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Construção social de uma variedade de mercados: capitalização de rendas e capitalismo de plataforma6 6 Agradeço a leitura atenta e generosa de dois pareceristas anônimos que contribuíram de forma decisiva no aperfeiçoamento desta versão.

Resumo

Este artigo pretende contribuir para alinhavar questões de uma ampla agenda de reflexões que permita avançar na construção de algumas das principais mediações teóricas e históricas para o melhor entendimento da dinâmica expansiva e contraditória do capitalismo, salientando o papel do dinheiro, das plataformas e a construção social dos mercados na atual conjuntura. Aponta como as relações entre dinheiro e mercados podem permitir uma abordagem que dialogue com a perspectiva do capitalismo de plataforma como um contexto geo-histórico de operações das atividades econômicas, cálculos e intercâmbios que são mediados por dispositivos e tecnologias digitais. Finalmente, sustenta-se que existem outros variegados e polimórficos mercados na realidade concreta do dia a dia, muito além dos mercados capitalistas, que podem se constituir em um horizonte promissor de alternativas para ações insurgentes e emancipatórias.

Palavras-chave:
capitalismo; dinheiro; mercados; capitalismo de plataforma

Abstract

This article seeks to contribute to outlining issues of a broad agenda of reflections that enable us to advance in the construction of some of the main theoretical and historical mediations for a better understanding of the expansive and contradictory dynamics of capitalism, emphasizing the role of money, platforms and the social construction of markets in the current conjuncture. It indicates how the relations between money and markets can allow for an approach that dialogues with the perspective of Platform Capitalism as a geohistorical context of operations of economic activities, calculations and exchanges that are mediated by digital devices and technologies. Finally, it is argued that there are other varied and polymorphic markets in the concrete reality of everyday life, far beyond capitalist markets, which can constitute a promising horizon of alternatives for insurgent and emancipatory actions.

Keywords:
Capitalism; Money; Markets; Platform Capitalism

Introdução

O capitalismo é a contradição em movimento permanente. Como sistema de organização social fundado em mercadorias, ele realiza mutações quantitativas e qualitativas ininterruptas e se alimenta de suas próprias metamorfoses endógenas, mas também está imerso em seus inerentes e crescentes paradoxos e armadilhas.

A expansão, a reciclagem e o relançamento cíclico em novos patamares de dilatação fazem parte de sua natureza constitutiva. Capitalismo é sinônimo de crise, pois o capitalismo é a própria propensão à crise recorrente. Esse sistema se nutre de suas próprias crises, momento disruptivo em que ele se oxigena e recondiciona, recompondo suas forças. Cada conjuntura de crise, com suas modalidades, caracteres e processos constituintes, manifesta diversificadas determinações, espacialidades e temporalidades. O momento crítico apresenta lutas e contradições entre as tentativas de valorização das variadas unidades, frações e fragmentos do capital social, com seus interesses ora díspares, ora unificados, de reprodução econômica e política. A coerção concorrencial imporá assimetricamente turbulências, destruições, recomposições, desorganizações e reconfigurações das relações entre as diversas unidades e subfrações capitalistas. Massas de riqueza serão destruídas, reconcentradas e redistribuídas.

Nesta terceira década do século XXI o capitalismo se encontra em uma crise multidimensional. Nesse contexto, este ensaio pretende contribuir para alinhavar algumas questões de uma ampla agenda coletiva de reflexões que permita, em aproximações consecutivas, avançar na construção de algumas das principais mediações teóricas e históricas para o melhor entendimento da dinâmica expansiva e contraditória do capitalismo, salientando o papel do dinheiro, das plataformas e dos mercados na atual conjuntura.

O eixo argumentativo do artigo gira em torno da ideia de que o sistema capitalista realiza transformações e ao mesmo tempo preserva a sua essência constitutiva. Serão discutidas suas principais contradições, com destaque para o dinheiro enquanto sujeito e potência que vai ao encontro consigo mesmo. Em seguida sugere-se que as articulações entre dinheiro e mercados podem abrir um diálogo promissor com a abordagem do capitalismo de plataforma, um novo modo de coordenação socioeconômica em que interações mercantis e socioespaciais são mediadas por dispositivos e tecnologias digitais. Ao final, sustenta-se que, para além dos mercados capitalistas, na conjuntura e cotidianidade, existem outros mercados, alternativos, plurais, variegados e polimórficos, que podem se constituir em um horizonte promissor de alternativas para lutas e disputas insurgentes.

Capitalismo - Mutações com Persistências: dinâmica contraditória, dinheiro, abstração-real e o encontro consigo mesmo

O capitalismo está sempre mantendo e reafirmando suas lógicas imanentes e suas determinações mais gerais e buscando se transformar para se reproduzir. Seria importante esboçar aqui algumas de suas principais características e movimentos, sejam os essenciais, próprios de sua natureza, sejam os de suas trajetórias e dinâmicas contemporâneas. Essa empreitada implica discriminar analiticamente, para efeitos de exposição e argumentação, o que é lhe constitutivo e estrutural, daquilo que lhe é mutação conjuntural. Bom lembrar que é preciso ter clareza que o capitalismo sempre exacerba o que lhe é constitutivo. Renova e aperfeiçoa seus instrumentos, lógicas e processos (re)formativos e se apresenta sob novas formas de manifestação. Há conservação e transformação simultâneas e permanentes.

Para discutir essas persistências articuladas com mutações, deve-se enfrentar a historicidade do objeto real-concreto (capitalismo), buscando reter suas determinações gerais e procurar recorrentemente decifrar as situações concretas, no tempo e no espaço.

Torna-se necessário, em um processo de aproximações sucessivas, alimentar recorrentemente mediações geo-históricas e teóricas, hierarquizando determinações e procurando balancear devidamente fatores determinantes, condicionantes e coadjuvantes no curso do movimento histórico concreto. Ou seja, ao mesmo tempo, reter as determinações gerais e decifrar as “situações reais” conjunturais. Realizar um balanço adequado das recorrências, persistências e das rupturas e transformações ao longo de um processo histórico, sem linearidades. Intentar um exercício espiralado dialético abstrato-concreto complexo, marcado por ensaios e erros, a fim de se procurar aquilatar corretamente as mais adequadas mediações históricas e teóricas e apreender a hierarquização, buscando uma síntese, das múltiplas determinações da realidade.

Uma advertência é que a análise da novidade não deve obliterar ou negligenciar as recorrências e imanências. É conveniente balancear devidamente as lógicas e os processos constitutivos e renitentes, observando simultaneamente as rupturas e as persistências no movimento histórico-sistêmico.

Com certeza a complexidade e a natureza pluridimensional da realidade não cabem em modelos analíticos generalizantes e com alto grau de abstração. Tais abordagens excluem a história e acabam procurando submeter as várias dimensões da realidade concreta ao isolamento, ao recorte arbitrário, separando e compartimentando aspectos e ângulos da concretude histórico-geográfica sob análise. Assim, torna-se possível e desejável o debruçar minucioso sobre a natureza, as lógicas imanentes e as determinações gerais e abstratas do sistema social em que estamos imersos, como algumas lembradas em seguida.

