessidades sexuais transformadas são satisfeitas". Rubin assinala que o sistema de sexo-gênero é o locus da opressão das mulheres.
Sem querer discorrer sobre as causas da opressão feminina, o que se pretende destacar é que a diferença entre os corpos é uma das referências recorrentes pelas quais o poder é exercido e legitimado. Sob tal lógica, os homens devem assegurar controle sobre os corpos das mulheres, no que se refere à reprodução, força de trabalho, ou prazer.
No caso da reprodução humana, sua inerente dimensão biológica ativou o vínculo com a saúde e aproximou a medicina das decisões reprodutivas. De acordo com Mitjavila & Echeveste (1994), a medicina, para além da intervenção nas decisões reprodutivas, representa uma das instâncias socialmente mais significativas das sociedades complexas. Para Foucault (1998), a importância da medicina nas sociedades complexas remonta aos séculos XVIII e XIX, com o nascimento da medicina social. Desde esses períodos os saberes médicos já se situam como peças de poder na relação entre médico e doente.
Assim, as ações sobre o corpo e regulação da fecundidade, ditadas ou orientadas pelos médicos, em muito têm contribuído para legitimar o uso dos meios de regulação, por meio dos métodos anticonceptivos modernos, e institucionalizado a demanda por regulação da fecundidade.
As "Mulheres da Várzea"
A maioria da população estudada, doravante denominada de "Mulheres da Várzea", é adulta na faixa etária dos 25 aos 39 anos e se encontra na fase intermediária da idade reprodutiva (46%); 24% estão no início da idade reprodutiva, na faixa dos 15 aos 24 anos e 30% estão no final da idade reprodutiva, na faixa de 40 a 49 anos. Em média, apresentam grupo doméstico pequeno, morando de 4 a 5 pessoas por domicílio. A renda familiar é baixa, com cerca de 73% igual ou inferior a três salários mínimos. As "Mulheres da Várzea" têm baixa escolaridade. Aproximadamente, 75% têm menos de oito anos de estudos. Quando analisado separadamente, a maior freqüência de anos de estudos corresponde a cinco anos. A maioria das mulheres é casada ou amasiada (82%), 14% são separas e 4% viúvas. Um pouco menos da metade, cerca de 45% estão inseridas no mercado de trabalho, enquanto que 55% são donas-de-casa. Das mulheres que trabalham, 16,7% têm emprego formal e 26,7% prestam serviços temporários em residências particulares. O restante (49,5%) concilia, ou tenta conciliar, seu trabalho com as tarefas domésticas. São os casos das mulheres que vendem mercadoria ou fazem mercadorias para vender em sua própria casa. Outra forma das mulheres obterem renda é por meio das pensões (7,3%). Embora compartilhando dos proventos da casa, predominantemente, as mulheres consideram que a chefia da casa é masculina (63%). Convém lembrar que as tarefas remuneradas desenvolvidas pelas mulheres nem sempre ganham o status de trabalho.
Práticas reprodutivas das "Mulheres da Várzea"
As "Mulheres da Várzea" casam-se mais cedo quando comparadas aos dados do Nordeste (DHS/BEMFAM, 1997). A idade mediana da primeira união entre as "Mulheres da Várzea" (19 anos) é mais baixa do que a idade mediana da primeira união das mulheres em Pernambuco (20,9 anos) e do Nordeste (21,1). Das 400 "Mulheres da Várzea", 80% se casaram uma vez, 17% se casaram duas vezes e apenas 3% se casaram três ou mais vezes. Das mulheres que se casaram uma única vez, 50% delas têm mais de 13 anos de casadas. Esse quadro sugere que a primeira união das "Mulheres da Várzea" está sendo cada vez mais antecipada e que as uniões, de forma geral, são estáveis e duradouras, endossando a credibilidade no casamento.
Assim como as "Mulheres da Várzea" iniciam seu ciclo reprodutivo mais cedo do que as nordestinas, elas também o encerram mais cedo, optando pela esterilização cirúrgica. A época da esterilização das "Mulheres da Várzea" é 27 anos, em média, e é mais baixa do que a época de esterilização das mulheres do Nordeste, 28,9 anos. Este quadro só é alterado quando estratificado por faixa etária. As mulheres que se encontram no fim do ciclo reprodutivo (40 a 49 anos) esterilizaram-se em média com 34 anos. As demais faixas etárias, início e meio do ciclo reprodutivo, apresentam a média de 23 e 27 anos, respectivamente.
