Open-access O Cinema Dito dos Primeiros Tempos: um Caldo de Cultura em Plena Ebulição...1

Resumo

A noção de séries culturais permite pensar visões e discursos alternativos sobre as condições para o advento do cinema. Numa perspectiva que considera a "polifonia" institucional e cultural que precede e caracteriza os primeiros tempos do cinema, onde se inscrevem notadamente o praxinoscópio, a lanterna mágica e o kinetoscópio de Edison, trata-se de estabelecer a série cultural da animação como quadro de referência para o conjunto da rescinematografica. Se o paradigma da captação-restituição própria ao cinematógrafo Lumière parecia até agora dominar no seio da instituição como no da produção cinematográfica, o retorno da animação de imagens como princípio fundador do cinema enseja compreender sua verdadeira força diferencial e sua capacidade de adaptação perante as numerosas crises identitárias atravessadas, dentre as quais a hibridação digital e a porosidade generalizada ligada à convergência de plataformas e mídias atuais.

Palavras-chave cinema; cinematógrafo; séries culturais; animação; digital

Abstract

The concept of cultural series makes it possible to consider alternative outlooks and discourses on the historical circumstances out of which cinema emerged. This approach bringing into light the institutional and cultural "polyphony" defining early cinema, in which the praxinoscope, the magic lantern and the Edison kinetoscope cross paths, leads the author to posit that the "animation" cultural series provided the main framework of the res cinematografica. While the capturing-restoring paradigm associated with the Lumière Cinématographe appeared to be dominant within both the output of pioneering filmmakers and the institution of the early years of moving pictures, a return to the animation of images as the founding principle of cinema brings a new understanding of its real differential force. This shift further sheds light on cinema's ability to evolve and adapt during the multiple identity crisis it has lived through, up to and including the current trend towards hybridity brought about by digital technology, as well as by the heightened porosity associated with new digital platforms and media convergence.

Keywords cinema; cinématographe; cultural series; animation; digital

Para entender as condições do aparecimento de um fenômeno midiático tão complexo quanto o cinema, parece-me indispensável examinar os desdobramentos dessa mídia em direção à sua fase institucional, de início, levando em conta diferentes fatores culturais estreitamente entrelaçados que presidiram à sua formação. O advento do cinema é um processo evolutivo, feito de encontros e interações, às vezes conflitivas e turbulentas, entre diversas práticas culturais já presentes no momento em que se inventam diferentes procedimentos para realizar imagens em movimento. Como tentei explicar anteriormente (principalmente, GAUDREAULT, 2008), os primeiros “usuários” do cinematógrafo não fazem senão utilizar um aparelho novo a partir de séries culturais (ibidem, p. 113 e ss.) em cujo seio já possuíam, cada um a seu modo, uma prática que lhes era própria. Na virada do século XX, o cinematógrafo é tão somente um novo instrumento de trabalho (nem mais nem menos), de que nos servimos no quadro de práticas culturais diversas, e o cinema, nesse momento, ainda não havia se tornado uma mídia autônoma.

Não se pode, por conseguinte, datar a invenção do cinema em 1895, que marca a invenção não do cinema, mas do Cinematógrafo Lumière, o qual, à época, foi aparentemente o mais exitoso dos procedimentos para captação-restituição de imagens fotográficas em movimento, mas ao qual o fenômeno “cinema” não poderia da mesma forma se resumir. Cinematógrafo não equivale portanto a cinema. Mesmo se nós colocamos a primeira palavra com inicial maiúscula, para tomar em seu sentido mais geral, cinematógrafo e cinema ainda não seriam equivalentes. O Cinematógrafo Lumière e os outros procedimentos da mesma ordem não representam, com efeito, senão um preâmbulo para que um dia advenham, em primeiro lugar o cinematógrafo (sem inicial maiúscula), depois o cinema. Desse modo, pode-se dizer que a invenção do aparelho é uma condição necessária, mas não suficiente para que ocorra o advento do cinema. No fundo, eis exatamente por que a teoria francesa do “dispositivo” dos anos 1970 pôde dar uma resposta e forjar a expressão idônea de “aparelho de base” (BAUDRY, 1970, p. 1-8; 1975, p. 56-72; e 1978 3, Comolli4, etc.): o Cinematógrafo Lumière, o Kinetógrafo Edison e outros Bioskop são a base, não o topo.

O cinema – permitam-me insistir mais uma vez – é um fenômeno sociocultural que não se “inventa” de modo tão simples: não há a patente “cinema”, porque o cinema não é um procedimento, é um dispositivo social, cultural, econômico, etc. Portanto, o cinema se constitui, se institui e, finalmente, se institucionaliza. Uma vez realizada a invenção das componentes do procedimento inicial – tal mecanismo para as paradas por intermitência da película, tal tipo de obturador para a entrada de luz, tal rapidez na rolagem do filme para a impressão do negativo, tal tipo de película e de perfurações, tal mecanismo para o seu movimento, etc. –, seria necessário ainda, em especial, que se precisasse os diversos modos de fabricação de imagens em movimento (passando assim do hardware ao software). Seria necessário também que a última novelty (novidade) chegasse para fazer parte dos usos e costumes de toda e qualquer pessoa (isso apenas aconteceria instituindo o novo hábito que representa o simples fato de “ir ao cinema. E teria sido também necessário que se colocasse à prova diversos modos de exploração dessas imagens em movimento, estabelecendo uma rede de intermediários entre os “fazedores” e os “exibidores” de imagens em movimento. E teria sido necessário também que esses agentes de produção e de distribuição adviessem (ou, dado o caso, que eles se voltassem para o cinematógrafo e que eles integrassem o seu fazer preexistente). Tudo isso demanda tempo, tempo que se conta em anos.

Para que se conseguisse alcançar um certo nível de estabilidade, seria preciso com efeito passar por um período bastante longo de tentativas e erros (é isso, notadamente, o “cinema dos primeiros tempos”). É exatamente ao que vão se entregar no decorrer da última década do século XIX e um pouco depois, algumas centenas de interlocutores5 que se convencionou chamar os “pioneiros do cinema” (todos neófitos em matéria de cinematografia, sem dúvida...), atraídos pelos encantos do aparelho novo e pelo que tornava doravante possível a visualização individual (kinetoscópio) ou a projeção sobre uma tela (Cinematógrafo) de imagens luminosas em movimento. Ora, no momento em que se apoderavam da última novelty para integrá-la ao seu fazer, o deles, os neófitos em questão eram todos, salvo exceções, já inscritos – até mesmo arraigados – em uma profissão relativamente conectada ao cinematógrafo (mas de todo modo, estranha a ele) e no que está por trás de sua invenção (pesquisa científica, fotografia, lanterna mágica, espetáculo de cena, atrações de feira, etc.), cada uma dessas profissões tendo sua própria cultura (constituída de regras e de convenções particulares). O advento do cinema foi, portanto, a realização de interlocutores diversos que pertenciam a culturas diferentes e é num semelhante “caldo de cultura” – se isso não é uma verdadeira efervescência de culturas próprias a cada uma das séries culturais contribuindo para o dito advento – que o cinema surgiu, muitos anos depois de se ajustar o procedimento original.

