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Da história das culturas escolares à história das culturas infantis no Oitocentos paranaense: uma primeira aproximação por meio de egodocumentos

From the history of school cultures to the history of children’s cultures in the paraná in the Nineteenth century: A first approach by means of egodocuments

RESUMO

O artigo tem por objetivo, numa primeira aproximação ao tema, investigar as relações entre a história das culturas escolares e a história das culturas infantis no Oitocentos paranaense, tomando por fontes egodocumentos. Na primeira parte, discute-se como, em termos teóricos e metodológicos, os egodocumentos podem ser utilizados como fontes para a história das culturas escolares e das culturas infantis no Oitocentos bem como delimita-se o corpus documental utilizado neste estudo. Na segunda parte, analisa-se dois aspectos das culturas infantis em diálogo com as culturas escolares: a busca pelo reconhecimento dos pares e do professor no processo de escolarização e a invenção de práticas e espaços de sociabilidade, em forma de brincadeira, inspirados em práticas e espaços de sociabilidade do mundo adulto, por meio de “clubes de faz-de-conta” formados por crianças escolarizadas, com regras e valores sociais próprios. Ao final, encerra-se com considerações, a modo de conclusão.

Palavras-chave:
História; Culturas Escolares; Culturas Infantis; Egodocumentos; Século XIX

ABSTRACT

In a first approach to the theme, this paper is aimed at investigating the relations between the history of school cultures and the history of children’s cultures in the nineteenth century in the Paraná based on egodocuments. In addition to delimiting the documentary corpus used in this study, the first part presents a discussion on how, in theoretical and methodological terms, egodocuments may be used as sources for the history of school cultures and children’s cultures in the nineteenth century. The second part presents an analysis of two aspects of children’s cultures in dialogue with school cultures: the search for peer and teacher recognition in the schooling process as well as the invention of practices and sociability spaces in playful ways, inspired by practices and sociability spaces of adulthood through “make-believe clubs” formed by school children, with their own rules and social values. Lastly, considerations are made by way of conclusion.

Keywords:
History; School Cultures; Children’s Cultures; Egodocuments; 19th Century

Introdução

Quando, em 1993, na Conferência de Encerramento do XV ISCHE (International Standing Conference for de History of Education), Dominique Julia se pronunciou sobre a cultura escolar como objeto histórico, numa definição hoje muito citada e conhecida, a concebeu como:

[...] um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas, que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses comportamentos; normas e práticas coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épocas (finalidades religiosas, sociopolíticas, ou simplesmente de socialização). Normas e práticas não podem ser analisadas sem se levar em conta o corpo profissional dos agentes que são chamados a obedecer a essas ordens e, portanto, a utilizar dispositivos pedagógicos encarregados de facilitar sua aplicação, a saber, os professores primários e os demais professores. [...] Enfim, por cultura escolar é preciso compreender também, quando isso é possível, as culturas infantis (no sentido antropológico do termo), que se desenvolvem nos pátios de recreio e o afastamento que apresentam em relação às culturas familiares (Julia, 2001JULIA, Dominique. A cultura escolar como objeto histórico. Revista Brasileira de História da Educação, n. 1, p. 9-43, 2001. https://repositorio.unifesp.br/handle/11600/39195
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, p. 10-11).

Decorridos trinta anos dessa Conferência, olhando para a sua recepção na historiografia da educação brasileira, pode-se dizer que os historiadores e historiadoras da educação testaram e perscrutaram vários aspectos dessa cultura escolar conforme categorizada pelo historiador francês. Sabemos, hoje, muito do que acontecia no interior da sala de aula, desde meados do oitocentos até as últimas décadas do século passado; conhecemos, em diversos períodos e regiões, como professores, sobretudo primários, apropriaram-se das normas e por meio de suas práticas, para falar com Certeau (1999CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1999.), inventaram o cotidiano escolar; compreendemos, também, os impactos da cultura escolar sobre a sociedade mais ampla, naquele processo a que Faria Filho (2008FARIA FILHO, Luciano Mendes de. O processo de escolarização em Minas Gerais: questões teórico-metodológicas e perspectivas de análise. In: VEIGA, Cynthia Greive; FONSECA, Thaís Nívia de Lima e (Org.). História e historiografia da educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. p. 77-98.) denominou de escolarização do social1 1 Foge aos intentos deste artigo empreender um balanço do uso do conceito na historiografia da educação brasileira. Para saber da sua fortuna crítica, vejam-se, dentre outros, Faria Filho et al. (2004); Bencostta (2010) e Vidal e Schwartz (2010). . Tanto se tem pesquisado sobre o tema que Ester Buffa (2016BUFFA, Ester. Os 30 anos do GT de história da educação: sua contribuição para a constituição do campo. Revista Brasileira de História da Educação, n. 4, v. 16, p. 393-419, 2016. https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/40736
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), ao analisar a produção que circulou pelo GT de História da Educação da ANPEd quando este comemorou seus trinta anos, não deixou de observar a fragmentação que a história da escola, por esse enfoque, acabou por produzir no campo, uma questão que, sem dúvida, terá de ser, no devido tempo, enfrentada pelos pesquisadores.

Todavia, em que pesem os avanços e descobertas realizadas, há um aspecto mencionado por Dominique Julia que parece não ter despertado tanto a atenção dos historiadores e historiadoras: o da história das culturas infantis na sua relação com a história das culturas escolares. É verdade que já não fazemos história da educação sem crianças (Faria Filho; Araújo, 2011FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Representações da escola e do analfabetismo no século 19. In: GALVÃO, Ana Maria de Oliveira; BATISTA, Antonio Augusto Gomes (Org.). Leitura: práticas, impressos, letramentos. Belo Horizonte: Ceale/Autêntica, 2011. p. 151-174.). Mas ainda estamos longe de ouvir com frequência suas vozes e suas impressões sobre os processos de sua educação, seja por questões teóricas ou empíricas (Anjos, 2021ANJOS, Juarez José Tuchinski dos. Apontamentos sobre o testemunho infantil na historiografia da educação (Brasil, séculos 19 e 20). Cadernos de História da Educação, v. 20, p. 1-14, 2021. https://doi.org/10.14393/che-v20-2021-24
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). Conforme provoca-nos a pensar Julia, não são somente as práticas ocorridas no interior das salas de aula - geralmente mediadas pelos professores, os “agentes do ensino” - que produzem a totalidade da cultura que a escola e a escolarização têm o poder de disseminar na sociedade e na história. Há, ainda, uma cultura muito mais difícil de apreender e que, a ela, está, segundo o historiador francês, indiretamente associada: as culturas infantis.