Considerando os intervalos de nascimentos dos filhos e taxa de fecundidade, verifica-se que a diferença entre as "Mulheres da Várzea" e as do Nordeste permanece. Nas "Mulheres da Várzea", o intervalo de nascimento é de 24 meses e a taxa de fecundidade é 2,5 filhos por mulher, enquanto que nas de Pernambuco são 31 meses e 2,7 filhos por mulher, e no Nordeste são 29 meses e 3,1 filhos por mulher, respectivamente. De forma similar à esterilização, a faixa etária está associada à taxa de fecundidade das "Mulheres da Várzea". Quanto mais as "Mulheres da Várzea" encontram-se próximas do fim do ciclo reprodutivo, maior o número de filhos dessas mulheres.
Tal comparação indica que as "Mulheres da Várzea" têm um ciclo reprodutivo menor, iniciando e encerrando mais cedo a sua reprodução, assim como, restringindo mais a quantidade de filhos. O encerramento desse período é garantido definitivamente pela perspectiva da esterilização, e o intervalo do ciclo reprodutivo, do início ao fim, é definido muitas vezes pelas decisões médicas, como será mostrado posteriormente.
Quanto à prevalência de métodos contraceptivos, as "Mulheres da Várzea" retratam o mesmo quadro pernambucano, nordestino e brasileiro. Os métodos mais utilizados são a esterilização e a pílula. Cerca de metade das mulheres (51%) são esterilizadas e 24% utilizam os métodos hormonais, principalmente a pílula. Os métodos de barreiras e comportamentais totalizam apenas 9%. O restante (16%), não utilizam nenhum método.
Quando listados os métodos contraceptivos e questionado sobre o uso específico de cada método entre as mulheres em algum momento das suas vidas, a opção contraceptiva das "Mulheres da Várzea" restringe-se novamente à esterilização e à pílula.
Se agrupados em métodos hormonais, de barreiras e comportamentais, apenas os hormonais são plenamente conhecidos. Os métodos de barreiras, em geral, são desconhecidos, e em muitos casos, não foram sequer referidos. Dos métodos de barreira, a camisinha é o mais utilizado. No entanto, a camisinha está associada às doenças sexualmente transmissíveis e, por vezes, seu uso como método contraceptivo é limitado. É comum ouvir referência ao não uso da camisinha porque "não precisa", "meu marido não é doente", "ele não é ruaceiro", "vive em casa e não tem outra mulher". O DIU, embora bastante referido, quase nunca é utilizado. As referências apontam sempre aspectos negativos que estão associados a um fato acontecido com alguém próximo, permeando de medos os relatos: "tenho muito medo", "Deus me livre!", "dá câncer".
Dentre os métodos comportamentais, o coito interrompido e a tabela são os mais referidos. O coito interrompido, apesar de bastante conhecido, tem uma prática, na maioria das vezes associada à tenra idade e à instabilidade do relacionamento (principalmente o namoro). A tabela é bastante mencionada. Muitas mulheres já ouviram falar da tabela, já até a fizeram, mas não sabem realmente como ela funciona: "minha tabela tem 8 anos", "furei", "eu não sei fazer". A natureza matemática e biológica do método confunde as mulheres. De forma semelhante, o método do muco vaginal necessita da noção do funcionamento do corpo, do ciclo, etc. O forte teor científico, inerente à explicação do seu uso, limita-o às mulheres mais jovens e que ainda estão cursando a escola, e sua propagação torna-se mais restrita.
Desta forma, as opções contraceptivas das "Mulheres da Várzea" terminam por ser a esterilização e a pílula. No entanto, dado à falta de conhecimento total ou parcial dos demais métodos, mostrados anteriormente, tais opções não se constituem em preferências, nem livre escolha. Tais opções, na realidade, se referem às únicas alternativas propostas.
Os médicos nas decisões reprodutivas da população
O reduzido aceso e permanência das "Mulheres da Várzea" na escola sugerem que esta não é a única fonte de informação e conhecimento dos métodos contraceptivos. Uma outra fonte de informações e conhecimento para a difusão dos métodos contraceptivos e, conseqüentes práticas reprodutivas com tendência ao controle da fecundidade são os serviços de saúde. Expresso na procura de atendimento médico, cerca de 70% das "Mulheres da Várzea" recorrem freqüentemente aos serviços de saúde. Em sua maioria, fazem exames preventivos de câncer ginecológico, contracepção, tratamento de doenças sexualmente transmissíveis, ou acompanhamento pré-natal. A busca por tais serviços caracteriza-se pela apropriação das recomendações médicas nos termos dos grandes paradigmas da saúde pública: "saúde é prevenção", exaltando a importância do acompanhamento médico. Apenas 3% das mulheres afirmam não seguir as orientações médicas indicadas.