O cinematógrafo desde seus primórdios é, portanto, o lugar de uma expressão eminentemente polifônica6, o que é sem dúvida necessário ter em conta caso se queira entender como a instituição “cinema” pôde se formar a partir de um bricabraque institucional e cultural que caracteriza os primeiros tempos do cinematógrafo. É preciso também levar em conta esse dado histórico fundamental quando se pretende entender como o cinema terminará por emergir desse “far west” para trazer a lume uma nova mídia autônoma, a qual estará finalmente livre da submissão às séries culturais que no início a haviam nutrido.

O caráter polifônico, atribuído por mim a isso que é convencionado chamar o “cinema dos primeiros tempos”, aplica-se igualmente ao período que precede à invenção do Kinetógrafo (por Edison e Dickson, por volta de 1889-1891) e do Cinematógrafo (pelos irmãos Lumière, em torno de 1894-1895). O período que conduziu o aparelho chamado de base ao pleno funcionamento é, com efeito, ele também, inscrito numa cultura “multisserial”, exatamente da mesma natureza que aquela da cinematografia nascente. No momento em que eles se voltaram para a análise e a síntese do movimento pela trucagem de imagens, os inventores, tendo participado da última demão no aparelho de base, já pertenciam a uma ou mais séries culturais então constituídas, e as proposições que cada uma delas formulou procediam (necessariamente) da série cultural que era a sua (e à qual elas se assemelhavam...). Assim, por exemplo, Marey e Demenÿ, como Edison e Dickson, têm uma abordagem de ordem cronofotográfica, enquanto os Lumière têm uma abordagem de ordem sobretudo fotográfica. Assim também, Émile Reynaud, cuja abordagem está em continuidade com a série cultural do brinquedo óptico, que ele finalizou ao combinar com a série cultural da projeção luminosa. Não é surpreendente, portanto, que o dispositivo de Edison e suas primeiras imagens em movimento lembrem as “séries cronofotográficas”. Surpreende menos que o dispositivo Lumière pareça se confundir com um aparelho fotográfico e que uma projeção Lumière tenha ares de uma fotografia que de repente se anima. É ainda bem menos estranho que o Théâtre optique de Émile Reynaud produza desenhos animados que parecem saídos diretamente de algum praxinoscópio aperfeiçoado – o que, na verdade, ele é (cf. seu dispositivo com espelhos e seu cilindro).

Essa questão é essencial para qualquer um que tente determinar quem terá inventado o aparelho de base. Assim, pode-se dizer que cada uma das séries culturais participantes dessa corrida que foi a invenção do “cinema” tem seu próprio herói: Reynaud, para a série cultural do brinquedo óptico; Marey e Edison, para a cronofotografia; Lumière, para a fotografia; e, para a lanterna mágica, Birt Acres (como veremos logo adiante). Sem dúvida, não é preciso tomar semelhante afirmação ao pé da letra, mas apesar disso, devemos levá-la em conta durante nossa apreciação desse fenômeno eminentemente plural que representa alguma coisa de tão complexo quanto a invenção do aparelho de base, à qual contribuíram diversas séries culturais tendo cada uma sua parte de “mérito” na dita invenção.

Como prova disso cabe observar a declaração de um lanternista profissional, Roger Child Bayley, que afirma em 1900, cinco anos após o depósito da patente dos Lumière para seu Cinematógrafo e sem nenhuma intenção polêmica aparente, não apenas que isso que nós chamamos de aparelho de base seria uma “lanterna cinética”, mas também que o inventor desse aparelho de base seria Birt Acres, um lanternista de renome (além do mais, britânico como Child Bayley), de quem os outros inventores de procedimentos cinematográficos seriam meros imitadores:

No início do ano de 1896, uma nova invenção de um lanternista, M. Birt Acres, foi objeto de uma primeira demonstração em Londres; esta “lanterna cinética”, como se chamou então, permitia projetar em uma tela, com uma fidelidade completamente notável, imagens animadas de cenas de ruas e de outros temas em movimento. Logo em seguida, outros inventores chegaram à suas próprias versões desse aparelho e as lanternas cinéticas, ornando-se com toda a sorte de nomes gregos ou latinos, tornaram-se a sensação do momento 7

(CHILD BAYLEY, 1900, p. 102).

Aqui, Child Bayley encampa a invenção do cinematógrafo no seio da série cultural de que ele é agora um dos detentores e mestres: a lanterna mágica. Pode-se pensar que o faz sem malícia nenhuma e sem ser guiado por uma forma qualquer de “anti-lumièrismo” primário. De sua perspectiva de lanternista, é assim (isto é, como ele o descreve) que as coisas teriam acontecido e é preciso dar-lhe razão: também foi efetivamente assim que as coisas aconteceram. Do mesmo modo que o advento do cinema, o último retoque no aparelho de base é um fenômeno evolutivo e muito esperto seria quem pudesse dizer em que data e sobre qual procedimento deve-se deter a escolha para eleger o (único) inventor. Reynaud, por volta de 1888, já havia introduzido a perfuração da fita e inventado alguma coisa como as projeções luminosas de imagens animadas. Edison já havia inventado, por volta de 1890, a película de 35mm e alguma coisa como as imagens animadas fotográficas, etc. Nessa corrida com obstáculos visando estabelecer a quem deveria ser concedida a prioridade na invenção do aparelho de base, é preciso se perguntar o que importa mais. Trata-se no fundo de saber se vai se tomar a projeção por um critério determinante ou se a invenção de um aparelho de visualização individual basta. Caso se considere a projeção pública como o critério determinante, resta ainda saber se é preciso ou não, que esta sessão seja paga para poder ser reconhecida como uma “primeira vez” válida (como o decreta por exemplo Georges Sadoul). Antes de se colocar tais questões, entretanto, o historiador sério teria interesse em se perguntar se a pesquisa “da invenção Una, Definida e Definitiva”, para retomar as palavras de Michel Frizot (2004, p. 319), é um jogo que vale a pena, ou se isso não é, finalmente, um exercício de total frivolidade.

Fig. 1
Inscrição de um número da revista The Optical Magic Lantern Journal and Photographic Enlarger (1889-1904).

O texto de Child Bayley é um exemplo patente da atitude que consiste em interpretar um contexto midiático dado usando lentes de uma série cultural particular (aqui a lanterna mágica) em detrimento de outras. Aliás, existe um terreno bastante propício ao desenvolvimento de tal atitude à época da cinematografia emergente: aquela da imprensa especializada. Mesmo os títulos de jornais ou de revistas, onde se encontra menções ao novo aparelho e à nova série cultural, agora em plena expansão, de fato dizem muito sobre a relação entre o cinematógrafo e as séries culturais que iriam acabar se apropriando dele. No instante em que se coloca em andamento a institucionalização, antes que se assista a criação de periódicos exclusivamente consagrados à cinematografia8, com efeito, é nas revistas ou jornais comerciais saídos de séries culturais heterogêneas e exógenas, por exemplo, The Optical Magic Lantern Journal and Photographic Enlarger (Reino Unido), L’Industriel forain (França) ou The New York Dramatic Mirror (Estados Unidos), que o cinematógrafo encontra refúgio.