Na definição de William Corsaro, as culturas infantis dizem respeito a “um conjunto estável de atividades ou rotinas, artefatos, valores e interesses que as crianças produzem e compartilham na interação com seus pares” (Corsaro, 2009, p. 32). Em termos históricos, um dos lugares onde podemos “enxergar” tais culturas são as práticas engendradas pelos alunos durante suas infâncias escolarizadas através das quais se apropriavam do repertório cultural que a escola lhes colocava às mãos e, a partir de valores e regras partilhadas entre eles, elaboravam sentidos e significados outros, uma cultura própria, que sem opor-se às culturas escolares, reafirmava o alcance desta na vida das pessoas. Tomando, por vezes, o mundo da escola e da escolarização como referência, acabava por fortalecê-la no seu processo de institucionalização2 2 Não desconsidero que as culturas infantis independem das culturas escolares para se manifestarem. Elas existem, de fato, para além da escola. Mas aqui, dado o percurso de pesquisa realizado e as evidências disponíveis que serão no devido momento examinadas, minha atenção recai sobre as culturas infantis elaboradas em diálogo com as culturas da escola. .

Quais, então, teriam sido, no passado, os impactos da cultura escolar sobre as culturas da infância? De que formas a escola deixou marcas na experiência de ser criança e de ser aluno ao longo da história da educação? Que relações entre crianças foram estabelecidas tendo a escola como mediadora social? Que culturas infantis a escola ajudou a produzir? Realizar uma primeira aproximação a tais questões, investigando as relações entre a história das culturas escolares e a história das culturas infantis no Oitocentos paranaense, tomando por fontes egodocumentos3 3 Sob a categoria de egodocumentos, ancorado em Antonio Viñao (2000) me refiro a autobiografias, memórias ou reminiscências registradas por escrito, nas quais há relatos sobre a infância de seus autores. , é o objetivo deste artigo4 4 Este artigo apresenta parte dos resultados de uma pesquisa de pós-doutorado que contou com apoio financeiro da CAPES, a quem registro agradecimentos. .

A problemática de que se ocupa este estudo poderia ser desenvolvida para qualquer período histórico ou região em que se disponham de evidências que permitam a aproximação desejada com as crianças do passado e suas culturas infantis. Todavia, a escolha pelo Oitocentos não foi aleatória. Segundo um balanço apontou, embora ainda escassas e sem problematizar as culturas infantis em particular, são mais frequentes pesquisas abordando a ótica das crianças no século XX do que no século XIX (Anjos, 2021ANJOS, Juarez José Tuchinski dos. Apontamentos sobre o testemunho infantil na historiografia da educação (Brasil, séculos 19 e 20). Cadernos de História da Educação, v. 20, p. 1-14, 2021. https://doi.org/10.14393/che-v20-2021-24
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). Desse modo, ao realizar essa primeira investida sobre a temática, intenta-se adensar o olhar que os historiadores têm lançado sobre esse momento histórico, que deu início, entre nós, ao longo processo de afirmação da escola pública primária como uma instituição socializadora da infância5 5 Acerca do processo de produção da escola primária no Oitocentos brasileiro em sua relação com a infância veja-se, dentre outros, Gouvêa (2004); Veiga (2005) e Anjos e Souza (2016). . A eleição pelo Paraná como região ser visitada deve-se ao fato de, sendo esta a última província criada no Império, vivenciou, de modo bastante singular, o processo histórico de produção da escola pública acima mencionado, sendo, por isso, um bom observatório social de fenômenos mais amplos então em movimento no Brasil. Além do mais, foi, para essa localidade, identificado um conjunto significativo de egodocumentos, dentre os quais foram selecionados os que aqui serão objeto de análise.

O artigo em tela conta com três partes. Na primeira, discutiremos como, em termos teóricos e metodológicos, os egodocumentos podem ser utilizados como fontes para a história das culturas escolares e das culturas infantis no Oitocentos bem como delimitaremos o corpus documental que será utilizado neste estudo. Na segunda parte, analisaremos dois aspectos das culturas infantis em diálogo com as culturas escolares: a busca pelo reconhecimento dos pares e do professor no processo de escolarização (informada, no caso que vamos analisar, por questões de gênero ligadas à construção de masculinidades e uma gama de valores somente percebidos pelas crianças enquanto alunos) e a invenção de práticas e espaços de sociabilidade, em forma de brincadeira, inspirados em práticas e espaços de sociabilidade do mundo adulto, por meio de “clubes de faz-de-conta” formados por crianças escolarizadas, com regras e valores sociais próprios. Ao final, encerramos com algumas considerações a modo de conclusão.

Egodocumentos como fontes para a história das culturas escolares e infantis

Egodocumentos são “aqueles textos nos quais o sujeito fala ou se refere a si mesmo, nos quais o eu encontra refúgio e se converte em elemento de referência” (Viñao, 2000VIÑAO, Antonio. A modo de prologo, refugios del yo, refugios de otros. In: MIGNOT, Ana Cristina Venâncio; BASTOS, Maria Helena Câmara; CUNHA, Maria Teresa Santos (Org.). Refúgios do eu: educação, história, escrita autobiográfica. Florianópolis: Mulheres, 2000. p. 9-15., p. 11, tradução livre). Nestes documentos encontramos, com frequência, os adultos rememorando, por meio de uma operação retórica - a retórica de infância (Becchi, 1994BECCHI, Egle. Retórica de Infância. Perspectiva, n. 22, p. 63-95, 1994. https://periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/article/view/10743
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) - as crianças que um dia foram, as relações que estabeleceram com outras crianças e as marcas que a instituição escolar que viram e experimentaram deixou em suas vidas, possibilitando, por isso, a apreensão das culturas escolares e das culturas da infância - das quais foram partícipes - por um prisma todo particular.

