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ÍNDICE DE PREÇOS HEDÔNICOS PARA IMÓVEIS: UMA ANÁLISE PARA O MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE

Resumo

Este trabalho tem como objetivo mensurar a valorização dos preços dos diversos tipos de imóveis para o período entre 1995 e 2003. Para isso foi utilizada uma amostra contendo valores de transações com apartamentos, casas, barracos, lojas, salas, galpões e terrenos na cidade de Belo Horizonte. Foi utilizado o método dos preços hedônicos, pois este calcula índices de preços controlando pelas características dos bens. Como resultado temos que a valorização dos imóveis foi pequena no período, em muitos casos abaixo da inflação, devido ao fraco desempenho da economia, da alta taxa de juros e do pequeno volume de crédito habitacional.

Palavras-chave:
Índice de preços para bens imóveis; Modelo de preços hedônicos; Economia

Abstract

This paper focuses on measuring the price appreciation of several real estate types between 1995 and 2003. We used as sample transaction values of apartments, houses, huts, shops, halls, warehouses and land in Belo Horizonte. The hedonic pricing method was used once its basic premise is that the price of a marketed good is related to its characteristics. As a result, we could realize that the properties valuation was small in the period, in many cases below the inflation rate, due to the poor economy, high interest rates, and housing credit small volume.

Keywords:
Real estate price indexes; Hedonic price model; Urban economics; Belo Horizonte

1 Introdução

Índice de preços que mensure a variação de preço dos bens imóveis é um indicador importante, tanto em análises macroeconômicas, quanto nos estudos e na prática de planejamento urbano. Todavia, mensurar a variação do preço dos imóveis não é trivial. O bem imóvel é heterogêneo quanto às características que compõem cada unidade; desse modo, índices calculados a partir de valores médios ou medianos podem apresentar viés. Somado a isso, as vendas de cada unidade se dão de forma infrequente no tempo, não sendo possível acompanhar o comportamento de uma cesta predefinida de imóveis ao longo do tempo.

O modelo de preços hedônicos tem sido utilizado como metodologia para se gerar índices de preços para bens imóveis. Por esse modelo, o preço do bem é uma função dos atributos que o compõe. Cada atributo, portanto, teria um preço-embutido no preço final do bem ("preço sombra")-e o preço do imóvel seria o somatório do preço sombra de cada um de seus atributos. Desse modo, a utilização do modelo de preços hedônicos é uma forma de se obter índices de preço para imóveis controlado pelas diferenças nos atributos de cada observação. Em 2006, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) realizaram o Workshop on Real Estate Price Indexes, onde foram apresentadas as experiências de vários países na construção de índice de preços para imóveis. Em um balanço das apresentações, (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.) constatou que o modelo de preços hedônicos é o mais utilizado e, segundo esse autor, é o mais recomendando para a construção dos índices.

Na academia, a aplicação do modelo de preços hedônicos para o mercado de imóveis é diversa, sendo a construção de índice de preços um subitem dessa literatura. Como exemplo da diversidade de temas incorporados pela literatura de preços hedônicos tem-se: (Freeman, 1979Freeman, A. (1979), 'Hedonic prices, property values and measuring environmental benefits: a survey of the issues', The Scandinavian Journal of Economics 81(2), 154-173.), que utilizou o modelo de preços hedônicos para mensurar o impacto da qualidade do ar no preço dos imóveis; (Clark, 2006Clark, D., s. . (2006), 'Externality effects on residential property values: the example of noise disamenites', Growth and Change 37(3), 460-488.), que teve como objetivo testar o impacto da poluição sonora no mercado imobiliário; (Tita et al., 2006Tita, G. E., Petras, T. L. & Greenbaum, R. T. (2006), 'Crime and residential choice: a neighborhood level analysis of the impact of crime on housing prices', Journal of Quantitative Criminology 22, 299-317.) utilizaram o modelo para estimar a desvalorização dos imóveis decorrentes da criminalidade urbana; (Gibbons & Machin, 2003Gibbons, S. & Machin, S. (2003), 'Valuing english primary schools.', Journal of Urban Economics 53(2), 197-219.) tiveram como foco o impacto da qualidade das escolas no valor dos imóveis; (Sheppard, 2010Sheppard, S. (2010), Measuring the impact of culture using hedonic analysis, Technical report, Williamstown: Center for Creative Community Development. URL: Disponível em: <Disponível em: http://web.williams.edu/Economics/ArtsEcon/library/pdfs/UsingHedonicAnalysis2010.pdf >. Acesso: jun. 2013.
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), por sua vez, testou o impacto das amenidades culturais no valor das propriedades urbanas.

Como exemplo de aplicação do modelo de preços hedônicos na construção de índice de preços para imóveis, tem-se: (Gatzlaff & Ling, 1994Gatzlaff, D. H. & Ling, D. C. (1994), 'Measuring changes in local house prices: anempirical investigation of alternative methodologies', Journal of Urban Economics 35, 221-244.), que estimaram índices para a Região Metropolitana de Miami-EUA entre 1971-1991 utilizando variadas especificações do modelo de preços hedônicos, assim como o modelo das vendas repetidas, não encontrando diferenças significativas nos índices gerados pelas diversas metodologias. (Hoesli et al., 1997Hoesli, M., Giaccotto, C. & Favarger, P. (1997), 'Three new real estate price indexes for geneva, switzerland', Journal of Real Estate Finance and Economics 15(1), 93-109.) utilizaram o modelo de preços hedônicos para o mercado imobiliário de Genebra-Suíça entre 1970-1999. Como resultado, os autores apontam que o preço dos imóveis acompanhou a inflação nos anos de 1970; na década de 1980, houve um boom nesse mercado, contemporâneo ao boom no mercado americano; já na década de 1990 houve um crash em decorrência do aumento na taxa de juros das hipotecas.

(Maurer et al., 2004Maurer, R., Pitzer, M. & Sebastian, S. (2004), 'Hedonic price indices for the paris housing market', Allgemeines Statistisches Archiv 88, 303-326.) aplicaram um modelo de preços hedônicos para o mercado imobiliário de Paris-França entre 1990 e 1999. Os autores verificaram uma baixa correlação entre a variação do preço dos imóveis e a variação do valor das ações e títulos, concluindo que a aquisição de imóveis, ou de títulos lastreados no preço dos imóveis, é importante na diversificação do portfólio dos investidores. (Li et al., 2006Li, W., Prud'Homme, M. & Yu, K. (2006), Studies in hedonic resale housing price indexes., Real Estate Price Indexes Paper 10, OECD-IMF Workshop, Paris. URL: Disponível em: <Disponível em: http://economics.ca/2006/papers/0406.pdf >. Acesso em: ago. 2009.
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) testaram varias especificações do modelo de preços hedônicos na geração de índice de preços para Ottawa-Canada, concluindo que os resultados foram praticamente idênticos nas diversas especificações.

