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Análise de consistência de iogurte: correlação entre medida sensorial e instrumental

Analysis of consistency of yogurt: correlation between sensorial and instrumental evaluation

Resumos

O efeito das variáveis independentes: soro desmineralizado em pó (0,0; 1,5 e 3,0 %), cultura láctica (1,0; 2,0 e 3,0 %) e temperatura de tratamento da mistura (85; 90 e 95°C) foi estudado nas respostas consistência sensorial e instrumental do iogurte. A metodologia de superfície de resposta foi usada para efetuar tratamentos estatísticos dos experimentos e desenvolver modelos matemáticos da relação entre as variáveis e as respostas. A consistência instrumental e sensorial apresentaram resultados semelhantes e correlacionáveis entre si, r = 0,65 (p < 0,01), ambas foram maiores quando aumentou-se a temperatura da mistura e diminuiu-se o teor de soro desmineralizado em pó.

iogurte; consistência; soro desmineralizado em pó


The independent variables: demineralized whey powder (0.0; 1.5 e 3.0 %), lactic culture (1.0; 2.0 e 3.0 %) and mix treatment temperature (85; 90 e 95°C) were studied on the responses sensorial and instrumental consistencies. Response surface methodology was used to make statistical treatment of the experiments and to develop mathematical models of the relationship between the variables and the responses. Instrumental and sensorial consistency showed similar results and correlation between itself, r=0.65 (p < 0.01), both were higher when a mix treatment temperature was increased and amount of demineralized whey powder was decreased.

yogurt; consistency and demineralized whey powder


Análise de consistência de iogurte: correlação entre medida sensorial e instrumental

Analysis of consistency of yogurt: correlation between sensorial and instrumental evaluation

A.L.B.PennaI; M.N. OliveiraII; R.BaruffaldiII

I Departamento de Engenharia e Tecnologia de Alimentos, IBILCE/UNESP. R. Cristóvão Colombo, 2265. 15400-000. São José do Rio Preto-SP

II Departamento de Tecnologia Bioquímico-Farmacêutica, Faculdade de Ciências Farmacêuticas/USP. Av. Lineu Prestes, 580. 05508-900. São Paulo, SP

RESUMO

O efeito das variáveis independentes: soro desmineralizado em pó (0,0; 1,5 e 3,0 %), cultura láctica (1,0; 2,0 e 3,0 %) e temperatura de tratamento da mistura (85; 90 e 95°C) foi estudado nas respostas consistência sensorial e instrumental do iogurte. A metodologia de superfície de resposta foi usada para efetuar tratamentos estatísticos dos experimentos e desenvolver modelos matemáticos da relação entre as variáveis e as respostas. A consistência instrumental e sensorial apresentaram resultados semelhantes e correlacionáveis entre si, r = 0,65 (p < 0,01), ambas foram maiores quando aumentou-se a temperatura da mistura e diminuiu-se o teor de soro desmineralizado em pó.

Palavras chave: iogurte, consistência, soro desmineralizado em pó.

SUMMARY

The independent variables: demineralized whey powder (0.0; 1.5 e 3.0 %), lactic culture (1.0; 2.0 e 3.0 %) and mix treatment temperature (85; 90 e 95°C) were studied on the responses sensorial and instrumental consistencies. Response surface methodology was used to make statistical treatment of the experiments and to develop mathematical models of the relationship between the variables and the responses. Instrumental and sensorial consistency showed similar results and correlation between itself, r=0.65 (p < 0.01), both were higher when a mix treatment temperature was increased and amount of demineralized whey powder was decreased.

Key words: yogurt, consistency and demineralized whey powder.

1 — INTRODUÇÃO

Iogurte é um produto fermentado elaborado com leite enriquecido com alto teor de sólidos usando uma cultura mista de Lactobacillus delbrueckii ssp. bulgaricus e Streptococcus salivarius ssp. thermophilus (15). É caracterizado por um gel suave, viscoso e um delicado sabor característico (9). É o mais conhecido dos leites fermentados.

As tecnologias para utilização do soro, subproduto da indústria de fabricação de queijos, têm crescido exponencialmente durante os últimos dez anos. O desmineralizado é produzido através da utilização de membranas e colunas de troca de íons. Devido às suas propriedades funcionais, as proteínas do soro podem ser usadas em uma ampla faixa de formulações, como produtos infantis, enterais, alimentos dietéticos para o ganho ou para a redução de peso, sucos de frutas fortificados com proteínas e outros alimentos e bebidas (8).

