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Nina Rodrigues e os Índios do Brasil* * O artigo é resultado da pesquisa de estágio de pós-doutoramento realizada no Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia da Universidade Federal do Pará ((PPHIS-UFPA), realizada entre 2017 e 2022 e financiada pelo Programa Nacional de Pós-Doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/Capes).

Nina Rodrigues and Brazil’s Indigenous Peoples

Nina Rodrigues et les Indiens du Brésil

Nina Rodrigues y los Indios de Brasil

Resumo

Os índios, em especial aqueles provindos do que então era entendido como “mestiçagem” ou “miscigenação” com brancos e negros, tornaram-se um fator-chave no plano teórico do médico e antropólogo Raimundo Nina Rodrigues. Habitualmente, sua herança intelectual é vinculada à população “áfrico-bahiana”, posto seus estudos detalhados sobre etnologia urbana. Este artigo busca explorar, dentre suas propostas, o papel do “brasílio-guarany” e seu fator nocivo para o desenvolvimento do país, na ótica cientificista. Nina Rodrigues abriu diálogo com dois autores de destaque no século XIX sobre os ameríndios do Norte do país (em especial Pará e Amazonas), José Veríssimo e Couto de Magalhães. Sustentamos que o resultado deste confronto de ideias é um exemplo contundente de como o médico maranhense realizou certo deslocamento de sua posição em face do racismo científico, do qual ele se afasta (mas não abandona), incorporando elementos do evolucionismo-social e criando uma leitura única das relações sociais e biológicas entre as chamadas três raças formadoras da nação.

índios; raça; Nina Rodrigues; José Veríssimo; Couto de Magalhães

Abstract

Indians, especially those who came from what was then understood as mestiçagem or miscegenation with whites and blacks, became a key factor in the theoretical framework of physician and anthropologist Raimundo Nina Rodrigues. Typically, his intellectual heritage is linked to the “African-Bahian” population, given his detailed studies on urban ethnology. This article seeks to explore among his proposals the role of “Brasílio-Guarany” and its perceived harmful impact on the country’s development from a scientistic perspective. Nina Rodrigues engaged in a dialogue regarding Brazil’s Indians from the country’s Northern region (especially Pará and Amazonas) with two prominent nineteenth-century authors: José Veríssimo and Couto de Magalhães. We argue that the result of this clash of ideas is a striking example of how the Maranhão-born doctor underwent a shift in his position regarding scientific racism, from which he distances himself (but does not entirely abandon), incorporating elements of social evolutionism and creating a unique interpretation of the social and biological relations among the so-called three races shaping the nation.

indians; race; Nina Rodrigues; José Veríssimo; Couto de Magalhães

Résumé

Les Indiens, en particulier ceux issus de ce qui était alors compris comme “métissage” ou “miscegenèse” avec des blancs et des noirs, sont devenus un élément clé dans la théorie du médecin et anthropologue Raimundo Nina Rodrigues. Habituellement, son héritage intellectuel est lié à la population “africo-bahianaise”, compte tenu de ses études détaillées sur l’ethnologie urbaine. Cet article cherche à explorer, parmi ses propositions, le rôle du “brasílio-guarany” et son impact négatif sur le développement du pays, selon une perspective scientifique. Nina Rodrigues a engagé un dialogue avec deux auteurs de renom du XIXe siècle sur les Amérindiens du Nord du pays (en particulier au Pará et en Amazonie), José Veríssimo et Couto de Magalhães. Nous soutenons que le résultat de cette confrontation d’idées est un exemple frappant de la manière dont le médecin maranhense a opéré un certain déplacement par rapport au racisme scientifique, dont il s’éloigne (mais n’abandonne pas), en incorporant des éléments de l’évolutionnisme social et en créant une lecture unique des relations sociales et biologiques entre les trois races constitutives de la nation.

indiens; race; Nina Rodrigues; José Veríssimo; Couto de Magalhães

Resumo

Los indios, en especial aquellos provenientes de lo que entonces era entendido como “mestizaje” o “mestización” con blancos y negros, se convierten en un factor clave en el plano teórico del médico y antropólogo Raimundo Nina Rodrigues. Habitualmente, su herencia intelectual es vinculada a la población “afro-bahiana”, teniendo em cuenta sus estudios detallados sobre etnología urbana. Este artículo busca explorar, entre sus propuestas, el papel del “brasílio-guarany” y su factor nocivo para el desarrollo del país, desde una perspectiva científica. Nina Rodrigues abrió el diálogo con dos autores destacados en el siglo XIX sobre los amerindios del Norte del país (en especial Pará y Amazonas), José Veríssimo y Couto de Magalhães. Sostenemos que el resultado de esta confrontación de ideas es un ejemplo contundente de cómo el médico marañense hizo un cambio en su posición frente al racismo científico, del cual se distancia (pero no abandona), incorporando elementos del evolucionismo social y creando una lectura única de las relaciones sociales y biológicas entre las llamadas tres razas formadoras de la nación.

indios; raza; Nina Rodrigues; José Veríssimo; Couto de Magalhães

Introdução

Nas últimas três décadas, a historiografia brasileira tem criticado reiteradamente a ausência do índio1 1 . Muito embora saibamos que a palavra “índio” remete a uma visão generalizante acerca dessas populações, optamos por mantê-la nesse artigo, por ser essa a noção utilizada no período que abordamos. Mais recentemente, o termo “indígena” vem se afirmando como alternativa, por remeter à diversidade cultural que caracteriza esses povos. e da agência indígena nos estudos acadêmicos e nos materiais didáticos brasileiros2 2 . Para as principais referências da “Nova História Indígena”, cf. Cunha, 1992; Henrique, 2018; Kodama, 2009; Mattos, 2004; Montero, 2006; Monteiro, 1994; Sampaio, 2001. . Em grande medida, é como se o país permanecesse refém de uma tradição que remonta ao século XIX, na qual o indígena não aparece como personagem de primeira grandeza em nossa história. Ou melhor, aparece, em meados dos oitocentos, como bem queriam os “lettrados” membros do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), porém como um personagem emoldurado pelo romantismo, idealizado como uma figura passiva, domesticado, belo como uma escultura inerte, sem vida.

Se o indígena, suas formas de vivência e convivência, suas tradições, sua cultura, enfim, ainda permanecem – apesar dos esforços em contrário nas últimas décadas – como uma sombra à escrita, ao ensino e à divulgação da História, o precedente deste fenômeno pode ser localizado na supressão deste personagem ou na leitura deformada que dele se fazia em trabalhos acadêmicos e científicos sobre a “História Pátria” na segunda metade do século XIX. Já em um momento de crítica ao indianismo e glórias à cientificidade, diversos intelectuais, como o médico e antropólogo maranhense Raimundo Nina Rodrigues (1862-1906), empenharam-se em divulgar uma imagem do nativo americano deturpada em todo ou em parte, rearranjada dentro da “fábula das três raças”, como o elemento mais inerte do tripé da formação nacional. Era, para este intelectual, não a primeira (branca) ou sequer a segunda (negra), mas a “terceira raça” (Rodrigues, 2006 [1889]:130).

Alguns dos mais importantes intérpretes do Brasil que se dedicaram à etnografia dos povos indígenas, ainda que com um viés autoritário e evolucionista, também foram relegados ao segundo ou terceiro escalão da tradição do pensamento social brasileiro. É o caso do escritor paraense José Veríssimo Dias de Matos (1857-1916) e do general mineiro José Vieira Couto de Magalhães (1837-1898), nomes relevantes de nossa história intelectual (Bezerra Neto, 1999; Henrique, 2003Henrique, Márcio Couto. (2003), O general e os tapuios: linguagem, raça e mestiçagem em Couto de Magalhães (1864-1876). Dissertação (Mestrado em Antropologia), Universidade Federal do Pará, Belém.). É com esses dois personagens, em especial, que Nina Rodrigues vai ora apontar contradições, ora concordâncias, e desenhar em sua obra, uma interpretação própria dos indígenas brasileiros, com atenção especial aos povos do “Extremo Norte – na Amazônia e estados a oeste”. (Rodrigues, 1957 [1894]:96).

José Veríssimo e Nina Rodrigues: hereditariedade e branqueamento

A obra do médico maranhense Nina Rodrigues, professor da Faculdade de Medicina da Bahia (FAMEB), é invariavelmente vinculada – como não poderia deixar de ser – às religiões afro-brasileiras. Nos dois principais domínios em que atuou – a medicina legal e a antropologia – deixou aos seus sucessores uma “etnografia detalhada e verossímil” da religião “áfrico-bahiana”, sendo mencionado, anos depois de sua morte, não apenas como o fundador da antropologia brasileira, mas também como o “primeiro etnógrafo do Brasil urbano” (Maggie, Fry, 2006:10). O que pouco foi explorado e, surpreendentemente, aflora em seus escritos de forma vigorosa, é sua visão sobre o “typo brasílio-guarany” e seus “mestiços”, personagens que embora não sendo o foco de sua análise, possuem papel proeminente nela.

Nina Rodrigues iniciou cedo suas investigações etnológicas, enquanto “prático” (clínico) em sua terra natal, a partir da qual elaborou suas primeiras classificações raciais. Com dados que colheu na capital, como no Hospital dos Lázaros de São Luís, chegou à conclusão de que os tipos puros primitivos estavam em vias de extinção. Os índios americanos haviam desaparecido quase que por completo, sobrevivendo em um ou outro ponto afastado da província. O “negro genuíno” já não possuía nenhuma influência em nossa “economia ethnica”, dada a supressão do tráfico. E os europeus, chegados por força da imigração, apresentavam predomínio limitado. Essa ideia ecoava as previsões pessimistas que se fazia no século XIX acerca do futuro dos povos indígenas brasileiros, vistos como povos em extinção, a exemplo do que propagavam von Martius (1982Martius, Carl. F. P. von. (1982 [1847]), "Como se deve escrever a história do Brasil", in O estado do direito entre os autóctones do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, pp. 85-107. [1847]) e Couto de Magalhães (1876)Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma..

O resultado desse processo, segundo Nina Rodrigues, teria sido a formação de um tipo supostamente brasileiro, produto da terra, dos cruzamentos que se deram ao longo de quatro séculos, o mestiço, figura complexa e objeto privilegiado de seus estudos:

(...) se não podemos dizer que a população do Maranhão é inteiramente mestiça, devemos pelo menos consideral-a como rigorosamente brazileira, n`este sentido que mesmo n`aquellas famílias em que a pureza das raças primitivas tem se conservado, os seus descendentes actuaes já contão mais de uma geração puramente maranhense. (Rodrigues, 1889b: 362)

O autor, então, identifica cinco grandes grupos de “raças compósitas” que formariam a população de sua terra natal: o branco, o caboclo, o mulato, o cafuso e o negro. Sua proposta publicada em artigos de 1889 à 1890, na Gazeta Médica da Bahia, tinha como objetivo imediato definir a incidência da lepra nos diferentes grupos populacionais maranhenses. Ou como diz o autor, precisar a “origem ethnologica das predisposições e imunidades mórbidas que nos forão transmitidas”. (Rodrigues, 1889Rodrigues, Raimundo Nina. (1889), “Contribuição para o estudo da lepra no Maranhão”. Gazeta Médica da Bahia, Salvador, anno XX, n. 7.:363).