No Brasil, o modelo de preços hedônicos também tem sido aplicado para se mensurar diversos aspectos do mercado imobiliário. Alguns estudos focam em um conjunto de variáveis ambientais, como (Hermann & Haddad, 2005Hermann, B. M. & Haddad, E. A. (2005), 'Mercado imobiliário e amenidades urbanas: a view through the window', Estudos Econômicos 35(2), abr./jun.) para São Paulo, (Albuquerque et al., 2007Albuquerque, E., Melo, A. & Souza, H. (2007), Ativo ambiental e preço de imóvel em recife: um estudo exploratório a partir da utilização do método dos preços hedônicos, in 'VII Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica', Fortaleza.), para Recife, e (Batalhone et al., 2002Batalhone, S., Nogueira, J. & Mueller, B. (2002), Economics of air pollution: hedonic price model and smell consequences of sewage treatment plants in urban areas, Brasília, DF: Universidade de Brasília.), para Brasília. Outros estudos focam em aspectos mais específicos: (Teixeira & Serra, 2006Teixeira, E. & Serra, M. (2006), 'O impacto da criminalidade no valor de locação de imóveis: o caso de curitiba', Economia e Sociedade 15(1), 175-207.) testam o impacto da criminalidade urbana para a cidade de Curitiba; (Amrein, 2010Amrein, C. (2010), Capital humano e capital urbano: o impacto das escolas nos preços dos imóveis no município de são paulo, Dissertação (mestrado em ciências econômicas), Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo.) teve como foco a qualidade das escolas no município de São Paulo; (Aguirre & Faria, 1997Aguirre, A. & Faria, D. v. (1997), 'A utilização de preços hedônicos na avaliação social de projetos', Revista Brasileira de Economia 51(3), 391-411.) e (Faria, 2008Faria, R. e. a. (2008), 'Uma aplicação do método de preços hedônicos no setor de saneamento: o projeto de são bento do sul-sc', Planejamento e Políticas Públicas (31), 116-127.) utilizaram o modelo para avaliar políticas públicas.

A construção de índice de preços tem recebido menor atenção nos estudos brasileiros. A literatura sobre o tema ainda é pequena, resumindo-se aos trabalhos de (González, 1997bGonzález, M. A. S. (1997b), 'Variação qualitativa e índice de preços na análise do comportamento recente dos aluguéis residenciais em porto alegre (1994-1997)', Análise Econômica 28, 133-147.), (Rozenbaum & Macedo-Soares, 2007Rozenbaum, S. & Macedo-Soares, T. D. L. V. A. (2007), 'Proposta para construção de um índice local de preços de imóveis a partir dos lançamentos imobiliários de condomínios residenciais', Revista de Administração Pública 41(6), 1069-1094.) e (Rozenbaum, 2009Rozenbaum, S. (2009), IMPA - Índice Municipal de Preços de Apartamentos: propostas de metodologia, Doutorado em administração de empresas, Programa de Pós-Graduação em Administração de Empresas, PUC-RIO, Rio de Janeiro.). (González, 1997bGonzález, M. A. S. (1997b), 'Variação qualitativa e índice de preços na análise do comportamento recente dos aluguéis residenciais em porto alegre (1994-1997)', Análise Econômica 28, 133-147.) mensurou a variação mensal dos aluguéis de apartamentos em Porto Alegre entre janeiro de 1993 e abril de 1997, utilizando o modelo de preços hedônicos. Como resultado, nos primeiros meses do Plano Real (até metade de 1995) os preços subiram significativamente; posteriormente houve queda nos preços, que voltaram ao patamar do início do plano.

(Rozenbaum & Macedo-Soares, 2007Rozenbaum, S. & Macedo-Soares, T. D. L. V. A. (2007), 'Proposta para construção de um índice local de preços de imóveis a partir dos lançamentos imobiliários de condomínios residenciais', Revista de Administração Pública 41(6), 1069-1094.) utilizaram o modelo de preços hedônicos para mensurar a variação mensal do preço de lançamentos no bairro da Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, entre 2002 e 2005. Houve desvalorização em 2002 e em 2003 devido ao pequeno dinamismo da economia e o alto patamar da taxa de juros. Já em 2005, houve uma pequena valorização real.

(Rozenbaum, 2009Rozenbaum, S. (2009), IMPA - Índice Municipal de Preços de Apartamentos: propostas de metodologia, Doutorado em administração de empresas, Programa de Pós-Graduação em Administração de Empresas, PUC-RIO, Rio de Janeiro.) cálculou um índice trimestral de preço para apartamentos no município do Rio de Janeiro, entre 1999 e 2007, por meio de modelagem hedônica, utilizando dados do Imposto de Transmissão Imobiliaria Inte-Vivos (ITBI). Pelos índices calculados, o valor do preço dos apartamentos no Rio de Janeiro acompanhou a inflação durante o período, estando em um patamar bem abaixo da taxa básica de juros da economia (taxa SELIC).

O objetivo deste artigo é mensurar a variação de preço de imóveis para Belo Horizonte, entre 1995 e 2003, a partir do modelo de preços hedônicos, utilizando a base de dados do ITBI de Belo Horizonte. Serão gerados índices anuais para cada tipo de imóvel existente na base do ITBI: apartamento, casa, barracão, terreno, sala, loja e galpão. Este trabalho justifica-se pelas seguintes razões:

a) A discussão nacional, como apontado acima, é pequena e, portanto, este artigo contribui para o crescimento dessa literatura.

b) Os artigos existentes na literatura nacional mensuram índices de preços para apartamentos. Neste artigo, estendemos a construção de índice para outros tipos de imóveis, englobando, além de apartamentos, casas, barracões, terrenos, salas, lojas e galpões, construindo índices separados para cada tipo de imóvel. c) Foco no município de Belo Horizonte. As contribuições existentes na literatura nacional têm como foco Porto Alegre (González 1997bGonzález, M. A. S. (1997b), 'Variação qualitativa e índice de preços na análise do comportamento recente dos aluguéis residenciais em porto alegre (1994-1997)', Análise Econômica 28, 133-147.) e Rio de Janeiro (Rozenbaum & Macedo-Soares, 2007Rozenbaum, S. & Macedo-Soares, T. D. L. V. A. (2007), 'Proposta para construção de um índice local de preços de imóveis a partir dos lançamentos imobiliários de condomínios residenciais', Revista de Administração Pública 41(6), 1069-1094., Rozenbaum 2009Rozenbaum, S. (2009), IMPA - Índice Municipal de Preços de Apartamentos: propostas de metodologia, Doutorado em administração de empresas, Programa de Pós-Graduação em Administração de Empresas, PUC-RIO, Rio de Janeiro.). Existem estudos utilizando a metodologia hedônica para Belo Horizonte, porém nenhum teve como objetivo a construção de índice de preços. Dos trabalhos existentes para Belo Horizonte, podemos citar: (Aguirre & Macedo, 1996Aguirre, A. & Macedo, P. (1996), Estimativa de preços hedônicos para o mercado imobiliário de belo horizonte, in ANPEC, ed., '8 Encontro Nacional de Econometria', Vol. 1, Aguas de Lindoia, pp. 1-16.), que utilizaram dados do mercado imobiliário para estimar os preços sombras de diversas características físicas dos apartamentos; (Paixão, 2010Paixão, L. (2010), 'Externalidades de vizinhança, estruturação do espaço intraurbano e preço dos imóveis: evidências para o mercado de apartamentos de belo horizonte', Ensaios FEE 31(1), 235-258.), (Miranda & Amaral, 2009Miranda, R. & Amaral, H. (2009), Precificação de imóveis residenciais: uma abordagem hedônica-multinível, in 'Anais do IX Encontro Brasileiro de Finanças', São Leopoldo.) e (Furtado, 2007Furtado, B. (2007), 'Mercado imobiliário e a importância das características locais: uma análise quantílico-espacial de preços hedônicos em belo horizonte', Análise Econômica 47, 71-98.), que tiveram como objetivo estimar o impacto de uma série de variáveis de localização no preço de apartamentos; (Macedo, 1998Macedo, P. B. (1998), 'Hedonic price with spatial effects: an application to the housing market of belo horizonte, brazil', Revista Brasileira de Economia 52(1), 63-81.), que buscou aplicar técnicas de econometria espacial para uma amostra de apartamentos; (Pontes et al., 2011Pontes, E., Paixão, L. & Abramo, P. (2011), 'O mercado imobiliário como revelador das preferências espaciais: uma análise do impacto da criminalidade urbana no preço de apartamentos em belo horizonte', Revista de Economia Contemporânea 15(1), 171-197.), (Paixão, 2009Paixão, L. (2009), 'O impacto da violência no preço dos imóveis comerciais de belo horizonte: uma abordagem econômica', Revista de Economia Aplicada 13(1), 125-152.) e (Rondon & Andrade, 2005Rondon, V. & Andrade, M. (2005), 'Uma estimação dos custos da criminalidade em belo horizonte', Ensaios FEE 26(2), 829-854.), que utilizaram o modelo de preços hedônicos para mensurar os custos da criminalidade urbana refletido no preço dos imóveis. Portanto, a construção de índice de preços para imóveis permanece uma lacuna na literatura de modelos hedônicos aplicados a Belo Horizonte.

d) Por fim, uma vez calculados os índices, podemos fazer uma análise conjuntural do comportamento do preço dos imóveis frente ao ambiente macroeconômico do período.