Fig. 2
Inscrição de um número da revista The Optical Lantern and Kinematograph Journal (1904-1907).

Trata-se de um terreno privilegiado para o pesquisador desejoso em estudar de perto os traços das relações interseriais à época do cinematógrafo e os índices da progressão do processo rumo à institucionalização do cinema. Encontra-se um exemplo de grande pertinência desta progressão ao examinar a página de rosto de The Optical Magic Lantern Journal and Photographic Enlarger (fig.1), na qual o próprio nome sofreu numerosas evoluções no curso dos anos, cada um revelando o tema do “combate” contínuo entre as duas séries culturais que eram a então envelhecida lanterna mágica e a jovem e viçosa cinematógrafo. Em 1889, a revista foi lançada sem menção alguma no seu próprio título à cinematografia (é claro!). Em 1904, a revista muda de nome para se tornar The Optical Lantern and Kinematograph Journal9 (fig. 2), substituindo assim a menção que fazia referência à série cultural “fotografia” (Photographic Enlarger) para introduzir em seu lugar e nome a série “cinematografia”. Em seguida, assiste-se a inversão do cinema e da lanterna mágica, o cinematógrafo tomando a posição principal no novo título, Kinematograph and Lantern Weekly, que a revista se dá em 1907 (fig. 3), antes de mudar mais uma vez de identidade em 1919, agora, expulsando literalmente a lanterna mágica de seu título, que não compreende doravante mais que um único dos dois termos da proposição inicial, aquele do cinema: Kinematograph Weekly (fig. 4).

Fig. 3
Inscrição de um número da revista The Kinematograph and Lantern Weekly (1907-1919).
Fig. 4
Inscrição de um número da revista Kinematograph Weekly (a partir de 1919).

Terminar-se-á portanto por afugentar a lanterna mágica para fora da página de rosto de uma revista no início consagrada, quase exclusivamente, a esta série! Triste destino para essa mídia, que terá visto sua aura periclitar em um período mais ou menos curto (entre 1889 e 1919) e cujo declínio se deixa perceber tranquilamente ao longo da evolução do título da revista: óptica e mágica ao mesmo tempo (The Optical Magic Lantern) até 1904, a lanterna perde portanto seu caráter mágico para não ser mais que óptico; em 1907, continua a se fazer ainda mais discreta e aparece apenas como “lanterna”, nem mágica, nem óptica... para terminar por desaparecer completamente, em 1919, do título da revista!

De fato, a lanterna mágica de que se fala aqui, a que cede a vez ao cinematógrafo de maneira tão rápida e igualmente espetacular, é aquela da qual Child Bayley dizia que teria sido o próprio nicho da invenção do cinematógrafo? Sim, é exatamente. Mas ela perdeu seu esplendor e conheceu, em apenas alguns anos, um declínio que alguns interpretariam como uma morte... O que não é totalmente o caso: se a instituição da lanterna mágica está por certo morta, a função do “aparelho de base” da chamada instituição permanece bem viva como o provam, por exemplo, todos os conferencistas que vão, mundo afora, ilustrar suas palestras com a ajuda desses diapositivos desmaterializados projetados sobre uma tela (como nos velhos tempos!), graças a um programa do tipo PowerPoint instalado em um computador conectado a esse avatar da lanterna mágica que é o projetor digital, verdadeira lanterna mágica dos tempos modernos.

Esta breve história de relações entre a série cultural da lanterna mágica e a série cultural do cinematógrafo não é senão um exemplo do que eu chamaria, portanto, a “polifonia dos primeiros tempos do cinema”, para designar a multiplicidade de vozes que constituem as diversas séries culturais conjugadas pelo cinematógrafo no momento em que fazia sua estreia e que se entrelaçavam, em sincronia, mas não necessariamente sempre de modo harmônico, no interior da nova série cultural que representava as imagens animadas. Essa polifonia vai acompanhar o cinematógrafo ao longo de sua metamorfose em cinema, no movimento que o conduzirá a seu “segundo nascimento”, de acordo com um processo que Philippe Marion e eu tentamos descrever pela primeira vez, já faz uns quinze anos, quando havíamos introduzido o chamado modelo de um “duplo nascimento do cinema”10. Na época em que havíamos esboçado as grandes linhas de nosso modelo, tratava-se de conseguir dissociar a invenção do procedimento (v. 1890-1895) do advento da instituição (v. 1908-1912), para que se parasse enfim de assimilá-los um (a invenção) ao outro (o advento), como se fez por exemplo ao festejar o centenário do cinema na data de aniversário da invenção de um procedimento técnico como aquele do Cinematógrafo Lumière. Como eu o proclamo de um lado e de outro há vários anos, o período chamado hoje de cinema dos primeiros tempos vê o cinematógrafo se transformar para se metamorfosear em cinema, tirando proveito de uma mudança de paradigma bastante radical para nos obrigar a distingui-los claramente um do outro e a ver a passagem entre os dois sobressaindo-se de uma ruptura, de uma solução de continuidade.

Fig. 5
Placa comemorativa fixada em 1926 na fachada do prédio que abrigava o Salão Indiano do Grand Café (14, boulevard des Capucines, em Paris).

Não estariam de acordo com a posição que adoto aqui, por exemplo, aqueles que organizaram as comemorações do centenário do cinema em 1995... Pelo simples fato de sua realização, essas comemorações reconhecem implicitamente aos irmãos Lumière a invenção não somente de seu Cinematógrafo – o que é um fato verídico –, mas também do cinema – o que é questionável de várias formas, mesmo se tratando de um reconhecimento que, sem ser universal, foi amplamente disseminado através do mundo. No entanto, a ideia da supremacia dos Lumière não era ainda dominante no curso dos anos 1920, a julgar pela prudência de um índio Sioux utilizada para descrever a importância histórica da primeira projeção pública e paga do Cinematógrafo Lumière, em sua placa comemorativa afixada nas paredes externas do Grand Café em 192611 (fig. 5): “ICI LE 28 DÉCEMBRE 1895 / EURENT LIEU / LES PREMIÈRES PROJECTIONS PUBLIQUES / DE PHOTOGRAPHIE ANIMÉE / À L’AIDE DU CINÉMATOGRAPHE / APPAREIL INVENTÉ PAR LES FRÈRES LUMIÈRE” (Aqui, no dia 28 de dezembro de 1895 / Ocorreram / As primeiras projeções públicas / de fotografia animada / com ajuda do cinematógrafo / Aparelho inventado pelos irmãos Lumière).