Não entraremos aqui na nosologia da enfermidade em si, posto que isso iria requerer um estudo à parte, aliás, já bordado por autores recentes (Oda, 2003a; 2003b; 2004)3 3 . Sobre o tema específico da lepra na Amazônia entre fins do século XIX e início do XX, cf.Henrique, 2012; 2019. . O que nos interessa é compreender como Nina Rodrigues pensava, em suas palavras, o “modo de ser verdadeiramente mestiço” da população do Norte e Nordeste do Brasil. Como refletiria mais tarde em seu último livro, Os Africanos no Brasil, já certo do caminho que deveria desbravar, seu verdadeiro desafio era compreender o “futuro e valor social do mestiço ário-africano no Brasil: tal, pois, a fórmula do nosso problema O Negro” (Rodrigues, 2010Rodrigues, Raimundo Nina. (2010), Os Africanos no Brasil. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais. [1932]:11). Como veremos adiante, a natureza desse tipo, ainda virgem de “contribuições elucidativas”, demandava “investigações em domínios das mais variadas competências” e suas conclusões seriam confrontadas com os cruzamentos entre indígenas e outras raças.

Ao explicar a divisão, o médico sugere que sua iniciativa parte dos mestiços de “primeiro sangue” (no caso, brancos e negros) para, então, ampliar a base de análise e com a definição dos “caracteres morfológicos”, distribuir com certa aproximação, os mestiços de “segundo” e “terceiro” graus – mais distantes dos tipos puros. Nota-se, aqui, a ausência da raça americana ou do “tronco vermelho”, fato este que não é fortuito. Embora, como veremos adiante, esse grupo tome importância crescente (mas não dominante) em seus estudos, no seu quadro de classificação original, ele não merece, ainda, destaque à parte.

A sutileza das categorias pode ser notada na minuciosidade com que são tratadas. O branco compreende não só o produto do cruzamento entre os portugueses, mas também destes com indígenas e negros, com tendência para retornar à pureza racial. O caboclo ou mameluco seria resultado do cruzamento da raça vermelha com a ariana4 4 . Na Amazônia do século XIX, depois de batizados e de aprenderem rudimentos da língua portuguesa, os índios tinham sua identidade étnica negada, sendo chamados de caboclos ou tapuios (Harris, 1998; Henrique, 2018). . Este refugia-se nos sertões da província do Maranhão e estaria, de acordo com Nina Rodrigues, destinado a grandes e inesperadas modificações já que, cada vez mais, a influência da “raça americana aborígene” é restringida.

Os cafusos são definidos pelo cruzamento entre índios e negros, o que resulta em indivíduos escuros e arroxeados. Nina Rodrigues aplica a este grupo as considerações que foram feitas a propósito da estabilidade (ou da falta dela) dos caboclos e lembra ao leitor que curiboca, denominação popular no Pará e Amazonas, é quase desconhecida pelos estudiosos (embora aceita por Veríssimo)5 5 . Segundo o Dicionário de Palavras Brasileiras de Origem Indígena, “curiboca” ou “caraiboca”, significa “caboclo”, “filho de índio com negro”, “mestiço de branco e índio” (Chiaradia, 2008:166). . Os mulatos, por sua vez, um tipo que rareia muito, compreendem além dos mestiços do negro com o português, outros grupos que o autor não nomeia, mas são biologicamente mal definidos. Por último, os negros em si, descritos como descendentes diretos dos africanos ou ainda dos mestiços em vias de retornar à negritude, popularmente tratados como crioulos.

Nina Rodrigues amplia o quadro descrito acima e o expande para todo o país em texto clássico de 1890, “Os mestiços brasileiros” – reunido na coletânea As Coletividades Anormais. Surge, então, a figura enigmática do “pardo”, que reuniria mestiços nos quais “se associam os caracteres das três raças”. Diz o médico que muitos supunham “ser este o tipo futuro da nossa população”:

Não o cremos nós, entretanto. Tal resultado exigia que as três raças mães tivessem tomado uma parte igual na constituição da nossa população mestiça, o que não é verdade, e que todas desenvolvessem no cruzamento igual capacidade eugenésica, o que pelo menos não é provável. (Rodrigues, 2006a [1890:135-136)

O argumento da desigualdade biológica das raças humanas, aplicado à realidade nacional, reforçava o caráter primitivo e selvagem dos índios e seus mestiços na obra de Nina Rodrigues. Agora, com uma nova redação, os subgrupos de caboclos ou mamelucos estavam, efetivamente, destinados ao desaparecimento. Não apenas devido à inferioridade “psycho-physiologica” em comparação com o branco, “ao menos no Norte”, como também à “incapacidade do índio para sofrer a civilização européia importada” – elemento determinante para os “homens de sciencia” adeptos dos postulados do racismo científico (Arteaga, 2009Arteaga, Juan Manuel Sánchez. (2009), "Las ciencias y las razas en Brasil hacia 1900". Asclepio. Revista de Historia de la Medicina y de la Ciencia, v. LXI, n. 2, pp. 67-100.; Schwarcz, 1993Schwarcz, Lilia Moritz. (1993), O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil - 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras.; Stocking Jr., 1982). O médico não poderia ser mais claro:

O predomínio de duas quaisquer das três raças primitivas sobre a terceira tornou sensivelmente distinta a população nos diversos Estados da confederação. Fato verdadeiro este, quando ainda só nos referimos ao Norte, como fazemos, porquanto a divergência deve-se acentuar cada vez mais forte para as populações do Sul, para onde tem convergido uma imigração européia diversa. (Rodrigues, 2006a [1890]:136)

O problema das raças cruzadas, no entanto, não tinha como ser abordado de forma minuciosa se não fossem estabelecidos os tipos puros, primários, originais – as “raças mães”. Em seu livro de estreia, datado de 1894 e intitulado As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil, Nina Rodrigues retoma a discussão, com uma importante mudança. Neste que é seu primeiro ensaio sistematizado de “psychologia criminal brasileira”6 6 . Nina Rodrigues tornou-se um nome de referência nacional e internacional na esfera dos estudos criminológicos, estabelecendo escola no Brasil e abrindo diálogo com nomes como Alexandre Lacassagne (1843-1924), Cesare Lombroso (1835-1909) e José Ingenieros (1877-1925). Cf.Rodrigues, 1895; 1898; 1901. , o autor elenca os “elementos antropológicos puros”, finalmente, com destaque para o ameríndio, o “brazilio-guarany selvagem”.

É com este trabalho que o médico maranhense faz suas primeiras observações sobre aquele que era referência na temática indígena à época, o crítico literário José Veríssimo. Natural da Vila de Óbidos, na então província do Pará, Veríssimo atuou na imprensa, no magistério e dedicou grande parte de seus esforços em obras sobre literatura brasileira. Entre 1895 e 1899, foi editor da Revista Brasileira, publicação que não apenas fomentou o debate para a criação da Academia Brasileira de Letras (ABL), fundada em 1897, como também veiculou artigos de autores do porte de Machado de Assis, Graça Aranha, Euclides da Cunha e o próprio Nina Rodrigues (Bertol, 2020Bertol, Rachel. (2020), "Revista Brasileira, dirigida por José Veríssimo - motor de uma geração". Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 103.).

Foi na revista editada por Veríssimo que o médico publicou, em 1896, a primeira versão de O animismo fetichista dos negros baianos, uma de suas principais obras de etnologia urbana. Esse estudo resultará no segundo livro de sua autoria, de mesmo nome, obra de grande impacto, elogiada pelo sociólogo Marcel Mauss (1872-1950)7 7 . Cf.Mauss, 1902. . O conceito de “animismo” foi proposto por Edward Tylor, em Primitive Culture (1871), supondo a existência de uma forma mais “primitiva” de religião, aquela que atribui “alma” a todos os habitantes do cosmos e que precederia o politeísmo e o monoteísmo. Nesse sentido, as sociedades indígenas e africanas foram classificadas como “selvagens”, “atrasadas”, portadoras de uma suposta “mentalidade primitiva”, de um pensamento “pré-lógico”.

Essa noção costuma ser associada, em grande parte, à obra de Lucien Lévy-Bruhl, especialmente em seu livro A mentalidade primitiva, de 1922. Anos mais tarde, Lévy-Bruhl recebeu duras críticas de Claude Lévi-Strauss, que apontou para a “falsa antinomia entre mentalidade lógica e mentalidade pré-lógica”, afirmando, então, que “o pensamento selvagem é lógico no mesmo sentido e da mesma maneira que o nosso” (Lévi-Strauss, 1989:296)8 8 . Jack Goody estendeu a crítica a essa dicotomia à obra de Lévi-Strauss, com sua divisão entre o “pensamento selvagem” e o “pensamento domesticado”. Segundo Goody, ainda que seja através de “dicotomias expressadas mais positivamente”, o antropólogo francês foi “vítima do binarismo etnocêntrico embutido em todas as nossas categorias” (2012 [1977]:20). .

Conforme apontou Roy Wagner, ao considerar a lógica como antitética à emoção e à motivação, o termo “lógica” torna-se perigoso e enganador e, o efeito dessas noções que atribuem às sociedades indígenas um pensamento “pré-lógico” ou mágico, fruto da suposta condição de “primitividade” desses “homens da idade da pedra”, “é tornar o problema do pensar um aspecto supremo da nossa abordagem da cultura” (Wagner, 2010Wagner, Roy. (2010), A invenção da cultura. São Paulo: Cosac Naify.:182-183). Por conta disso, “a ideia de uma religião embrionária, fundada em crenças desprovidas de lógica, perdeu lugar no discurso dos antropólogos, que passaram a buscar racionalidades por trás de diferentes práticas mágico-religiosas” (Sztutman, 2021Sztutman, Renato. (2021), A notável atualidade do Animismo. Disponível em: https://outraspalavras.net/eurocentrismoemxeque/a-notavel-atualidade-do-animismo/, acesso em 7 fev. 2023.
https://outraspalavras.net/eurocentrismo...
).

A partir dos anos de 1990, diversos autores se propuseram a uma reabilitação do conceito antropológico de “animismo”. Sztutman, por exemplo, inspirado em autores como Bruno Latour (1994)Latour, Bruno. (1994), Jamais fomos modernos. São Paulo: Ed. 34., Eduardo Viveiros de Castro (1996)Viveiros de Castro, Eduardo. (1996), A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac Naify. e Philippe Descola (1992)Descola, Philippe. (1992), "Societies of nature and the nature of society", in A. Kuper (ed.), Conceptualizing society. London: Routledge., dedicou-se a repensar a antropologia política tendo em vista a noção de cosmopolítica, “na qual se integram aos coletivos humanos agente não-humanos” e cujo desdobramento é a ideia de que a noção de “política” dificilmente poderia ser dissociada da noção da “natureza” e que qualquer “política dos homens” deveria ser compreendida como uma “política cósmica” ou “cosmopolítica” (Sztutman, 2005Sztutman, Renato. (2005), O profeta e o principal: a ação política ameríndia e seus personagens. Tese (Doutorado em Antropologia). Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da Universidade de São Paulo, São Paulo.:24). Ao invés de ser definido como mera crença, representação simbólica ou forma primitiva de religião, o animismo foi reabilitado como modo de descrever tudo o que existe, como ontologia, associada a práticas, tal como a ontologia naturalista (Descola, 1986Descola, Philippe. (1986), La nature domestique: symbolisme et praxis dans l'écologie des Achuar. Paris: Editions de la Maison des Sciences de l'Homme.).

De todo modo, é importante destacar que a crítica ao substrato racista da noção inicial de animismo já havia sido alvo de críticas de importantes intelectuais negros do pós-colonialismo. Conforme o martinicano Frantz Fanon,

Magia Negra, mentalidade primitiva, animismo, erotismo animal, tudo isso reflui para mim. Tudo isso caracteriza os povos que não acompanharam a evolução da humanidade.

Trata-se, em outros termos, da humanidade vilipendiada.