2 Metodologias de cálculo do índice de preços para imóveis

A partir dos trabalhos apresentados no Workshop on Real Estate Price Indexes, (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.) compilou as metodologias que resumem o "estado da arte" na construção de índice de preços para imóveis. As metodologias existentes - método das vendas repetidas (e sua variante, método do valor avaliado), método da estratificação e modelo dos preços hedônicos - diferem no que diz respeito à representatividade da amostra, ao custo de se obter uma base de dados, à forma como lidam com a questão da depreciação e reformas, e à robustez dos resultados.

O método das vendas repetidas (repeated sale model), segundo (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.), consiste em utilizar modelagem econométrica em uma amostra de imóveis que foram vendidos e, posteriormente, revendidos. A vantagem desse método é não necessitar de uma base de dados que contenha informações sobre as diversas características do imóvel, diminuindo os custos de construção da base de dados e tornando o tratamento econométrico menos complexo. A principal desvantagem é utilizar apenas um subconjunto das transações imobiliárias (revendas), podendo esse subconjunto não ser uma amostra representativa do total. Outra desvantagem associada a esse método é a dificuldade de lidar com as questões referentes à depreciação e às reformas. Por fim, esse método é mais adequado para realidades onde as revendas de imóveis sejam frequentes, como é a realidade dos EUA; no caso da Europa e Brasil, por exemplo, onde as transações são menos frequentes pode haver problema de insuficiência da amostra (Gouriéroux & Laferrère, 2009Gouriéroux, C. & Laferrère, A. (2009), 'Managing hedonic housing price indexes: the french experience', Journal of Housing Economics 18., Rozenbaum, 2009Rozenbaum, S. (2009), IMPA - Índice Municipal de Preços de Apartamentos: propostas de metodologia, Doutorado em administração de empresas, Programa de Pós-Graduação em Administração de Empresas, PUC-RIO, Rio de Janeiro.).

O método do valor avaliado (sales price aprraisal) é uma variante do método das vendas repetidas, na qual se busca aproveitar informação sobre todas as transações imobiliárias ocorridas em um dado período. Para isso, utiliza o valor avaliado no período subsequente para aqueles imóveis que não foram revendidos. Segundo (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.), embora esse método contorne o problema do desperdício de informação inerente ao método das vendas repetidas, a questão de como incorporar a questão da depreciação e dos melhoramentos continua sem solução. Por fim, (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.) aponta que os resultados desse método são totalmente dependentes da qualidade da avaliação. Estando os valores avaliados distantes dos valores de mercados, os índices calculados terão pouca utilidade.

O método da estratificação (stratification method) consiste em estratificar os imóveis em tipos homogêneos quanto às suas características (físicas e locacionais), e a partir daí, utilizar a média ou mediana para calcular variações temporais nos preços. Para não gerar índices viesados, é necessário que se construam índices específicos para cada característica relevante do imóvel por localização, estando essa metodologia sujeita ao problema de insuficiência da amostra (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.). Outro problema inerente a essa metodologia, segundo (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.), é dificuldade de lidar com as questões referentes à depreciação e melhoramentos.

O método hedônico (hedonic methods) consiste em uma regressão em que o preço do imóvel (geralmente em logaritmo) é a variável dependente. As variáveis independentes compreendem as características do imóvel e uma dummy para cada período de tempo, sendo o período inicial a categoria básica. O índice de preço é a exponencial do parâmetro estimado para cada dummy de tempo. (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.) cita como principais vantagens desse método o não desperdício de informação, a possibilidade de incorporar a depreciação e os melhoramentos e de se calcular índices específicos por tipo de imóvel e por localização.

(Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.) pondera que existem algumas dificuldades associadas à utilização do modelo de preços hedônicos. Primeiramente, o modelo requer que haja informações sobre os preços e as características físicas e espaciais do imóvel. Não estando essa base disponível nos registros administrativos, construí-la é uma tarefa dispendiosa. Outras dificuldades inerentes às aplicações do modelo de preços hedônicos é o fato de a teoria não especificar a priori a forma funcional da regressão hedônica e nem as características do bem que devem ser incluídas no modelo. Como consequência, diferentes pesquisadores, a partir da mesma amostra de imóveis, podem gerar índices diferentes, na medida em que especificam a forma funcional de forma distinta e/ou incluem um conjunto diferenciado de características no modelo.

Analisando os aspectos favoráveis e desfavoráveis de cada método, (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.) conclui que o método hedônico é o mais completo. Ao contrario do método das vendas repetidas, o modelo de preços hedônicos utiliza o universo das transações imobiliárias. O método hedônico não depende de informações externas, como o método do valor avaliado, cuja qualidade da informação (exógena) sobre o valor avaliado do imóvel é fundamental para o desempenho da estimativa. Assim como o método da estratificação, o modelo de preços hedônicos é capaz de gerar índices diferenciados por tipo e localização do imóvel. O método hedônico, todavia, é o único que permite incluir, sem apelar para ajustes exógenos, às questões referentes à depreciação e melhoramentos sofridos pelo imóvel ao longo do tempo. Como conclui o autor:

My overall evaluation of the hedonic regression is that it may be probably the best method that could be used in order to construct constant quality price indexes for various types of property, provided that adequate data are available (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press., p.105).

3 O modelo de preços hedônicos para o mercado imobiliário de Belo Horizonte

3.1 O modelo de preços hedônicos e sua forma funcional

O método utilizado para estimar a variação do preço dos imóveis foi o hedônico com dummy de tempo, como proposto em (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.). A base de dados utilizada para o valor de transação e para as características físicas foi a do ITBI, disponibilizada pela Secretaria de Fazenda da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte (SEFAZ/PBH).

O modelo hedônico estabelece uma relação entre o preço e os atributos do imóvel. Para nossos propósitos, a função hedônica pode ser descrita da seguinte forma:

onde P é o preço do imóvel; F um conjunto de características físicas do imóvel; Ium conjunto de variáveis que relacionam o preço do imóvel à sua idade; A um conjunto de características da acessibilidade da localização do imóvel; V um conjunto de características da vizinhança do imóvel; C são as características relacionadas à criminalidade na região onde o imóvel se situa; e T o período de tempo no qual o imóvel foi negociado.

O modelo de preços hedônicos estabelece que o preço marginal (implícito) de cada um dos atributos do bem é calculado a partir da primeira derivada parcial da função hedônica para cada um dos seus componentes. A teoria não estabelece qual a forma funcional e nem quais variáveis devem fazer parte do modelo. Para (Griliches, 1971Griliches, Z. (1971), Introduction: hedonic price indexes revisited, in Z. E. Griliches, ed., 'Prices indexes and quality change: studies in new methods of measurement', Cambridge: Harvard University Press.), essas questões exigem uma resposta empírica, dependendo dos objetivos do pesquisador e da base de dados que se dispõe.