Vê-se muito bem que a placa deseja (e deve) comemorar uma verdadeira première (raramente se coloca uma placa para celebrar uma “segunda vez”...): as “primeiras projeções públicas de fotografia animada” de toda a aventura humana ocorreram, portanto, se considerarmos o teor dessa placa em Paris, dia 28 de dezembro de 1895 no Grand Café. O que, sabe-se agora, é profundamente errôneo12. Quando se observa um pouco mais de perto, contudo, pode-se encontrar uma outra significação ao texto da placa. Um significado que, desta vez, daria cem por cento de razão a seu autor. A placa poderia pretender dizer que, em 28 de dezembro de 1895, nesse prédio em cuja parede fora colocada, havia ocorrido não “as primeiras projeções públicas de fotografia animada” de toda a aventura humana, mas em verdade “as primeiras projeções públicas de fotografia animada” que jamais foram feitas com-a-ajuda-do-Cinematógrafo-Lumière. O que, sem dúvida, frisa o truísmo e a tautologia! É, no entanto, o que diz, com todas as letras, o texto da placa: “primeiras projeções públicas de fotografia animada coma ajuda do Cinematógrafo... ”Com a ajuda do Cinematógrafo... Lumière, de fato.

Fig. 6
Papel de carta da revista de Maurice Noverre, Le Nouvel Art Cinématographique (por volta de 1928)

A ideia de dissociar um e outro, “cinematógrafo” e “cinema”, está longe de ser nova. Com efeito, encontra-se a distinção aqui e ali (em francês, em todos os casos), ao longo da história da reflexão histórica sobre o cinema. Assim está no próprio título que Jacques Deslandes assinou em 1968 com Jacques Richard: Du cinématographe au cinéma (Do Cinematógrafo ao Cinema). É a mesma distinção a sustentar a hipótese que Edgar Morin desenvolvia com vigor, uns dez anos antes, em sua obra magistral e amplamente conhecida O Cinema ou O Homem Imaginário (MORIN, 1956), ao postular que a chegada de Méliès no mundo da cinematografia representava justamente o ponto de passagem entre um (o cinematógrafo) e outro (o cinema). É uma ideia da mesma ordem que é defendida com paixão, perto do fim dos anos 1920, por Maurice Noverre e sua revista Le Nouvel Art Cinématographique, como o demonstra manifestamente a inscrição em seu papel de carta fazendo homenagem a Méliès (fig.6), a qual se lê como um... manifesto (no qual Noverre sustenta que o cinematógrafo é um simples “aparelho” de registro, um simples “instrumento”, para opor ao “espetáculo denominado ‘Cinema’”, que “é uma arte”).

Se a ideia de dissociar “cinematógrafo” e “cinema” está longe de ser nova, a ideia de um segundo nascimento do cinema (ver GAUDREAULT; MARION, 2013b, p. 158-177),13 não é, muito menos, tão nova quanto possa parecer à primeira vista. Assim, encontramos aqui e ali a expressão “segundo nascimento” em dois textos antigos assinados por autores célebres: Alexandre Arnoux (em 1928) e André Bazin (em 1953). Os dois textos foram escritos tirando proveito de duas crises identitárias entre as mais agudas que o cinema havia conhecido: a que provocou a chegada do “falado” e a que acompanhou o surgimento da televisão. Eis portanto o que escrevia Arnoux a propósito da invasão do falado, que se mostraria particularmente ameaçadora para alguns:

Não podemos permanecer indiferentes. Nós assistimos a uma morte ou a um nascimento, ninguém pode ainda discernir. Passa-se algo de decisivo no mundo da tela e do som. [...] Segundo nascimento ou morte? Eis a questão que se coloca a favor do cinema. 14>

(ARNOUX, 1928, p. 3, grifos meus.)

Segundo nascimento ou morte?, se pergunta Arnoux com sutileza, recusando ver a ameaça que espreitava o cinema (a desaparição do “mudo”) como alguma coisa de totalmente negativa. Por sua vez, dado que se vê particularmente interpelado pelo advento da televisão, Bazin (1953, p. 23-24) escreve um artigo com um título sintomático: “Le cinéma est-il mortel” (O Cinema é Mortal?)15, mostrando de modo preciso que o surgimento da televisão tem um efeito perturbador sobre vários interlocutores da res cinematografica. Bazin faz referência a este “segundo nascimento” que o cinema teria experimentado, depois que a invenção dos Lumière (de início, simples curiosidade técnica) tornou-se espetáculo:

Talvez, seja mesmo por um jogo espirituoso, uma ilusão de óptica da História, fugaz como o desenho de uma sombra pelo sol, que pudemos durante cinquenta anos crer na existência do cinema. Talvez, “o cinema” seria com efeito um estado da vasta evolução dos meios mecânicos de reprodução que têm sua origem no século XIX com a fotografia e o fonógrafo e cuja forma mais recente é a televisão. [...] Em suma, Lumière via como justo, quem recusava vender sua câmera para Méliès sob pretexto de que se tratava apenas de uma curiosidade técnica útil no máximo para os médicos. Foi um segundo nascimento do cinema que engendrou o espetáculo que se tornou hoje em dia

(ibidem, p. 24, grifos meus.).

Primeiro nascimento, segundo nascimento... e talvez mesmo ainda um terceiro, o qual estaríamos assistindo agora16. Mas tudo isso é tão somente um problema de quantidade. É preciso um mínimo de salto qualitativo para que possamos falar de “nascimento”. Um salto qualitativo da ordem de uma mudança radical de paradigma (assim, no quadro do modelo que defendemos, Philippe Marion e eu, a adição da cor e a chegada das telas panorâmicas, por exemplo, não poderiam ser consideradas como limiares paradigmáticos). Sem dúvida, tudo depende também de limites impostos à série que se constrói quando se começa a enumerar os elementos que a compõem. Se a série tomada em consideração reagrupa, digamos, as “projeções luminosas de fotografias animadas”, sem dúvida estão excluídos daí o kinetoscópio de Edison (ausência de projeção) e o Théâtre óptique de Émile Reynaud (ausência de imagens fotográficas). Esta é a escolha que os historiadores tradicionais fizeram, privilegiando como ponto de origem de sua série “cinema” a famosa “primeira projeção pública paga” de 28 de dezembro de 1895. “Eh, muito bem! Eles entenderam errado!”, teria eu vontade de dizer, sem de modo algum lhes fazer seriamente uma reprimenda, na medida em que a construção de séries sujeita-se em grande parte ao livre arbítrio de cada pesquisador e às exigências de sua demonstração. No entanto, é preciso saber que ao construir uma série que ainda não foi socialmente reconhecida, corre-se o risco de que esta série escolhida não tenha, jamais, reconhecimento. Foi exatamente o que aconteceu com Maurice Noverre que, no início dos anos 1930, militou de forma ativa a favor de que fosse conferido o título de “inventor do cinema” para Étienne-Jules Marey:

Nossa Vitória está completa.

As Festas do Centenário de Étienne-Jules Marey (1830-1904) aconteceram em Paris (24-25 de junho) e em Beaune (Côte-d’Or, 28-29 de junho de 1930), em meio a um entusiasmo indescritível.

Em seu discurso de 29 de junho, M. Marraud, ministro da Instrução Pública, saudou Marey como “o construtor do primeiro Cinematógrafo em película móvel” (1887).