Sim, nós (os pretos) somos atrasados, simplórios, livres nas nossas manifestações. É que, para nós, o corpo não se opõe àquilo que vocês chamam de espírito. Nós estamos no mundo. E viva o casal Homem-Terra! Aliás, nossos homens de letras nos ajudam a vos convencer. Vossa civilização branca negligencia as riquezas finas, a sensibilidade” (2008 [1952]:116)9 9 . Em Crítica da razão negra, o camaronês Achille Mbembe faz duras críticas a etnologia ocidental e às filosofias da história predominantes no século XX e que, segundo ele, “assentam na ideia segundo a qual existiram dois tipos de sociedades humanas – as sociedades primitivas, regidas pela “mentalidade selvagem”, e as sociedades civilizadas, governadas pela razão e dotadas, entre outras coisas, do poder conferido pela escrita. A mentalidade dita selvagem teria uma incapacidade em processos de argumentação racionais. Não seria lógica, mas ‘pré-lógica’” (MBembe, 2014:81). .

Inserido nesse contexto de fins do século XIX, Nina Rodrigues foi partícipe desse processo de produção de uma “humanidade vilipendiada”, ao destinar aos índios e negros um lugar de inferioridade na escala de evolução humana, dada sua incapacidade de perceber o modo de estar no mundo das populações não ocidentais.

O médico-antropólogo traça um panorama da regularidade das práticas religiosas, em especial as promovidas pela população “áfrico-bahiana”. No que se refere à etnografia da Amazônia, Veríssimo não é citado no livro O animismo fetichista dos negros baianos, em específico, mas sim em outros importantes trabalhos, como veremos adiante, ora se aproximando, ora se distanciando de suas afirmações.

Ambos eram partidários de uma visão evolucionista, em que o índio, assim como o negro (em graus bastante diferentes) se posicionavam em um estágio infantil e bestial da humanidade. Eram, também, críticos da forma como a catequese fora implementada ao longo da história, o que destituiu o ameríndio de seu “imaginário fantasioso”, de sua “cosmologia”, levando-os à alienação e à degradação. Não à toa, Nina Rodrigues se questionava:

O que é feito hoje das civilisações barbaras brilhantes, complexas e poderosas que, ao tempo da descoberta da America, occupavam o Mexico e o Peru? Dissolveram-se, desappareceram totalmente na concurrencia social com a civilização européa, muito mais polida e adiantada. Onde estão as colonias prosperas e civilizadas dos selvagens brazileiros que a abnegação sincera e convencida dos nossos missionários se gloriava, em santa ingenuidade, de haver conquistado para o rebanho do Senhor? (Rodrigues, 1957Rodrigues, Raimundo Nina. (1957), As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil. Salvador: Livraria Progresso Editora. [1894]:29)

É no próprio Veríssimo que encontra a resposta:

É opinião nossa que a catechese, por si só, é impotente para civilisar o selvagem. Por maior que seja a força da civilisação, ella nunca se imporá a um selvagem pelo unico contacto de um homem, por mais autorisada e eloquente que seja a sua voz e attrahente a sua doutrina. Comquanto a perfectibilidade humana seja um dogma que aceitamos e proclamamos, não cremos que a barbaria de seculos, a barbaria tradicional, possa ser substituída pela civilisação, em um dia, em um anno, em annos mesmo e longos até, nem pelo missionario, nem pelo interprete, nem pela colônia militar. (Matos, 1887Matos, José Veríssimo Dias de. (1887), "As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes". Revista Trimensal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, Tomo L [50], parte I, pp. 295- 390.apudRodrigues, 1957Rodrigues, Raimundo Nina. (1957), As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil. Salvador: Livraria Progresso Editora. [1894]:116)

Os aldeamentos criados no século XIX pelo Império Brasileiro representavam para esses intelectuais o maior exemplo do fracasso da tentativa de “domesticação” dos povos originários das Américas. De acordo com Márcio Couto Henrique, a partir da promulgação do Regulamento das Missões, em 1845, três elementos tornaram-se essenciais para a colonização da região amazônica: presídio, colônia militar e missão (2018:82). A ideia era não apenas converter os “gentios”, como também controlar o território e garantir a segurança dos caminhos, das rotas comerciais. O estrondoso fracasso da estratégia foi não apenas denunciado por aqueles que testemunharam seus resultados práticos, mas reconhecido pelo próprio Estado Imperial.

Veríssimo dizia que só era possível elevar as raças cruzadas do indígena a estados avançados de desenvolvimento se houvesse uma “pressão enorme de uma grande immigração, de uma raça vigorosa” que nessa luta “as aniquile assimilando-as” (Matos, 1887Matos, José Veríssimo Dias de. (1887), "As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes". Revista Trimensal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, Tomo L [50], parte I, pp. 295- 390.apudRodrigues, 1957Rodrigues, Raimundo Nina. (1957), As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil. Salvador: Livraria Progresso Editora. [1894]:150). Sua hipótese parte da premissa de que era preciso incentivar o “mestiçamento”, para acelerar o processo de embranquecimento da população nativa (Bezerra Neto, 1999). Nina Rodrigues não concordava com tal assertiva por inúmeras razões – entre elas, naturalmente, a degeneração física e psíquica do mestiço, e o clima tórrido da região Norte que impediria o estabelecimento do branco.

Mas, para além disso, Nina Rodrigues passou a dar atenção a elementos que fugiam ao determinismo racial e mesológico. Quando analisou, por exemplo, a “mutilação cadavérica” ou dépeçage – encontrada em crônicas de alguns viajantes dos oitocentos – afirma que a ingestão ou utilização de pedaços do corpo humano seria um exemplo extremo do absoluto desapego desses povos com limites éticos e morais, sobretudo no que se refere aos ditames cristãos. Não seria necessariamente uma questão biológica, mas sim psicológica e social, “são pela maior parte casos de parada do desenvolvimento psyquico em phases remotas da evolução do sentimento e da concepção religiosa” (Rodrigues, 1904Rodrigues, Raimundo Nina. (1904), "5ª Memória. A psychologia da mutilação cadavérica. O esquartejamento criminoso". Revista dos Cursos da Faculdade de Medicina da Bahia, Salvador, Typographia Bahiana, ano II, Tomo II, pp. 157-199.:186).

Segue o autor:

Aqui é o coração que é ingerido para dar coragem do morto, a quem o come; ali é a mão que tem determinadas virtudes mágicas e assim por diante. Estamos aqui em pleno domínio fetichista. Assim como o selvagem crê que um objeto inanimado ou animado pode possuir virtudes e qualidades sobrenaturais, assim pode atribuir ao coração ou a outros órgãos qualidades e virtudes especiais (...). (Rodrigues, 1904Rodrigues, Raimundo Nina. (1904), "5ª Memória. A psychologia da mutilação cadavérica. O esquartejamento criminoso". Revista dos Cursos da Faculdade de Medicina da Bahia, Salvador, Typographia Bahiana, ano II, Tomo II, pp. 157-199.:179)

Esses elementos animistas-fetichistas típicos de raças puras selvagens, fossem negras ou “vermelhas”, eram para Nina Rodrigues a marca do atraso desses povos e provavam a eloquência do estado miserável em que muitos índios viviam em inúmeros territórios de colonização europeia como, por exemplo, as colônias portuguesas na Ásia que no século XIX já viviam uma severa crise econômica.

A prática de comer carne humana, existente entre alguns povos indígenas do Brasil, constituía uma etiqueta desconhecida dos europeus e que, por isso, serviu como base de uma visão que inferiorizava as sociedades indígenas. Tal prática alimentar era tida, nos primeiros séculos de colonização, como “um signo de ‘barbarização’, de ausência de civilização ou, pior ainda, faz dela o signo privilegiado da ausência de humanidade” (Agnolin, 2002Agnolin, Adone. (2002), "Antropofagia ritual e identidade cultural entre os Tupinambá". Revista de Antropologia, v. 45, n. 1, pp. 131-185.:136; ênfase do original). Nos livros didáticos utilizados nas escolas brasileiras, consolidou-se uma visão romantizada, segundo a qual os índios comiam carne humana para “adquirir a força de seus inimigos”.

Trabalhos como os de Adone Agnolin ampliaram essas leituras, enfatizando a relação entre o valor nutritivo e valores simbólicos presentes na antropofagia, vista, então, como uma atividade profundamente ritualizada, rica em “proteínas simbólicas” (Agnolin, 2002) ou em “mais-valia simbólica”, como definiu Carlos Fausto (1992)Fausto, Carlos. (1992), "Fragmentos de história e cultura Tupinambá: da etnologia como instrumento crítico de conhecimento etno-histórico", in M. Carneiro da Cunha (ed.), História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, pp. 381-396.10 10 . O artigo citado de Agnole Agnolin foi extraído pelo autor de sua tese de Doutorado (Agnolin, 1998). Como parte de um contexto de renovação historiográfica e de surgimento da chamada Nova História Indígena, a dimensão simbólica da antropofagia foi apontada por outros autores nesse período, a exemplo de John Monteiro, ao afirmar que a principal finalidade da guerra indígena era o sacrifício ritual no terreiro (1994:29). . Motivada pela vingança, a antropofagia era de fundamental importância para a identidade cultural dos povos que a praticavam.

Refletindo sobre a região amazônica, Nina Rodrigues observou que:

(...) esses factores actuaram e actuam, uns em toda a extensão do paiz e outros em quase toda, e só alli no Pará e Amazonas a degradação do mestiço attingiu o gráo descripto pelo Sr. Veríssimo. Porque, senão porque actualmente predomina alli no mestiçamento o menos aproveitavel dos nossos elementos ethnicos, o indio? (Rodrigues, 1957Rodrigues, Raimundo Nina. (1957), As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil. Salvador: Livraria Progresso Editora. [1894]:151).

Dito de outra forma, ao contrário do que a bibliografia tradicional sobre os estudos rodrigueanos afirma, entre os mestiços que investiga, aqueles resultados da mistura com o índio seriam os mais inaproveitáveis. Thomas Skidmore em seu famoso Black into white (Preto no branco) – publicado em 1974, cuja versão brasileira só saiu em 1989 –, interpreta o “problema do negro” de Nina Rodrigues através de uma lente puramente racial e afirma que o médico foi o mais “prestigiado doutrinador racista brasileiro de sua época” (2012:103). Sabe-se hoje que tal proselitismo nunca existiu e Nina, ainda que por um viés claramente evolucionista, defendeu a preservação de terreiros, casas de Candomblé e festividades religiosas afro-baianas para “estudos científicos” – o que nunca fez em relação às “tribos” indígenas.

Já Lilia Schwarcz, em seu clássico O Espetáculo das Raças, publicado em 1993, defendeu a ideia de que a concepção de mestiçagem do branco com o negro era, para Nina Rodrigues, o pilar do argumento “fatalista” em seu plano teórico. Classificando-o como um “arauto da diferença”, sua imagem foi resumida como “um radical do pessimismo” (Schwarcz, 2009Schwarcz, Lilia Moritz. (2009), "Nina Rodrigues: um radical do pessimismo", in A. Botelho; L. M. Schwarcz (orgs.), Um enigma chamado Brasil: 29 intérpretes e um país. São Paulo: Companhia das Letras, pp. 90-103.:90-103), um adepto inconteste da raciologia e da antropologia criminal, “negando o modelo evolucionista social” (2009:92). Marcos Chor Maio, em artigo de 1995, também se utiliza de uma interpretação semelhante ao afirmar que para o médico os negros seriam inteiramente “incapazes de se conduzirem como cidadãos em seus plenos direitos”. (1995:232)

Perde-se de vista que ao longo de sua carreira, Nina Rodrigues lentamente passou a questionar alguns dos pressupostos mais arraigados do racismo científico, sem, no entanto, abandoná-los de forma absoluta (Monteiro, 2020Monteiro, Filipe Pinto. (2020), "O "racialista vacilante": Nina Rodrigues e seus estudos sobre antropologia cultural e psicologia das multidões" (1880-1906). Topoi (Rio de Janeiro), v. 21, pp. 193-215.). Um de seus argumentos é justamente a possibilidade de se encontrar nas raças selvagens, com especial atenção a negros e mulatos, formas superiores “de educação mental feliz, organização hereditária adequada à civilização e plenamente capazes de responder por seus atos perante a justiça” (Rodrigues, 1957Rodrigues, Raimundo Nina. (1957), As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil. Salvador: Livraria Progresso Editora. [1894]:145)11 11 . Outros argumentos a favor desta hipótese é a separação dos negros puros em inferiores e superiores – tal era o caso da primazia das lideranças sudanesas sobre os bantos no Brasil; o caso diferenciado de Lucas da Feira, um negro “creoulo” baiano com aptidões mentais acima da média; e a incidência da “paranoia” atestada tanto em brancos, como em negros, tendo estes últimos a capacidade para alcançar um nível intelectual que fornecia os elementos para um delírio “superior”, complexo e sistematizado. .