Utilizaremos neste trabalho um modelo semelhante ao utilizado por (Hoesli et al., 1997Hoesli, M., Giaccotto, C. & Favarger, P. (1997), 'Three new real estate price indexes for geneva, switzerland', Journal of Real Estate Finance and Economics 15(1), 93-109.), no qual a forma da função hedônica é dada por:

onde X é o conjunto das características físicas, de idade, acessibilidade, vizinhança e criminalidade do imóvel; e T representa o período tem que a transação ocorreu.βi é o preço implícito de cada característica i do imóvel; e δi é o coeficiente que representa a evolução do preço dos imóveis, em cada período t, tendo o período inicial como base, após controlado pelas características. A partir de (2), o modelo estimado segue a seguinte especificação:

onde ln P é o logaritmo natural do preço do bem imóvel; α o termo da constante; βi o preço implícito estimado para a i-ésima característica do imóvel; Xi cada uma das características física ou ambiental do imóvel; δ−t o coeficiente estimado para cada um dos t's períodos; T o período em que se realizou a transação; e α o termo do erro associado à regressão. Seguindo (Diewert, 2009Diewert, W. E. (2009), The paris oecd-imf workshop on real estate price indexes: conclusions and future directions, in W. E. E. Diewert, ed., 'Price and Productivity Measurement: volume 1 - housing', Trafford Press.), o índice de preço para cada período t(IPt), tendo o período inicial como base, é obtido por:

A variação dos preços entre períodos subsequentes (ΔPt,t+1 ) esta representada na expressão abaixo:

3.2 Variáveis incluídas no modelo

A variável dependente: preço da transação

O preço efetivado na transação, em termos nominais, transformado em logaritmo, constante na base de dados do ITBI, foi a variável dependente. Porém, trabalhar com os dados do ITBI requer contornar alguns problemas inerentes a esta base, como a possibilidade de ocorrer subdeclaração ou valores muito distantes da realidade de mercado.

O primeiro cuidado que tem que se tomar é com a possibilidade de haver subdeclaração do preço informado.1 1 González (1997a) cita outra situação frequente na base do ITBI: a inclusão de valores muito baixos (R$ 0,01), fato verificado na nossa base. Segundo o autor, isso não é decorrente da subdeclaração, mas devido à correção monetária, dado que o valor constante na guia do ITBI é o nominal de contrato. González (1997a) ainda adverte que mesmo na ausência de subdelcaração o preço declarado no ITBI costuma ser menor que o observado em anúncios de imobiliárias. Isso se deve ao fato de que no preço declarado inclui a margem de negociação - que costuma ocorrer nas transações imobiliárias - sobre o preço ofertado nos anúncios. Compradores e vendedores teriam incentivos para declarar um valor menor do que o efetivamente realizado para pagarem menos impostos (ITBI, no caso dos primeiros, e Imposto de Renda, no caso dos últimos). Para evitar que esse tipo de ação comprometa a arrecadação municipal, as prefeituras, como é o caso da PBH, mantêm um cadastro de preços avaliados para cada imóvel; havendo divergência de valores o ITBI incide sobre o maior dentre o declarado e o avaliado.

Além da subdeclaração, (González, 1997a González, M. A. S. (1997a), Fonte alternativa de informação para estudos infraurbanos, in 'ITBI. Encontro Nacional da ANPUR, 6', Recife, pp. 129-147.) enumera outros problemas que podem ocorrer na informação de preço do ITBI: i) erros de leitura, gravação, transcrição e cálculo dos dados; ii) especificidade do imóvel (alto luxo, localização privilegiada, entre outros) ou da transação (necessidade urgente de venda ou compra); iii) deficiência na coleta, por exemplo, a exclusão da parcela financiada no valor declarado. Para detectar esses problemas, González (1997a)González, M. A. S. (1997a), Fonte alternativa de informação para estudos infraurbanos, in 'ITBI. Encontro Nacional da ANPUR, 6', Recife, pp. 129-147.recomenda a utilização de técnicas estatísticas simples, como gráficos de dispersão com valores do preço por m2 e/ou do logaritmo do preço. Como solução, o autor sugere a remoção dos dados ou a inclusão de dummynos casos em que o pesquisador consegue identificar a razão para o preço discrepante.

A base de dados do ITBI contém, além da informação do preço declarado na transação, o preço avaliado pela prefeitura. Foram retiradas da base de dados todas as transações em que o preço declarado fosse menor que o preço avaliado.2 2 No caso do mercado de galpões foram utilizados os filtros constante na Tabela 1, mas não se retirou os dados em que o preço declarado fosse menor que o avaliado, pois isso diminuiu muito o tamanho da amostra, comprometendo a estimação do modelo. Posteriormente, foi feita a análise gráfica de dispersão dos valores do logaritmo e, quando necessária, a análise de dispersão do preço do metro quadrado, como proposto por (González, 1997a González, M. A. S. (1997a), Fonte alternativa de informação para estudos infraurbanos, in 'ITBI. Encontro Nacional da ANPUR, 6', Recife, pp. 129-147.). A Tabela 1 apresenta os limites identificados pela análise gráfica para eliminação de observações com valores discrepantes.

Tabela 1
Limites utilizados para eliminação de dados das amostras

Variáveis independentes

As variáveis independentes incluídas nos modelos a serem testados estão resumidas na Tabela 2.

Tabela 2
Conjunto de variáveis independentes que resumem os atributo físicos e espaciais dos imóveis

Dentre o conjunto de infraestrutura física do imóvel (F), temos que espaço é um dos parâmetros que norteiam a decisão dos agentes que atuam no mercado imobiliário, de acordo com os modelos de economia urbana3 3 Esses modelos trabalham com a ideia de que ha um trade off entre espaço e acessibilidade na escolha de localização, dado que o adquirente de imóvel urbano valoriza ambos. (Abramo, 2001Abramo, P. (2001), Mercado e ordem urbana: do caos à teoria da localização residencial, Rio de Janeiro., Evans, 2003Evans, A. (2003), 'The development of urban economics in the tewntieth century', Regional Studies, Brighton 37, 521-9.), por isso, espera-se que os coeficientes estimados para área do imóvel e área do terreno tenham sinal positivo. A literatura de preços hedônicos também reconhece o padrão de acabamento como item importante na valorização do preço do imóvel (Hermann & Haddad, 2005Hermann, B. M. & Haddad, E. A. (2005), 'Mercado imobiliário e amenidades urbanas: a view through the window', Estudos Econômicos 35(2), abr./jun.), ou seja, quanto melhor o padrão de acabamento maior tende a ser o preço do bem.

As variáveis referentes à idade do imóvel (I) são idade do imóvel e o quadrado da idade. A idade de um bem durável é uma proxy de sua depreciação (Goodman & Thibodeau, 1995Goodman, A. C. & Thibodeau, T. G. (1995), 'Age-related heteroscedasticity in hedonic house price equations', Journal of Housing Research 6(1), 25-42.). Por isso, espera-se uma relação negativa entre preço do bem imóvel e sua idade. O quadrado da idade é incorporado, pois, ao longo dos anos, alguns imóveis passam por reformas, renovações e/ou melhoramentos e, além disso, existem imóveis que são valorizados pelo fato de serem antigos (vintage effect) (Goodman & Thibodeau 1995Goodman, A. C. & Thibodeau, T. G. (1995), 'Age-related heteroscedasticity in hedonic house price equations', Journal of Housing Research 6(1), 25-42.). Esses dois efeitos atuam como um "freio" na depreciação decorrente da idade no valor dos imóveis. Por isso, espera-se um coeficiente positivo para o quadrado da idade do imóvel.