Sobre as culturas escolares, os egodocumentos trazem, com alguma frequência, referências ao mundo da escola e da escolarização: métodos de ensino, conteúdos ensinados, castigos físicos, profissão docente, práticas escolares, dentre outros aspectos (Anjos, 2019ANJOS, Juarez José Tuchinski dos; BARBOSA, Etienne Baldez Louzada. Cultura material da escola e a escolarização no egodocumento Como e porque sou romancista, de José de Alencar (Brasil, primeira metade do século XIX). Linhas, v. 20, n. 44, p. 154-174, 2019. https://doi.org/10.5965/1984723820442019154
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). Já no que diz respeito às culturas infantis, é possível encontrar neles informações sobre brincadeiras infantis, relações entre pares, relações intergeracionais, apenas para citar aspectos mais evidentes das culturas produzidas pelas crianças no passado. Se o estudo da cultura escolar por meio desse gênero de documentação tem sido empreendido por historiadores ocasionalmente (Lage, 2006LAGE, Ana Cristina Pereira. A memória educacional de um campanhense. Minas Gerais, século 19. CONGRESSO BRASILEIRO DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO, 4. Anais... Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2006.; Campos, 2011CAMPOS, Névio. Victor Ferreira do Amaral e Silva: do oikos a scholé (1862-1878). Revista Histedbr-online, v. 41, p. 72-87, 2011. https://doi.org/10.20396/rho.v11i41.8639836.
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; Anjos, 2016; Mariano 2017MARIANO, Nayana Rodrigues Cordeiro. Um memorialista e o seu tempo: Coriolano de Medeiros e a instrução na Parahyba oitocentista. CC, 9., Anais... João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 2017.; Anjos; Barbosa, 2019) seu uso como base para o estudo das culturas infantis, até onde se pode apurar, é inédito na historiografia da educação.

Enquanto o antropólogo que estuda as culturas infantis no presente tem a possibilidade de interagir com as crianças na pesquisa de campo por meio da descrição densa (Geertz, 1989GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989.), o historiador que queira se aproximar da criança do passado e das culturas nas quais estava imersa - as teias de significados que ela tecia (Geertz, 1989) - tem nos egodocumentos um resquício das experiências que seus autores, então adultos escrevendo sobre suas vidas, vivenciaram um dia em suas infâncias. Pode-se assumir, diante desses documentos, uma atitude antropológica, na tentativa de “compreender um acontecimento conhecido por praticantes entre si, mas desconcertante quanto ao seu próprio significado” (Davis, 2011DAVIS, Natalie Zemon. Antropologia e história nos anos 1980. In: NOVAIS, Fernando Antonio; SILVA, Rogério Forastieri da (Org.). Nova História em Perspectiva. v. 1. São Paulo: Cosac Naify, 2011. p. 329-340., p. 331).

A crítica historiográfica desse tipo de documentação de caráter autorreferencial pode partir de certo ceticismo, afinal até que ponto a memória - com suas propriedades de lembrar e fazer esquecer (Burke, 2000BURKE, Peter. História como memória social. In: BURKE, Peter. Variedades de História Cultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. p. 67-90.) - permite recuperar vestígios da voz da criança que os egoautores um dia foram nos seus relatos egodocumentais? Entre diversos historiadores que se ocuparam dessa questão, podem ser destacadas as seguintes objeções:

[...] a dificuldade de estabelecimento de critérios de validade documental (Becchi); os riscos da ilusão biográfica sobre a infância que eles podem alimentar (Heywood) e os fenômenos da literatura e da memória que presidem seu processo de produção (Baggerman e Dekker) e que podem, assim, obliterar os relatos de infância (Anjos, 2019ANJOS, Juarez José Tuchinski dos; BARBOSA, Etienne Baldez Louzada. Cultura material da escola e a escolarização no egodocumento Como e porque sou romancista, de José de Alencar (Brasil, primeira metade do século XIX). Linhas, v. 20, n. 44, p. 154-174, 2019. https://doi.org/10.5965/1984723820442019154
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, p. 14).

Se esses aspectos, em certa medida, sintetizam alguns dos limites dos egodocumentos enquanto fontes sobre as experiências da criança do passado, por outro lado, não impedem o historiador de tomar contato, ainda que a modo de prisma (Becchi; Julia, 1998BECCHI, Egle; JULIA, Dominique (sur la dir.). Histoire de l’Enfance en Occidente. Tome 1. Paris: Seuil, 1998.) com fenômenos que marcaram as infâncias de seus autores e em cima dos quais podem ter produzido sentidos e significados para sua história de vida. Afinal, como salienta Marianne Gullestad (2005GULLESTAD, Marianne. Infâncias imaginadas: construções do eu e da sociedade nas histórias de vida. Educação e Sociedade, v. 26, n. 91, 2005.p. 509-534. https://doi.org/10.1590/S0101-73302005000200011.
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):

[...] através da imaginação poética da história do adulto, pode-se, às vezes, vislumbrar algo de como é ser uma criança. Numa autobiografia, a parte da infância pode ser lida como o produto de um diálogo entre a criança que o autor foi e o adulto que ele ou ela é então. As memórias de infância não são apenas parcialmente esquecidas, também são parcialmente lembradas. Além de enfatizar o quanto é esquecido, quero, também, portanto, ressaltar como é notável que tanto seja realmente lembrado. Como todas as memórias, as de infância não são apenas inerentemente instáveis, como também um tanto contínuas. Portanto, a questão mais interessante passa a ser o que é lembrado e selecionado como apresentável numa história de vida (Gullestad, 2005GULLESTAD, Marianne. Infâncias imaginadas: construções do eu e da sociedade nas histórias de vida. Educação e Sociedade, v. 26, n. 91, 2005.p. 509-534. https://doi.org/10.1590/S0101-73302005000200011.
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, p. 524).

Assumindo, assim, ser possível - em meio a alcances e limites próprios dessa documentação - obter algum conhecimento histórico sobre as culturas escolares e as culturas infantis através de egodocumentos, é preciso ter presente o alerta de Gomes (2004GOMES, Ângela Castro. Escrita de si, escrita da história: a título de prólogo. In: GOMES, Ângela Castro (Org.). Escrita de si, escrita de História. Rio de Janeiro: FGV, 2004. p. 7-25.) sobre o tipo de “verdade” que emerge das escritas de si, como é o caso dos egodocumentos:

Uma documentação construída nessas bases exige deslocamentos nos procedimentos de crítica às fontes históricas, no que envolve questões relativas ao “erro” ou à “mentira”, digamos assim, no texto em exame. Nestes casos está descartada a priori qualquer possibilidade de se saber “o que realmente aconteceu” (a verdade dos fatos), pois não é essa a perspectiva do registro feito. O que passa a importar para o historiador é exatamente a ótica assumida pelo registro e como o seu autor se expressa. Isto é, o documento não trata de “dizer o que houve”, mas de dizer o que o autor diz que viu, sentiu e experimentou, respectivamente, em relação a um acontecimento [...] Nesse sentido, o trabalho de crítica exigido por essa documentação não é maior ou menor do que o que é necessário com qualquer outra, mas precisa levar em conta suas propriedades, para que o exercício de análise seja efetivamente produtivo (Gomes, 2004GOMES, Ângela Castro. Escrita de si, escrita da história: a título de prólogo. In: GOMES, Ângela Castro (Org.). Escrita de si, escrita de História. Rio de Janeiro: FGV, 2004. p. 7-25., p. 15).