Procurou-se conhecer quem sugeriu os métodos contraceptivos a essas mulheres. Das 388 que responderam, 40% (156) indicaram ter sido a própria mulher, demonstrando certa autonomia do controle do seu corpo. A decisão do marido foi incluída em 13% (51) das respostas, sendo em 9% (34) decisão conjunta do casal e 4% (17), decisão exclusiva do marido. Porém, excetuando a sugestão das próprias mulheres, os que mais intervieram na indicação do uso do método contraceptivo foram os médicos, apontados por 30% (115) mulheres.
Quando questionadas se estavam satisfeitas, as respostas apresentadas sugeriam que o importante era atender as recomendações médicas "não sei, só sei que o médico disse que era o melhor". Para elas, as determinações desse saber do médico são inquestionáveis e indiscutíveis. É comum perceber a apreensão naturalizada das decisões médicas, independentemente das vontades pessoais. Mesmo aquelas que expressaram insatisfação com o método contraceptivo adotado, os desejos de ter filhos eram dissimulados e substituídos pelos discursos dos próprios médicos: "o médico disse que eu já tinha filho demais".
Esta realidade indica a possível existência de um paradoxo ou contradição: a prática médica, que sempre busca (a princípio busca) resguardar ou preservar, ou recuperar a saúde da mulher, nem sempre está baseada em critérios técnicos. Em alguns casos, porém, tais orientações retratam apenas o julgamento valorativo do próprio médico ligado sobretudo às condições econômicas dessas mulheres.
Neste sentido, foi comum ouvir queixas das "Mulheres da Várzea" em relação à adoção de métodos que provocaram outros novos problemas, tais como os associados ao uso de pílulas (nervos, varizes, pressão) ou os problemas associados à esterilização (arrependimento, registro de frigidez, etc.). O alto índice de esterilização nas mulheres nem sempre correspondeu à decisão da mulher, ou a consciência plena dessa decisão. "O médico disse que eu não tinha mais condições". Com afirmações similares, muitas das "Mulheres da Várzea" justificaram a opção da esterilização sugerida pelos médicos. A grande maioria, porém, não sabe exatamente que falta de condições são essas. Neste aspecto, um outro ponto refere-se à falta de informação das mulheres. Mesmo recorrendo ao médico, as informações sobre as demais alternativas contraceptivas não são obtidas, restringindo-se às apresentadas pelos médicos, cujos critérios de exposição, na maioria dos casos, limitam-se à eficácia do método ou à necessidade do seu monitoramento.
Valores familiares das "Mulheres da Várzea"
Os valores familiares das "Mulheres da Várzea" foram analisados com base na construção de um índice, medindo o grau de propensão aos valores tradicionais dos atributos femininos. Este índice foi construído a partir da reação pessoal das "Mulheres da Várzea" a proposições relacionadas à casa, casamento e maternidade, e das respectivas justificativas para tais posicionamentos. As proposições "O mundo é a casa do homem, a casa é o mundo da mulher"; "e viveram felizes para sempre"; "uma mulher sem filhos é uma mulher incompleta"; "mulher precisa de amor, homem precisa de sexo"; "sexo só para procriar"; reforçavam o espaço da casa como espaço da mulher e espaço fora de casa como domínio masculino; o casamento como uma proposta indissolúvel e duradoura; e a maternidade como uma predestinação da mulher, cumprindo sua função natural e estabelecendo a paridade entre reprodução e sexualidade. O nível de medição das repostas exigidas às "Mulheres da Várzea" foi o ordinal, aplicando-se um contínuo que variou do maior ao menor grau de propensão aos valores tradicionais dos atributos femininos. Segundo esse grau de propensão, 29% das "Mulheres da Várzea" são altamente propensas; 40% são parcialmente propensas e 31% são não-propensas à adoção aos valores tradicionais femininos. O grau de propensão aos valores tradicionais dos atributos femininos delineou a formação de três grupos:
O Grupo A é o grupo das mulheres altamente propensas aos valores tradicionais dos atributos femininos. Segundo essas mulheres, o espaço da casa constitui seu habitat natural e a rua constitui exclusivo domínio masculino, enquanto ambiente de trabalho. De outra forma "a rua não tem muito que dar". Esta posição não é singular. Existem posições que, apesar de reconhecerem a separação entre o espaço da casa (feminino) e o da rua (masculino), reivindicam direitos iguais, compartilhando com os homens, principalmente, os cuidados com a casa. Outras posições opostas, afirmam que o "homem em casa não presta". As mulheres altamente propensas acreditam na indissolubilidade do casamento, tendo como referência, de forma geral, o seu próprio casamento. Para essas mulheres, casamento é sinônimo de união familiar e "benção dos céus". São contra a separação e acreditam que o casamento institui a presença masculina na família, considerando que "é muito difícil criar filho sem pai". Nesta perspectiva, os filhos constituem o sentido do casamento: "se casa, quer família". As mulheres que não cumprem essa função sentem-se vazias, incompletas e infelizes. São "árvores que não tiveram frutos". Essas mulheres, ao referirem-se à natureza, garantem a obrigatoriedade de ter filhos, mesmo sendo apenas um, ou, em última instância, adotando. Os cuidados com os filhos são compensados pela companhia do dia-a-dia em casa, ou pela promissora assistência na velhice.