Os atributos de acessibilidade do imóvel (A) são representados pela distância ao centro da cidade e concentração de estabelecimentos de comércio e serviços. A acessibilidade é fator-chave na valorização da terra urbana e questão central dos modelos de economia urbana (Abramo, 2001Abramo, P. (2001), Mercado e ordem urbana: do caos à teoria da localização residencial, Rio de Janeiro., Evans, 2003Evans, A. (2003), 'The development of urban economics in the tewntieth century', Regional Studies, Brighton 37, 521-9.). Segundo esses modelos, existe um gradiente decrescente nos preços da terra urbana, na medida em que esta se afasta do centro da cidade. Belo Horizonte é uma cidade cujo centro tem um importante poder polarizador (Macedo, 1998Macedo, P. B. (1998), 'Hedonic price with spatial effects: an application to the housing market of belo horizonte, brazil', Revista Brasileira de Economia 52(1), 63-81., Amaral et al., 2007Amaral, P., Simões, R. & Hermeto, A. (2007), A centralidade é o centro: uma análise do setor de serviços em bh, in 'V Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos Regionais e Urbanos', Enaber, Recife., Paixão & Abramo, 2008Paixão, L. & Abramo, P. (2008), 'Os vetores de expansão da atividade imobiliária em belo horizonte: 1994-2003', Nova Economia, Belo Horizonte 18(2), 229-263.).4 4 A Região Central de Belo Horizonte concentra 27,3% dos estabelecimentos de comércio da cidade, 34,2% dos estabelecimentos de serviços e apenas 3,1% da população. O centro de Belo Horizonte é ainda destino de 1/3 dos deslocamentos realizados na Região Metropolitana ((Paixão & Abramo 2008, p.239-240). Por isso, foi inserida a variável distância ao centro da cidade. A variável facilidades urbanas foi acrescentada para captar o efeito dos centros locais no preço dos imóveis, uma vez que a proximidade a aglomerações de comércio e serviços, em tese, valoriza o terreno urbano.

O conjunto de variáveis que descrevem a vizinhança do imóvel inclui o indicador de hierarquia socioespacial do bairro, as inadequações de moradia e infraestrutura urbana e um indicador de concentração de estabelecimentos industriais. As características de vizinhança são importantes na formação do valor dos imóveis urbanos. (Brueckner et al., 1999Brueckner, J., Thisse, J. & Zenou, Y. (1999), 'Why is central paris rich and downtown detroit poor? an amenity-based theory', European Economic Review 43, 91-107.) consideram a renda das famílias a melhor proxy para a qualidade dos serviços localizados em um bairro. Nesse sentido, foi incluído o indicador de hierarquia socioespacial, e espera-se que quanto maior for o índice para o bairro maior será o preço do imóvel.

As cidades brasileiras são caracterizadas pela grande desigualdade quanto às condições de moradia da população e a oferta de infraestrutura urbana. O índice de inadequação de moradias é uma proxy para a presença de vilas e favelas nas proximidades do imóvel. Imóveis localizados próximos a grandes vilas e favelas costumam sofrer um desconto no preço; por isso, espera-se que o indicador tenha sinal negativo.

A ausência de infraestrutura urbana adequada também é fator que desvaloriza o imóvel. Dentre a infraestrutura urbana incluem-se a presença de iluminação pública, saneamento básico e condições adequadas de coleta de lixo, fatores que influenciam diretamente o conforto, a sensação de segurança e a saúde da população local. Por isso, espera-se que o indicador de inadequação de infraestrutura urbana tenha um sinal negativo.

A proximidade de áreas industriais é desvalorizada no mercado imobiliário, uma vez que áreas onde se aglomeram estabelecimentos industriais tendem a ser mais poluídas, distante do centro e com um grande fluxo de pessoas e veículos (gerando engarrafamentos e altos índices de ruídos). Desse modo, espera-se que o sinal do coeficiente estimado para a variável indústria seja negativo.

A variável que representa a criminalidade urbana (C) foi a taxa de homicídios por Área de Ponderação (AP) por 100.000 habitantes para cada ano analisado. A criminalidade urbana tem sido apontada como fator que contribui para decadência urbana, existindo evidências de que aumentos na taxa de criminalidade são rapidamente capitalizados no mercado imobiliário (Tita et al., 2006Tita, G. E., Petras, T. L. & Greenbaum, R. T. (2006), 'Crime and residential choice: a neighborhood level analysis of the impact of crime on housing prices', Journal of Quantitative Criminology 22, 299-317.). Utilizamos a taxa de homicídios como proxy para a criminalidade urbana, uma vez que esse é um crime considerado mais grave pelos participantes do mercado imobiliário.5 5 Estudos que utilizaram preços hedônicos para estimar o custo da criminalidade no preço dos imóveis no Brasil encontraram um coeficiente maior para a variável homicídio em relação à variável roubos a transeuntes ou assaltos a mão armada (Rondon & Andrade 2005, Teixeira & Serra 2006, Paixão 2009). Desse modo, espera-se uma relação negativa entre o coeficiente estimado para homicídios e o preço do imóvel.

As variáveis temporais (T), que representam o período em que o imóvel foi negociado, estão representadas na Tabela 3.

Tabela 3:
Variáveis que representam o ano de transação do imóvel

A evolução do preço dos bens imóveis será mensurada por ano, uma vez que essa é única informação sobre a data da transação disponível na base de dados utilizada. O índice de preço para cada ano, tendo o ano de 1995 como base, é calculado pelo exponencial do coeficiente estimado, como proposto em (5); e a variação anual do preço é estimada a partir do exponencial da diferença entre os coeficientes estimados para os dois anos, como proposto em (6).

4 Resultados

As Tabelas (4) e (5) resumem os resultados da regressão, especificada em (3), para cada tipo de imóvel sobre os valores nominais dos imóveis transacionados.6 6 No apêndice encontram-se as saídas da regressão para os valores reais, em R$ de 2003 tendo o IPCA como deflator, dos imóveis transacionados. Nota-se que os parâmetros estimados para as variáveis de controle são idênticos. A constante e os parâmetros estimados para as variáveis temporais, assim como os respectivos desvios padrões estimados, são os que sofrem alterações.

Tabela 4:
Modelo de Preços Hedônicos para imóveis residenciais: apartamento, casa e barracão
Tabela 5:
Modelo de Preços Hedônicos para imóveis comerciais (loja, sala e galpão) e terreno

O ajuste do modelo variou de acordo com o tipo de imóvel. O melhor ajuste foi para o mercado de apartamentos, com um R 2-ajustado de 83,3%. Para os mercados de casa, loja, sala, galpão e terrenos, o ajuste foi satisfatório para dados do tipo cross-section, com o R 2-ajustado em torno dos 50,0%. Para o mercado de barracos o ajuste da regressão foi um pouco pior, com um R 2-ajustado de 30,9%. A base de dados do ITBI contempla apenas as transações que ocorreram no mercado formal. Grande parte das transações com barracos acontecem no mercado informal, podendo haver problema de insuficiência da amostra.7 7 O acesso a imóveis via mercado informal é comum nas cidades brasileiras. Para um entendimento do mercado imobiliário informal, ver ((Abramo 2003, (2007).

4.1 Variáveis de Controle

O comportamento das variáveis de controle seguiu, na maior parte dos casos, aquele predito no modelo. Dentre as variáveis de Infraestrutura física do imóvel (F) área e terreno, seguiram o padrão previsto, com parâmetros estimados positivos e significativos a 5% em todos os mercados - com exceção do mercado de lojas onde o parâmetro para terreno não foi significativo, embora área do terreno seja um item com pouca participação na formação do preço dos diversos tipos de imóveis. Acabamento também seguiu o padrão esperado em todos os mercados, exceto no mercado de casas onde o parâmetro para o acabamento Luxo não foi significativo a 5% e teve um valor estimado menor do que o acabamento Alto. Esse comportamento pode ser reflexo do efeito localização, na qual casas localizadas em áreas centrais ou de expansão imobiliária são valorizadas mais pelo potencial do uso do terreno do que pelo padrão da construção em si.