O mestiço da Amazônia, marcado pela digital indígena, por sua vez, estaria em um patamar inferior aos da Bahia ou do Rio de Janeiro, compostos, estes, em sua maioria pelo cruzamento de brancos com negros. Afirma Nina Rodrigues que “a indolencia, a apathia, a imprevidencia, todos os máos predicados que o Sr. Veríssimo descobre e aponta no mameluco paraense” são facilmente encontrados nos mestiços de todo o país. (Rodrigues, 1957 [1894]:152). Mas há, em sua visão, uma excepcionalidade trágica do mestiço amazônico que “consiste menos em uma diferença substancial, do que em differença de intensidade ou de gráo”.

O que ocorre em favor de outros grupos mestiçados, como os mulatos, segundo Nina, é que estes estão em uma “etapa”, um “degrau”, uma “fase” mais avançada de desenvolvimento do que os selvagens primitivos da Amazônia. Essa leitura do desenvolvimento das raças é devedora da obra de Edward Burnett Tylor (1832-1917), a partir do qual o racialismo de Nina, defendemos, parece vacilar12 12 . Em Monteiro (2016) e pesquisas posteriores, foram identificados vários autores que serviram para Nina questionar o racismo dogmático tal qual o conhecemos. Para além de Tylor, também exploramos as concepções antirraciológicas do sociólogo Gabriel Tarde (1843-1904) e Scipio Sighele (1868-1913). Pesquisas nossas ainda em andamento também sugerem a influência de nomes como o psicólogo alemão Theodor Waitz (1821-1864) e o antropólogo francês Julien Girard de Rialle (1841-1904), citados por Nina em seus trabalhos. Todos parecem confirmar nossa hipótese, mas necessitariam de um texto à parte para serem abordados de forma adequada. . Tylor, tal como seus contemporâneos, Lewis Henry Morgan (1818-1881) e Sir James George Frazer (1854-1941), fazem um paralelo entre as “tribos” selvagens de seu tempo, descritas por viajantes, naturalistas e cientistas em geral, com aquelas que viveram em eras passadas; e o estudo comparativo entre as primeiras e os povos ditos civilizados.

Ao tratar “cultura” e “civilização” como sinônimos, Tylor tem por objetivo, segundo o historiador George Stocking Jr., salientar a existência de uma “hierarquia de valores”, já que as civilizações espalhadas pelo mundo se encontravam, cada qual, em graus distintos de uma sequência única e progressiva de desenvolvimento humano. (Stocking Jr., 1963:784). Tal perspectiva evolucionista rompe com o fixismo e o finalismo racial. Este prospecto escalonado da evolução da humanidade – típico da corrente monogenista e evolucionista-social de meados do XIX13 13 . Cf.Castro, 2005; Ratnapalan, 2008; Stocking Jr., 1963. – retratava no topo o branco europeu vitoriano, seguido pari passu pelo negro africano e, por fim, o índio americano.

Fica patente o deslocamento de concepção que Nina Rodrigues imprimiu em seus trabalhos e que tentamos aclarar em oportunidades anteriores. A partir de autores como Tylor, entre outros, seu determinismo racial, defendemos, parece vacilar, muito embora ele não abandone o racismo científico. Nina passa a elaborar um prospecto escalonado da evolução da humanidade – típico da corrente evolucionista-social de meados do XIX14 14 . Idem. – assentado em “estágios” ou “níveis”, por assim dizer. Cada raça pertence a um determinado grau de desenvolvimento intelectual, moral e sentimental – todas, como os indígenas, com uma origem comum.

Em relação a estes últimos, Veríssimo tinha uma opinião distinta de Nina Rodrigues. Em ensaio de 1878 intitulado “As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes”15 15 . Este ensaio merecia uma história à parte. Foi publicado pela primeira vez sob o título “As raças cruzadas do Pará”, na obra de estreia do autor, Primeiras Páginas, de 1878. Aqui utilizamos a terceira versão que saiu na Revista Trimensal do IHGB, no ano de 1887. Importante apontar que quando da publicação da 1ª edição de sua conhecida obra Scenas da vida Amazonica, em 1886, o mesmo ensaio foi reeditado, nas palavras de Veríssimo “muito augmentado e modificado, mas inteiramente refundido e correcto. É por assim dizer, um trabalho novo”. Novo, afirma, porque ao final deste diz que modificou sua maneira de ver (...) acerca do remedio a dar para arrancar as raças cruzadas do Pará (e Amazonas) ao abatimento em que jazem (..). Porém, curiosamente, no mesmo texto, supostamente revisto, Veríssimo não muda sua opinião sobre as raças primitivas ou as populações “cruzadas”. Sublinhamos que nas edições seguintes de Scenas da Vida Amazonica o autor suprimiu o ensaio de 1878 “para dal-o, também corrigido, num dos futuros volumes dos Estudos Brazileiros do A.”, o que nunca ocorreu. , o escritor paraense esmiúça não apenas as vantagens dos indígenas da região amazônica em relação ao resto das “tribus esparsas” pelo interior de todo o país, mas, sobretudo, em relação aos “nigricianos”. Estes não resistiriam a um estudo comparativo (e evolutivo) de crenças e tradições populares que, ao fim e ao cabo, revelariam “a inferioridade desse elemento e a supremacia das raças indígenas”. (Matos, 1887Matos, José Veríssimo Dias de. (1887), "As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes". Revista Trimensal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, Tomo L [50], parte I, pp. 295- 390.:312)

Embora superior à raça “etiópica”, o ameríndio em seu estado puro não deixava de ser um tipo inferiorizado. Segundo o estereótipo recorrente acerca dos índios amazônicos, suas caraterísticas nômadas, extrativistas, seus traços grosseiros, enfim, eram um desafio, segundo Veríssimo, ao branco português que deveria soerguê-lo ao “grêmio da civilização”. Mas, frente a um colonizador conhecidamente mal educado, aventureiro, representante do que havia de pior na civilização europeia, tal empreendimento teria sucesso? “Vejamos o que sairá d’esse connubio”, afirma Veríssimo num tom melancólico, mas certamente otimista (Matos, 1887Matos, José Veríssimo Dias de. (1887), "As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes". Revista Trimensal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, Tomo L [50], parte I, pp. 295- 390.:304).

Em suas principais obras etnográficas, literárias e educacionais – Scenas da Vida Amazônica (1886), Educação Nacional (1890) e Estudos de Literatura Brasileira (1901) – Veríssimo busca justamente na miscigenação racial, de acordo com José Maia Bezerra Neto

(..) a originalidade do Brasil enquanto nação, percebendo as possíveis vantagens advindas do cruzamento das raças, ou seja, a constituição de uma homogeneidade étnica a longo prazo, impedindo a existência de problemas raciais no Brasil como acontecia, por exemplo, nos Estados Unidos da América, desde que houvesse a hegemonia dos elementos raciais superiores durante o processo de mestiçagem, subtraindo-se os caracteres físicos e morais daqueles considerados inferiores. (1999:545)

A miscigenação, portanto, é a porta de entrada pela qual a raça ariana, ainda que mal preparada (representada pelo português e não pelo inglês), poderia finalmente se “aclimatar” ao Brasil, refinar o sangue, expurgando o elemento indígena, e levar o país a uma homogeneidade étnica. Veríssimo é claro ao afirmar que “em regra geral, cada nôvo cruzamento aproxima o mameluco, o filho do branco e do índio (curiboca, ou mameluco propriamente dito) da raça branca” (Matos, 1887Matos, José Veríssimo Dias de. (1887), "As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes". Revista Trimensal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, Tomo L [50], parte I, pp. 295- 390.:330) – o que para Nina Rodrigues não era algo desejável. Mas, o próprio Veríssimo dava sinais de que esse “mestiçamento” não seria um processo célere e simples. No pequeno dicionário de palavras de origem “Tupi Guarany” usadas pelas “gentes da Amazônia”, interposto à obra de 1878, descreve o termo “Catinga”, da seguinte forma:

Máo cheiro, odor que exhala do corpo humano ou de outro qualquer animal; catinga de urubú, de jacaré, cheiro sui generis a certas raças, aos negros, tapuios e etc., e que em muitíssimos casos, apparece nos mestiços seus descendentes como um protesto sensível á pretendida pureza de linhagem. (Matos, 1887Matos, José Veríssimo Dias de. (1887), "As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes". Revista Trimensal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, Tomo L [50], parte I, pp. 295- 390.:330)

Protesto esse identificado e reiterado pelo autor em grupos familiares de mestiços em todo “Valle do Amazonas”, de Belém do Pará a Manaus. De acordo com Veríssimo, a vulgaridade, o relaxamento de costumes, a falta de compostura e respeito mútuo seriam características marcantes dessas populações:

Sem a noção positiva de pudor, sem o forte e insubstituível laço do casamento, a família mameluca, como a tapuia, está, por assim dizer, em plena decomposição, esphacella-se; concorrendo assim, pela sua influencia numérica, para a desmoralisação dos costumes de ambas as províncias. (Matos, 1887Matos, José Veríssimo Dias de. (1887), "As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes". Revista Trimensal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, Tomo L [50], parte I, pp. 295- 390.:373)

Naturalmente, tal avaliação apelava ao lado mais pessimista de Nina Rodrigues quando este afirma que “a julgar pela descripção do Sr. José Veríssimo, é bem pouco promettedor o futuro do cruzamento indígena na Amazonia” (Rodrigues, 1957 [1894]:107). Mas, a civilização – a mãe, ou melhor, a “madrasta” das raças inferiores, dizia Veríssimo16 16 . Essa ideia encontra-se, também, nas obras de Couto de Magalhães (cf. Henrique, 2006). – haveria de chegar às províncias do Norte do país, ainda que tardiamente, com a participação efetiva das populações “cruzadas”. E, em relação a estas, alerta: “Si me fôra permitido dar um aviso, era que as aproveitássemos em bem da vastissima e riquissima região amazonica” (Matos, 1887Matos, José Veríssimo Dias de. (1887), "As Populações Indígenas e Mestiças da Amazônia. Sua Linguagem, suas Crenças e seus Costumes". Revista Trimensal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, Tomo L [50], parte I, pp. 295- 390.:389).