Tecnologicamente, a consistência do iogurte é tão importante quanto o sabor ou o aroma. A firmeza adequada, sem separação de soro é essencial para se melhorar a qualidade do produto. Segundo BENEZECH & MAINGONNAT (3), três etapas são fundamentais na produção de iogurtes e importantes para a melhoria da textura: a preparação e tratamento térmico do leite, a incubação e o processo usado no resfriamento.

As características, viscosidade e consistência de um produto, podem determinar sua aceitação ou não por parte do consumidor. Estas também são importantes durante o processamento, até mesmo na determinação de seus parâmetros. A redução da viscosidade do iogurte pode acontecer em diferentes etapas após a incubação: durante o bombeamento e transporte, no resfriamento e nas operações de acondicionamento.

A consistência e a textura são atributos percebidos pelas papilas da boca, existindo, no entanto, uma grande variedade de instrumentos destinados a avaliar as características reológicas e de textura dos alimentos. Para as medidas instrumentais de consistência de iogurtes utilizam-se os consistômetros, que destinam-se a avaliar as características de alimentos semi-sólidos. A análise sensorial é uma medida integrada e multidimensional com 3 vantagens importantes: identifica a presença ou ausência de diferenças perceptíveis, qualifica as características sensoriais importantes de forma rápida e denota problemas particulares que não podem ser detectados por outros procedimentos analíticos (11).

Correlacionar medidas instrumentais com avaliações sensoriais, é de suma importância devido à necessidade do desenvolvimento de testes objetivos que possam predizer e em última instância, substituir a avaliação sensorial (5). Diversos autores avaliaram a existência de correlação entre atributos sensoriais e medidas instrumentais. ALMEIDA, JORGE & DA SILVA (2), efetuaram avaliações sensoriais de cor e textura em tomates e verificaram a existência de correlação destes atributos com o estágio de maturação. Os coeficientes de correlação encontrados foram 0,92 para textura e 0,96 para cor, muito satisfatórios para descrever as alterações do tomate durante a maturação.

ALDROVANDI et al. (1), desenvolveram modelo matemático para relacionar a aceitabilidade de textura de doce de leite com propriedades químicas (determinação de umidade, valor de pH, teores de sólidos solúveis, de proteínas, de sacarose, de amido e de gordura) e físicas (dureza, adesividade, elasticidade, coesividade e gomosidade). Devido a existência de correlação, a aceitabilidade da textura do doce de leite pode ser explicada por meio destas medidas químicas e físicas.

Neste trabalho foram avaliadas a consistência instrumental e sensorial de iogurtes fabricados com a adição de soro desmineralizado em pó verificando-se a existência de correlação estatística entre as medidas.

2 — MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 - Técnica de preparo do iogurte

O leite pasteurizado foi inicialmente padronizado a 12,5 % de sólidos usando-se leite em pó desnatado. O leite, após padronização, recebeu até 3 % de sólidos lácticos (leite em pó e/ou soro em pó). O soro desmineralizado em pó foi usado em substituição parcial ou total dos sólidos nas proporções 0% (zero), 1,5% (metade) e 3,0% (total), conforme o protocolo experimental. Adicionaram-se 7% p/v de açúcar em todos os experimentos antes da fermentação. O volume de leite variou de 870 a 890 ml, de acordo com o experimento, totalizando 900 ml com o acréscimo dado pela cultura láctica.

Foi feita a mistura dos ingredientes, aquecimento a temperatura controlada (85, 90 ou 95°C), em cada caso, por 5 minutos em banho termostatizado. A seguir foi resfriada em banho de água e gelo até a temperatura 43°C para receber a cultura láctica em quantidade de 1 a 3 %, conforme o experimento. Incubou-se em estufa a 42°C por tempo suficiente para o pH atingir valores próximos a 4,3. Após fermentação, foi feita a quebra do coágulo e resfriamento em banho de água e gelo. O iogurte permaneceu 16h em refrigerador entre 4 e 8°C antes de ser submetido à avaliação físico-química.

2.2 - Medida da consistência instrumental

A consistência foi determinada através da distância percorrida em centímetros pela amostra mantida a 10°C, num intervalo de 30 segundos, em consistômetro de Bostwick, que é um equipamento de baixo custo, simples e de largo emprego no controle rotineiro de qualidade.

2.3 - Teste sensorial

Neste teste o provador expressou sua opinião quanto às amostras numa escala hedônica de 5 pontos, sendo: péssimo -1 ponto; ruim - 2 pontos; regular - 3 pontos; bom - 4 pontos e, ótimo - 5 pontos. As amostras foram codificadas, usando-se números de 3 dígitos, tomadas ao acaso, de acordo com instruções de MORAES (10).