Dentre as variáveis de Idade (I), idade apresentou o comportamento esperado, parâmetro com valor negativo em todos os mercados, embora no mercado de barracos e galpões o valor desse parâmetro foi não significativo a 5%. O comportamento de idade ao quadrado também seguiu o esperado, parâmetro positivo a significativo a 5%, em todos os mercados exceto barracos, onde não foi significativo a 5%, e galpões, onde além de não ter sido significativo a 5% teve o sinal negativo.

Nas variáveis de Acessibilidade (A), distância ao centro da cidade teve o comportamento esperado em todos os mercados, exibindo o parâmetro sinal negativo e sendo significativo. Facilidades teve o comportamento esperado - sinal positivo e parâmetro significativo - em todos os mercados, exceto apartamentos, barracos e salas. Nesses três mercados, o parâmetro estimado foi negativo-embora em pequena magnitude-e significativo. Esse resultado pode estar indicando, nesses três mercados, a existência de um trade off entre a conveniência de estar localizado em regiões com abundância de comércio e serviços e as desamenidades inerentes a essa proximidade - poluição sonora, grande fluxo de veículos e pessoas, criminalidade etc.

No subgrupo das características de Vizinhança (V), a variável hierarquia socioespacial apresentou o comportamento esperado. Em todos os mercados o parâmetro estimado foi significativo com sinal positivo. O indicador de moradia apresentou sinal negativo, como esperado, e foi significativo a 5% em todos os mercados, exceto nos mercados de apartamentos e barracos em que o parâmetro não foi significativo a 5%. Ou seja, estar perto de vilas e favelas foi o fator que levou à desvalorização de quase todos os tipos de imóveis, exceto barracos e apartamentos. No caso dos barracos esse comportamento pode ser explicado por estes se localizarem em vilas ou favelas que foram urbanizadas. Já para apartamentos esse resultado surpreendeu o que pode estar associado à localização de grandes complexos de vilas e favelas em áreas ditas "nobres" da cidade.

Inadequação de infraestrutura, por sua vez, só teve o parâmetro estimado significativo e negativo-como esperado-no mercado de apartamentos. Para barracões, o parâmetro estimado foi negativo e não significativo. Nos mercado de casas, terrenos, salas e lojas, surpreendentemente, o parâmetro estimado, além de positivo, foi significativo. No caso dos terrenos o sinal positivo pode ser reflexo da expectativa de instalação de infraestrutura no futuro. No caso das salas e lojas os coeficientes estimados foram altos (0,15 e 0,14 respectivamente). Para as casas o valor do parâmetro estimado foi menor (0,03). Esses resultados podem estar refletindo alguma peculiaridade do mercado de imóveis comerciais - salas e lojas - e do mercado de casas não captadas pelas hipóteses aqui adotadas.

O parâmetro estimado para a variável indústria seguiu o esperado, sinal negativo, na maior parte dos mercados, exceto nos mercados de barracos e galpões. Porém, para casas o parâmetro estimado foi significativo somente a 10%, já para o mercado de salas o parâmetro estimado não foi significativo nem a 10%. Para barracos e galpões, os parâmetros estimados foram positivos e significativos. No caso dos barracos, o sinal positivo pode estar refletindo a escolha locacional dos operários da indústria que pagam um prêmio para residirem próximos aos seus locais de trabalho. Desse modo, no mercado de barracos, estar próximo às indústrias é, para certos tipos de família, tido mais como uma economia de tempo e de custo de transporte do que uma desamenidade. No mercado de galpões, o prêmio pago para se localizar próximo a indústria pode ser reflexo, tanto da economia de custo de transporte entre o local de fabricação e armazenamento dos produtos quanto do fato das aglomerações industriais estarem perto de grandes rodovias, facilitando o fluxo dos produtos das grandes redes de atacadistas.

Por fim, homicídios, variável que representa a Criminalidade urbana (C), teve o comportamento esperado, parâmetro estimado com sinal negativo e significativo a 5%, em todos os mercados, exceto barracos, galpões e lojas. No mercado de barracos e galpões, o parâmetro estimado foi positivo, mas não significativo. Para o mercado de lojas, o parâmetro estimado, além de positivo, foi significativo. Esse resultado pode ser consequência do fato de que áreas com grandes concentrações de comércio são também áreas onde costumam ocorrem grande número de homicídios. Essas áreas costumam ser vazias à noite, dado que a maior parte dos estabelecimentos comerciais encontra-se fechada e o fluxo de pessoas se torna pouco intenso, o que torna essas áreas mais suscetíveis a esse tipo de crime.

4.2 Índice de preços para imóveis

Os coeficientes estimados para as dummies de tempo permitem o cálculo dos índices de preços (IPt) e das variações anuais nos preços (ΔPt,t+1 ). Para apartamentos e salas, todos os coeficientes estimados foram significativos. No caso dos barracos, o primeiro ano não foi significativo a 5%. Nos mercados de casas, terrenos e galpões, os parâmetros estimados para os dois primeiros anos não foram significativos a 5%, embora no caso de galpões o segundo ano tenha sido significativo a 10%. Para as lojas, os parâmetros estimados para o primeiro e o terceiro ano não foram significativos. Como os coeficientes estimados para essa variável representam a variação de preço a partir do ano base, é esperado que com o passar dos anos eles se tornem cada vez mais significativos (Hoesli et al., 1997Hoesli, M., Giaccotto, C. & Favarger, P. (1997), 'Three new real estate price indexes for geneva, switzerland', Journal of Real Estate Finance and Economics 15(1), 93-109., p.102). A Tabela 6 apresenta a variação real anual do preço dos imóveis (equação 5), calculada a partir dos coeficientes estimados (equação 3) deflacionados pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).8 8 No apêndice encontra-se a valorização dos imóveis calculada a partir da regressão com os valores das transações em R$ de 2003 tendo o IPCA como deflator. Nota-se que o valor estimado é básicamente o mesmo, com algumas diferenças a partir da terceira casa decimal. A Tabela 7apresenta algumas variáveis macroeconômicas relevantes para o entendimento do mercado imobiliário.

Tabela 6:
Taxa de variação anual real do preço dos imóveis em Belo Horizonte 1995-2003
Tabela 7:
Indicadores macroeconômicos- Brasil - 1996-2003

O período entre 1996 e 2003 foi marcado pela consolidação da estabilidade de preços. Em janeiro de 1999, houve a maxidesvalorização do Real, que dividiu o período em dois. Entre 1996 e 1998, a estabilidade de preços foi mantida por meio da âncora cambial, um regime de câmbio semifixo, que, conjugada com as boas condições do mercado financeiro internacional, permitiu com que o Real se apreciasse. Os déficits em Transações Correntes, oriundos da taxa de câmbio apreciada, eram cobertos por capitais externos atraídos pela alta taxa de juros doméstica (Selic) e pela grande liquidez do mercado internacional. Nesse contexto, a despeito da taxa juros alta, o mercado de crédito bancário e o mercado de capitais expandiram-se (Hermann, 2010Hermann, J. (2010), 'Liberalização e desenvolvimento financeiro: lições da experiência brasileira no período 1990-2006', Economia e Sociedade 19(2).).

O comportamento do mercado imobiliário, nessa primeira fase, foi diverso. Apartamentos, casas e barracos apresentaram aumento real de preços. O efeito negativo da alta taxa de juros - média de 20,44% no período - foi mais que contrabalanceado pelo crescimento da renda,9 9 O PIB, entre 1996-1998, cresceu em ritmo menor que no período 1999-2003. Porém, estendendo a análise para o período 1995-1998, a taxa de crescimento média do PIB real entre 1995-1998 fica em 3.32%, evidenciando que o período 1995-1998 foi marcado por maior crescimento que o período 1999-2003. O ano de 1995 não foi incluído na análise por não estarem disponíveis os dados de transações imobiliárias de 1994, tornando impossível a estimação da valorização imobiliária entre 1994 e 1995. 3,98% em média, e pela relativa estabilidade no volume de crédito habitacional (queda média de 0,24% no período). Barraco foi o imóvel com maior alta no período, 7,52%, em média, o que pode ser atribuído pelo ganho de renda real das camadas mais pobres da população propiciado pela diminuição da inflação. No caso de apartamentos, a valorização foi mais modesta, 5,44%, e no caso das casas uma pequena desvalorização real foi registrada, 0,88%, o que pode ser atribuído ao comportamento do crédito imobiliário, que teve uma pequena queda no período.