O capitalismo é uma relação social antagônica, contraditória e progressiva (de destruição criadora) marcada pelo impulso expansivo de autoacrescentamento. Como regime de organização social baseado em mercadorias e ancorado na exploração do trabalho alheio não pago (na utilização da mercadoria que é “mágica”, viva: força de trabalho), é orientado pela busca da valorização ilimitada do valor.

O modo de produção capitalista, que é produção de mercadorias por meio de mercadorias, requer alta circulação e alta taxa de rotação do capital e pressupõe a mercantilização levada às últimas consequências, com todas suas potencialidades e contradições. Esse regime de organização da produção social é orientado pelo aprofundamento e o aperfeiçoamento da divisão social do trabalho em variadas dimensões e escalas espaciais e pela expansão contínua. Ele procura, de forma ininterrupta, a incorporação e o açambarcamento de “outros” espaços externos e relações exógenas às suas bases originárias, rompendo seus próprios limites e fronteiras, em uma busca perpetua de formas de exploração e reprodução. Ou seja, o capital se reproduz sobre suas próprias bases e, ao mesmo tempo, requer a exploração de “outros” modos, mercados e ambientes socioespaciais etc., que se encontram “fora” de sua base socioespacial inicial. Ele reclama o que está fora de sua lógica interna-endógena para existir e se reproduzir, isto é, “demanda o outro”.

Sendo um sistema que tem por base decisões e cálculos privados individuais, ele apresenta a característica de ser uma economia ancorada em decisões atomizadas e autônomas que são tomadas por cada uma das unidades (constitutivas) de capital-poder. Além de possuir essa natureza decisória descentralizada, o capitalismo é uma economia monetária, orientada pelo acúmulo irrefreável do dinheiro, o que dá ao seu funcionamento as características de incerteza, instabilidade, ambiente inescapável de crise e ciclicidade.

A pressão exercida pela coerção da concorrência entre as várias unidades individuais calculativas coexistentes (subdivididas em frações do capital) não poderá ser esquivada por nenhum de seus átomos decisórios relacionais, e será crescente. “Marx entende por concorrência a ação recíproca que os vários capitais exercem entre si ao se defrontarem nos vários planos em que o mercado se faz presente.” (Possas, 1989POSSAS, M. Dinâmica e concorrência capitalista: uma interpretação a partir de Marx. São Paulo: Hucitec, 1989., p. 56). Nos espaços de mercado há a interação de uma pluralidade fracionada de/dos capitais.

A mudança estrutural da “destruição criadora” será impulsionada pelas forças coercitivas da concorrência enquanto “um processo de ruptura e transformação situada no âmago do dinamismo capitalista” (Possas, 1989POSSAS, M. Dinâmica e concorrência capitalista: uma interpretação a partir de Marx. São Paulo: Hucitec, 1989., p. 69), como na concepção de Schumpeter da pressão competitiva constante, que “cria e destrói estruturas”. Segundo ele, o que dá “o impulso fundamental e mantém em movimento a máquina capitalista” decorre dos novos produtos, métodos, arranjos organizacionais, tecnologias etc., que descortinam renovados horizontes para a acumulação de capital. A concorrência que “comanda uma vantagem decisiva” dá os fundamentos às empresas e está em “seus alicerces e em sua própria existência” (Schumpeter, 1985 [1943]SCHUMPETER, J. A. Capitalismo, socialismo e democracia. São Paulo; Zahar, 1985 [1943]., p. 114).

Como sistema ancorado na propriedade privada, individual e exclusiva, juridicamente garantida, há a prevalência e o domínio de uma classe social sobre os despossuídos dos meios de produção. Da propriedade resulta variados direitos, inclusive os de retorno assegurado de rendimentos. O (mero) monopólio privado da propriedade privada (absoluta) proporciona, como um direito intrínseco, “retornos proprietários”.

O capitalismo é, por sua imanente natureza, um sistema que se estrutura em torno da ânsia incontida e ilimitada pela acumulação de riqueza nas formas mais gerais, líquidas e abstratas. O dinheiro é o veículo que dá acessibilidade facilitada e universal ao mundo das variadas mercadorias. Por isso procura-se, de forma incontida, a retenção e a expansão de massas de dinheiro enquanto mercadoria universal-total. Busca-se, de forma desenfreada, a acumulação (infinita) de símbolos gerais (formas universais) de riqueza. Disputa-se por alcançar a riqueza em sua forma mais universal, geral, pura e abstrata possível: o dinheiro.

Rotta (2008ROTTA, T. N. Dinheiro inconversível, derivativos financeiros e capital fictício: a moderna lógica das formas. 2008. Dissertação (Mestrado em Economia) - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008., p. 150) sintetiza com precisão esta problemática, demonstrando como “a troca generalizada precisa primeiro ser mediada, assumindo uma forma objetiva diferente de si mesma. O dinheiro, como objeto autônomo, realiza a passagem do particular ao geral”.

Por seu turno, o capital financeiro

é o dinheiro que se tornou mercadoria, isto é, mercadoria-dinheiro. O objeto de mediação, o dinheiro, torna-se coisa mediada, mas como o meio efetivo é o próprio dinheiro, medeia-se ele consigo mesmo. O capital financeiro é a mediação do dinheiro consigo mesmo e assim sendo, enquanto capital financeiro, assume uma finalidade interna, com a possibilidade de se pôr como sujeito. (Rotta, 2008ROTTA, T. N. Dinheiro inconversível, derivativos financeiros e capital fictício: a moderna lógica das formas. 2008. Dissertação (Mestrado em Economia) - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008., p. 151-152).

Em um contexto em que a forma dinheiro tende à autonomização e à substantivação, ao encontro consigo mesmo, as contradições sistêmicas vão se exacerbando e serão colocadas, crescentemente, em uma espécie de “fuga para a frente”, sempre em novos patamares paradoxais e desafiadores. Esta lógica tornar-se-á um abstraimento totalizante, a partir de um movimento constante de metamorfoses, isto é, de mudança e sofisticação permanentes de formas.

Historicamente, o capital se forma a partir da riqueza formada no comércio e na usura, isto é, do acúmulo de dinheiro. Tanto no comércio de mercadoria quanto no comércio de dinheiro, o resultado da operação do capital mercantil é um fluxo monetário (há ao final do período uma massa de dinheiro, em sua mais forma ideal, líquida, geral e abstrata, maior do que aquela do início da operação). Ou seja, a lógica comercial-usurária da circulação de mercadorias e circulação monetária orienta-se e resulta no dinheiro.