Outros dois aspectos podem ser observados no intuito de proceder à crítica historiográfica dos egodocumentos: cruzá-los entre si, a fim de verificar repertórios de práticas e culturas em circulação num dado momento ou contexto histórico e cruzá-los, também, com outros documentos produzidos na época sobre a qual falam, que permitam ler à contrapelo (Benjamin, 1987BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de história. In: BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas I. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 222-234.) as informações que a escrita autorreferencial contém.

Tendo presentes essas cautelas metodológicas, iremos interrogar, na busca por vestígios das culturas infantis e dos sentidos partilhados em torno delas pelos egoautores em suas infâncias - ainda que por vezes retrabalhados pelos adultos que se tornaram - três egodocumentos relativos à Província do Paraná, que cumpre apresentar.

O primeiro egodocumento é o texto intitulado Meus Dois Mestres, que apresenta fragmentos autobiográficos do crítico literário Nestor Vitor. Esse egoautor nasceu em Paranaguá, em 12 de abril de 1868. Realizou estudos primários em Paranaguá e o secundário no Instituto Paranaense, em Curitiba. Na juventude, foi abolicionista e republicano. Casou-se com Catarina Alzira Coruja, tendo 8 filhos, dos quais 4 sobreviveram. No início do século 20, morou na Europa, onde foi correspondente de jornais. Retornando ao Brasil, fixou-se no Rio de Janeiro, desenvolvendo carreira como crítico literário. Sebastião Paraná (19--) o considerava um dos líderes do movimento literário brasileiro, embora os especialistas em literatura o vejam, atualmente, como um crítico menor. Faleceu em 13 de outubro de 1932. É fundador da cadeira n. 6 da Academia Paranaense de Letras (Paraná, 19--; Vargas; Hoerner Junior; Bóia, 2011VARGAS, Túlio; HOERNER JÚNIOR, Valério; BÓIA, Wilson. Biobibliografia da Academia Paranaense de Letras. Curitiba: Academia Paranaense de Letras, 2011.). Seu egodocumento descreve, em especial, suas vivências como aluno da 1ª cadeira de meninos de Paranaguá, regida pelo professor José Cleto, na década de 1870.

O segundo egodocumento é o texto sem título, de Emiliano Perneta, publicado em suas obras completas e que relata reminiscências de uma brincadeira infantil. Nasceu em Curitiba (em região atualmente pertencente à Pinhais) em 3 de janeiro de 1866. Filho do comerciante Francisco David Perneta e Cristina Maria dos Santos. Realizou estudos primários e secundários no Paraná e a Faculdade de Direito de São Paulo. Atuou como jurista, poeta e jornalista. Foi considerado “príncipe dos poetas paranaenses”, em coroação realizada no Passeio Público de Curitiba. Faleceu em Curitiba em 19 de janeiro de 1921. Não consta ter sido casado. É patrono da cadeira número 30 da Academia Paranaense de Letras (Leão, 1968LEÃO, Agostinho Ermelino de. Dicionário Histórico e Geográfico do Paraná. v. 2. Curitiba: Instituto Histórico, Geográfico e Etnográfico Paranaense, 1968.; Vargas; Hoerner Júnior; Bóia, 2011VARGAS, Túlio; HOERNER JÚNIOR, Valério; BÓIA, Wilson. Biobibliografia da Academia Paranaense de Letras. Curitiba: Academia Paranaense de Letras, 2011.).

O terceiro egodocumento é a autobiografia Coração Aberto, de Rodrigo Octávio. Ela será utilizada apenas para fins de cruzamento com o egodocumento de Emiliano Perneta, já que seus autores foram contemporâneos e colegas de infância. Nasceu em Campinas, em 1866. Passou parte da meninice em Campinas, Rio de Janeiro e Paraná. Era filho do presidente da Província paranaense, homônimo. Foi advogado, professor, magistrado, contista, cronista, poeta e memorialista. Faleceu em 28 de fevereiro de 1944. Foi membro da Academia Brasileira de Letras (ABL, 2023).

Além dos egodocumentos acima descritos, também com o intento de cruzá-los com outras fontes, recorremos a algumas informações relativas ao contexto no qual seus autores viveram a infância no Paraná Oitocentista: a imprensa periódica e um relatório de professor, que serão incorporados à narrativa histórica no devido momento.

Apresentados os protocolos teóricos e metodológicos desta pesquisa, passemos à análise das culturas infantis no nosso corpus egodocumental.

Das culturas escolares às culturas infantis

De modo geral, os professores paranaenses, independentemente do método de ensino que diziam adotar - individual, simultâneo, mútuo - organizavam suas escolas em classes, de acordo com o grau de adiantamento dos alunos pelas diferentes matérias de que se compunha o currículo da instrução primária de então. Isso trazia consigo um desafio bem assinalado por Franciele França, já que “a relação entre a frequência e método interferia no modo como este seria executado nas escolas, se com o auxílio ou não de monitores e ainda de alunos mestres e professores adjuntos” (França, 2014, p. 140). Assim, mesmo professores que afirmavam utilizar o método simultâneo, com frequência, por meio de bricolagens, combinavam-no com elementos do método individual e/ou do método mútuo/lancasteriano/monitorial. Isso não foi diferente com José Cleto, professor da 1ª cadeira de meninos de Paranaguá que, na década de 1870, mesmo servindo-se do método da União Americana e de Abílio Borges - que suponho ser o intuitivo ou de lições de coisas (Valdez, 2006VALDEZ, Diane. A representação da infância nas propostas pedagógicas do Dr. Abílio César Borges, o Barão de Macaúbas (1856-1891). Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2006.) - também o associava a elementos do método mútuo/lancasteriano ao fazer uso de monitores. Para ele, certamente, tal recurso visava a racionalidade do ensino (entendida como controle disciplinar da turma com vistas ao melhor aproveitamento da atividade intelectual) e o seu maior êxito, como pontuou, antes dele, seu colega de ofício, o professor Décio da Costa Lobo, em um relatório de 1866:

Dos alunos da 3ª classe nomeei monitores que compondo diversos graus segundo o adiantamento de cada um tem o cuidado de vigiar os bancos, chamando a atenção dos descuidados, coibindo os turbulentos e obrigando a tomarem posição decente os mal ensinados, porém de modo que não seja perturbado o andamento do ensino. Estes mesmos monitores são encarregados de inspecionar sobre o modo por que os alunos procedem quando se dirigem para suas casas, para na primeira sessão darem-me parte dos que mal procederam. O seu distintivo é uma fita [...] do cargo que ocupam. Além destes, no princípio de cada banco, há um dos discípulos da 2ª classe, escolhidos por suas boas qualidades para vigiarem os seus vizinhos e fazê-los estar em ordem. Esses são denominados vigilantes e tomam o lugar dos monitores quando a terceira classe é chamada à minha presença (DEAP-PR, AP 204, 1866, p. 146).

O uso de monitores no processo de ensino na escola primária oitocentista, por essas e outras funções que exerciam, tornou-se, sem dúvida, elemento frequente das culturas escolares então engendradas. Mas, para as crianças, tornar-se monitor ou aspirar sê-lo deu ensejo à construção de outros sentidos e significados, próprios de uma cultura infantil, cujos valores só eram percebidos por elas. Disso, o egodocumento de Nestor Vitor, aluno de José Cleto na década de 1870, nos fornece interessantes evidências para estudo.

Segundo nosso egoautor, José Cleto valia-se do recurso pedagógico dos monitores para, além de apoio para o bom andamento da instrução, exercitar uma forma de emulação entre os alunos. Narra-nos Nestor Vitor:

Entre os alunos havia diversos monitores: cada classe tinha o seu. Mas desses monitores destacavam-se dois: o chamado monitor geral e o seu imediato. Tais lugares eram conquistados nas sabatinas entre dois: aquele que ocupasse um banco mais acima tinha de aceitar o desafio do outro, que lhe fosse imediatamente inferior. Se perdesse, recuava para a posição deste (Vitor, 1946VITOR, Nestor. Meus Dois Mestres. Revista da Academia Paranaense de Letras, 1946. p. 72-82., p. 80).

Na busca por imprimir racionalidade ao trabalho pedagógico, José Cleto, na versão desse seu antigo aluno, contava com diversos monitores, espalhados pelas várias classes de que se compunha sua escola. Porém, estabelecia certa hierarquia entre eles, ao destacar dois dentre os demais: o monitor geral e o seu imediato. Segundo o relato, semanalmente - aos sábados - uma disputa definia quem seria superior ou imediato de quem. Numa sociedade permeada por valores liberais, como era a do Brasil Império, a ideologia da carreira aberta ao talento com base no esforço pessoal e na competição, como se vê, era coisa ensinada e aprendida desde muito cedo. José Cleto não era o único a emular seus estudantes por meio desse tipo de disputas. Há na historiografia e em outros egodocumentos evidências disso. Entretanto, se para o professor a lição sobre esforço pessoal e meritocracia acabava quando findava o exame, para as mentes infantis de seus alunos o negócio era bem mais complexo.

Eu chegara a monitor geral, já estudando no último ano do curso. Meu imediato era um menino pouco mais velho do que eu. Chamava-se Alberto Filgueira. Alberto, com seu nariz de cavalete, rosto comprido, enérgico de caráter e inteligente, tirava de uma perna. Por isso mesmo, sem dúvida, o gênio mais se lhe acirrara e a ambição por proeminência ali na escola se tinha avivado. Quando dei por ele, constituíra-se o rapaz em meu rival e tão possuidamente que acabou por ficar “mal comigo”. O fato não me pareceu extraordinário. Não era um nem dois: eram dez ou eram mais os que me mandavam recado ou bilhete dizendo-me que, se tivesse vergonha, não falasse mais com eles. Depois vinha a reconciliação, tão fácil naquela idade, tanto mais que eu nada praticava conscientemente para tais rompimentos nem também repelia as propostas de paz. Infantilidades próprias daquela idade. Mas o caso com Alberto Filgueira era seu tanto mais sério: representava uma ameaça que os outros não podiam fazer. Eles não tinham remédio senão liquidar contas comigo na rua e mais de um o tentou com vantagem, revelando superioridade física, coisa tão fácil, porque esta, comparativamente, me falecia (Vitor, 1946VITOR, Nestor. Meus Dois Mestres. Revista da Academia Paranaense de Letras, 1946. p. 72-82., p. 81)

Do que se depreende do excerto acima, entre os meninos da escola, a disputa pelo cargo de monitor geral estabelecia, no meio deles, grande rivalidade. De fato, esse era um dos elementos configuradores da emulação. Mas a questão, aqui, parece ser mais profunda: por que é que, entre eles, havia a disputa por tal lugar? Possivelmente pelo tipo de relação de poder que o posto, necessariamente, representaria sobre os demais. Se recordarmos as atribuições de um monitor como descritas pelo outro professor de Paranaguá, Honório Décio da Costa Lobo, percebe-se que o detentor desse tipo de cargo tinha o poder - entendido, aqui, na esteira de Norbert Elias (1994ELIAS, Norbert. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Zahar, 1994.), como sinônimo de oportunidade social - de vigiar, inspecionar, subordinar os demais colegas. Consequentemente, sem ter quem o vigie, o monitor chefe só estaria abaixo do professor, o que lhe valeria, por certo, maior tranquilidade e respiro nos assuntos de relações escolares.

Mas, na vida de Nestor Vitor, essa rivalidade teve personagens bem definidos: de um lado, ele - que, em adulto, ao narrar esse fato, procura enfatizar que não estava assim tão preocupado com o posto quanto os demais, ainda que esse acontecimento jamais tenha sido apagado de sua memória e escolhido por ele como um dos elementos que deveriam compor sua autobiografia - e o colega Alberto, que, na sua interpretação, por ter uma deficiência, tinha por questão de honra chegar àquele lugar de destaque.