Nina Rodrigues, porém, tendo em perspectiva o caboclo/mameluco nortista como o mais inadequado para o progresso do país, mantém a defesa de suas hipóteses graduadas sobre a divisão racial. Enquanto Veríssimo defende o fato “incontestável” da superioridade intelectual do mestiço amazônico, Nina Rodrigues volta a reafirmar a tese contrária, isto é, a de que o mulato é que tenderia, respeitando certas condicionantes, à prosperidade. Para isso, serve-se da opinião do botânico e antropólogo Ladislau de Souza Mello Netto (1838-1894), diretor do Museu Nacional do Rio de Janeiro, que também asseverou:

(...) e é que em relação aos mestiços oriundos da raça branca com a preta, mostram-se elles ordinariamente mais inteligentes que os mestiços resultantes da juncção do sangue branco ao sangue americano, ainda que menos reflectidos, menos methodicos, no que produzem, e se me é permittido dizel-o, menos equânimes. (Netto, 1882Netto, Ladislau de Souza Mello. (1882), "Do Atavismo". Revista da Exposição Anthropologica Brasileira, Rio de Janeiro, Pinheiro & Cia., pp. 4-5., apudRodrigues, 1957Rodrigues, Raimundo Nina. (1957), As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil. Salvador: Livraria Progresso Editora. [1894]:144)

Importante fazer notar que essa equanimidade, na ótica de Veríssimo, passava, isto sim, pela predominância do sangue português que, embora “pouco adequado” à tarefa civilizacional, era nossa única garantia de pureza da raça – processo em andamento e tido como irreversível. Portanto, não era qualquer nacionalidade que estava em vias de formação. Era uma “brasilidade” fruto do elemento lusitano com o ameríndio – algo que para Nina Rodrigues, por seu lado, era a fórmula certa para o fracasso. Veríssimo deixou sua opinião registrada em inúmeras ocasiões, como na obra Educação Nacional, inclusive, louvando a não interferência de elementos estranhos à nação:

O Brazil, graças á unidade de raça formada pelo franco cruzamento das três que aqui concorreram no inicio da nossa constituição nacional, graças a não-perturbação desse primeiro resultado pela concurrencia de elementos estrangeiros, assim como á unidade da língua, da religião, e, em summa, das tradições que mais puderam influir naquelle facto, isto é, as portuguezas, tem incontestavelmente mais accentuado caracter nacional. (Matos, 1906:53)

Em conversa com o físico e colecionador neerlandês Elie van Rijckevorsel (1845-1928), que passava pelo Pará para coleta de materiais e estudos geomorfológicos, o escritor paraense celebrou o fracasso das tentativas de ocupação do território por parte dos holandeses. Assim, afirmou no ensaio “Os hollandezes no Brazil” (incluído na obra Estudos de literatura brasileira) que ele e seu interlocutor concordavam sobre a imprevidência dos neerlandeses (exploradores de “curtissimas vistas”, comparados aos portugueses)17 17 . Cabe apontar que José Veríssimo, assim como Nina Rodrigues e tantos outros intelectuais de seu tempo, mantinham uma forte crítica à dinâmica da colonização portuguesa na América, entendida como predatória, porém inevitável. No ensaio mencionado, entretanto, o escritor paraense avalia que as possessões holandesas no Extremo Oriente, como Malásia e Indonésia, viviam em estado muito pior, posto que eram apenas colônias de exploração onde negros e nativos eram feitos de escravos. Para um resumo da atuação de Rijckevorsel no Brasil, em especial as adversidades que passou no Pará, cf.Pyenson, 1989. . A vitalidade e a originalidade dos cruzamentos no país, podiam ser encontradas ao Norte do continente:

Não me turva o entendimento nenhum preconceito patriótico, que nenhum tenho; mas convenço-me de que com a preconisada colonização hollandeza não seriamos a nacionalidade que somos, uma das mais compactas e homogêneas da America, pelo cruzamento physico e moral que aqui fizeram as raças que a formaram. (Matos, 1903Matos, José Veríssimo Dias de. Estudos de Literatura brasileira. (1903), Rio de Janeiro: Garnier editores.:238)

No livro Os africanos no Brasil, quarta obra de sua autoria, Nina Rodrigues faz menção ao ensaio do escritor paraense sobre os holandeses, mas inverte seu argumento para reforçar a degradação que marcava os Estados do Norte em comparação com os do Sul. Não fosse suficiente o drama do processo de mestiçagem, o fracasso da dominação holandesa e a prevalência portuguesa eram, na verdade, sinais de mal presságio. Até porque, para o autor maranhense, não era possível deixar de atestar a consolidação de uma nação ariana, forte e poderosa, de origem teutônica (germânica) ao sul do Brasil, em contraposição aos

(...) Estados do Norte, mestiços, vegetando na turbulência estéril de uma inteligência viva e pronta, mas associada à mais decidida inércia e indolência, ao desânimo e por vezes à subserviência, e assim, ameaçados de se converterem em pasto submisso de todas as explorações de régulos e pequenos ditadores. É esta, para um brasileiro patriota, a evocação dolorosa do contraste maravilhoso entre a exuberante civilização canadense e norte-americana e o barbarismo guerrilheiro da América Central. (Rodrigues, 2010Rodrigues, Raimundo Nina. (2010), Os Africanos no Brasil. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais. [1932]:15 e 16)

Nina Rodrigues nunca escondeu seu desalento com a realidade que se desenhava a longo prazo no Brasil. Mas, as referências que faz à Veríssimo em sua obra, direcionadas à depreciação do elemento indígena e seus mestiços, nos aponta para uma outra direção. Com seu desaparecimento ao Norte do país e o aperfeiçoamento (branqueamento) do negro e seus mestiços, nem tudo estava perdido. Como veremos a seguir, ao convocar Couto de Magalhães para também criticá-lo, Nina Rodrigues ao mesmo tempo que resguarda seu argumento sobre a desigualdade das raças, as mantém como um elemento definidor da nacionalidade.

Couto de Magalhães e Nina Rodrigues: lendas e costumes

A chamada “domesticação” dos “índios selvagens” passava, na segunda metade do século XIX, por várias proposições. Os mais radicais, como o historiador Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878) defendiam, literalmente, o extermínio dos povos arredios à civilização ocidental. Outros pregavam justamente o inverso, a necessidade de preservação dessas raças “ferozes”, fosse para facilitar a aclimatação do homem branco através do “mestiçamento”, caso de José Veríssimo e de Couto de Magalhães, fosse para estudos científicos e antropológicos isolados, como Nina Rodrigues desejava.

O general e folclorista José Vieira Couto de Magalhães (1837-1898) externou em seus estudos uma posição muito próxima de ambos, embora com distinções consideráveis. Membro do IHGB, presidente da província do Grão-Pará entre 1864 e 1866, foi um dos políticos e ensaístas defensores da valorização do elemento indígena na constituição da nacionalidade brasileira. Se orgulhava de falar o Nheengatú, língua geral amplamente utilizada na Amazônia até inícios do século XX e, propôs, em sua obra máxima, O Selvagem, de 1876, a formação de tradutores indígenas para facilitar a transmissão dos vocábulos nativos para o universo linguístico dos brancos (Henrique, 2010Henrique, Márcio Couto. "O Soldado-civilizador: Couto de Magalhães e os índios no Brasil do século XIX". (2010), in C. Alves; M. A. Nepomuceno (orgs.), Militares e educação em Portugal e no Brasil. FAPERJ: Quartet: Rio de Janeiro.).

Em seu livro, Couto de Magalhães faz um relato histórico e etnográfico das populações que visitou na Amazônia e oferece atenção especial ao índio e ao “mestiço, seu descendente”, provindo do cruzamento com os brancos portugueses. Assim como seus colegas de “lettras”, era devedor de uma visão evolucionista da humanidade e, em muitos aspectos, abertamente darwinista-social18 18 . Embora não seja um consenso, há uma vasta literatura que defende que Tylor não possui nenhuma “dívida intelectual” com o darwinismo, não apenas porque o antropólogo inglês não cita Darwin em seus trabalhos mais conhecidos (em um momento de forte debate sobre a teoria da “sobrevivência do mais forte”), mas também porque suas referências são pré-darwinianas. Stocking Jr., apoiado em Margaret Hodgen, sugere que Tylor defendia justamente o inverso, isto é, “a sobrevivência dos inaptos”, processos, costumes, opiniões, e assim por diante (cf. Stocking Jr., 1963; 1965; Hodgen, 1936). Para uma visão atualizada da questão (cf.Castro, 2005). . Embora previsse o desaparecimento da “pobre raça” indígena, insistiu na ideia de educar os “meninos selvagens”, para que como intérpretes, pudessem criar um “(...) laço entre a civilisação aryana, de que nós somos os representantes, e essa civilisação aborígene que ainda não transpôs os limites da idade da pedra, e de que eles são os representantes”. (Magalhães, 1876Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma.:94)

Não haveria, portanto, de se cultivar receios em torno dos futuros habitantes do Brasil. Segundo o general, o mestiço que se encontrava à época vivendo no vale do Amazonas, resultado do “tronco branco”, possuía no máximo, um quinto de sangue indígena (cálculo que o autor não explica como definiu). Assim, em seu panorama:

Nosso grande reservatório é a Europa; (...) os indígenas, por uma selecção natural, hão de cedo ou tarde desapparecer; mas, se formos previdentes e humanos, elles não desapparecerão antes de haver confundido parte do seu sangue com o nosso, communicando-nos as immunidades para resistir a acção deletéria do clima intertropical que predomina no Brasil. (Magalhães, 1876Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma.:101)

Nina Rodrigues cita Couto de Magalhães em algumas de suas obras e manobra seus argumentos em favor de objetivos próprios. Invariavelmente, o médico reitera a inferioridade das chamadas raças primitivas ao afirmar que estudos como os do general “tem fornecido á sciencia exemplos bem conservados dessa incapacidade orgânica, cerebral” dos selvagens. (Rodrigues, 1957 [1894]:35). Já em relação à catequese – fenômeno religioso-social cujo repúdio compartilhava com Veríssimo –, Nina Rodrigues também converge com Couto de Magalhães. Após citar trecho de O Selvagem, em que o general menciona a perda dos costumes originais dos índios provocada pelas missões, afirma:

Depois de uma descripção magistral do estado miserando de decadencia moral a que chegaram os indios civilisados, o Sr. José Veríssimo, apreciando a capacidade de civilização do indio e referindo-se ás citações do Dr. Couto de Magalhães acima transcriptas, assim se pronuncia: “A não ser o aldeiamento, ahi condemnado, julgamos inexequível qualquer tentativa de catechese e civilisação do selvagem”. (Magalhães, 1876 apudRodrigues, 1957Rodrigues, Raimundo Nina. (1957), As raças humanas e a responsabilidade penal no Brazil. Salvador: Livraria Progresso Editora. [1894]:115)

Cabe sinalizar que essa leitura não corresponde de todo à verdade. Couto de Magalhães enfrentou grandes desafios quando assumiu a presidência da província do Pará, não apenas porque vivia-se, ainda, os anos de reconstrução pós-Cabanagem (1835-1840), mas também porque a estratégia de aldeamentos para “amansar” os índios “bravos” era a política indigenista oficial, chancelada pelo Regulamento das Missões. Daí que o general, embora à contragosto e testando inclusive alternativas, se serviu da política missionária – tocada, nesta época, por capuchinhos, e depois, em menor escala, dominicanos, carmelitas, entre outras ordens religiosas.