Se este dinheiro é cedido, é lançado na circulação na forma de empréstimo, transformando-se em capital. Segundo Marx (2017MARX, K. O capital: crítica da economia política - o processo global de produção capitalista. São Paulo: Boitempo , 2017 [1894]. Livro III. [1896], p. 411),

é o que acontece com o capital portador de juros, e justamente isso constitui seu caráter específico. O possuidor de dinheiro, que quer valorizá-lo como capital portador de juros, aliena-o a um terceiro, lança-o na circulação, converte-o em mercadoria como capital; e não só como capital para ele mesmo, mas também para outros; ele não é capital apenas para quem o aliena, mas é desde o início transferido a um terceiro como capital, como valor que possui o valor de uso de criar mais-valor, lucro; como um valor que conserva a si mesmo no movimento e que, depois de ter funcionado, retorna àquele que o desembolsou originalmente, no caso em questão, ao possuidor do dinheiro; portanto, um valor que só por algum tempo permanece distante de quem o desembolsou, que só transita temporariamente das mãos de seu proprietário para as mãos do capitalista em atividade.

A busca da acumulação ilimitada de símbolos gerais e formas universais de riqueza e as tentativas de capitalização de (qualquer) fluxo de rendas, leva à consolidação do juro7 7 “Uma vez que o futuro será formado pelo resultado do conjunto de medidas e convicções dos diversos agentes econômicos, o manejo da taxa de juros proporciona ainda um efeito de referência para decisões e expectativas sobre as condições de liquidez para a realização de investimento e consumo futuro.” (Belluzzo; Galípolo, 2021, p. 88). como o padrão geral de remuneração do capital. O “juro é a renda que o capital monetário propicia a seu detentor pelo mero efeito da propriedade” (Paulani, 2016PAULANI, L. M. Acumulação e rentismo: resgatando a teoria da renda de Marx para pensar o capitalismo contemporâneo. Brazilian Journal of Political Economy, v. 36, n. 3, p. 514-535, 2016. , p. 525).8 8 John Maynard Keynes, em 1936, já bem definia a taxa de juro como um prêmio e criticava o domínio dos rentistas, denunciando o “poder cumulativo de opressão do capitalista em explorar o valor de escassez do capital. A taxa de juro atual não compensa nenhum verdadeiro sacrifício (...), não há razões intrínsecas para a escassez do capital” (Keynes, 1983 [1936], p. 255). As decisões de aplicação de capital-dinheiro ficam orientadas, e depois dirigidas, pelos sinais dos juros. Nesse contexto, ocorre a invasão e a prevalência da lógica patrimonial, especulativa e fictícia de valorização e seu poder de orientar a avaliação e a gestão geral sobre todas as outras frações de capitais.

Afirma-se a submissão do sistema econômico, em geral, aos imperativos da lógica financeira da acumulação: com o encurtamento dos horizontes temporais, a busca de lucros rápidos no curto prazo, os refúgios mais seguros possíveis e a fuga dos riscos.

É no capital portador de juros que a relação capitalista assume sua forma mais exterior e mais fetichista. Aqui deparamos com D -D’, dinheiro que engendra mais dinheiro, valor que valoriza a si mesmo, sem o processo mediador entre os dois extremos. (Marx, 2017MARX, K. O capital: crítica da economia política - o processo global de produção capitalista. São Paulo: Boitempo , 2017 [1894]. Livro III. [1896], p. 464).

Mesmo que estando sempre presente ao longo da história capitalista, ainda que em germe, esse sistema de acumulação contínua conduziu ao momento em que o capital “se encontrou consigo mesmo” (em um processo dialético de abstração-real). Ele está agora diante de si, defronte suas determinações mais gerais e abstratas: validando a autonomização do capital-dinheiro sob a forma de capital a juros - a “valorização pela valorização” (D- D’) - e ratificando a prevalência da forma fictícia sobre as outras formas de manter, conservar, preservar e expandir a riqueza.

Ao conformar-se enquanto ser/totalidade desenvolvida (expansiva e autodeterminante), o capital se encontra orientado apenas pelo “impulso absoluto ou mania de enriquecimento, como uma forma particular de pulsão” (Marx, 2011MARX, K. Grundrisse: manuscritos econômicos de 1857-1858 - Esboços da crítica da economia política. São Paulo: Boitempo, 2011 [1857-1858]. [1857/1858], p. 165), pois ele “engendra suas próprias condições de existência (...) Já não precisa de pressupostos para se desenvolver; ele mesmo está pressuposto; partindo de si, cria os pressupostos de sua conservação e crescimento” (Rosdolsky, 2011 ROSDOLSKY, R. Gênese e estrutura de O Capital de Karl Marx. Rio de Janeiro: Contraponto, 2001 [1968].[1968], p. 220).

Nesse contexto, importa relembrar os desdobramentos lógico-genéticos, desde as formas mais simples até as mais complexas, desenvolvidas e desdobradas em O Capital, de Marx, em que há “uma sucessão, que vai da Mercadoria ao Dinheiro, ao Capital em função, e ao Capital portador de juros e seu desdobramento, o capital Financeiro, chega-se pôr fim, à forma mais desenvolvida, o Capital Fictício” (Carneiro, 2019CARNEIRO, R. Acumulação fictícia, especulação e instabilidade financeira. Parte I: uma reflexão sobre a financeirização a partir de Marx, Keynes e Minsky. Economia e Sociedade, v. 28, n. 2, p. 293-312, 2019., p. 295).

Ainda de acordo com Carneiro (2019CARNEIRO, R. Acumulação fictícia, especulação e instabilidade financeira. Parte I: uma reflexão sobre a financeirização a partir de Marx, Keynes e Minsky. Economia e Sociedade, v. 28, n. 2, p. 293-312, 2019., p. 297):

Ao formular o conceito de capital portador de juros, Marx ([1894], 2017) distingue esta, que é a forma geral do capital (D-D’), da sua forma particular (D-M-D'). A primeira é uma relação de propriedade amparada numa estrutura jurídica, e formas variadas de contratos, por meio das quais o proprietário da mercadoria capital cede temporariamente seu valor de uso a terceiros. A forma por excelência da remuneração do capital propriedade é o juro, definido em cada momento do tempo de modo contingente, pela correlação de forças entre prestamistas e prestatários. Um aspecto lógico-histórico de grande relevância a destacar é que o capital portador de juros, se origina da circulação do capital em função e depois se autonomiza. Assim, tanto nos ciclos de produção quanto nos de investimento, o capital assume formas materiais e formas líquidas (dinheiro).

Palludeto e Rossi (2018PALLUDETO, A. W. A.; ROSSI, P. O capital fictício: revisitando uma categoria controversa. Unicamp - Instituto de Economia, Texto para Discussão, n. 347, 2018., p. 16-17) também apresentam

o capital fictício como um desdobramento lógico-genético do capital portador de juros e propõem que o mesmo seja definido a partir de três atributos-chave: a renda futura, o mercado secundário e a inexistência real (...) essa categoria redefine o cálculo capitalista que passa a incorporar a capitalização como um princípio central tanto para avaliação da riqueza existente quanto para realização de novos empreendimentos.