Evidência de que, para além do olhar do professor, esse caldo de representações era sorvido pelos meninos da escola, numa relação de pares, é a afirmação do próprio Nestor Vitor de que inimizades entre eles por conta do dito cargo não eram coisa incomum. Ora ficavam de mal entre si, trocando bilhetinhos de desafeto; ora iam às vias de fato -- e aqui um ingrediente de masculinidade em formação, informando essa cultura de pares, era a violência entre si. Nesse último caso, o egoautor confessa que geralmente saia perdendo, por lhe faltarem as forças físicas necessárias para a vitória nos confrontos. Desse modo, ele sugere, implicitamente, que a posse do cargo tão almejado por todos trazia, além do bônus, o ônus de ficar mal com os demais colegas de classe. Mas aqui ele lembra algo que também nós não podemos esquecer: eram todas crianças e, sem mais graves consequências, rapidamente faziam as pazes e ficavam de bem. Mas, com a Alberico, as estratégias geralmente mobilizadas entre os que venciam ou perdiam o posto não funcionava, já que, pelo visto, ele de fato compensava o que aos olhos dos outros era um problema - sua deficiência - com uma inteligência de certo modo avantajada, que, com certo contragosto, Nestor Vitor deixa entrever nas entrelinhas do que segue:

[...] Alberto teimou, teimou até que um dia venceu-me, passando a ser monitor geral. Mas desde então fizemos as pazes, porque eu, em vez de mostrar-me descontente, abracei-o, diante do mestre, diante de todos e não disputei mais o lugar que perdera. Faltavam meses para fazermos exame final: achei que não valia a pena por tão pouco.

Daí em diante Alberto ficou sendo meu camarada às direitas. Isso mostra que não era um menino comum. Se o fosse, meu gesto não daria o resultado que deu (Vitor, 1946VITOR, Nestor. Meus Dois Mestres. Revista da Academia Paranaense de Letras, 1946. p. 72-82., p. 81).

De novo, é difícil saber se quem nos fala é o pequeno Nestor Vitor - derrotado na sua aspiração de manter-se monitor chefe ou o adulto Nestor Vitor, para quem esse tipo de disputa já não fazia mais tanto sentido. Em todo caso, no plano das experiências infantis que seu relato traz presentes, por partilharem das mesmas aspirações, é que seu colega, de tanto tentar, uma hora alcançou o posto almejado, e Nestor Vitor, não tendo outro remédio, abraçou e acabou tornando-se amigo do menino. É curioso fazer sobre isso uma última observação: se a grande meta da emulação era despertar os brios infantis para a competitividade e, dentre os meninos da escola de Nestor Vitor, a busca por um posto numa hierarquia de poder ali produzida, o gesto dos meninos, em sendo tal como relatado, subverte radicalmente a prática de emulação. Por razões que não ficam claras, ao menos para Nestor Vitor, a coisa acabou por ali, já que, em breve, faria exames escolares e achou que continuar na disputa “não valia a pena por tão pouco”. E ainda saiu lucrando uma amizade.

Outra manifestação das culturas infantis informadas por referências da escola - ou melhor, no caso que será analisado, de uma sociedade que começava a valorizar os espaços de sociabilidade intelectuais e letrados, mas cujo letramento era tributário da lenta disseminação da escolarização - são brincadeiras de faz de conta que tentavam, de algum modo, imitar práticas dos adultos instruídos da época, como os Clubes e Agremiações. Conforme vão nos esclarecer Gondra e Schueler (2008GONDRA, José Gonçalves; SCHUELER, Alessandra Frota Martinez de. Educação, poder e sociedade no Império brasileiro. São Paulo: Cortez, 2008.):

No decorrer do século 19, a educação foi pensada no plural, como também foram plurais as forças educativas que, de modo associado ou concorrente, delinearam iniciativas e constituíram formas e práticas diversas para promover os projetos de educação e de nação. Uma dessas forças educativas foi representada pela ação da própria sociedade civil, por meio da criação de múltiplos espaços de sociabilidade, formais ou informais, que longe de se constituírem como lugares estanques ou isolados uns dos outros, estabeleceram entre si uma série de relações e intersecções, embates e confrontos (Gondra; Schueler, 2008GONDRA, José Gonçalves; SCHUELER, Alessandra Frota Martinez de. Educação, poder e sociedade no Império brasileiro. São Paulo: Cortez, 2008., p. 63).

Sob a denominação de “Clubs”, Associações e Sociedades, esses espaços de sociabilidade a partir da segunda metade do Oitocentos - embora já existentes anteriormente - se disseminaram com grande velocidade, sempre permeados pelos ideais de ilustração e instrução que unia seus membros. São por isso e a seu modo também testemunhos das manifestações da escolarização do social, já que evidenciavam no seio da sociedade uma “visão escolarizada do social, onde a centralidade e a importância é dada não à cultura e aos processos de transmissão orais, mas à cultura letrada, erudita, própria à elite escolarizada que se formava” (Faria Filho, 2011FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Representações da escola e do analfabetismo no século 19. In: GALVÃO, Ana Maria de Oliveira; BATISTA, Antonio Augusto Gomes (Org.). Leitura: práticas, impressos, letramentos. Belo Horizonte: Ceale/Autêntica, 2011. p. 151-174., p. 155). A província paranaense também conheceu várias dessas agremiações, como se constata, por exemplo, pela rápida leitura do Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Província do Paraná para o ano de 1877, organizado por José Ferreira de Barros e editado no Rio de Janeiro.

Identificados como “Clubs”, havia pelo menos quatro em funcionamento. Na capital, Curitiba, o Club Literário Curitibano, “inaugurado em 19 de dezembro de 1874. Possui mais de 700 volumes de obras científicas e literárias além de mapas e jornais” (Almanak, 1876, p. 100). Na vila de São José dos Pinhais, distante poucas léguas, funcionava o Club Literário Sãojoesano, “instalado no dia 15 de outubro de 1876” (Almanak, 1876, p. 130). Descendo rumo ao litoral, em Antonina, existia o “Club Democrático Antoninense”, cuja “biblioteca compõem-se de perto de 800 volumes de diversas obras” (Almanak, 1876, p. 233). Voltando ao planalto, em Campo Largo, encontrava-se ativo o Club Literário Campolarguense “instalado a 19 de agosto de 1875, cuja biblioteca possui 471 volumes de diversas obras” (Almanak, 1876, p. 249).