Afinal, era preciso não apenas incorporar as terras indígenas ao Império, como também encontrar uma forma de civilizá-los e torná-los uma mão de obra útil (Henrique, 2003Henrique, Márcio Couto. (2003), O general e os tapuios: linguagem, raça e mestiçagem em Couto de Magalhães (1864-1876). Dissertação (Mestrado em Antropologia), Universidade Federal do Pará, Belém.). Segundo Couto de Magalhães:

Nós temos para utilisar o braço selvagem duas fontes de riqueza, em que elles hão feito suas provas, e nas quaes temos tirado resultados conhecidos: nossos vastos campos apropriadissimos como os de nenhum outro paiz do mundo ás industrias pastoris; e nossas vastas florestas do Amazonas, Goyaz e Matto-Grosso, abundantemente providas de materiaes para utilisar milhões de braços nas industrias extractivas da borracha, cacáo, salsaparrilha, ipecacuanha, cravo, oleo de copahyba, e multidão de outras que já representam em nossa riqueza publica, uma somma de cerca de 15 mil contos de valor annual de exportação. (1876:92)

Não há como negar, como se vê, que trabalho e terra se tornam fatores críticos para a conquista dos sertões amazônicos. Algo que se intensifica a partir da Lei de Terras, promulgada em 1850 e que define como devolutas as terras tomadas aos índios conquistados. Assim, subjugava-se, confinava-se, deportava-se, tutelava-se, ora escravizava-se, populações inteiras que serviriam de abastecimento e reserva de mão de obra. Sabe-se hoje, como bem apontou Manuela Carneiro da Cunha, que os próprios indígenas se utilizavam da legislação, de suas brechas e da dinâmica dos aldeamentos para alcançar interesses seus. Mas não se pode negar que se favorecia, também, invasores os quais, supunha-se, “instruiriam os índios no trabalho agrícola, nos ofícios mecânicos e na religião católica”. (Cunha, 1992:142)

Essa política predatória era, de modo geral, condenada por Nina Rodrigues quando voltada para povos e raças selvagens. Mas, cabe sublinhar que o médico sempre tinha como preocupação maior os negros e seus mestiços. Embora se calasse em relação à exploração dos indígenas (posto que em seu mapa demográfico brasileiro, a tendência era a sua extinção completa), o mesmo não fazia em relação aos “áfrico-bahianos”. Estes precisavam ser preservados não por uma questão “sentimental” – que no pós-abolição tomou “ares de modismo”, na sua avaliação – mas sim por uma questão científica, posto que as raças primevas eram representantes fiéis de fases mais atrasadas do desenvolvimento da humanidade.

Surge então, novamente, na obra do médico maranhense, a contenda sobre a supremacia ou não dos indígenas e seus mestiços frente aos negros e aos mulatos. Se com José Veríssimo, os argumentos circundaram em torno de questões hereditárias e do branqueamento, com Couto de Magalhães, o universo das lendas e contos populares tomará espaço preponderante. É conhecida pelos estudiosos do Norte do Brasil, a prevalência de algumas temáticas específicas que fizeram parte do repertório de observações e estudos de etnógrafos viajantes que estiveram em meio aos indígenas. Talvez a mais importante e, não por acaso, objeto de críticas de Nina Rodrigues, seja a lenda do jabuti (Henrique, 2003Henrique, Márcio Couto. (2003), O general e os tapuios: linguagem, raça e mestiçagem em Couto de Magalhães (1864-1876). Dissertação (Mestrado em Antropologia), Universidade Federal do Pará, Belém.). Conforme Couto de Magalhães assinalou:

As circumstancias desses tempos não eram taes que eu dispuzesse da calma necessaria para estudar esses mythos. Notei no entretanto que entre as taes historias havia um thema singular, o qual consistia em mostrar o jabuti, que aliás é um dos animaes mais fracos de nossa fauna, vencendo aos mais fortes quadrupedes, a custa de astucia e intelligencia. (Magalhães, 1876Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma.:149)

Nas inúmeras histórias orais em que o jabuti aparece como protagonista, o animal se defronta com outros mais rápidos, fortes e valentes – tal qual o veado, a anta, a raposa e a onça – superando-os com artimanhas e sagacidade. Para Couto de Magalhães, os episódios que coligiu eram um sinal claro de que os índios ensinavam e aperfeiçoavam-se mutuamente, cultivando e aumentando seu grau de inteligência:

Cada vez que reflicto na singularidade do poeta indígena de escolher o prudente e tardo jabuti para vencer aos mais adiantados animaes da nossa fauna, fica-me evidente que o fim dessas lendas era altamente civilizador, embora a moral n`ellas ensinada divirja em muitos pontos da moral christã. (Magalhães, 1876Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma.:158)

De acordo com Márcio Couto Henrique, apoiado em Câmara Cascudo, os relatos folclóricos, contos e estórias possuem um fundo moral positivo, com uma intenção educativa. É a projeção dos mais “expressivos índices intelectuais populares” (Cascudo, 2000:156 apudHenrique, 2003Henrique, Márcio Couto. (2003), O general e os tapuios: linguagem, raça e mestiçagem em Couto de Magalhães (1864-1876). Dissertação (Mestrado em Antropologia), Universidade Federal do Pará, Belém.:70). Isto porque é uma tradição transmitida por linguagem oral que sobrevive ao tempo, conserva e documenta, por assim dizer, “a sobrevivência, o registro de usos, costumes, fórmulas jurídicas, esquecidas, mortas” (Idem). Não entraremos aqui na discussão teórica sobre a natureza propriamente dita do conto popular tal qual reformulada pelo testemunho de um mediador cultural, o próprio Couto de Magalhães.

O que nos importa neste espaço é atentar para a leitura que Nina Rodrigues fez dos escritos do general, em uma clara tentativa de reforçar a inferioridade da raça ameríndia. Mais importante: enfatizar a precedência dos negros e seus mestiços nos contos populares registrados no Brasil, em especial aqueles vinculados à figura do jabuti e suas proezas entre os outros animais – o que o levou, naturalmente, a refletir sobre características do “tronco vermelho” nas Américas.

Ao fazer uma crítica do livro Contos Populares do Brasil, do ensaísta sergipano Silvio Romero (1851-1914), Nina Rodrigues sugere que ele fora influenciado por Couto de Magalhães. Logo, Romero teria atribuído aos indígenas contos que são “positivamente de origem africana”. Com um certo tom de indignação, escreve que o literato “não deixou aos Negros um só conto da tartaruga, cágado ou jaboti, que invariavelmente, à exceção de um, dado aos Brancos, foram todos atribuídos ao elemento indígena” (Rodrigues, 2010 [1932]:209). Para refutar a assertiva, Nina Rodrigues faz uso dos trabalhos do etnógrafo e coronel do exército britânico Alfred Burdon Ellis (1852-1894), oficial que serviu em diversos países da costa oeste africana.

Posto que para o médico maranhense a contribuição africana ao “folk-lore” brasileiro foi de inesgotável opulência, escreve que “(...) importantes e recentes estudos do Coronel A. Ellis demonstraram que, na Costa dos Escravos, a tartaruga é, para os Nagôs, um poderoso centro de convergência de contos populares. Este ponto é capital para a boa compreensão da nossa psicologia popular” (Rodrigues, 2010Rodrigues, Raimundo Nina. (2010), Os Africanos no Brasil. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais. [1932]:209). A existência no Brasil de numerosa colônia Nagô desde os tempos coloniais, cujos representantes transmitiram à população mestiça e crioula, costumes de sua língua não permitiriam, diz, sequer discutir a possibilidade de ter provindo dos índios o que classifica como “ciclo completo” dos contos da tartaruga.

Pior do que isso, o general mineiro teria, na opinião de Nina Rodrigues, uma “pretensão teológica” de ver nas lendas do jabuti o pensamento de “educar a inteligência” por meio de uma fábula ou parábola, “o que o levou a emprestar aos pobres índios sentimentos e raciocínios de povos cultos e até a moral cristã de que Couto de Magalhães estava possuído” (Rodrigues, 2010 [1932]:219). Para desmenti-lo era preciso procurar uma explicação, ou melhor, uma teoria racional, que Nina encontrou na origem totêmica do jabuti:

É da essência mesmo do Totemismo atribuir ao objeto ou animal “totem” de que se supõem descender os selvagens, virtudes e qualidades superiores. Por este modo tornam-se os animais dignos de um respeito e consideração que não podem ser transgredidos ou violados sem graves consequências para o indivíduo ou seu clã. Assim faz-se racional e se compreende como animais estúpidos possam ser dotados, pelo mito e pelo conto popular, de grande tino e argúcia. O fato tinha intrigado a Couto de Magalhães. (Rodrigues, 2010Rodrigues, Raimundo Nina. (2010), Os Africanos no Brasil. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais. [1932]:220)

Mas, como explicar, então, contos semelhantes, girados em torno do mesmo “totem”19 19 . Para uma definição dos conceitos de totemismo, animismo e fetichismo (Bird‐David, 1999; Jones, 2005; Sansi, 2008). Para uma análise específica em Nina Rodrigues (cf. Serafim, 2009). , entre povos distintos, de continentes distantes? Supor que no século XIX, negros retornados à África tivessem levado um “motivo mítico” tão acentuado, fechado e concatenado como os contos da tartaruga era insustentável para Nina, que afirma: “Ao contrário, a ideia de que os índios brasileiros tenham recebido os contos da tartaruga, dos Negros, tem a seu favor as maiores probabilidades” (Rodrigues, 2010Rodrigues, Raimundo Nina. (2010), Os Africanos no Brasil. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais. [1932]:223). O médico avalia que a despeito da dificuldade de contato de negros com índios “não-domesticados”, a possibilidade maior é deste contato ter ocorrido através do comércio de pequenas cidades com tribos vizinhas, assim como pelos escravos fugidos que se “internavam pelas matas”, constituindo quilombos ou se incorporando a aldeias.

Nina, entretanto, também considera possível admitir que existam ao mesmo tempo duas origens inteiramente independentes sobre os contos do Jabuti, uma africana e outra americana. Isso, obviamente, respeitados os métodos etnológicos, sem abusar das semelhanças entre os “espíritos dos selvagens” e desde que existam “clãs totêmicos” bem identificados, afirma. Como já apontamos anteriormente, o médico era leitor assumido da teoria tylorista. Deste autor, ele utiliza, entre outros, o conceito de “sobrevivências”, criado, ou pelo menos, sistematizado por Tylor, como método antropológico para ter acesso à “cultura” de raças ancestrais já capituladas pelas sociedades modernas.

As sobrevivências podiam ser encontradas entre as tribos modernas, como afirmou também o escritor e folclorista escocês Andrew Lang (1844-1912), entusiasta da corrente cientificista evolucionista-social. Segundo Nina Rodrigues, apoiado em Lang, o selvagem atribui a todo o universo uma “consciência obscura”, própria de sua personalidade, em que os objetos naturais são tomados como seres inteligentes e animados. E, é por isso que Lang, em uma de suas obras mais conhecidas, Myth, Ritual, and Religion, de 1887, se propõe “a explicar as partes mais absurdas da mitologia como sobrevivências de suas ideias e de seus costumes” (Lang, 1896:31 apudRodrigues, 2010Rodrigues, Raimundo Nina. (2010), Os Africanos no Brasil. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais.:197)20 20 . Nesta ocasião, Nina utiliza a versão francesa de 1896 da obra do escritor escocês (Lang, 1896). .

Ao contrário dos racialistas dogmáticos como Agassiz – que defendia a ideia de “províncias zoológicas” para explicar a origem de cada raça –, Tylor parte do pressuposto de que há uma uniformidade no desenvolvimento dos povos, que pode ser identificada a partir das “baixas civilizações”, uma espécie de “unidade psíquica” da humanidade. Para Nina Rodrigues essa é uma premissa proveitosa para a análise dos mitos primitivos, dado que também para Lang há “a difusão de histórias praticamente idênticas em todas as partes do globo, como o resultado da predominância em todas as partes do mundo, em um momento dado, de hábitos mentais e ideias análogas” (Lang, 1896:31 apudRodrigues, 2010Rodrigues, Raimundo Nina. (2010), Os Africanos no Brasil. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais.:166:2010)21 21 . Para uma análise recente das aproximações de Andrew Lang e Edward B. Tylor, cf. Cox, 2017. .

Tal leitura ensejava a hipótese de que se negros e índios eram seres que se encontravam ainda em uma etapa primitiva da evolução, não haveria porque negar a possibilidade de que ambos cultivassem, de forma independente, o mito do jabuti, cada qual com suas próprias narrativas. Para Nina Rodrigues, já havia consenso sobre as mentalidades inferiores, seus estágios, seus condicionantes. O que se sobressai, quando de sua crítica a Couto de Magalhães, é fruto desse escalonamento. Para o médico, os negros estavam um passo à frente do índio e para o general, o inverso era verdadeiro.