Para as mulheres altamente propensas, a procriação está relacionada à sexualidade. O sexo é um complemento do casamento e "não adianta fazer se não pensar em filhos" (mesmo que eventualmente). No entanto, percebem a sexualidade exercida de forma diferenciada para homens e mulheres. Conforme o grupo das mulheres altamente propensas, a sexualidade feminina está relacionada ao amor romântico, enquanto que a masculina está relacionada à necessidade animal, sendo preciso, em muitos casos, submeter-se ao sexo e satisfazê-lo. Esta posição não é única. Embora algumas mulheres estabeleçam as relações entre homem e sexo, e entre mulher e amor, reivindicam que ambos precisam das duas coisas, amor e sexo, e que o sexo não só existe para a procriação (embora seja o fim último), mas "sexo é prazer também".
O Grupo C é o grupo das mulheres não propensas aos valores tradicionais dos atributos femininos. Esse grupo não concebe a separação entre os espaços da casa (feminino) e da rua (masculino). Acreditam que "hoje em dia não tem mais isso" e que os "direitos são iguais". Para as mulheres não propensas, a realização da mulher está em trabalhar e ser independente. Neste sentido a referência masculina não é requisitada, surgindo apenas no momento da divisão e compartilhamento de tarefas, onde "o que um faz, o outro faz". Para essas mulheres, o casamento nos moldes tradicionais, indissolúvel e duradouro é "muito difícil" e "nem todos conseguem". Asseguram que a "felicidade está dentro da gente" e não no casamento. Ou seja, o casamento não está, necessariamente, inserido em seus projetos de vida. De forma semelhante, os filhos também não. Este aspecto diverge em algumas posições. Para umas, "filho prende muito" e "atrapalha" o desenvolvimento profissional e pessoal. Outras compartilham da necessidade de completarem-se com filhos. E a grande maioria advoga que existem outras alternativas para sentirem-se completas (destacam o trabalho), embora a decisão de ter, ou não ter filhos, dependa de cada pessoa. Reprodução e sexualidade para esse grupo de mulheres estão completamente dissociadas. Sexo é prazer. No entanto, o prazer do sexo permanece vinculado à afetividade.
O Grupo B é o grupo das mulheres parcialmente propensas aos valores tradicionais dos atributos femininos. Esse grupo mescla as propriedades dos dois grupos anteriores, e mostra-se, em muitos casos, ambíguo e paradoxal. Para esse grupo, a separação dos espaços da casa e da rua é mais tênue do que a do Grupo A e mais rígida do que a do Grupo C. Para a maioria, a casa tanto é do homem como da mulher, assim como os dois devem sair para trabalhar, sem descartar a alternativa de que "a mulher em casa é melhor". As mulheres parcialmente propensas dividem-se entre a credibilidade do casamento nos moldes tradicionais e as dificuldades reais de existência desse modelo. Ilustrada pela experiência do próprio casamento, a separação só é concebida quando o bem-estar familiar não é ameaçado (em sua maioria, refere-se ao próprio sustento ou ao sustento dos filhos).