O processo de acumulação fictícia na atual conjuntura de financeirização ativa veio (“apenas”) consolidar e sancionar essa lógica que se encontrava in nuce nas trocas e na circulação e acumulação monetárias.

A dita “financeirização não é uma deformação do capitalismo, mas um “aperfeiçoamento” de sua natureza. Na incessante busca da “perfeição”, ou seja, na busca de dinheiro a partir de dinheiro, o capitalismo excita esperanças de enriquecimento e solapa as ilusórias realidades da “economia real”. (Belluzzo; Galípolo, 2021BELLUZZO, L. G. M.; GALÍPOLO, G. Dinheiro: o poder da abstração real. São Paulo: Contracorrente, 2021., p. 136).

Chegou-se, assim, ao auge de um capitalismo entranhado e dominado pela lógica monetária-financeira que preside as decisões e avaliações de aplicação de capital. O curtoprazismo, a orientação pelos acionistas, a lógica da assetization, que busca transformar coisas em ativos (Birch; Muniesa, 2005BIRCH, K.; MUNIESA, F. Assetization: turning things into assets in technoscientific capitalism. Cambridge: The MIT Press, 2020.), que preferimos denominar de mercadejação exacerbada, isto é, a tentativa utópica de generalização do processo de formatação e reformatação de (novos e velhos) mercados. A orientação geral do funcionamento sistêmico é no sentido da capitalização das receitas e rendas regulares, consolidando a natureza cada vez mais fetichizada da acumulação e a orientação pelos símbolos e significados mais universais de riqueza.

De acordo com Marx:

A formação do capital fictício tem o nome de capitalização. Para capitalizar cada receita que se repete com regularidade, o que se faz é calculá-la sobre a base da taxa média de juros, como o rendimento que um capital, emprestado a essa taxa de juros, proporcionaria”. (Marx, 2017MARX, K. O capital: crítica da economia política - o processo global de produção capitalista. São Paulo: Boitempo , 2017 [1894]. Livro III. [1894], p. 524, grifos do autor).

No capitalismo, se formam fluxos de rendas, uns provenientes dos rendimentos auferidos ou esperados que são resultados (“extraordinários”) derivados das operações das atividades empresariais e outros que são resultados (“normais”), garantidos, decorrentes do simples fato de se deter uma propriedade privada. As rendas passarão necessariamente por processos de capitalização.

Ao desenvolverem-se o capital portador de juros e o sistema de crédito, todo capital parece duplicar e às vezes triplicar pelos diversos modos em que o mesmo capital ou o mesmo título de dívida aparece sob diferentes formas em diferentes mãos. Esse “capital monetário” é, em sua maior parte, puramente fictício. (Marx, 2017MARX, K. O capital: crítica da economia política - o processo global de produção capitalista. São Paulo: Boitempo , 2017 [1894]. Livro III. [1894], p. 527).

A lógica fictícia de valorização veio capitalizar virtualmente todos os diversos fluxos de rendimentos “fazendo-os dialogar” (realizando a mediação) com determinada taxa de juros, enquanto parâmetro geral do enriquecimento privado. “A formação do valor do capital fictício é a capitalização de um fluxo esperado de rendimentos à taxa de juros convencionalmente utilizada.” (Palludeto; Rossi, 2018PALLUDETO, A. W. A.; ROSSI, P. O capital fictício: revisitando uma categoria controversa. Unicamp - Instituto de Economia, Texto para Discussão, n. 347, 2018., p. 8).

A lógica da capitalização e da financeirização fictícia invadem todo os escaninhos do sistema de avaliações capitalistas. Ao final do processo, a “capitalização torna-se, assim, potencialmente extensivo a todo tecido socioeconômico, redefinindo o cálculo capitalista e, assim, a própria forma de precificação” (Palludeto; Rossi, 2018PALLUDETO, A. W. A.; ROSSI, P. O capital fictício: revisitando uma categoria controversa. Unicamp - Instituto de Economia, Texto para Discussão, n. 347, 2018., p. 13).

Em síntese, poderíamos afirmar que o capital fictício é um desdobramento da forma do capital portador de juros e trilha o caminho inverso. Se no capital portador de juros um montante de dinheiro entregue a outrem dá direito a um fluxo de renda futura para quem o cedeu; no capital fictício pressupõe-se o contrário: um fluxo de renda futura dá direito a um montante de dinheiro no presente para quem o possui.

Veremos em seguida como o sistema na atualidade exacerbou sua lógica fundante de ser um extrator voraz, “automatizado”, de busca, a todo custo, da extração de rendas diversificadas. O movimento sistêmico se apropria e coloniza rendas, capitalizando-as, e busca criar nossos horizontes de valorização dos capitais e forma, formata ou renova mercados variados, alguns inéditos. Também utiliza novos aparatos, dispositivos e mecanismos para o seu avanço evolutivo, como os digitais, conforme apontado abaixo.

Mercados e cálculos para a extração e capitalização de rendas: o Capitalismo de Plataforma e os intercâmbios mediados por dispositivos e tecnologias digitais

Será desenvolvida em seguida a argumentação de que, na atualidade, o capitalismo de plataforma9 9 Entendemos por capitalismo de plataforma uma fase do sistema em que modos de coordenação sociais, econômicas e institucionais sob uma lógica de informações algorítmicas, dominados por poderosos atores big techs, agilizam interações mercantis e socioespaciais que são mediadas por dispositivos e tecnologias digitais. (Kenney; Zysman, 2020KENNEY, M.; ZYSMAN, J. The platform economy: restructuring the space of capitalist accumulation. Cambridge Journal of Regions, Economy and Society, n. 13, p. 55-76, 2020.; Pessanha, 2020PESSANHA, R. M. Inovação, financeirização e startups como instrumentos e etapas do capitalismo de plataforma. In: GOMES, M. T. et al. (org.). Geografia da inovação: território, redes e finanças. Rio de Janeiro: Consequência, 2020. p. 433-468.; Srnicek, 2018SRNICEK, N. Capitalismo de plataformas. Buenos Aires: Caja Negra, 2018.; Langley; Leyshon, 2017LANGLEY, P.; LEYSHON, A. Platform capitalism: the intermediation and capitalisation of digital economic circulation. Finance and Society, v. 3, p. 11-31, 2017.), financeirizado e extrativo de rendas diversas, é como um ápice da lógica capitalista descrita anteriormente neste ensaio. A orientação fictícia e de capitalização exacerbada neste novo ciclo capitalista busca inovativamente o encontro consigo mesmo, com sua lógica imanente mais profunda, operando, cada vez mais, transações mediadas digitalmente em seu benefício.