Tylor, que a todos inspirou, defendia, grosso modo, que por baixo da “fina camada” de civilização erigida pelas elites brancas, havia um vasto sedimento de selvageria. Porém, ao descer na escala social, era possível encontrar esses “espécimes” inferiores tanto entre camponeses e trabalhadores incultos das áreas rurais inglesas, como entre nativos da Ásia, África e Américas. Como afirma Celso Castro:

Passava-se a dispor de uma espécie de “máquina do tempo” que permitia, observando o mundo dos “selvagens” de hoje, ter uma idéia de como se vivia em épocas passadas. Assim, as informações sobre a sociedade antiga e sobre a mente do homem primitivo, até então dependentes dos relatos da antiguidade greco-romana − Heródoto, Tucídides, Tácito etc. − poderiam ser complementadas por novos relatos (Castro, 2005Castro, Celso. (2005), Evolucionismo cultural/textos de Morgan, Tylor e Frazer; textos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.:14; ênfases do original).

Tais relatos eram coligidos por etnógrafos e exploradores como Couto de Magalhães. E, segundo este, com tal material revolveríamos muitos de nossos problemas

(...) se considerarmos que esta curiosa família humana não tem ainda escripto a historia do homem do período da pedra; e que o nosso aborígene é um homem d´esse período, o que equivale a possuirmos n’elle um livro de historia mais antigo talvez que o Genesis ou os Vedas (Magalhães, 1876Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma.:96).

Em O Selvagem, logo no primeiro parágrafo do capítulo IV - Raças Selvagens, o general se pergunta: “As raças encontradas no Brazil, e que estão ainda extremes de qualquer cruzamento recente, são provenientes de um só tronco?”. (Magalhães, 1876Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma.:68). Sua resposta positiva é exposta ao longo de toda a narrativa e, especialmente, quando a discussão se volta ao processo de mestiçagem ou “cruzamentos recentes”. Sua intenção é fortalecer a hipótese de que tipos como o mameluco, o mulato ou o cafuso são perfeitamente civilizáveis – obedecendo, naturalmente, a decantação do sangue primitivo – posto que tiveram uma mesma origem.

Não por acaso, uma de suas referências é o naturalista francês Jean Louis Armand de Quatrefages (1810-1892), autor de L’únité de l’éspece humaine, de 1861. Quatrefages é um dos nomes mais citados entre os monogenistas, isto é, aqueles que defendiam a unidade da espécie humana em contraposição aos poligenistas, que acreditavam na existência de diferentes centros de criação22 22 . Para uma discussão detalhada sobre poligenismo x monogenismo, ver Schwarcz, 1993; Domingues, 2003). . Afirma o general mineiro: “O Sr. Quatrefages, diante d’este extenso cruzamento (...) conclue, que o resultado final será benéfico para a humanidade; nós accrescentaremos que será benéfico também para o Brazil”. (Magalhães, 1876Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma.:97)

O objetivo final, relembramos, é conservar a superioridade da raça branca nos meios tropicais, o que não seria possível sem os cruzamentos. Para Couto de Magalhães, os mestiços não apresentam “caracteres intellectuaes e moraes” inferiores à raça branca. Um trecho de sua obra, suspeitamos, deve ter agradado Nina Rodrigues: “A Bahia é das províncias do império aquella em que a raça mais intimamente se cruzou com a negra; o desenvolvimento intellectual n’essa província é um dos mais intensos do império”. Já em São Paulo e no Maranhão, predominaram a mistura entre brancos e indígenas. Os paulistanos estariam na vanguarda dos “melhoramentos materiaes” e os maranhenses teriam o “mais enérgico movimento litterário do Império”. (Magalhães, 1876:103-104)

Como já discutimos em trabalhos recentes, Nina Rodrigues ora se aproximava dos prognósticos mais pessimistas dos poligenistas e darwinistas-sociais, ora das narrativas (muitas esperançosas) dos monogenistas e evolucionistas-sociais. O trabalho de Couto de Magalhães lhe serviu, por um lado, para corroborar a inferioridade dos tipos com os quais o branco se fundiu e, por outro, para discriminar os inferiores dentre os inferiores. Índios e negros eram considerados primitivos, mas tendo como pressuposto uma humanidade única, escalonada, graduada, os primeiros estavam em um nível abaixo dos segundos, mas não estanques – o que contraria algumas das interpretações tradicionais sobre seus estudos, focados apenas na degeneração racial, como mencionamos acima.

Considerações finais

O pessimismo com que Nina Rodrigues encarava o futuro das populações indígenas do Brasil era compartilhado por muitos outros intelectuais da época. O general Couto de Magalhães, por exemplo, em seu trabalho de 1876, dizia que em mil anos não haveria mais no sangue dos habitantes do Brasil a mais leve aparência dessa “pobre raça” (Magalhães, 1876Magalhães, José Vieira Couto de. (1876), O Selvagem. Rio de Janeiro: Typographia da Reforma.:77). A extinção física dos índios era considerada inevitável e, de certa forma, desejada, restando o consolo de ter a memória de sua existência na língua, na poesia nacional e no sangue dos brasileiros. O desaparecimento dos índios era apresentado como resultado de um “processo lento, porém sábio, da natureza” (1876:101), seguindo, neste aspecto, uma lógica darwinista-social, segundo a qual só os mais fortes sobreviveriam à evolução.

Apesar das previsões pessimistas que negavam aos índios um futuro, eles não desapareceram. Segundo o último Censo Demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, a população indígena brasileira era de 896.917 indígenas. O referido Censo revelou que as comunidades indígenas estão presentes nas cinco regiões do Brasil, sendo que o maior número de indígenas se concentra na região Norte, 305.873 mil – aproximadamente 37,4% do total (IBGE, 2012Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). (2012), Censo Brasileiro de 2010. Rio de Janeiro: IBGE.). Esse número deve aumentar no Censo que está em andamento desde 2022.

Desde o início desta pesquisa, notamos que o “tipo” vermelho ou “brasílio-guarany”, nos termos da época, aparecia de forma esporádica nos trabalhos de Nina Rodrigues. Com uma leitura minuciosa das fontes, ricas em informações etnográficas e etnológicas, compreende-se que para além de citações despretensiosas, estes sujeitos históricos possuíam um papel determinado em seu plano de teorização científica. Fosse tomada como uma raça pura ou mestiça, fato incontestável é que o paradigma rodrigueano que entusiasmou toda uma geração de autores – embora estes criassem teses incompatíveis com o pensamento do mesmo, como mostrou Carneiro (1968) e Correia (2013) – torna-se mais inteligível quando alinhamos a questão a partir dos trabalhos em que dialoga com intelectuais que trataram do tema em sua época, com foco nos que atuaram no Norte do Brasil.

Deparamo-nos, sem dúvida, com um intelectual ambíguo, tensionado tanto pelas teorias cientificistas de seu tempo quanto pelo momento turbulento em que o país vivia com a passagem da Monarquia à República e, em especial, com a forma desastrosa como a abolição foi realizada. Frente a esse cenário e a um futuro nada animador, o médico tentou encontrar soluções para o problema dos mestiços, que parecia se tornar o grande fardo da nação brasileira. Como um dos grandes intérpretes da nação, Nina se esforçou para adequar em um único estratagema teórico, conhecimentos, conceitos, autores que, muitas das vezes, se encontravam em polos antagônicos de disputa intelectual.

Assim, com a intenção de complexificar seu pensamento, nos debruçamos sobre a sua interpretação em torno da controvertida imagem do indígena brasileiro nos círculos letrados do século XIX. Nossas impressões são de que Nina Rodrigues se contrapôs aos dois intelectuais mais fecundos que atuaram e escreveram sobre a realidade amazônica, seus povos, línguas e costumes, a partir de suas vivências na região Norte do país. José Veríssimo e Couto de Magalhães aparecem em suas obras como referências de grande importância, dado o fato de que, tal como Nina Rodrigues, consideravam o ameríndio uma raça inferior.

Mas, há diferenças significativas pontuadas e que ao serem constatadas, nos serviram de norte ao longo das leituras e da pesquisa. Veríssimo apostava no branqueamento do indígena como forma de viabilizar o progresso humano ao Norte do Brasil, com foco no Pará e no Amazonas. A mestiçagem seria, assim, um evento positivo, pois faria do branco um resistente aos tórridos trópicos, desde que direcionada pelos dois elementos constituintes de nossa nacionalidade: o índio e o português. Nina, por sua vez, não apenas considerava o “mestiçamento” uma temeridade, dado que desembocava na degradação de todas as raças, mas o protagonismo indígena nesse processo seria uma verdadeira tragédia, posto que este se encontrava no estágio mais baixo de desenvolvimento humano, a selvageria.

Este protagonismo se dava frente ao elemento negro, como apontamos. Suas pesquisas na Bahia, de modo inverso, demonstravam uma capacidade singular para a civilização de alguns grupos restritos de “pretos” e seus mestiços. Portanto, não podia concordar, também, com Couto de Magalhães que, por sua vez, levava aos leitores uma impressão de supremacia moral e intelectual dos nativos brasileiros. Ao resgatar distintas lendas, em especial a do Jabuti, como forma de educação e civilização através de contos, alegorias e tradições orais, o general considerava imprescindível o aproveitamento dos saberes indígenas no processo civilizacional do vale amazônico.

Este estudo comparativo entre as obras dos três autores reforça o argumento de que Nina Rodrigues gradativamente se distancia (mas não renega inteiramente) o racialismo dogmático. Ao que tudo indica, para o médico, a desigualdade entre as raças era um fato dado – e no caso aqui específico, entre índios e negros era bastante evidente –, mas esta não decorria de origens distintas de cada “espécie”. Pelo contrário, eram “consequencia da desigualdade anthropologica e sociológica” dos tipos de uma origem única que aqui viveram e se misturaram (Rodrigues, 1957 [1894]:181).

Há, portanto, uma disputa, ainda que não declarada, pelo protagonismo das raças inferiores no processo de mestiçagem com o branco. Que este último era superior, para os autores, não resta dúvida. Mas, os argumentos se mobilizam no sentido de elaboração de uma proposta possível para a civilização do país com a contribuição de raças que se encontram em um período de desenvolvimento pelo qual o branco havia passado e superado. Assim, não é possível tomar o pensamento de Nina Rodrigues e sua interpretação sobre as raças, como algo estático, finalista e fatalista.

Defendemos o inverso neste artigo, e seu diálogo sobre os índios com José Veríssimo e Couto de Magalhães parece corroborar tal hipótese. Havia um nível de gradação entre os tipos inferiores – influência direta da corrente evolucionista-social, que se contrapunha ao racismo científico –, e o entendimento sobre qual destas raças seria a mais viável para o embranquecimento ocupou a mente desses intelectuais no conturbado alvorecer da República. O “brasílio-guarany”, acreditamos, é peça-chave para o entendimento do pensamento rodrigueano, pela forma como discriminou os “tipos” puros e mestiços e pela proposta que defendeu em seus textos, refletindo não apenas as incertezas da época, mas as tensões entre os diversos autores que se preocuparam com o assunto.

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  • Waitz, Theodor. (1863), Introduction to anthropology. London: Longman, Green, Longman, and Roberts.