O grande Mestre da Universidade da França falou. A Causa foi ouvida. [...] A História das origens da Cinematografia, na França, doravante, foi regulamentada de maneira definitiva.17

De maneira definitiva? Necas! Com efeito, não é a versão das coisas que a “História oficial” conservaria, ao menos até agora (reviravoltas são sempre possíveis...), e são os irmãos Lumière que reinam, ainda hoje, no firmamento da invenção do cinema... Para sempre? Não necessariamente, porque o vento está mudando. Por dois tipos de razões, parece-me. Razões de ordem historiográfica e razões de ordem... “histórica”. As razões de ordem historiográfica são evidentes: no início do terceiro milênio, não se pratica mais história como se praticava na segunda metade do século XX. A questão “quem inventou o cinema?” foi desmontada peça por peça e não faz mais o menor sentido hoje em dia. Com efeito, dá-se conta de que se essa questão não encontrou resposta definitiva, sem dúvida, é porque foi mal colocada. Além disso, os pesquisadores aderem cada vez mais à ideia segundo a qual a chegada do cinematógrafo (aqui, pouco importa se o aparelho em questão foi inventado pelos Lumière ou por um de seus concorrentes) provocou um verdadeiro efeito de ruptura nas séries culturais já minimamente institucionalizadas, que foram tomadas em conta.

No que concerne às razões de ordem “histórica”, pode-se mencionar o advento do digital, que subverte literalmente todas as concepções que nós tínhamos, até há pouco, disso que é o “cinema”: estamos provavelmente migrando para um novo paradigma. Um novo paradigma no qual a técnica fotográfica não é mais o nec plus ultra, nem mesmo a condição sine qua non da “cinematograficidade”... Quem terá dito isso há quase dez ou quinze anos?

A virada digital tem efeitos múltiplos, pois atinge todos os setores dessa “Arte industrial” (BAZIN, op. cit., p. 24)18 que é o cinema. Por menos que se aceite a ideia de que a esfera contemporânea do “cinema” inclui assistir DVDs, ao que nós procedemos em nossas salas, e que os “filmes” (ainda chamamos de “filmes”, embora não sejam mais registrados em película) podem doravante chegar até um espectador isolado e sem projeção nenhuma (o que aliás é o caso, mas de maneira marginal, desde a invenção da televisão, que iniciou essa mudança de paradigma19), é o modelo do kinetoscópio que é promovido! Portanto, torna-se fácil recolocar em serviço uma série que jamais morreu – sobretudo nos Estados Unidos, onde inúmeros são aqueles que consideram o inventor do “cinema” (ou, em inglês, de movies, moving pictures, motion pictures), como sendo Edison – série na qual o traço pertinente (como se diz em linguística) para que haja ou não cinema, não é a “projeção pública” de imagens fotográficas em movimento, mas a simples “animação” dessas imagens, o simples fato de que elas estejam, justamente, em movimento.

Se, ao contrário, tivermos em mente a proliferação de imagens de síntese (sem traço fotográfico nenhum), na esfera contemporânea disso que chamamos ainda “cinema”, é em torno do Théâtre optique de Émile Reynaud que se é promovido! Sabe-se que Reynaud foi literalmente posto em quarentena pelos historiadores teleológicos do cinema, pois havia cometido um “pecado capital” à seus olhos. Com efeito, teria rejeitado na concepção do praxinoscópio (e de seus diversos avatares), a obturação com cortes do zootrópio e do fenacistoscópio, para privilegiar um sistema de espelhos dispostos em volta de uma coroa poligonal (um procedimento julgado anticinematográfico e claramente “retrógrado” por esses historiadores20 – que consideram, com ou sem razão, o princípio de obturação como um dos alicerces fundamentais da cinematografia). Por outro lado, em uma perspectiva teleológica, a caução fotográfica abandonava cruelmente o Théâtre optique21 mesmo se, com a sua tela estendida, sobre a qual as imagens eram projetadas diante de uma assembleia de espectadores, o dispositivo de recepção de imagens concebido por Reynaud (de uma ortodoxia que encantaria Baudry!) era da mesma natureza que o do cinematógrafo.

Apesar disso, Reynaud realizou efetivamente, 38 meses antes de 28 de dezembro de 1895, projeções públicas pagas de imagens em movimento (além disso, reunidas em uma fita perfurada).

Isso não bastou à tradição para evitar colocar relativamente fora de curso, Reynaud e seus procedimentos. Todavia, e de modo paradoxal, pode-se antever um belo futuro a Reynaud, verdadeira figura rechaçada da história da invenção do cinema. Com efeito, o contexto atual se mostra totalmente propício para Reynaud renascer das cinzas, cujo fantasma vem com frequência bater nas portas da historiografia do cinema, para ser novamente excluído (mas, parece-me que, cada vez, com menos violência). Encontramos nos últimos anos vários sinais prenunciadores desse renascimento das cinzas, alguns menos refinados que outros. Assim, a recente petição de princípios de um Bernard Lonjon (2007) faz não apenas de Émile Reynaud o verdadeiro inventor do cinema (é o título preciso de seu livro!), mas também da cidade de Puy-en-Velay, a partir da qual Reynaud propagava-se, a “cidade-mãe do cinematógrafo” (LONJON, 2007, p. 92, textualmente: do cinematógrafo... com um c minúsculo, é claro), e isso, desde junho de 1875!

Todavia, não é de surpreender ver sair algo tão explosivo, contestatório e contestável quanto o livro de Lonjon. Em suma, trata-se de um movimento pendular. Como o Théâtre óptique de Reynaud não ocupa de modo algum o lugar que deveria ser o seu nas histórias do cinema, seria preciso esperar até que um dia surgisse um defensor dos oprimidos.

De imediato, devo acrescentar uma coisa: não é preciso se colocar, sobretudo, a questão do lugar de Reynaud ou de outros “pioneiros do cinema” em termos de justiça distributiva. O historiador não está aí para fazer valer os méritos de quem quer que seja (mesmo se em geral é o que acontece de fato). Se Reynaud ocupa o pequeno lugar que tem nas histórias teleológicas do cinema em nossos dias, é tão simplesmente porque são histórias do cinema e é tão simplesmente também porque são histórias teleológicas. Como a história “do cinema” praticada hoje em dia é cada vez menos uma história do cinema (quero dizer do cinema isolado: com efeito, faz-se cada vez mais a história de imagens projetadas, a história de imagens em movimento, etc.) e ela dá mais conta do que a história teleológica de séries culturais contemporâneas da invenção e do advento do cinema, o lugar de Reynaud e dos dispositivos que ele criou está em constante reavaliação. Decerto, quando se examina a obra de Reynaud com a visão restrita ao cinema, ao cinema isolado, ou, preferencialmente, disso que se pode descrever como a “cinefotografia”, suas “pinturas animadas” não ganham o peso necessário e são excluídas oficialmente do paradigma.