Poder-se-ia afirmar que é o momento de cúspide do sistema, que vai se sofisticando e se tornando “mais puro” em relação às suas determinações constitutivas mais profundas, ampliando seu exercício de poder, incluindo o de dominação abstrata. Sob a inspiração de Fernand Braudel (2005BRAUDEL, F. Civilização material, economia e capitalismo. São Paulo: Martins Fontes. 2005 [1979]. [1979]), Jamie Peck e Rachel Phillips (2020PECK, J.; PHILLIPS, R. The platform conjuncture. Sociologica, v. 14, n. 3, p. 73-99, 2020., p. 73), afirmam que “o capitalismo de plataforma está, portanto, localizado na zona opaca ‘por onde vagam os grandes predadores’, com suas características condições de monopolização, poder econômico e político concentrado e culturas de evasão regulatórias sistemáticas”. Citando Grabher e König (2020GRABHER, G.; KÖNIG, J. Disruption, embedded: a polanyian framing of the platform economy. Sociologica, v. 14, n. 1, p. 95-118, 2020.), eles tomam a definição desses de que a plataforma é um modo emergente de coordenação socioeconômica, que apresenta simultaneamente dimensões e ingredientes econômicos, sociais, institucionais e tecnológicos.

O capitalismo, financeirizado e em crise crônica, reconcentra e recentraliza seu poder, acelerando suas inovações, aperfeiçoando seus instrumentos e dispositivos, agilizando a busca por novos horizontes e ritmos de valorização, formando e reformatando mercados e espaços para a troca, a interação e o intercâmbio. É como se todos os operadores do capital se tornassem, antes de tudo, mercadores e negociadores, diretamente ou indiretamente, de dinheiro. Há uma crescente plataformização da extração de rendas variadas (circulatórias; informativas; de propriedade minerária, fundiária, imobiliária etc.), capitalizando-as.

Os serviços de interação e intermediação vendem a possibilidade da interação em uma lógica exacerbada daqueles “atos volitivos” do intercâmbio humano, descritos por Marx (1980MARX, K. O capital: crítica da economia política - o processo de produção do capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980 [1867]. Livro I. [1867]) no Capítulo 2 do “Livro I” de O Capital, em que ele caracteriza “O processo de troca”, mas também em suas análises da natureza do capital mercantil e financeiro (na “Parte IV” do “Livro III”). Atos que buscam constituir espaços de encontro e “relações recíprocas” entre compradores e vendedores, criando acordos e nexos interpessoais e unindo dois pontos no espaço-tempo (two-sided markets), segundo Muellerleile (2020MUELLERLEILE, C. Plataforms, merchants and market space. In: BERNDT, Christin; PECK Jamie; RANTISI Norma M. (ed.) Market/place: exploring spaces of exchange. Newcastle upon Tyne: Agenda Publishing , 2020.). As contradições postas na dialética do ato de troca (processo simultaneamente individual e social) tendem a se exacerbarem com a sua multiplicação no tempo e no espaço. O intercâmbio contínuo de bens e serviços permutáveis e alienáveis reciprocamente, por vontade mútua, busca, em última instância, o alívio e o repouso “final”, “cristalizando-se na forma de dinheiro”, sobretudo nos momentos de dificuldade (crise) de validação social dos trabalhos individuais que jazem por trás de cada mercadoria. Isto é, estes atos mercantis colocam “uma determinada mercadoria especial em relação com uma mercadoria universal (o dinheiro)”, “realizando valor por meio de um processo social” (Marx, 1980 [1867]MARX, K. O capital: crítica da economia política - o processo de produção do capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980 [1867]. Livro I.). A novidade do capitalismo de plataforma é que agora não há necessariamente o encontro face-a-face em um ponto físico e fixado do espaço, mas a utilização crescente de dispositivos e estruturas digitais. Realiza-se agora no “mundo virtual” a mediação e a intermediação das “mercadorias que entram no processo de troca buscando realizar o salto mortal da conversão em dinheiro”, com o trabalho nela contido intentando “possuir forma socialmente útil, ou de ser reconhecido como elemento da divisão social do trabalho” (Marx, 1980 [1867]MARX, K. O capital: crítica da economia política - o processo de produção do capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980 [1867]. Livro I., p. 119), ou seja, “atrair dinheiro”.

Já no Capítulo 3 de O Capital, “O dinheiro ou a circulação de mercadorias”, Marx discute como as mercadorias buscam sua conversão em dinheiro e as trocas antes simples, vão se complexificando, subdividindo e sofisticando, assim como os desejos das pessoas vão se multiplicando. Ele sustenta que: “a divisão social do trabalho tanto especializa seu trabalho, quanto pluraliza suas necessidades”, de modo que “os componentes dispersos do organismo social de produção, configurados na divisão social do trabalho”, são reunidos no espaço do intercâmbio e “a independência recíproca das pessoas se integra num sistema de dependência material de todas as partes” (Marx, 1980 [1867]MARX, K. O capital: crítica da economia política - o processo de produção do capital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980 [1867]. Livro I., p. 121, grifos do autor).

Cabe lembrar que as relações sociais em economias monetárias, como as capitalistas, são tecidas por “cisões e decisões” (Schwartz, 1991SCHWARTZ, G. Decifre a economia. São Paulo: Saraiva, 1991.), divisão entre unidades decisionais, de classe, por exemplo, e o processo de utilização de plataformas digitais veio exacerbar aquela lógica de constituição e evolução de espaços de encontro, interações sociais e intercâmbios entre diferentes unidades seccionadas pelo processo social.

Não obstante, não se deve visualizar apenas o lado da lógica da intermediação que as plataformas proporcionam e agilizam. Elas, através de suas “infraestruturas”, logram acumular riqueza e poder, criam dependência de uso de seus aparatos e dispositivos, mesmo “não produzindo algo per se, mas sobretudo extraindo renda, coordenando, rastreando o processo de circulação via redes digitais” (Muellerleile, 2020MUELLERLEILE, C. Plataforms, merchants and market space. In: BERNDT, Christin; PECK Jamie; RANTISI Norma M. (ed.) Market/place: exploring spaces of exchange. Newcastle upon Tyne: Agenda Publishing , 2020., p. 253).

Em outras palavras, podemos assim interpretar as plataformas como instrumentos extratores de renda, que detectam, monitoram e promovem a circulação mercantil (movimentação de mercadorias, informações e de dinheiro) através de seus aparatos sociotécnicos digitais.

Nesse sentido, as plataformas se constituem em sistemas de mediação, avaliação e estabilização de “formas de espacialidade dispersa do trabalho social abstrato (...) elas são como novos ‘spatial fix’ para o capital” (Muellerleile, 2020MUELLERLEILE, C. Plataforms, merchants and market space. In: BERNDT, Christin; PECK Jamie; RANTISI Norma M. (ed.) Market/place: exploring spaces of exchange. Newcastle upon Tyne: Agenda Publishing , 2020., p. 253). Elas podem auxiliar na configuração de arranjos, ajustamentos, soluções e na fuga para a frente expansiva intrínseca ao movimento do capital, reorganizando espaços de operação mercantil, engendrando novas mercadorias e serviços e provocando “novas classes de trabalhadores e capitalistas” e novos marketplaces, através da lógica de operação do que se configura como uma espécie de plataform fix (Muellerleile, 2020MUELLERLEILE, C. Plataforms, merchants and market space. In: BERNDT, Christin; PECK Jamie; RANTISI Norma M. (ed.) Market/place: exploring spaces of exchange. Newcastle upon Tyne: Agenda Publishing , 2020.).