Os preços das lojas, salas e terrenos sofreram pequena queda em termos reais, entre 1995-1998. No caso de lojas e salas, embora a renda da população estivesse registrando aumento, o alto patamar da taxa de juros pode ter feito com que lojistas e prestadores de serviços preferissem alugar estabelecimentos em vez de comprá-los. No mercado de terrenos, as taxas de juros elevadas, combinada com a pequena queda no volume de crédito habitacional, inibiram o investimento na construção de novas unidades residenciais, por parte das construtoras. Como o terreno urbano é insumo básico para a produção de novas moradias, a pouca disposição dos empresários em investirem na construção civil de moradias fez com que o valor real dos terrenos caísse (2,32% em média).

A partir de 1997, as condições do mercado financeiro internacional começaram a se deteriorar com ataques especulativos contra moedas, que resultaram nas crises cambiais, nos países do Leste da Ásia (1997-1998), Rússia (1998) e Brasil (1999). Em 1998, a economia brasileira já exibiu os efeitos da crise, com um crescimento do PIB de 0,04%. A âncora cambial foi mantida, a despeito de o Real passar por ataques especulativos durante 1998, o que resultou em grandes perdas de reservas para o Brasil. Em janeiro de 1999, frente à grande perda de reservas propiciada por um ataque especulativo, a âncora cambial foi abandonada de forma traumática - não por uma decisão planejada de política econômica, mas por conta da conjuntura econômica internacional (Modenesi, 2005Modenesi, A. (2005), Regimes monetários: teoria e experiência do Real, Barueri: Manole.). A partir de 1999, o Brasil passou para um regime de câmbio flutuante, e a âncora nominal passou a ser a meta de inflação.

Os mercados de apartamentos e de casas sofreram diretamente o impacto da maxidesvalorização do Real, com desvalorização real de 13,72% e 11,51%, em 1999, respectivamente. A mudança no regime cambial gerou incertezas nos agentes econômicos quanto ao comportamento futuro da inflação. O PIB, que já havia crescido pouco, em 1998, voltou a ter um crescimento muito pequeno, 0,25%, em 1999. O crédito imobiliário encolheu em 4,41% em valores reais, em 1999, frente a um crescimento real de 3,96%, em 1998. A conjunção desses fatores - incerteza, baixo crescimento e queda no volume de crédito habitacional - fizeram diminuir a demanda por imóveis residenciais em 1999 e, consequentemente, quem precisou vender imóveis, nessa conjuntura, teve que aceitar grandes descontos.

O período entre 1999-2003 foi marcado pelas instabilidades no mercado financeiro internacional e pelo baixo crescimento da economia mundial, o que acarretou em um baixo crescimento da economia brasileira, com um refluxo no mercado de crédito e de capitais (Hermann, 2010Hermann, J. (2010), 'Liberalização e desenvolvimento financeiro: lições da experiência brasileira no período 1990-2006', Economia e Sociedade 19(2).). A política econômica passou a ser desenhada seguindo o "tripé" macroeconômico: metas de inflação, metas de superávit primario e regime de câmbio flutuante.

Os imóveis residenciais - apartamentos, casas, barracos - sofreram desvalorização real no período, −6, 60%, −3, 27% e −0, 19%, em média, respectivamente. Entre os fatores que explicam esse comportamento esta a queda na renda real média dos trabalhadores, 5,26%, a taxa real básica de juros elevada, embora menor que no período anterior, 10,72%, e a forte queda no montante real de crédito habitacional, 20,86%. Renda baixa, juros elevados e queda no crédito imobiliário foram fatores que retraíram a demanda por imóveis, levando à desvalorização real observada. A desvalorização foi menor no mercado de barracos, provavelmente pelas aquisições nesse mercado serem menos dependentes do financiamento habitacional, sendo os preços menos sensíveis a variações no montante de crédito habitacional e na taxa de juros.

Lojas e salas registraram desvalorização ainda maior em comparação ao período anterior, 6,99% e 8,00%, respectivamente. A combinação de baixo crescimento econômico, queda na renda real dos trabalhadores e taxa de juros elevada desestimularam comerciantes e prestadores de serviços a expandirem suas atividades e, em consequência, adquirirem novas unidades. Desse modo, a demanda por esses tipos de imóveis retraiu-se ainda mais, o que explica a maior desvalorização. No caso dos terrenos, a desvalorização média, entre 1999 e 2003, foi de 6,26%. Esse resultado reflete a baixa expectativa dos empresários da construção civil quanto à viabilidade dos empreendimentos em um cenário de baixo crescimento econômico, queda na renda dos trabalhadores e, principalmente, alta taxa de juros e pouco crédito disponível para habitação.

Por fim, os índices de preços foram muito erráticos para o mercado de galpões. Entre 1996-1998, estes apresentaram valorização real de 1,45%. No período 1999-2003, essa média passou para 10,44%. Chama atenção nesse mercado, anos de valorização muito expressiva como 1999, 709,8%, e 2003, 71,66%, assim como a grande desvalorização de 88,02%, em 2000, posterior à grande valorização de 1999. Isso pode indicar problemas de transcrição de dados na base, não detectados pelos filtros propostos, ou alguma peculiaridade do mercado desse tipo de imóvel - as variáveis escolhidas podem ter sido insuficientes e/ou inadequadas para a análise, ou mesmo o modelo de preços hedônicos pode não ser a ferramenta mais adequada para se calcular índice de preços para esse mercado específico.

5 Conclusão

Elaborar índice de preços que deem conta da valorização imobiliária é uma tarefa importante, tanto para os agentes que atuam no mercado imobiliário, como para participantes do mercado financeiro, autoridades monetárias e policy makers. O imóvel é um bem heterogêneo quanto aos atributos que o compõe e, por isso, qualquer cálculo de variação do preço tem que levar em conta essa heterogeneidade. A literatura apresenta quatro métodos que mensuram índice de preços de imóveis, levando em conta sua heterogeneidade: o método de vendas repetidas, o método do valor avaliado, os métodos estratificados e o método hedônico.

O método hedônico é recomendado por aproveitar informações sobre o universo dos imóveis transacionados em cada período e por incorporar, sem ajustes exógenos, a questão da depreciação, reformas, melhoramentos e renovações. No caso brasileiro, as características do mercado imobiliário: poucas transações e ausência de uma base de dados sobre hipotecas torna difícil a aplicação do método das vendas repetidas. Por isso, foi adotado na análise o método dos preços hedônicos.

A base de dados utilizada foi a das transações imobiliárias ocorridas entre 1995 e 2003 para bens imóveis. Foram incluídos na análise os apartamentos, casas, barracos, lojas, salas, galpões e terrenos. As variáveis explicativas foram selecionadas a partir dos conjuntos de características físicas e espaciais que influenciam no valor do imóvel. A escolha foi realizada tendo como base as teorias de economia urbana, a literatura sobre preços hedônicos e a realidade da estruturação urbana brasileira.