2.4 - Planejamento estatístico dos experimentos

O efeito das variáveis independentes: soro desmineralizado em pó (0,0; 1,5 e 3,0 %), cultura láctica (1,0; 2,0 e 3,0%) e temperatura de tratamento da mistura (85; 90 e 95°C) foi estudado nas respostas consistência instrumental e sensorial.

A Tabela 1 mostra as variáveis independentes e os níveis de variação usados no perfil de otimização. Os ensaios foram realizados segundo um projeto ortogonal de segunda ordem, de acordo com BOX, HUNTER & HUNTER (4), constituído de 18 ensaios, 14 axiais e 4 centrais. A significância do modelo foi testada pela análise de variância (teste F) e a influência das variáveis foi visualizada pelas linhas de contorno da resposta. Em todas as análises considerou-se um nível de significância de 5 %. Utilizou-se o aplicativo Statgraphics versão 5.0 para ajuste dos modelos matemáticos e o programa Statistica versão 4.3 para gerar as figuras.

3 — RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados médios das medidas do valor de pH, da acidez e da consistência instrumental e sensorial de cada um dos 18 experimentos podem ser visualizados na Tabela 2. As equações de segundo grau ajustadas para a consistência instrumental e sensorial são respectivamente:

y1 = 11,75 + 1,38 X1 - 0,95 X3 - 0,80 X1X3 (equação 1)

y2 = 4,08 - 0,19 X1 + 0,19 X3 + 0,20 X1X3 (equação 2)

Os coeficientes das variáveis e suas significâncias, para o modelo consistência instrumental e sensorial estão apresentados na Tabela 3.

As superfícies de resposta e as linhas de contorno para o modelo consistência instrumental (y1) são mostradas na Figura 1. A consistência instrumental cresce com o aumento da temperatura de tratamento da mistura (X3) e com a diminuição do soro desmineralizado em pó (X1). A consistência mostrou-se independente da variável X2, quantidade de cultura láctica.


O tratamento térmico provoca mudanças na estrutura físico-química das proteínas, no abaixamento do valor de pH e nas propriedades nutritivas, tanto para a cultura das bactérias quanto para o consumidor, e ainda tem a finalidade de pasteurizar o leite (14).

O tratamento térmico mostrou também influencia na consistência e na separação do soro do iogurte. Embora o tratamento térmico não altere muito a estrutura da caseína, apresenta uma influência significativa na desnaturação das proteínas do soro e na sua interação com a caseína (13).

DANNENBERG & KESSLER (6, 7), observaram estreita relação entre as propriedades reológicas e o grau de desnaturação da β-lactoglobulina entre 60 e 90 % tendo, a firmeza do gel obtido aumentado consideravelmente. Dependendo do processo de aquecimento e da intensidade do calor, uma proporção de β-lactoglobulina e α-lactoalbumina é depositada sobre a caseína. BENEZECH & MAINGONNAT (3) verificaram que esta fusão e hidratação das micelas de caseína, durante a posterior fermentação, determinam as propriedades reológicas do iogurte.

O soro desmineralizado em pó tem maior influência na consistência, comparando-se com a temperatura de tratamento da mistura, isto é, para um mesmo intervalo de variação de soro e de temperatura, a consistência instrumental decresce mais rapidamente na direção do aumento do soro desmineralizado em pó. Acrescentando-se na mistura para iogurte, 0,75% de soro desmineralizado em pó (X1 = -0,5) observa-se uma diminuição na consistência instrumental; porém, se a temperatura de tratamento da mistura for 91°C (X3 = 0,2), consegue-se manter a consistência entre os 9 e 10 cm de escorrimento (Tabela 2 e Figura 1), próximas daquela obtida somente com leite em pó desnatado, sem soro. Estes valores de consistência são ligeiramente superiores àqueles encontrados em iogurtes comerciais naturais (6,5 a 9,2 cm de escorrimento) avaliados por PENNA, OLIVEIRA & BARUFFALDI (12).

Para se utilizar 3% de soro desmineralizado em pó (X1 = 1) sem grandes prejuízos na consistência (12cm de escorrimento), é necessário efetuar o tratamento da mistura a 91,5°C (X3 = 0,3). Desta maneira, obtém-se iogurtes com consistência semelhante àquela encontrada em iogurtes comerciais adicionados de polpa de morango e de mel, apresentando de 10,1 a 14cm de escorrimento (12).