A plataformas agilizam, mas também criam, espaços de mercados novos. Se, conforme discutido na próxima seção, os mercados são dispositivos coletivos calculativos (Callon; Muniesa, 2005CALLON, M.; MUNIESA, F. Peripheral vision: economic markets as calculative collective devices. Organization Studies, v. 26, n. 8, p. 1229-1250, 2005.), pode-se afirmar que as plataformas digitais se constituem também em dispositivos coletivos calculativos. É preciso organizar um espaço de ordenamento de expectativas, o que exige que se desenvolvam avaliações rotineiras e normalizadas de extração de resultados, “estimativas do curso da ação”, associadas a determinado bem ou serviço (Callon, 1998CALLON, M. (ed.). The laws of the markets. Oxford: Blackwell, 1998.). Dada a natureza, as qualidades e as características dos bens transacionáveis, que precisam ser valorados, estando em um ambiente envolto inescapavelmente em incerteza, é preciso tornar o cálculo factível: criar arranjos que possibilitem e aperfeiçoem os cálculos e fortalecer as práticas calculativas que permitem a circulação, tratamento, tradução, estratificação, classificação, interpretação e análise dos dados e informações, que vão criando os contornos de cada mercado específico (Callon; Muniesa, 2005CALLON, M.; MUNIESA, F. Peripheral vision: economic markets as calculative collective devices. Organization Studies, v. 26, n. 8, p. 1229-1250, 2005.).

Assim, as plataformas são aparatos e arranjos que dão suporte e facilitam as interações interpessoais e promovem modos de coordenação entre as ações transacionais entre os diferentes agentes que são colocados em contato. Nessas interações, diversas práticas calculativas de agentes com capacidades diferenciais são estabelecidas, dispositivos de cálculos são criados e aperfeiçoados e dinâmicas de tentativa e erro são realizadas, garantido o estabelecimento das transações mercantis, que se concluem com determinados resultados das negociações instauradas.

Nos sistemas digitais das plataformas, mercados vão sendo performados e configurados. Algumas expectativas e leituras da realidade do ambiente de mercado vão sendo compartilhadas. Vão se cristalizando momentaneamente algumas ocorrências e acontecimentos a partir de certas operações razoavelmente rotinizadas. Algumas dessas operações, com regularidade e determinada racionalidade, se veem sendo frustradas, outras, ajustadas e que consolidadas, engendrando certo regramento. Ao longo do tempo, quando tomam a forma de práticas regulares, geralmente com o auxílio de artefatos técnicos e socioinstitucionais (planilhas, instrumentos jurídicos, de registro, algoritmos, etc.), tais operações acabam elaborando uma gramática calculativa que se constitui em “laboratório” de práticas e experimentações. Esses ambientes de criação são espaços privilegiados para se “conceber e imaginar dispositivos estatísticos, formas de propriedade etc.”. São espaços de testes e ensaios variados, que coletam informações, experimentam ações e engendram iniciativas novas ou adaptadas. Essa dinâmica imaginativa vai garantindo atuações que são parametrizadas e normalizadas e acabam consolidadas em um market-plataform fix, ou seja, um arranjo sociotécnico que se configura como um espaço de interação, troca e negociação.

É preciso ter meios, dispositivos e mecanismos que permitam cálculos e que “os compromissos sejam alcançados” (Callon; Muniesa, 2005CALLON, M.; MUNIESA, F. Peripheral vision: economic markets as calculative collective devices. Organization Studies, v. 26, n. 8, p. 1229-1250, 2005., p. 1235), ter posicionamentos que definam um campo de competição, mas, sobretudo, “é preciso singularizar um bem para torná-lo calculável (...) um bem torna-se singularizável, e então calculável, só apenas depois das operações de extração, tradução e reformatação”.

Nesse sentido, uma viagem de Uber, uma encomenda de alimento por aplicativo, um aluguel de acomodações através do Airbnb, o uso de uma “maquininha de pagamento”, uma consulta no Google etc., singularizam e estabilizam uma mercadoria-serviço e um mercado calculáveis.

“O Mercado” e os vários e polimórficos mercados existentes para além dos mercados capitalistas

Há no momento uma ampla frente acadêmica de construção de uma economia política e geográfica, ou uma geoeconomia política, dos mercados e do processo de mercadejação (Berndt; Peck; Rantisi, 2020BERNDT, C.; PECK, J.; RANTISI, N. M. (ed.) Market/Place: exploring spaces of exchange. Newcastle upon Tyne: Agenda Publishing, 2020.; Berndt; Boeckler, 2023BERNDT, C.; BOECKLER, M. Geographies of marketization: Studying markets in postneoliberal times. Progress in Human Geography, v. 47, n. 1, p. 124-140, 2023.). Ela pode auxiliar, em muito, no entendimento da complexa dinâmica do capitalismo atual.

Muito distante da visão da corrente principal e hegemônica da chamada ciência econômica, das mídias e do senso comum sobre a onipresença e a ação mecânica do tal “Mercado”, há uma infinidade de mercados se estruturando, existindo e “funcionando” na realidade concreta, corriqueira, cotidiana e mundana. Não existe o tal “Mercado”, puro, geral-abstrato, ente naturalizado pelos economistas neoclássicos e pelo pensamento conservador, tornado ideologicamente uma verdade evidente e banalizada. Tal entidade não existe na forma propagandeada de um mecanismo abstrato e homogeneizante, que impõe e está baseado em decisões individualizadas e atomísticas de entes plenamente racionais, equipotentes, que estão submetidos a uma lei objetiva e cega da “oferta e demanda”.

Visto como ente autodelimitado, autoajustável, “livre”, “puro”, autocontido e autoconfinado, que impõe sua lógica inexorável de forma autônoma e “sem as impurezas” humanas, a abstração-Mercado infunde-se cotidiana e hegemonicamente como a narrativa generalizada e incontestável.

Estranho que, mesmo na chamada “ciência econômica”, pouco se tenha avançado na teorização mais consistente sobre: o que é um mercado? qual a sua natureza? quais seus mecanismos de funcionamento? como ele é formado e se desenvolve? dentre muitas outras questões. Por outro lado, geralmente se encontra “a simples reprovação por parte da perspectiva crítica” (Magalhães, 2020MAGALHÃES, F. N. C. Da construção socioespacial dos mercados aos avanços da financeirização. Geousp, v. 24, n. 2, p. 279-296, ago. 2020.), não vendo os mercados como construções sociais.