Já com o nome de Associação, podem ser localizadas duas, embora de naturezas diversas, mas sempre com a finalidade de sociabilidade intelectual. Em Curitiba, a Associação de Aclimação, “fundada em 25 de setembro de 1875” (Almanak, 1876, p. 98) e preocupada em incrementar o desenvolvimento das culturas agrícolas da Província. Na cidade da Lapa, entrementes, a finalidade da Associação Literária Lapeana era bastante próxima a dos Clubs. Segundo o Almanak, “esta associação foi fundada há perto de quatro anos e sua biblioteca conta mais de 300 volumes. Está construindo um teatro com duas ordens de camarotes e plateia para 250 pessoas” (Almanak, 1876, p. 207).

Ainda com a nomenclatura de Sociedades, os paranaenses, interessados em teatro ou na arte dramática amadora como a designavam mais frequentemente, dispunham de, ao menos, cinco agremiações espalhadas por diversas cidades e vilas: Sociedade Dramática Amadora, Sociedade Philo-Dramática Particular Paranaguense; Sociedade Lotérica Teatral; Sociedade Teatral Thalia Paranaguense e a Sociedade União Curitibana (Almanak, 1876).

Essa sociedade local marcada por espaços de sociabilidade - cada vez mais crescentes e, naquele momento, em recente expansão e nascimento - é o pano de fundo para, inspirados em Clifford Geertz (1989GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989.), desembaraçarmos a teia de significados presente na cultura infantil produzida por Emiliano Perneta e um grupo de amigos seus na Curitiba dos anos de 1878-18796 6 Embora o organizador das obras completas de Emiliano Perneta date este relato como referente à década de 1880, a referência nele à Rodrigo Octávio, o filho do presidente da Província do Paraná entre 1878-1879, nos leva a trazer a cronologia para esse período, uma vez que, após a demissão de seu pai do cargo - coisa comum na dança das cadeiras da política de conciliação adotada por D. Pedro II - toda a família deixou a Província. .

Emiliano, nascido nos arredores da capital provincial em 1866, teria por volta dos 12 anos quando, junto dos amigos “Francisco Ribas, Panfílio e Paulo Assumpção, Pedro Fonseca, Sérgio de Castro Júnior, Rodrigo Octávio e Castrinho” (Perneta, 1946PERNETA, Emiliano. Obras Completas. I. Curitiba: Gerpa, 1946., p. 48) decidiram, na casa do Major Teolindo Ribas, situada à Rua das Flores, realizar a primeira sessão do que denominaram Clube Juvenil. Mas é por aí que acaba a solenidade e adentra-se no mundo de um faz-de-conta infantil, que parece ter se prolongado por algum tempo na vida daquele grupo de meninos:

Os sócios, ao toque da campainha - dlim, dlim, dlim - sentaram-se em redor de uma mesa, o presidente abriu a sessão, deu começo à eleição. Depois principiou o negócio dos estatutos! Esse era geralmente o ponto onde se tinham quebrado antes todos os nossos belos projetos de sociedade. E, entretanto, eram estatutos a coisa menos útil para os clubes, porque os fatos desfaziam, dia por dia, as leis criadas de momento pelos nossos cérebros infantes. Felizmente, desta vez, o Didi trouxe a lei preparada de casa. E como era obra feita em palácio, houve da parte de todos uma aceitação tácita e respeitosa, como de coisa superior e desconhecida. O clube denominou-se Clube Juvenil. As sessões concorreram a princípio semanalmente, depois foram-se precipitando, não só pelo prazer febril das crianças - destruírem com os brinquedos à força de brincarem - como também porque... direi?... havia queijo e banana ao fim de cada sessão, oferecidos por dona Januária, um coração delicado de rosas e de lírios. Desta frequência resultou, naturalmente, uma certa frouxidão. O prazer da reunião naquele lugar solene foi-se desmoralizando. Já se dizia: passe-me o ilustre tinteiro... e quando o presidente queria reagir, ele mesmo quebrava-se, ouvindo um gaiato exclamar: - não toque tanto a ilustríssima campainha! Um dia bateu a loucura. Grande leilão! Os objetos passaram todos para as mãos dos sócios, no meio de grandes gargalhadas. E assim dissolveu-se o Clube Juvenil (Perneta, 1946PERNETA, Emiliano. Obras Completas. I. Curitiba: Gerpa, 1946., p. 49-50).

À primeira vista, a leitura deste egodocumento pode aparentar ter pouco interesse ou relevância para que se compreenda o processo de institucionalização da escola no Paraná por meio de culturas infantis. O estilo narrativo, inclusive, próprio da estética simbolista - da qual Emiliano foi um dos introdutores no Brasil, tendo incentivado várias vezes que seus colegas intelectuais lessem e conhecessem Charles Baudelaire - também não ajuda muito a decifrar os códigos das culturas escolares e vestígios da escolarização do social nas culturas da infância presentes no relato. Mas eles estão todos aí, se relermos tudo, com a devida atenção.

Para começar, é importante observar que a brincadeira infantil, para possuir um mínimo de verossimilhança com os Clubes de verdade, frequentados possivelmente pelos pais de alguns dos meninos envolvidos - de Rodrigo Octávio, por exemplo, temos certeza disso, graças ao seu egodocumento (Octávio, 1934OCTÁVIO, Rodrigo. Coração aberto. Livro de Saudades. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1934 [1919]. [1919]) - contava com elementos materiais e simbólicos que existiam, de fato, nesses espaços de sociabilidade. Ela possuía ritos, como o toque da sineta anunciando a abertura da sessão, a formação de uma mesa diretora bem como um estatuto, que expressaria os regulamentos e regras sobre as quais a brincadeira deveria se pautar, num consenso entre os envolvidos.