A maternidade é importante na vida das mulheres parcialmente propensas. Esse grupo compartilha da concepção de se ter pelo menos um filho. As condições sócio-econômicas surgem como um dos motivos que impedem o maior número de filhos. "Tem gente que não tem condições" e "para criar tanto filho... é preciso pensar duas vezes". Mesmo valorizando a presença dos filhos na vida das mulheres, a associação entre reprodução e sexualidade feita pelas mulheres parcialmente propensas é fraca. A quase totalidade dessas mulheres reivindica o sexo como instrumento de prazer. Tal como nos demais grupos, a sexualidade é concebida diferentemente entre os sexos. O "homem só gosta disso" e "só quer sexo", a mulher, por sua vez, precisa de amor e carinho.
No que se refere às configurações sócio-demográficas e reprodutivas dos grupos A, B e C, acima descritos, a distribuição etária dividida por grupos aproxima-se da distribuição etária geral, concentrando cerca de 50% no meio da idade reprodutiva, nas faixas entre 25 a 39 anos. No entanto, o nível de escolaridade por grupos é diferenciado. O Grupo A apresenta o nível de escolaridade mais baixo, comparado aos demais grupos. Por outro lado, o Grupo C é o que apresenta o nível de escolaridade mais alto. Convém destacar que o acesso à escola contribuiu significativamente para determinar a variação das práticas reprodutivas e do grau de propensão aos valores tradicionais dos atributos femininos. Quanto mais anos de escolaridade, mais as "Mulheres da Várzea" retardam o casamento, diminuem a quantidade de filhos, ingressam no mercado de trabalho e se afastam dos valores tradicionais dos atributos femininos.
A distribuição por grupos A, B e C reproduzem situação conjugal geral, ou seja, predominantemente são casados e moram com seus parceiros (aproximadamente, 84%). O Grupo C, no entanto, apresenta o maior percentual de separados (17%), enquanto nos grupos A e B, esse percentual gira em torno dos 12%. Nos grupos A e B, mais da metade das mulheres (58%) não trabalham, enquanto no C, um pouco mais da metade está inserida no mercado de trabalho (52%).
O Grupo A casa-se mais cedo e tem mais filhos que os demais grupos. Na quase totalidade dos casos, o grupo casa-se uma única vez e, em média, aos 18 anos, embora a maior freqüência (moda) seja aos 16 anos. Esse grupo tem, em média, três filhos por mulher. Os grupos B e C casam-se, predominantemente, uma única vez e, em média aos 19 anos, sendo a maior freqüência (moda) aos 17 anos. Ambos têm, em média, dois filhos.
Os métodos contraceptivos mais utilizados pelos grupos A, B e C são a pílula e a esterilização. O Grupo A apresenta o maior índice de esterilização (57%) e praticamente só utiliza a pílula (16%) como outra alternativa contraceptiva. Outros métodos contraceptivos utilizados pelos outros grupos que aparecem expressivamente são a camisinha e o método hormonal injetável.
Estruturação do comportamento reprodutivo
Os dados apresentados nas seções anteriores retrataram a pluralidade da realidade das "Mulheres da Várzea". Os perfis descritos traduziram a combinação de valores e práticas nem sempre coerentes e muitas vezes contraditórios. Enquanto as práticas reprodutivas mostram-se mais homogêneas, apontando para a redução da fecundidade e adoção de tecnologias reprodutivas irreversíveis, os valores familiares constituem um sistema aberto e heterogêneo, variando conforme a concepção de casamento, casa e maternidade das "Mulheres da Várzea". As práticas reprodutivas relativas à formação, espaçamento e encerramento de família (nupcialidade, práticas contraceptivas e esterilidade) permaneceram as mesmas, independentemente dos valores familiares dessas mulheres, exceto no que se refere ao número de filhos. Nestes casos, o grau de propensão aos valores tradicionais dos atributos femininos está associado ao número de filhos. Quanto maior a propensão aos valores tradicionais, maior o desejo da maternidade, maior o número de filhos das "Mulheres da Várzea". Dentre as relações entre práticas e valores, foi possível identificar conflito entre o desejo da maternidade e a prática da contracepção. Predominantemente, a necessidade de não ter mais filhos foi respaldada pela ausência de saúde ou pelas condições concretas de sobrevivência. Considera-se que, para essas mulheres, a adoção da contracepção foi a condição facilitadora de preservar a saúde, adequar-se à situação econômica e paradoxalmente reafirmar o papel de reprodutora biológica e social da mulher, substituindo a ótica quantitativa de ter filhos pela ótica qualitativa de criar bem os filhos tidos.