O modelo teve melhor adequação ao mercado de apartamentos, embora o ajuste para os mercados de casas, lojas, salas, galpões e terrenos tenham sido satisfatórios. Para o mercado de barracos, o ajuste foi menor, provavelmente devido à parcela significativa das transações com esse tipo de imóvel se dar no mercado informal. Área do imóvel, padrão de acabamento, distância ao centro e hierarquia socioespacial foram fatores que influenciaram a formação do preço do bem nos diversos mercados analisados. O mercado de barracos apresentou algumas peculiaridades, como ter o coeficiente estimado para concentração de estabelecimentos industriais positivo, resultado que pode refletir o prêmio pago pelos empregados da indústria para residirem próximo ao local trabalho. No mercado de casas, imóveis com padrão de acabamento luxo foram menos valorizados que imóveis de padrão alto. Esse resultado pode ser o reflexo da valorização dos terrenos de casas localizadas próximas ao centro ou em áreas de expansão imobiliária, que podem ser aproveitados para a construção de edifícios de apartamentos ou comerciais.

Os coeficientes estimados para as dummy de tempo foram, em geral, significativos, e a partir destes, foi possível calcular os índices de preços e as variações de preço dos bens imóveis. Os índices de preços estimados para o mercado de galpões foram muito erráticos, levantando dúvidas sobre a adequação do método hedônico para gerar índices de preços para esse tipo de imóvel.

No período anterior à maxidesvalorização cambial (1996-1998), apartamentos, casas e barracos valorizaram em termos reais. Em 1999, ano da mudança no regime cambial, foi registrada uma grande perda de valor real para apartamentos e casas decorrentes do cenário de incerteza. No caso dos barracos, a perda de valor foi menor. Entre 1999 e 2003, apartamentos, casas e barracos perderam valor em termos reais. A política de juros altos, a diminuição no rendimento da população, o baixo crescimento econômico e a queda no montante de crédito habitacional são os fatores que explicam a desvalorização real dos imóveis residenciais no período.

Lojas e salas desvalorizaram, em termos reais, no período 1996-2003, devido principalmente ao fraco desempenho da economia, o que inibiu os empresários de investirem em novas unidades de negócios. O comportamento dos terrenos foi semelhante do verificado para as salas e lojas. Como o terreno é o insumo básico para a construção de novas unidades residenciais ou empresariais, o comportamento do preço dos terrenos é reflexo da falta de perspectiva dos empresários da construção civil.

Pesquisas futuras que aumentem o escopo temporal seriam importantes para entender melhor as tendências e os ciclos do mercado de imóveis belo-horizontino (ou brasileiro, na medida em que forem estendidos para outras localidades) e as relações entre preço dos imóveis, o ambiente macroeconômico e o rendimento de outros ativos reais e financeiros. A inclusão do mercado imobiliário informal seria importante para o melhor entendimento da variação dos preços dos barracos. Por fim, trabalhos como este podem ser estendidos para outras cidades brasileiras, servindo como base para no futuro se construir um índice de preços para bens imóveis no Brasil.

Referências Bibliográficas

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  • 10
    JEL classification: C43, E31, R31.
  • 1
    González (1997a)González, M. A. S. (1997a), Fonte alternativa de informação para estudos infraurbanos, in 'ITBI. Encontro Nacional da ANPUR, 6', Recife, pp. 129-147. cita outra situação frequente na base do ITBI: a inclusão de valores muito baixos (R$ 0,01), fato verificado na nossa base. Segundo o autor, isso não é decorrente da subdeclaração, mas devido à correção monetária, dado que o valor constante na guia do ITBI é o nominal de contrato. González (1997a)González, M. A. S. (1997a), Fonte alternativa de informação para estudos infraurbanos, in 'ITBI. Encontro Nacional da ANPUR, 6', Recife, pp. 129-147. ainda adverte que mesmo na ausência de subdelcaração o preço declarado no ITBI costuma ser menor que o observado em anúncios de imobiliárias. Isso se deve ao fato de que no preço declarado inclui a margem de negociação - que costuma ocorrer nas transações imobiliárias - sobre o preço ofertado nos anúncios.
  • 2
    No caso do mercado de galpões foram utilizados os filtros constante na Tabela 1, mas não se retirou os dados em que o preço declarado fosse menor que o avaliado, pois isso diminuiu muito o tamanho da amostra, comprometendo a estimação do modelo.
  • 3
    Esses modelos trabalham com a ideia de que ha um trade off entre espaço e acessibilidade na escolha de localização, dado que o adquirente de imóvel urbano valoriza ambos.
  • 4
    A Região Central de Belo Horizonte concentra 27,3% dos estabelecimentos de comércio da cidade, 34,2% dos estabelecimentos de serviços e apenas 3,1% da população. O centro de Belo Horizonte é ainda destino de 1/3 dos deslocamentos realizados na Região Metropolitana ((Paixão & Abramo 2008Paixão, L. & Abramo, P. (2008), 'Os vetores de expansão da atividade imobiliária em belo horizonte: 1994-2003', Nova Economia, Belo Horizonte 18(2), 229-263., p.239-240).
  • 5
    Estudos que utilizaram preços hedônicos para estimar o custo da criminalidade no preço dos imóveis no Brasil encontraram um coeficiente maior para a variável homicídio em relação à variável roubos a transeuntes ou assaltos a mão armada (Rondon & Andrade 2005Rondon, V. & Andrade, M. (2005), 'Uma estimação dos custos da criminalidade em belo horizonte', Ensaios FEE 26(2), 829-854., Teixeira & Serra 2006Teixeira, E. & Serra, M. (2006), 'O impacto da criminalidade no valor de locação de imóveis: o caso de curitiba', Economia e Sociedade 15(1), 175-207., Paixão 2009Paixão, L. (2009), 'O impacto da violência no preço dos imóveis comerciais de belo horizonte: uma abordagem econômica', Revista de Economia Aplicada 13(1), 125-152.).
  • 6
    No apêndice encontram-se as saídas da regressão para os valores reais, em R$ de 2003 tendo o IPCA como deflator, dos imóveis transacionados. Nota-se que os parâmetros estimados para as variáveis de controle são idênticos. A constante e os parâmetros estimados para as variáveis temporais, assim como os respectivos desvios padrões estimados, são os que sofrem alterações.
  • 7
    O acesso a imóveis via mercado informal é comum nas cidades brasileiras. Para um entendimento do mercado imobiliário informal, ver ((Abramo 2003Abramo, P. (2003), Teoria econômica da favela. quatro notas sobre a localização residencial dos pobres e o mercado imobiliário informal, in 'A cidade da informalidade. O desafio das cidades latino-americanas', Sette Letras/Faperj, Rio de Janeiro., (2007Abramo, P. (2007), 'A cidade com-fusa: a mão inoxidável do mercado e a produção da estrutura urbana nas grandes metrópoles latino-americanas', Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais 9(2), 25-54.).
  • 8
    No apêndice encontra-se a valorização dos imóveis calculada a partir da regressão com os valores das transações em R$ de 2003 tendo o IPCA como deflator. Nota-se que o valor estimado é básicamente o mesmo, com algumas diferenças a partir da terceira casa decimal.
  • 9
    O PIB, entre 1996-1998, cresceu em ritmo menor que no período 1999-2003. Porém, estendendo a análise para o período 1995-1998, a taxa de crescimento média do PIB real entre 1995-1998 fica em 3.32%, evidenciando que o período 1995-1998 foi marcado por maior crescimento que o período 1999-2003. O ano de 1995 não foi incluído na análise por não estarem disponíveis os dados de transações imobiliárias de 1994, tornando impossível a estimação da valorização imobiliária entre 1994 e 1995.

Apêndice A

Tabela A.1
Modelo de Preços Hedônicos para imóveis residenciais: apartamento, casa e barracão
Tabela A. 2
Modelo de Preços Hedônicos para imóveis comerciais (loja, sala e galpão) e terreno
Tabela A.3:
Taxa de variação anual real do preço dos imóveis em Belo Hoizonte 1996-2003

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    23 Jul 2010
  • Aceito
    19 Set 2014
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