Com efeito, a importância relativa que concedemos à obra de cada um desses participantes da “invenção do cinema” está sujeita à série que nos serve de posto de observação. Se considerarmos as primeiras evoluções do cinematógrafo sob o ângulo de uma série que teria curso em torno dos últimos vinte anos do século XIX, a série, digamos, de “projeções animadas”, mais do que sob o ângulo do cinema isolado, nossa visão das coisas muda totalmente. Nosso primeiro reflexo, quando pensamos em “projeções animadas”, é fazer uma adequação biunívoca entre projeções animadas e projeções cinematográficas. A história tradicional do cinema nos condicionou a ter semelhante reflexo. Ora, a série cultural dita das “projeções animadas”, à qual se associa sempre os primórdios do cinema, está longe de se limitar somente à cinematografia. A série em questão pode compreender, notadamente, as projeções kinetoscópicas (que vieram ao mundo antes das projeções cinematográficas) e as projeções do Théâtre optique de Émile Reynaud (que também vieram ao mundo antes das projeções cinematográficas e inclusive antes das projeções kinetoscópicas…). A série também poderia compreender as “projeções movimentadas” da lanterna mágica, que precederam tudo isso.

Esta ideia de “série” me parece essencial no plano metodológico tanto quanto no plano heurístico, tão somente porque permite organizar o discurso e mudar a ordem das coisas, assim como a visão que nós temos. Prova disso é a recente publicação, assinada por Dominique Willoughby (2009), que constitui, de algum modo, uma outra maneira de o fantasma de Reynaud vir bater nas portas da historiografia do cinema. O empenho do qual esse livro procede repousa sobre os esforços espontâneos de um historiador que procura construir uma série e legitimá-la, modo para ele de fazer a história de uma “arte visual surgida aqui há 175 anos: o movimento de imagens criado por uma série de desenhos, gravuras ou pinturas, desde sua invenção em 1833” (ibidem, quarta capa, grifos meus) ou, para dizer de jeito mais simples, do que o autor chama o “cinema gráfico”, uma série no interior da qual Reynaud ocupa, naturalmente, um lugar de destaque. Além disso, uma série sobre a qual o autor afirma que está “na origem do cinema” e cujo domínio se estende:

de brinquedos ópticos até a voga do anime japonês atravessando o cartoon, o cinema experimental, as novas formas de longas-metragens de animação gráfica, até as técnicas digitais atuais de animação, de tratamento de imagens e de trucagem. (ibidem)

Percebe-se bem que a série a qual se depreende dos propósitos do autor não está muito longe do que se chama tradicionalmente o filme de animação ou o cinema de animação, que o dispositivo reynaudiano inaugura de algum modo (mesmo se não há, propriamente dito, nem filme, nem cinema em Reynaud). Com efeito, a verdadeira reabilitação de Reynaud, o retorno legítimo desse rejeitado, passa necessariamente pelo retorno de um outro rejeitado da história do cinema: a série cultural da animação de imagens – um retorno que constata por exemplo Lev Manovich que, depois de ter afirmado que o cinema, “nascido da animação [...] afastou a animação para sua periferia, apenas para, por fim tornar-se um caso particular de animação” (MANOVICH, 2010, p. 520), explica de que modo o contexto da cultura digital mudou a situação:

O papel privilegiado desempenhado pela construção manual de imagens no cinema digital ilustra uma tendência mais ampla: o retorno das técnicas pré-cinematográficas de produção da imagem em movimento. Estas últimas […] ressurgem hoje em dia como fundamento da produção cinematográfica digital. O que era quase resíduo no cinema torna-se sua norma; o que era margem torna-se centro. Com as mídias informáticas, assiste-se a um retorno do rejeitado pelo cinema.

(ibidem, p. 527-528).

Já em 1991, quando estávamos na aurora da virada digital, Alan Cholodenko, invertendo de um ponto a outro certos postulados da teoria clássica do cinema, chegou a erigir a animação como princípio fundador do cinema. Assim, escreve ele, em um verdadeiro manifesto intitulado “Who Framed Roger Rabbit, or The Framing of Animation” (Uma Cilada Para Roger Rabbit, ou Uma Cilada Para a Animação):

Ora, ainda que a instituição e o discurso cinematográficos tenham marginalizado a animação […], é somente através da animação que o cinema pode se definir como cinema. A animação é isso de que o cinema conserva o traço […], o que o cinema apagou ao tentar apagar todo traço desse apagamento, mas que é a condição mesma de sua existência. […] Eu não estou de acordo com aqueles que não vêem na animação senão um gênero cinematográfico […]. Com efeito […] pode-se dizer que a animação engloba todos os filmes, todo o cinema, que ela era (e ainda é) a condição de sua própria possibilidade: o dispositivo de animação. Nesse sentido, a animação não seria mais uma forma de cinema. É o cinema que seria uma forma de animação. Não esqueçamos que a câmera e o projetor serviam para animar as imagens fixas chamadas de “fotografias”.

(CHOLODENKO, 1991b, p. 213).

Como se pode constatar, essa ideia de calçar as lunetas da animação para compreender a evolução do cinema é portanto muito presente, aqui, em filigrana, ali de modo massivo, na reflexão de vários pesquisadores contemporâneos. No entanto, ela ainda não recebeu toda a atenção que merece nem provocou todos os efeitos que poderia ter provocado caso se houvesse verdadeiramente dado toda a sua dimensão.

Todavia, parece-me necessário hoje, até mesmo essencial, para o desenvolvimento da reflexão sobre o cinema, militar em favor de um retorno efetivo da série cultural da animação como quadro de referência do conjunto da res cinematografica e tentar compreender as razões de sua expulsão para a periferia do cinema. Pode-se ainda avançar nessa direção e admitir que isso seria uma maneira relativamente usurpadora que o paradigma da captação-restituição (ver GAUDREAULT; MARION, 2001, p. 34-41) tenha sido sacramentado como princípio primeiro estruturando a série cultural das projeções animadas, a ponto de fazer sombra à série cultural da animação (e são criadores como Reynaud, grande mestre da animação que teriam por assim dizer arcado com as consequências).

Com certeza, a animação sempre teve seu lugar entre os gêneros com direito à cidadania no planeta cinema, mas a expressão pela qual é designada – “cinema de animação” já é reveladora dessa evacuação da série cultural por sua inclusão no cinema institucionalizado, o que representa de algum modo colocá-la sob tutela. Tudo se passa como se, durante muito tempo subjugada pelo efeito novelty (novidade) da captação-restituição, que a institucionalização elegeu como fundamento identitário, o cinema terminou renegando uma parte essencial de suas origens e de sua primeira série cultural de pertencimento. Cholodenko mais uma vez:

Por mais que se possa considerar a animação como uma forma de cinema, sua marginalização é ao mesmo tempo extraordinária e previsível. Extraordinária na medida em que se pode sustentar que o filme de animação não apenas precedeu o cinema, mas o engendrou; que todos esses progressos tecnológicos do século XIX que são brinquedos ópticos, a teoria da persistência retiniana, o projetor, a película de celuloide, etc. – à exceção da fotografia – iriam se combinar para dar nascimento ao dispositivo de animação do Théâtre optique de Émile Reynaud em 1892; e que, por conseguinte, ao contrário do que se acredita geralmente, é o cinema que poderia muito bem ser considerado como o “rejeitado” da animação. 22

(CHOLODENKO, 1991a, p. 9-10).