A constatação acima conduz a concluir que as relações entre práticas e valores estão longe de estabelecer uma correspondência direta. A alternativa explicativa proposta neste estudo, é de que o comportamento reprodutivo esboça uma relação dinâmica entre práticas e valores. A elaboração do que as pessoas pensam é fundamental para acelerar a adoção de ações e modificar o comportamento, e vice-versa, embora nem sempre exista uma excessiva coerência interna das idéias, valores e práticas de determinado grupo. Dito de outra forma, a estruturação do comportamento reprodutivo das "Mulheres da Várzea" envolve práticas e valores que se processam dialeticamente, incluindo continuidade e dinamismo como partes simultâneas de um mesmo processo, onde o descompasso de apreensão entre valores e práticas decorre do próprio do processo de estruturação. Tal consideração relativiza o tempo.
Sem desconsiderar que "a maior mobilidade geográfica, os meios de comunicação de massa e muitos outros fatores extraíram elementos da tradição da vida social que há muito resistiam" (Giddens, 1993:39), o agente de mudança aqui destacado são as instituições de saúde, na figura do médico. Assim, as práticas médicas nas decisões reprodutivas caracterizam-se pelo poder de intervenção, por intermédio do controle sobre os recursos material, intelectual e ideológico na reprodução. O controle sobre o recurso material inclui o domínio das tecnologias reprodutivas; o controle sobre o recurso intelectual compreende conhecimento técnico-científico e as informações; e o controle sobre a ideologia significa habilidade para gerar, propagar e institucionalizar valores, atitudes e comportamentos.
Considerações finais
Busca-se, no momento, lançar luz sobre o reflexo da "intervenção branca" na regulação da fecundidade. A matriz classista e sexista sob a qual se processa tal "intervenção branca" está assentada em um tipo de assimetria nas relações de poder travada entre a mulher e as instituições de planejamento familiar, transformando a figura do médico ou do profissional de saúde no principal vetor de canalização deste poder. Cabe destacar dois aspectos apontados neste estudo sobre os quais a "intervenção branca" recai. Um primeiro aspecto remete à modelagem família, delineada pela "intervenção branca", baseando-se em um parâmetro comum de práticas reprodutivas. Isto significa que aportado em critérios técnicos, aparentemente neutros, tais como condições e números de partos, espaçamento entre filhos, opção contraceptiva e período e forma de encerramento do ciclo reprodutivo, entre outros, os médicos terminam por fixar um padrão reprodutivo e tendem a considerar, aprioristicamente, que os valores familiares da população também são homogêneos e generalizáveis. Desta forma, as orientações médicas em muitos casos, desconsideram a dinâmica própria das famílias e acomodam valores e práticas, muitas vezes alheios, à realidade e significado da população atendida.
O outro aspecto refere-se ao exercício dos direitos reprodutivos. Pensar acerca do exercício dos direitos reprodutivos implica considerar a decisão de homens e mulheres no campo da suas vidas reprodutivas e sexuais. No entanto, significativas parcelas das decisões que imperam nas questões reprodutivas são decisões médicas, que nem sempre coadunam com as da população, e podem ser convertidas em instrumento de coação, controle e opressão, promovendo valores de submissão, sacrifício e obediência.
Assim, diante de uma primeira aproximação desta conclusão, pode-se afirmar que a articulação entre saúde e direitos reprodutivos ainda é algo a ser conquistado, dado que:
A "intervenção branca" impossibilita as mulheres, principalmente as pobres, de controlar seu próprio corpo, quer seja para o prazer, reprodução ou contracepção.
A "intervenção branca" não necessariamente acomoda as práticas reprodutivas à concepção reprodutiva da população.
A "intervenção branca" manifesta o caráter socializador da medicina, e este pode servir de instrumento de controle social.
Entretanto, convém afirmar que este estudo não tem a pretensão de esgotar a temática. Espera-se que, ao abordar um dos canais de intervenção no comportamento reprodutivo, possa contribuir para o entendimento dos processos e atividades ligados à reprodução.
Recebido em 4 de junho de 2003
Versão final reapresentada em 29 de agosto de 2003
Aprovado em 25 de setembro de 2003
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
28 Ago 2006 -
Data do Fascículo
2003
Histórico
-
Recebido
04 Jun 2003 -
Revisado
29 Ago 2003 -
Aceito
25 Set 2003