Notas

  • 1
    . Muito embora saibamos que a palavra “índio” remete a uma visão generalizante acerca dessas populações, optamos por mantê-la nesse artigo, por ser essa a noção utilizada no período que abordamos. Mais recentemente, o termo “indígena” vem se afirmando como alternativa, por remeter à diversidade cultural que caracteriza esses povos.
  • 2
    . Para as principais referências da “Nova História Indígena”, cf. Cunha, 1992Cunha, Manuela Carneiro da. (1992), Manuela Carneiro da (org.). História dos Índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras.; Henrique, 2018Henrique, Márcio Couto. (2018), Sem Vieira nem Pombal: índios na Amazônia no século XIX. Rio de Janeiro: EDUERJ.; Kodama, 2009Kodama, Kaori. (2009), Os índios no Império do Brasil: a etnografia do IHGB entre as décadas de 1840 e 1860. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Fiocruz/EDUSP.; Mattos, 2004Mattos, Izabel Missagia de. (2004), Civilização e revolta: os Botocudos e a catequese na Província de Minas. Bauru: EDUSC.; Montero, 2006Montero, Paula (org.). (2006), Deus na aldeia: missionários, índios e mediação cultural. São Paulo: Globo.; Monteiro, 1994Monteiro, John Manuel. (1994), Negros da terra: índios e bandeirantes nas origens de São Paulo. São Paulo: Cia. das Letras.; Sampaio, 2001Sampaio, Patrícia Melo. (2001), Espelhos partidos: etnia, legislação e desigualdade na Colônia, Sertões do Grão-Pará, c.1755-c.1823. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro..
  • 3
    . Sobre o tema específico da lepra na Amazônia entre fins do século XIX e início do XX, cf.Henrique, 2012Henrique, Márcio Couto. (2012), "Escravos no purgatório: o leprosário do Tucunduba (Pará, século XIX)", História, Ciências, Saúde - Manguinhos, v. 19, supl., pp.153-177.; 2019.
  • 4
    . Na Amazônia do século XIX, depois de batizados e de aprenderem rudimentos da língua portuguesa, os índios tinham sua identidade étnica negada, sendo chamados de caboclos ou tapuios (Harris, 1998Harris, Mark. (1998), "What it means to be caboclo": some critical notes on the construction of Amazonian caboclo society as an anthropological object. Critique of Anthropology, v. 18, n. 1, pp. 83-95.; Henrique, 2018Henrique, Márcio Couto. (2018), Sem Vieira nem Pombal: índios na Amazônia no século XIX. Rio de Janeiro: EDUERJ.).
  • 5
    . Segundo o Dicionário de Palavras Brasileiras de Origem Indígena, “curiboca” ou “caraiboca”, significa “caboclo”, “filho de índio com negro”, “mestiço de branco e índio” (Chiaradia, 2008Chiaradia, Clóvis. (2008), Dicionário de palavras brasileiras de origem indígena. São Paulo: Limiar.:166).
  • 6
    . Nina Rodrigues tornou-se um nome de referência nacional e internacional na esfera dos estudos criminológicos, estabelecendo escola no Brasil e abrindo diálogo com nomes como Alexandre Lacassagne (1843-1924), Cesare Lombroso (1835-1909) e José Ingenieros (1877-1925). Cf.Rodrigues, 1895Rodrigues, Raimundo Nina. (1895), "Nègres criminels au Brésil". Archivio di Psichiatria Scienze Penali ed Antropologia criminale, Turim, vol. XVI, fasc. IV-V.; 1898; 1901.
  • 7
    . Cf.Mauss, 1902Mauss, Marcel. (1902), "Nina Rodrigues, L´animisme fetichiste des nègres de Bahia". L´Année Sociologique 1900-1901. Paris: Librairie Felix Alcan, pp. 224-225..
  • 8
    . Jack Goody estendeu a crítica a essa dicotomia à obra de Lévi-Strauss, com sua divisão entre o “pensamento selvagem” e o “pensamento domesticado”. Segundo Goody, ainda que seja através de “dicotomias expressadas mais positivamente”, o antropólogo francês foi “vítima do binarismo etnocêntrico embutido em todas as nossas categorias” (2012 [1977]:20).
  • 9
    . Em Crítica da razão negra, o camaronês Achille Mbembe faz duras críticas a etnologia ocidental e às filosofias da história predominantes no século XX e que, segundo ele, “assentam na ideia segundo a qual existiram dois tipos de sociedades humanas – as sociedades primitivas, regidas pela “mentalidade selvagem”, e as sociedades civilizadas, governadas pela razão e dotadas, entre outras coisas, do poder conferido pela escrita. A mentalidade dita selvagem teria uma incapacidade em processos de argumentação racionais. Não seria lógica, mas ‘pré-lógica’” (MBembe, 2014:81).
  • 10
    . O artigo citado de Agnole Agnolin foi extraído pelo autor de sua tese de Doutorado (Agnolin, 1998). Como parte de um contexto de renovação historiográfica e de surgimento da chamada Nova História Indígena, a dimensão simbólica da antropofagia foi apontada por outros autores nesse período, a exemplo de John Monteiro, ao afirmar que a principal finalidade da guerra indígena era o sacrifício ritual no terreiro (1994:29).
  • 11
    . Outros argumentos a favor desta hipótese é a separação dos negros puros em inferiores e superiores – tal era o caso da primazia das lideranças sudanesas sobre os bantos no Brasil; o caso diferenciado de Lucas da Feira, um negro “creoulo” baiano com aptidões mentais acima da média; e a incidência da “paranoia” atestada tanto em brancos, como em negros, tendo estes últimos a capacidade para alcançar um nível intelectual que fornecia os elementos para um delírio “superior”, complexo e sistematizado.
  • 12
    . Em Monteiro (2016)Monteiro, Filipe Pinto. (2016), O "Racialista Vacilante": Nina Rodrigues sob a luz de seus estudos sobre multidões, religiosidade e antropologia (1880-1906). Tese (Doutorado em História das Ciências e da Saúde). Fundação Oswaldo Cruz, Casa de Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro. e pesquisas posteriores, foram identificados vários autores que serviram para Nina questionar o racismo dogmático tal qual o conhecemos. Para além de Tylor, também exploramos as concepções antirraciológicas do sociólogo Gabriel Tarde (1843-1904) e Scipio Sighele (1868-1913). Pesquisas nossas ainda em andamento também sugerem a influência de nomes como o psicólogo alemão Theodor Waitz (1821-1864) e o antropólogo francês Julien Girard de Rialle (1841-1904), citados por Nina em seus trabalhos. Todos parecem confirmar nossa hipótese, mas necessitariam de um texto à parte para serem abordados de forma adequada.
  • 13
    . Cf.Castro, 2005Castro, Celso. (2005), Evolucionismo cultural/textos de Morgan, Tylor e Frazer; textos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.; Ratnapalan, 2008Ratnapalan, Laavanyan. (2008), "E. B. Tylor and the problem of primitive culture". History and Anthropology, v. 19, n. 2, pp. 131-142.; Stocking Jr., 1963.
  • 14
    . Idem.
  • 15
    . Este ensaio merecia uma história à parte. Foi publicado pela primeira vez sob o título “As raças cruzadas do Pará”, na obra de estreia do autor, Primeiras Páginas, de 1878. Aqui utilizamos a terceira versão que saiu na Revista Trimensal do IHGB, no ano de 1887. Importante apontar que quando da publicação da 1ª edição de sua conhecida obra Scenas da vida Amazonica, em 1886, o mesmo ensaio foi reeditado, nas palavras de Veríssimo “muito augmentado e modificado, mas inteiramente refundido e correcto. É por assim dizer, um trabalho novo”. Novo, afirma, porque ao final deste diz que modificou sua maneira de ver (...) acerca do remedio a dar para arrancar as raças cruzadas do Pará (e Amazonas) ao abatimento em que jazem (..). Porém, curiosamente, no mesmo texto, supostamente revisto, Veríssimo não muda sua opinião sobre as raças primitivas ou as populações “cruzadas”. Sublinhamos que nas edições seguintes de Scenas da Vida Amazonica o autor suprimiu o ensaio de 1878 “para dal-o, também corrigido, num dos futuros volumes dos Estudos Brazileiros do A.”, o que nunca ocorreu.
  • 16
    . Essa ideia encontra-se, também, nas obras de Couto de Magalhães (cf. Henrique, 2006Henrique, Márcio Couto. "A pátria como madrasta: raça, parentesco e identidade em Couto de Magalhães". (2006), in F. A. de F. Neves (ed.), Faces da história da Amazônia. Belém: Paka-Tatu, pp. 421-452.).
  • 17
    . Cabe apontar que José Veríssimo, assim como Nina Rodrigues e tantos outros intelectuais de seu tempo, mantinham uma forte crítica à dinâmica da colonização portuguesa na América, entendida como predatória, porém inevitável. No ensaio mencionado, entretanto, o escritor paraense avalia que as possessões holandesas no Extremo Oriente, como Malásia e Indonésia, viviam em estado muito pior, posto que eram apenas colônias de exploração onde negros e nativos eram feitos de escravos. Para um resumo da atuação de Rijckevorsel no Brasil, em especial as adversidades que passou no Pará, cf.Pyenson, 1989Pyenson, Lewis. (1989), Empire of reason: exact sciences in Indonesia, 1840-1940. Leiden: New York: E. J. Brill. (Série Brill's Studies in Intellectual History)..
  • 18
    . Embora não seja um consenso, há uma vasta literatura que defende que Tylor não possui nenhuma “dívida intelectual” com o darwinismo, não apenas porque o antropólogo inglês não cita Darwin em seus trabalhos mais conhecidos (em um momento de forte debate sobre a teoria da “sobrevivência do mais forte”), mas também porque suas referências são pré-darwinianas. Stocking Jr., apoiado em Margaret Hodgen, sugere que Tylor defendia justamente o inverso, isto é, “a sobrevivência dos inaptos”, processos, costumes, opiniões, e assim por diante (cf. Stocking Jr., 1963; 1965; Hodgen, 1936Hodgen, Margaret Trabue. (1936), The Doctrine of Survivals: A Chapter in the History of Scientific Method in the Study of Mano. London: Allenson & Co., Ltd, 1936.). Para uma visão atualizada da questão (cf.Castro, 2005Castro, Celso. (2005), Evolucionismo cultural/textos de Morgan, Tylor e Frazer; textos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.).
  • 19
    . Para uma definição dos conceitos de totemismo, animismo e fetichismo (Bird‐David, 1999; Jones, 2005Jones, Robert Alun. (2005), The secret of the totem: religion and society from McLennan to Freud. New York: Columbia University Press.; Sansi, 2008Sansi, Roger. (2008), "Feitiço e fetiche no Atlântico moderno". Revista de Antropologia, São Paulo, v. 51, n. 1, pp. 123-153.). Para uma análise específica em Nina Rodrigues (cf. Serafim, 2009Serafim, Vanda Fortuna. (2009), "Os conceitos "fetichismo" e "animismo" no discurso de Nina Rodrigues". Em Tempo de Histórias, Brasília, n. 15, pp. 63-74.).
  • 20
    . Nesta ocasião, Nina utiliza a versão francesa de 1896 da obra do escritor escocês (Lang, 1896).
  • 21
    . Para uma análise recente das aproximações de Andrew Lang e Edward B. Tylor, cf. Cox, 2017Cox, James L. (2017), "The debate between E. B. Tylor and Andrew Lang over the Theory of Primitive Monotheism: Implications for Contemporary Studies of Indigenous Religions", in P.-F. Tremlett; G. Harvey; L. T. Sutherland (eds.). Edward Burnett Tylor, Religion and Culture. London: Bloomsbury Publishing, pp. 11-28..
  • 22
    . Para uma discussão detalhada sobre poligenismo x monogenismo, ver Schwarcz, 1993Schwarcz, Lilia Moritz. (1993), O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil - 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras.; Domingues, 2003Domingues, Heloisa Maria Bertol (org.). (2003), A recepção do darwinismo no Brasil. Rio de Janeiro: editora Fiocruz, pp. 97-123.).
  • *
    O artigo é resultado da pesquisa de estágio de pós-doutoramento realizada no Programa de Pós-Graduação em História Social da Amazônia da Universidade Federal do Pará ((PPHIS-UFPA), realizada entre 2017 e 2022 e financiada pelo Programa Nacional de Pós-Doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/Capes).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    Abr 2025

Histórico

  • Recebido
    22 Maio 2022
  • Recebido
    12 Mar 2023
  • Aceito
    17 Abr 2023
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