De fato, como eu o proclamei em outra tribuna, “em certos aspectos, animação é kinematografia e kinematografia é animação”23. Hoje, portanto, seria talvez o paradigma da captação-restituição que teria dificuldades para se fazer, diante desse renascer das cinzas por parte da animação. Com efeito, sua posição dominante está mais que nunca ameaçada. Nos espíritos, de certo, mas também no mundo bastante real da produção cinematográfica. Essa passagem a um novo paradigma (ou esse terceiro nascimento do cinema – ver supra), do qual somos atualmente testemunhas, parece com efeito conceder à animação o lugar de princípio primeiro estruturante. Com o desaparecimento da força identitária e o apagamento do valor “diferencial” do cinema, quebrados pelos duros golpes da hibridação digital e diluídos na porosidade generalizada ligada à convergência de plataformas e de mídias, a animação de imagens, esse princípio que a instituição tomou o cuidado de declarar fora da identidade ou ao menos “para-identitário”, talvez esteja retomando seu lugar de princípio fundador da res cinematografica.

André Gaudreault é professor da Universidade de Montreal e dirige o GRAFICS (Grupo de Pesquisas sobre o Advento e a Formação das Instituições Cinematográficas e Cênicas), bem como a revista Cinémas e a seção canadense da parceria internacional TECHNÈS. É autor de vários livros sobre cinema, entre os quais La fin du cinéma? Un média en crise à l’ère du numérique (O fim do cinema? Uma mídia em crise na era do digital, 2013), com Philippe Marion; organizou outros como Techniques et technologies du cinéma (Técnicas e tecnologias do cinema), com Martin Lefebvre, onde foi originalmente publicado este artigo.

Nota do tradutor
O Cinema Dito dos Primeiros Tempos: um Caldo de Cultura em Plena Ebulição...

  • Adriano Carvalho Araújo e SousaI

    I - PUC/SP São Paulo (SP), Brasil

    Diferentes cineastas, por exemplo, Jean-Luc Godard, Harun Farocki, e, entre nós, um Júlio Bressane, colocam problemas da imagem para além da subordinação a uma técnica: o cinema, nesse sentido, sempre oferece um questionamento à nossa própria ideia do que sejam a imagem, o meio ou, não menos, o dispositivo...
    Então, direi que André Gaudreault está atento, desde o célebre Congresso de Brighton, a problemas da imagem. Relativiza uma história oficial do nascimento, mas também o aspecto, para usar um termo desgastado, ontológico do cinema. Em meados dos anos 2000, em parceria com Philippe Marion da Universidade de Louvain, passa a fazer uma espécie de genealogia, voltando-se para a “midiatividade” do cinema, ou seja, uma pulverização que leva a interrogar o próprio meio.
    Dessa parceria resulta, entre outros, La fin du cinéma? Un média en crise à l’ère du numérique (2013). O ensaio investiga o que ainda chamamos de cinema, através das sucessivas crises que o meio sofreu, especialmente aquela colocada pelo digital.
    As pesquisas mais recentes de Gaudreault, incluindo “O Cinema dito dos primeiros tempos”, que a revista Galáxia acolheu nesta edição, debatem o cânone historiográfico segundo o qual o ato e o critério inaugurador do cinema teriam sido a realização de “projeções luminosas de fotografias animadas”, que iria desembocar na hierarquização famigerada de “cinema de animação”.
    A historiografia institucionalizada, a morte do cinema, a retórica moderna “o fim de...”, aqui e lá, tudo é (re)visto com um espírito irônico, bem-humorado e ao mesmo tempo trazendo argumentos e conceitos que permitem avançar, por exemplo, ao apontar elementos em comum com a reflexão de Alan Cholodenko (2008) e sua crítica ao caráter fantasmagórico que Émile Reynaud e a animação têm na história do cinema.
    Gaudreault aborda a técnica e a linguagem para pensar em que se pode reconhecer o cinema no momento de sua pretensa fundação, mas também, hoje, face a transformações impostas por uma imagem digital sem materialidade fílmica, do código. Paralelamente, oferece reflexões epistemológicas: a ascensão de imagens geradas por computador acarreta, assim como os aparelhos dos primórdios do cinema, questionamentos historiográficos, culturais, semiológicos, enfim, estéticos, porque o próprio objeto passou por mutações profundas devidas às inovações tecnológicas.
    Gaudreault, um dos fundadores do Centro de Pesquisas sobre a Intermidialidade (atual CRIalt), em sua empreitada epistemológica relativiza até essa noção, que é, aliás, muito clara para propor alternativas a modelos apoiados em intertextualidade e intersemiose: olhar cosmopolita que ganha um “novo fôlego” no âmbito canadense. Quanto à tradução, procurei sempre que possível verter o estilo ensaístico do autor, suas ênfases e expressões com escolhas que, espero, restituam a força do original.

    Adriano Carvalho Araújo e Sousa é autor de Poética de Júlio Bressane: Cinema(s) da Transcriação (FAPESP/Educ, 2015) logodedalo@gmail.com