Percebamos, também, a presença de evidências indiretas de uma sociedade escolarizada. O estatuto, possivelmente escrito, preparado previamente em casa por um dos membros que possuía, certamente, o domínio da escrita, adquirido em algum espaço de escolarização. Se “Didi”, o autor, for um apelido do menino Rodrigo Octávio - o que se pode sugerir pela referência de que o estatuto era “obra feita em Palácio”, numa possível alusão ao Palácio da Presidência da Província - podemos acreditar ter sido obra de alguém que, àquela altura, frequentava uma das escolas públicas primárias de Curitiba, regida pelo professor Rouxinol (Octávio, 1934 [1919]). Ou seja, a escola deu, ali, seu quinhão para que a brincadeira pudesse acontecer. Outro elemento próprio de uma sociedade escolarizada - mas, também, de uma infância escolarizada - é o tinteiro, utensílio básico para a utilização da maior parte dos instrumentos de escrita disponíveis à época, objetos estranhos aos analfabetos, mas, aparentemente, bastante familiar àquele grupo de meninos.

Mas não pensemos, contudo, estarmos aqui diante de coisa formal ou oficializada. Atesta a ênfase do autor de que tudo aquilo era uma brincadeira, perpassada por barulho, algazarra, chistes e piadas feitas pelos membros do Clube Juvenil. Os quitutes - o queijo e as bananas oferecidos pela provável dona da residência onde a brincadeira se dava - também revela a participação coadjuvante dos adultos, aceitando e permitindo que a brincadeira dos meninos pudesse ser realizada. Ao final, o clube se dissolveu, um pouco porque, nas palavras de Emiliano Perneta, o brinquedo, repetido além da conta, foi perdendo para eles a graça; outro tanto porque, ao cabo, decidiram dividir entre si os bens do clube em meio a grande gargalhada. Era uma brincadeira que acabava. Mas uma brincadeira toda ela permeada por referências indiretas ao mundo da escola e da escolarização. Uma brincadeira, assim, já tocada e transformada por um fenômeno maior em movimento no Paraná do período provincial: a institucionalização da escola primária com a consequente escolarização do social - da infância, da cultura e das culturas infantis - que essa trazia consigo. Disso, a seu modo, testemunha-nos Emiliano Perneta em seu egodocumento e em seu testemunho de infância.

A modo de conclusão

Este artigo teve por objetivo investigar as relações entre a história das culturas escolares e a história das culturas infantis no Oitocentos paranaense, tomando por fontes egodocumentos.

Foi possível confirmar a potencialidade dos egodocumentos como fontes para se obter conhecimento não só sobre as culturas escolares, mas também sobre as culturas infantis. Pudemos, no caso do egodocumento de Nestor Vitor, apreender as relações entre pares vivenciadas na infância, na interseccionalidade das culturas escolares com as culturas infantis. Já em relação ao egodocumento de Emiliano Perneta, tivemos a oportunidade de perceber referências de um mundo escolarizado sendo apropriadas também numa cultura de pares, por meio de uma brincadeira infantil que tinha por mote a imitação dos clubes frequentados pelos adultos. Em ambas as situações, pela voz dos adultos autores dos egodocumentos, foi possível recuperar vestígios de pontos de vista e experiências vivenciadas por eles no decorrer de suas infâncias.

Sendo essa uma primeira aproximação dos egodocumentos como fontes para a história das culturas infantis, há aspectos a merecer maiores atenções em estudos futuros. Um primeiro, é a necessidade de avançar no diálogo com autores da sociologia e da antropologia da infância, com vistas a adensar as lupas teóricas com as quais os egodocumentos podem ser examinados. Um segundo aspecto que pode ser objeto de investimentos é o alargamento do corpus documental, ou seja, a busca por mais egodocumentos, não só do Paraná, mas também de outras partes do Brasil, nos quais se possam encontrar referências e evidências das culturas desenvolvidas pelas crianças, seja na condição de escolares ou para além dos limites da escola. Em todo caso, esta pesquisa pode ser lida como uma contribuição inicial ao que quiçá venha a constituir-se em mais um canteiro da história da educação e da infância: a história das culturas infantis (informadas ou não pelas culturas escolares) por meio de egodocumentos.

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  • VIDAL, Diana Gonçalves; SCHWARTZ, Cleonara. Sobre cultura escolar e história da educação: questões para o debate. In: História das culturas escolares no Brasil. Vitória: EDUFES, 2010. p. 13-36.
  • VIÑAO, Antonio. A modo de prologo, refugios del yo, refugios de otros. In: MIGNOT, Ana Cristina Venâncio; BASTOS, Maria Helena Câmara; CUNHA, Maria Teresa Santos (Org.). Refúgios do eu: educação, história, escrita autobiográfica. Florianópolis: Mulheres, 2000. p. 9-15.
  • VITOR, Nestor. Meus Dois Mestres. Revista da Academia Paranaense de Letras, 1946. p. 72-82.
  • APOIO/FINANCIAMENTO

    A pesquisa contou com apoio financeiro da CAPES através de Bolsa PNPD.
  • DISPONIBILIDADE DE DADOS DE PESQUISA

    Todos os dados foram gerados/analisados no presente artigo.
  • 1
    Foge aos intentos deste artigo empreender um balanço do uso do conceito na historiografia da educação brasileira. Para saber da sua fortuna crítica, vejam-se, dentre outros, Faria Filho et al. (2004); Bencostta (2010) e Vidal e Schwartz (2010).
  • 2
    Não desconsidero que as culturas infantis independem das culturas escolares para se manifestarem. Elas existem, de fato, para além da escola. Mas aqui, dado o percurso de pesquisa realizado e as evidências disponíveis que serão no devido momento examinadas, minha atenção recai sobre as culturas infantis elaboradas em diálogo com as culturas da escola.
  • 3
    Sob a categoria de egodocumentos, ancorado em Antonio Viñao (2000) me refiro a autobiografias, memórias ou reminiscências registradas por escrito, nas quais há relatos sobre a infância de seus autores.
  • 4
    Este artigo apresenta parte dos resultados de uma pesquisa de pós-doutorado que contou com apoio financeiro da CAPES, a quem registro agradecimentos.
  • 5
    Acerca do processo de produção da escola primária no Oitocentos brasileiro em sua relação com a infância veja-se, dentre outros, Gouvêa (2004); Veiga (2005) e Anjos e Souza (2016).
  • 6
    Embora o organizador das obras completas de Emiliano Perneta date este relato como referente à década de 1880, a referência nele à Rodrigo Octávio, o filho do presidente da Província do Paraná entre 1878-1879, nos leva a trazer a cronologia para esse período, uma vez que, após a demissão de seu pai do cargo - coisa comum na dança das cadeiras da política de conciliação adotada por D. Pedro II - toda a família deixou a Província.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    24 Fev 2023
  • Aceito
    24 Maio 2023
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