A consistência sensorial do iogurte depende apenas dos efeitos lineares das variáveis X1 e X3 (soro desmineralizado em pó e temperatura de tratamento da mistura) e da sua interação, como mostra a Tabela 3. A superfície de resposta e as linhas de contorno para a equação 2, do modelo consistência sensorial está apresentada na Figura 2, e mostra o comportamento da consistência em função das variáveis soro desmineralizado em pó e temperatura de tratamento da mistura. Quando o iogurte foi elaborado apenas com leite em pó desnatado (X1 = -1), a consistência sensorial se alterou muito pouco com a variação da temperatura de tratamento da mistura.


Aumentando-se a quantidade de soro desmineralizado em pó, os valores obtidos para consistência sensorial diminuem, como pode ser observado pelas linhas de contorno desta superfície. Entretanto a consistência sensorial pode ser considerada boa (valor 4), usando-se 3% (X1 = 1) de soro desmineralizado em pó, se a temperatura de tratamento da mistura estiver acima de 92,5°C (X3 = 0,5).

A consistência instrumental e sensorial apresentam resultados semelhantes e correlacionáveis entre si, r = 0,65 (p < 0,01). Ambas são maiores quando aumenta-se a temperatura da mistura e diminui-se o teor de soro desmineralizado em pó.

4 — REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido para publicação em 27/02/96

Aceito para publicação em 10/06/97

  • (1) ALDROVANDI, A., GÁMBARO, A., BURGUEŃO, J., DIANA, E. Dessarollo de um modelo matemático para relacionar a aceptabilidad de textura de dulce de leche com propriedades químicas y físicas. I Simposio Iberoamericano de Análise Sensorial. Campinas, 1996. Livro de Resumos, P 029.
  • (2) ALMEIDA, C., JORGE, J.T., DA SILVA, M.A.A.P. Avaliaçăo sensorial da textura e cor do tomate (Lycopersicum esculentum Mill), visando o estabelecimento de correlaçőes ao longo do tempo de maturaçăo. I Simposio Iberoamericano de Análise Sensorial. Campinas, 1996. Livro de Resumos, P 007.
  • (3) BENEZECH, T., MAINGONNAT, J.F. Characterization of the rheological properties of yoghurt - a review. J. Food Engineering, v.21, n.4, p. 447 -472,1994.
  • (4) BOX, G.E.P., HUNTER, W.G., HUNTER, J.S. Statistic for experimenters John Wiley & Sons, Inc. New York. p. 510-539, 1978.
  • (5) CAMPOS, S.D.S. Reologia e textura em alimentos ITAL, Campinas, 1989.
  • (6) DANNENBERG, F., KESSLER, H.G. Effect of denaturation of b-lactoglobulin on texture properties of set - style nonfat yoghurt. 1. Syneresis. Milchwissenschaft, Munich, v. 43, n. 10, p. 632-635, 1988 a.
  • (7) DANNENBERG, F., KESSLER, H.G. Effect of denaturation of b-lactoglobulin on texture properties of set - style nonfat yoghurt. 2. Firmness and flow properties. Milchwissenschaft, Munich, v. 43, n. 11, p. 700-704, 1988b.
  • (8) HUFFMAN, L.M. Processing whey protein for use as a food ingredient. Food Technol, Chicago, v. 50, n.2, p. 49-52, 1996.
  • (9) KOSIKOWSKI, F. Cheese and Fermented Milk Foods Michigan: Edwards Brothers, 1970.
  • (10) MORAES, M.A.C. Métodos para avaliaçăo sensorial dos alimentos Campinas: UNICAMP, 1983. 73 p.
  • (11) NAKAYAMA, M., WESSMAN, C. Application of sensory evaluation to the routine maintenance of product quality. Food Technol Chicago, v. 33, n. 9, p. 38, 1979.
  • (12) PENNA, A.L.B., OLIVEIRA, M.N., BARUFFALDI, R. Avaliaçăo da qualidade de iogurtes. Rev. Leite & Derivados, n. 16, p.13-20, 1994.
  • (13) RASIC, J.L., KURMANN, J.A. Yoghurt: Scientific Grounds, Technology Manufacture and Preparation Copenhagen: Tech. Dairy Publishing House, 1978.
  • (14) TAMIME, A.Y., ROBINSON, R.K. Yogurt: Ciencia y Tecnologia, Zaragoza: Acribia, 1991. 368 p.
  • (15) VEDAMUTHU, E.R. The yogurt story - past, present and future. Dairy, FoodEnviron. Sanit, v. 12, n. 6, p. 351-354, 1992.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Out 2012
  • Data do Fascículo
    Ago 1997
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