Na realidade concreta, o que existe é uma pluralidade de polimórficos mercados, que não devem ser naturalizados ou tomados como o reino da liberdade, do agir individual-racional e espontâneo. Mercados ou economias não devem ser vistos como antípodas de Estado ou da política. Eles têm natureza eminentemente multifacetada, se apresentando sempre segundo formas contextualizadas e configurações heterogêneas em cada tempo e lugar. Como um similar teórico a uma visão crítica do espaço social, ou de suas variadas escalas, o mercado é uma produção social conflituosa, contingente e relacional, tendo fronteiras em contestação e em movimento. Assim, mercados são construtos sociais expressos e amparados em relações e interações interpessoais complexas. São formas não-estáticas, não-rígidas ou não-uniformes, mas plásticas, híbridas, contextuais e plurais, que requerem enquadramento e molduras institucionalizadas, para que logre dar estabilidade às relações sociais dinâmicas e mutantes. Ou seja, essas formas-mercado são sensíveis às trajetórias geográficas e históricas, portanto, têm sensibilidade espaço-temporal e têm pouco sentido quando vistas de maneira geral e em alto nível de abstração (Berndt; Peck; Rantisi, 2020BERNDT, C.; PECK, J.; RANTISI, N. M. (ed.) Market/Place: exploring spaces of exchange. Newcastle upon Tyne: Agenda Publishing, 2020.).

Os mercados operam em contexto espesso de arranjos institucionais, legislações, regras, convenções, práticas informais, conformando uma rede de relações entre atores coletivos. Além disso, no entorno dos mercados são constituídas estruturas e relações sociais, de poder e significações que operam para estabilizar, estabelecer e performar mercados. As experimentações sociais vão, assim, engendrando oportunidades de constituição (social) de variegados mercados (Fligstein, 2001FLIGSTEIN, N. The architecture of markets: an economic sociology of twenty-first-century capitalist societies. Princeton: Princeton University Press, 2001.).

Como não existe o “Mercado” na sua forma pura, na prática empírica, imediata, pragmática e plural (no real-concreto, cotidianamente horizontal e mundano, no terreno da vida do dia a dia), os mercados realmente existentes são exigentes de regulação, o que requer a ação de forças contrabalanceadoras e estabilizadoras. A fim de que se estabeleçam as regularidades e racionalidades próprias ao funcionamento concreto dos mercados, é preciso que se concretizem processos de parametrização, que são critérios, padrões estabelecidos socialmente, que, ao serem fixados e firmados em interação dinâmica em rede, vão escorando e tentando delimitar as fronteiras móveis dos mercados. Assim, um processo social ativo, dinâmico, descentralizado, interdependente e complexo vai simultaneamente consolidando (erigindo fronteiras) entre “o que é” aquele mercado e descartando (segundo determinada divisão social do trabalho) “o que não é” aquele mercado. Tal processo intricado paulatinamente estabelece e estabiliza suas propriedades e características específicas, em longos processos de aprendizado, ensaios e erros, que definirão a sua trajetória particularizada.

As pesquisas sobre os diversos mercados precisam, assim, defender e desenvolver uma abordagem não-estática de como são preparados, moldados e formados cada um dos mercados específicos.

Ao longo do tempo e do espaço vão se delimitando e estabelecendo os contornos e os limites entre “o que está dentro” e “o que está fora” nas ambivalentes relações mercado versus não-mercados, ou seja, entre as formas e lógicas mercantis e as não-mercantis. Mecanismos e dispositivos deverão apoiar a delimitação dos loci, das “arenas”, que moldarão os mercados particulares. Espaços específicos deverão amparar e emoldurar as negociações e transações que são entabuladas entre os seres humanos, estabilizando o chamado ambiente de negócios. Será necessário ir estabelecendo e estabilizando modos habituais de agir. Torna-se crucial fronteirizar os limites de cada um dos mercados existentes e em formação através de práticas, conversações, narrativas e convenções, para se firmar, aos poucos, um agenciamento sociotécnico calculativo (Callon, 2021CALLON, M. Markets in the making: rethinking competition, goods, and innovation. New York: Zone Books, 2021.). Ou seja, é preciso ir armando um enquadramento dotado de fórmulas de ação negocial, costumes, verdadeiros templates e scripts (Berndt; Peck; Rantisi, 2020BERNDT, C.; PECK, J.; RANTISI, N. M. (ed.) Market/Place: exploring spaces of exchange. Newcastle upon Tyne: Agenda Publishing, 2020.) que possam orientar estimativas e avaliações da riqueza produzida e em circulação.

No sentido de bem amparar as operações mercantis em curso, diligenciando os cômputos, os exercícios contábeis, atuariais e de registro em geral, gerando e organizando dados e informações etc., e, desse modo, fazendo evoluir a capacidade para estimar os valores e as valorizações. Nesse contexto, procedimentos processuais práticos, trocas organizadas de ideias e conhecimentos, traduções específicas, conversações específicas entabuladas, princípios de atuação, engendrando uma verdadeira gramática de ação, celebração de acordos, desenvolvimento e consolidação de um saber-fazer próprio daquele espaço de mercado, que vão garantindo a sua cristalização e consolidação. Aprendizado coletivo de operacionalização é a grande resultante de um longo processo de decantações.

Nesse contexto, a estabilidade de relações e as interações técnico-sociais requerem a mediação de dispositivos, regras, lógicas, arranjos institucionais, instrumentos e aparatos jurídicos. Portanto, o Estado (assim como as várias formas estatais e estatalidades) estará sempre implicado na formação e instituição desses mercados. Ou seja, o chamado “mercado autorregulado” é uma remarcada utopia, como já afirmava Polanyi (2012POLANYI, K. A grande transformação: as origens da nossa época. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012 [1944]. [1944]).

Os mercados apresentam delimitações móveis, incompletas (em disputa mercado/não-mercado), com contornos e fronteiras contestadas, sempre em disputa, em curso. Há movimentos contínuos de suas bordas porosas, ora estabelece/estabiliza, ora ultrapassa/transborda suas fronteiras. Mercados são também cadeias de interação entre elementos heterogêneos (Berndt; Boeckler, 2023BERNDT, C.; BOECKLER, M. Geographies of marketization: Studying markets in postneoliberal times. Progress in Human Geography, v. 47, n. 1, p. 124-140, 2023.).

É necessário ter predisposição para o desenrolar daquela relação negociadora interpessoal e forjar instrumentos para calcular compromissos, avaliar e reavaliar consentimentos. São requeridos, desse modo, que se organize um particularizado mercado e que se assegure alguma garantia ou anteparo contra sobressaltos ou rupturas abruptas das situações em curso. Exige-se que se desenvolva um ecossistema de relações baseadas na manutenção, preservação, permanência e continuidade do ambiente e a “persistência contextual” das características estabelecidas (e “em vigor”) instituídas socialmente naquele espaço de mercado. Nesse lócus se formam convenções, com as características de acordos pactuados para o entendimento recíproco, para acomodações frequentes, que muitas vezes afirmam sua natureza de acerto tácito, implícito, subentendido, idiossincrático e não-formalizado. Assim, se “delimitam” mercados.