  • 1
    Aqui e ali, evoco temas que desenvolvi nesses últimos anos, trabalhando com Philippe Marion (Universidade de Louvain). Com efeito, nós assinamos vários textos e preparamos numerosas comunicações juntos, tanto e de tal modo que o pensamento que temos sobre o primeiro cinema tornou-se agora um pensamento comum. Aqui, o texto traz uma única assinatura, porque é obra de um único autor, mas um certo número de passagens se apoia sobre a “consciência” indiferenciada que nós acabamos por desenvolver juntos, meu colega e eu.
  • 2
    Pesquisa realizada no quadro dos trabalhos do GRAFICS (Grupo de Pesquisa sobre o Advento e a Formação de Instituições Cinematográficas e Cênicas), membro da parceria internacional TECHNÈS. O GRAFICS é subvencionado pelo Conselho de Pesquisas em Ciências Humanas do Canadá e o Fundo de Pesquisa do Québec – Sociedade e Cultura.
  • 3
    Estou bem consciente de que o “aparelho de base” segundo Baudry, dentro da lógica que é a sua, não se limita à câmera e no limite, conota uma coisa completamente distinta da aparelhagem técnica – como o próprio Baudry, aliás, toma o cuidado de precisar (1975, p. 59, nota de rodapé): “Assim, o aparelho de base comporta a película, a câmera, a revelação do filme, a montagem visada em seu aspecto técnico, etc., do mesmo modo que o dispositivo de projeção. Há uma grande diferença do aparelho de base para a câmera sozinha para a qual se pretendeu (deve-se perguntar por que, para servir a qual processo maléfico) que eu o limitasse.”
  • 4
    Em uma série de seis artigos intitulados “Técnica e Ideologia”, publicados nos Cahiers du cinéma em 1971 e em 1972 (n. 229, 230, 231, 233, 234-235 e 241). Os artigos foram retomados em J.-L. Comolli (2009).
  • 5
    No original intervenants, que também poderia ser traduzido por agentes ou intervenientes(N do T).
  • 6
    Agradeço a Philippe Marion, que me sugeriu esta ideia (comunicação pessoal do autor).
  • 7
    Agradeço a Philippe Gauthier a indicação deste texto.
  • 8
    Como o Moving Picture World e o Bioscope, publicados respectivamente nos Estados Unidos e na Inglaterra em 1907, o Ciné-Journal, fundado na França em 1908, etc.
  • 9
    A revista, com efeito, trazia o título de Optical Lantern and Cinematograph Journal de 1904 a 1906, antes de adotar a grafia Kinematograph, como o explica Stephen Bottomore (2005, p. 357): “Relançada como Optical Lantern and Cinematograph Journal em 1904 por um novo editor, Theodore Brown, dois anos depois, a revista passou a usar a ortografia mais ‘correta’ de ‘kinematógrafo’ (do grego).”
  • 10
    No colóquio internacional organizado pelo Centro de Pesquisas sobre a Intermidialidade, intitulado “A Nova Esfera Intermidiática”, museu de Arte Contemporânea, Montreal, 1999; Ver Gaudreault; Marion (2000, p. 21-36). No mesmo filão e dos mesmo autores, ver também 2006: p. 24-30. O modelo do duplo nascimento foi objeto de um colóquio em 2011, The Second Birth of Cinema: A Centenary Conference (O Segundo Nascimento do Cinema: Uma Conferência Centenária), que ocorreu na Universidade de Newcastle, Reino Unido, e cujas atas foram publicadas em um número especial, organizado por A. Shail, da revista Early Popular Visual Culture.
  • 11
    Data-se frequentemente de 1925 a apresentação dessa placa, mas foi na verdade em 1926 (17 de março) que houve o evento, como o confirma a entrega em 18 de março de 1926 da revista Comoedia. Ver também um resumo da cerimônia em L’Écran (jornal do Sindicato francês de diretores cinematográficos), n. 520, 20 mars 1926. Agradeço a Jean-Marc Lamotte por ter me fornecido essas informações precisas.
  • 12
    Dado que é comprovado que os Latham (Estados Unidos) com seu Panoptikon, Armat e Jenkins (Estados Unidos) com seu Phantoscope e os irmãos Skladanowsky (Alemanha) com seu Bioskop conduziram verdadeira e literalmente “projeções públicas de fotografia animada” (ainda por cima, públicas e pagas como a projeção no Grand Café), respectivamente em maio, em setembro e em novembro de 1895. O leitor interessado no tema poderá reportar-se a D. Rossel (1998) e a A. Gaudreault; T. Gunning (2009, p. 1-21).
  • 13
    Para mim e Philippe Marion, o conceito de “duplo nascimento” do cinema é uma metáfora predestinada a deixar sua marca. Sem dúvida, é preciso evitar tomá-la ao pé da letra em razão notadamente de suas conotações biológicas, que podem se mostrar desencontradas em certos contextos. Explicamos amplamente a questão no colóquio de Newcastle em 2011.
  • 14
    Agradeço a Marnie Mariscalchi por ter trazido este artigo ao meu conhecimento.
  • 15
    Agradeço a Marco Grosoli por ter trazido este artigo ao meu conhecimento.
  • 16
    Em todo caso, é o que defendi com Philippe Marion, no colóquio de Newcastle (ver A. Gaudreault; P. Marion: 2013b); ideia que nós retomamos e desenvolvemos em uma obra que acabamos de publicar: ver A. Gaudreault; P. Marion (2013a).
  • 17
    LE NOUVEL ART CINÉMATOGRAPHIQUE (1930, p. 5-6). Não há erro aqui: o artigo intitulado “Le Nouvel Art Cinématographique” é assinado exatamente por “Le Nouvel Art Cinématographique”, na revista Le Nouvel Art Cinématographique!
  • 18
    A expressão é de Bazin: “É que o cinema não é uma Arte e uma indústria, ele é uma Arte industrial.”
  • 19
    Bazin no mesmo artigo, assim prosseguia em sua reflexão: “Mas se pode bem imaginar que a evolução dessa arte por malentendido seja brutalmente interrompida pela aparição de uma técnica mais satisfatória tal como a televisão. Satisfatória não certamente do ponto de vista artístico – que não tem nada a fazer aqui – mas enquanto meio de reprodução automática da realidade. Seria preciso um idealismo pueril para crer com efeito que a qualidade artística do espetáculo cinematográfico possa defendê-lo contra as vantagens da televisão, cuja imagem realiza, para o homem moderno, o milagre da ubiquidade”. (ibidem)
  • 20
    Os quais parecem esquecer de que o sistema do prisma de espelhos, no entanto, esteve por um longo período em voga em numerosas, e bastante cinematográficas, mesas profissionais de montagem – notadamente, nas famosas Steenbeck...
  • 21
    Ainda que o aparelho imaginado por Reynaud tenha previsto, desde 1888, a projeção de imagens verdadeiramente fotográficas. Pode-se, nessa óptica, consultar a descrição anexada a um pedido de patente de invenção depositado por Reynaud dia 1º de dezembro de 1888 para o Théâtre Optique (patente de invenção n. 194482), que precisa o seguinte: “As poses que são figuradas podem ser desenhadas a mão, ou impressas por um procedimento qualquer de reprodução, em preto ou em cores, ou obtidas a partir da natureza através da fotografia” (grifos meus). A patente pode ser acessada on-line no seguinte endereço: < http://www.emilereynaud.fr/index.php/post/Brevet-d-invention-N-194-482-1888 >, acesso em 8 jan. 2014.
  • 22
    Em uma série de artigos anteriores, Cholodenko se debruçou sobre a noção de “grafo” – incluindo o grafo da fotografia – e chega a incluir a fotografia entre os elementos que iriam se combinar para dar nascimento ao dispositivo de animação. Ver entre outros A. Cholodenko (2005, p. 5-7; e 2008)
  • 23
    Em minha comunicação durante o Congresso da Society for Cinema & Media Studies (realizada em Los Angeles, em março de 2010), na qual eu defendia que não é senão a partir da institucionalização cinematográfica que é legítimo considerar a animação como uma província autônoma, ou relativamente autônoma, do cinema, porque não teria ocorrido, no curso dos primeiros anos do cinematógrafo, distinguir entre animação e cinema, esses dois “ramos” cinematográficos não formavam senão um único e mesmo conjunto. Propus também que o princípio de base do cinematógrafo era, no fundo, fazer stop motion frame-by-frame, fazer o stop motion dezesseis vezes por segundo. A concepção do aparelho para tomada de imagens prevê com efeito que se pare, essa tomada de imagens, cada vez que a película é exposta. Donde a questão seguinte: “Não poderíamos até dizer que cada filme é no fundo um filme de animação?” E a seguinte lembrança: uma das apelações de outrora para as projeções cinematográficas nos dava de imediato uma parte da resposta, visto que se dizia à época que as imagens do cinematógrafo eram “fotografias animadas”. O texto dessa comunicação foi reformulado em seguida para a o editorial coescrito com Philippe Gauthier e justamente intitulado “Guest Editorial: Could Kinematography be Animation and Animation Kinematography?” (Gaudreault; Gauthier: 2011, p. 85-91).
  • Traduzido do francês por Adriano C.A. e Sousa. Revisão técnica de Sheila Schvarzman.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2018

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2017
  • Aceito
    07 Jan 2018
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