Assim, descortinam-se trajetórias diversificadas e heterogêneas e experimentação aberta, como margens de manobra e configurações amplas, em diferentes vias e modalidades de formação e estruturação de mercados. O que se apresenta nos espaços sociais das transações, em interações interpessoais de troca, são “experiências comuns-ordinárias” que se estabelecem no lugar de mercado (marketplace). Ou seja, o processo histórico e geográfico revela diferentes formas de desenhar/estabelecer (constituir) mercados, em uma composição (disposição) dinâmica e diversificada de arranjos plurais de formas mercantis e não-mercantis, que sempre podem ser, em tempos e em espaços específicos, re-combinados e re-formatados.

Os seres humanos, nos mais diferentes lugares, promovem experiência social sem fim de organização de mercados em seu dia a dia. Este funcionamento cotidiano e situado dos mercados é aderente e específico às suas trajetórias históricas e geográficas contingentes. Por ser um construto relacional e dinâmico, esta forma de organização social das relações e interações interpessoais é produzida por meio de disputas, demarcações políticas e culturais e está sujeita a constantes contestações.

Ora negando, contornando, confluindo, refutando etc., muito além dos mercados capitalistas, existe concretamente uma infinidade de mercados híbridos e multiformes. Muitos deles são frentes de organização de forças de resistência, elaboração de alternativas e campos de lutas sociopolíticas e econômicas às impulsões capitalistas aqui tratadas.10 10 Um bom exemplo seria os projetos sociais de construção de formas de mercado tendo por base uma outra economia, de natureza popular, solidária e social, como aqueles estudadas pelo amplo programa de pesquisa e ativismos de autores como José Luis Coraggio (2018) (https://www.coraggioeconomia.org/index.htm). Não resta dúvida de “que outros tipos de relação entre subsistência, reprodução e esfera produtiva” têm plena vigência na escala da vida cotidiana e que “são inúmeras - e potentes - as possibilidades de ações emancipatórias no âmbito da performance dos mercados. Trata-se de um agenciamento socioespacial que pode ser transformado para funcionar de outros modos” (Magalhães, 2020MAGALHÃES, F. N. C. Da construção socioespacial dos mercados aos avanços da financeirização. Geousp, v. 24, n. 2, p. 279-296, ago. 2020., p. 293). Novos modos de produzir, circular, distribuir e intercambiar são experimentados nestes espaços potenciais e devem ser mais promovidos e estudados.

Considerações finais

A natureza complexa e contraditória do sistema capitalista, em termos estruturais e conjunturais, precisa ser esclarecida e tornada compreensível, em um projeto coletivo, para que se possa refletir sobre as características intrínsecas e as combinações de circunstâncias do seu movimento geo-histórico de longa duração no contexto do século XXI.

Procurou-se destacar neste artigo seu dinamismo e movimentos paradoxais, dando ênfase ao processo geral que conduz a que o símbolo universal da riqueza, o dinheiro, passe a presidir as relações socioeconômicas sistêmicas.

Foi enfatizado que o capitalismo constantemente realiza metamorfoses, porém, simultaneamente, mantém a sua essência constitutiva. Dentre as diversas facetas dessa essência, foi distinguido o papel central do dinheiro, que vai se tornando sujeito potente das relações sociais capitalistas. Nesse contexto, mercados específicos (orientados pelas lógicas do rentismo) são formados.

Foi discutido, em linha gerais, a atual conjuntura de condensação de contradições do capitalismo de plataforma, que fornece os elementos para a consecução da captação e capitalização agilizadas de rendas, que são extraídas e acumuladas em variadas frentes de acumulação. A plataforma realiza, através de sistemas digitais, as mediações adequadas para as operações calculativas que o sistema requer.

Argumentou-se que a plataforma provê os aparatos tecno-econômicos para a formação de novos mercados, porém esses são apenas algumas das formas de mercado em operação. Outros e variegados, híbridos e polimórficos mercados existem na realidade concreta do dia a dia, para além dos mercados capitalistas. Alguns desses mercados são e podem se constituir em frentes potenciais de alternativas para ações contra-hegemônicas.

Possíveis desdobramentos das mensagens centrais deste ensaio poderiam contribuir para uma discussão da presença e necessidade de embates e ativismos sociais, em todas as escalas espaciais, por formas mais criativas de evolução e consolidação de contenções sociopolíticas dos imperativos das finanças desregradas e da mercadejação exacerbada das relações sociais. Também poderiam contribuir para alertar sobre a urgência da ampliação dos estudos das variadas experimentações sociais de construção de amplas possibilidades de formatação de outros mercados alternativos ao capitalismo e de outras formas de organização dos processos de produção, circulação, distribuição e troca que sejam mais justos, inclusivos e enraizados na sociedade e na anteposição da substancialidade da vida humana à frente dos negócios privados.

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  • 6
    Agradeço a leitura atenta e generosa de dois pareceristas anônimos que contribuíram de forma decisiva no aperfeiçoamento desta versão.
  • 7
    “Uma vez que o futuro será formado pelo resultado do conjunto de medidas e convicções dos diversos agentes econômicos, o manejo da taxa de juros proporciona ainda um efeito de referência para decisões e expectativas sobre as condições de liquidez para a realização de investimento e consumo futuro.” (Belluzzo; Galípolo, 2021BELLUZZO, L. G. M.; GALÍPOLO, G. Dinheiro: o poder da abstração real. São Paulo: Contracorrente, 2021., p. 88).
  • 8
    John Maynard Keynes, em 1936, já bem definia a taxa de juro como um prêmio e criticava o domínio dos rentistas, denunciando o “poder cumulativo de opressão do capitalista em explorar o valor de escassez do capital. A taxa de juro atual não compensa nenhum verdadeiro sacrifício (...), não há razões intrínsecas para a escassez do capital” (Keynes, 1983 [1936]KEYNES, J. M. Teoria geral do emprego, do juro e do dinheiro. São Paulo: Abril Cultural, 1983 [1936]., p. 255).
  • 9
    Entendemos por capitalismo de plataforma uma fase do sistema em que modos de coordenação sociais, econômicas e institucionais sob uma lógica de informações algorítmicas, dominados por poderosos atores big techs, agilizam interações mercantis e socioespaciais que são mediadas por dispositivos e tecnologias digitais.
  • 10
    Um bom exemplo seria os projetos sociais de construção de formas de mercado tendo por base uma outra economia, de natureza popular, solidária e social, como aqueles estudadas pelo amplo programa de pesquisa e ativismos de autores como José Luis Coraggio (2018CORAGGIO, J. L. Potenciar la economía popular solidaria: una respuesta al neoliberalismo. Otra Economía, v. 11, n. 20, p. 4-18, 2018.) (https://www.coraggioeconomia.org/index.htm).

Editado por

Editor do artigo:

Ricardo Mendes Antas Jr

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    20 Jun 2023
  • Aceito
    18 Dez 2023
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