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Utilização da abordagem Quick Response Manufacturing em uma empresa de materiais de escrita: proposta e análise de benefícios esperados

Quick Response Manufacturing approach in a school supply company: proposal and analysis of expected results

Resumos

O Quick Response Manufacturing (QRM) é uma abordagem de gestão alternativa à Manufatura Enxuta, que objetiva alcançar a redução do lead time em ambientes com alta variedade de produtos. O objetivo da presente pesquisa é apresentar a proposta de implementação de alguns conceitos e ferramentas do QRM para redução do lead time em uma empresa de materiais de escrita. Basicamente a proposta seguiu os passos básicos de um projeto QRM, chegando à conclusão de que o longo lead time no setor estudado da empresa é ocasionado por quatro principais causas: (i) alocação de recursos em função dos tamanhos de pedidos; (ii) longo set up; (iii) quebra de máquinas; e (iv) tamanhos de lotes grandes. Seis cenários baseados em princípios e técnicas do QRM foram propostos e avaliados por meio de simulação, usando-se a tecnologia RMT (Rapid Modelling Technique). Os resultados esperados indicam que a empresa estudada pode obter uma redução de, aproximadamente, 68% no nível de WIP e de, aproximadamente, 74% no lead time médio, caso implemente a proposta sugerida. O presente trabalho contribui para aumentar a divulgação do paradigma QRM na academia e prática gerencial brasileira.

Redução do lead time; Quick Response Manufacturing; Gestão da produção; Estudo de caso


Quick Response Manufacturing (QRM) is a production management approach aiming at reducing lead time in environments with high product variety. The main goal of this research is to present a proposal for the implementation of some QRM concepts and tools for lead time reduction in a company which manufactures school supplies. The proposal followed the basic QRM project steps, concluding that four main reasons explained the long lead time found in the company: (i) allocation of resources made according to order sizes, (ii) set up time, (iii) machine failures, and (iv) large lot sizes. Six scenarios, based on QRM principles and techniques, were proposed and evaluated using Rapid Modelling Technology (RMT). The expected results indicate that the studied company can achieve a reduction of approximately 68% in the WIP level and 74% in the average lead time. This study contributes to spread out the QRM paradigm among researchers and managerial practice in Brazil.

Lead time reduction; Quick Response Manufacturing; Operations management; Case study


Elizangela Veloso Saes; Moacir Godinho Filho

Departamento de Engenharia de Produção, Universidade Federal de São Carlos - UFSCar, Rod. Washington Luís, Km 235, CEP 13565-905, São Carlos, SP, Brasil, e-mail: moacir@dep.ufscar.br; elizangelaveloso@yahoo.com.br

RESUMO

O Quick Response Manufacturing (QRM) é uma abordagem de gestão alternativa à Manufatura Enxuta, que objetiva alcançar a redução do lead time em ambientes com alta variedade de produtos. O objetivo da presente pesquisa é apresentar a proposta de implementação de alguns conceitos e ferramentas do QRM para redução do lead time em uma empresa de materiais de escrita. Basicamente a proposta seguiu os passos básicos de um projeto QRM, chegando à conclusão de que o longo lead time no setor estudado da empresa é ocasionado por quatro principais causas: (i) alocação de recursos em função dos tamanhos de pedidos; (ii) longo set up; (iii) quebra de máquinas; e (iv) tamanhos de lotes grandes. Seis cenários baseados em princípios e técnicas do QRM foram propostos e avaliados por meio de simulação, usando-se a tecnologia RMT (Rapid Modelling Technique). Os resultados esperados indicam que a empresa estudada pode obter uma redução de, aproximadamente, 68% no nível de WIP e de, aproximadamente, 74% no lead time médio, caso implemente a proposta sugerida. O presente trabalho contribui para aumentar a divulgação do paradigma QRM na academia e prática gerencial brasileira.

Palavras-chave: Redução do lead time. Quick Response Manufacturing. Gestão da produção. Estudo de caso.

ABSTRACT

Quick Response Manufacturing (QRM) is a production management approach aiming at reducing lead time in environments with high product variety. The main goal of this research is to present a proposal for the implementation of some QRM concepts and tools for lead time reduction in a company which manufactures school supplies. The proposal followed the basic QRM project steps, concluding that four main reasons explained the long lead time found in the company: (i) allocation of resources made according to order sizes, (ii) set up time, (iii) machine failures, and (iv) large lot sizes. Six scenarios, based on QRM principles and techniques, were proposed and evaluated using Rapid Modelling Technology (RMT). The expected results indicate that the studied company can achieve a reduction of approximately 68% in the WIP level and 74% in the average lead time. This study contributes to spread out the QRM paradigm among researchers and managerial practice in Brazil.

Keywords: Lead time reduction. Quick Response Manufacturing. Operations management. Case study.

1 Introdução

As empresas do século XXI estão diante de um mercado cada vez mais competitivo e exigente. Nesse cenário, a redução do lead time ganha destaque em todos os processos da empresa, visto que as estratégias baseadas no tempo fornecem respostas rápidas a seus clientes. Aqui é importante observar que a definição de lead time adotada nesta pesquisa compreende o tempo típico - em dias corridos - desde que o cliente faça o pedido, passando pelo caminho crítico, até que a primeira peça do pedido seja entregue ao cliente (ERICKSEN; STOFLET; SURI, 2007). Alguns importantes trabalhos também adotam essa definição em seus estudos, como por exemplo: Severino et al. (2010), Godinho Filho e Uzsoy (2009, 2010), Fahimnia, Marian e Motevallian (2009), Leng e Parlar (2009), Bottani e Rizzi (2008), Parveen e Rao (2008), Sellitto, Borchardt e Pereira (2008) e Bertolini et al. (2007).

Diante disso, muitas abordagens também demonstram uma preocupação com a redução do lead time, tais como: a Manufatura Enxuta, a Competição Baseada no Tempo (TBC-Time Based Competition) e o Quick Response Manufacturing (QRM). Essa última abordagem, foco da presente pesquisa, se caracteriza como uma abordagem alternativa à Manufatura Enxuta, uma vez que busca a redução do lead time em um ambiente de alta variedade de produtos.

O QRM foi criado em 1998 e, desde então, vem sendo implementado com sucesso em mais de 200 empresas nos Estados Unidos e na Europa (QRM, 2010). Além disso, o QRM começa a ganhar espaço na literatura internacional sobre Gestão da Produção, sendo referenciado em inúmeros trabalhos atuais, tais como: Riezebos (2010), Godinho Filho e Uzsoy (2009, 2010), Vandaele et al. (2008), Hopp e Spearman (2008), Fernandes e Carmo-Silva (2006), Treville, Shapiro e Hameri (2004), dentre outros.

Apesar dessa importância crescente e do grande potencial de aplicação em sistemas de produção que trabalham com alta variedade, o QRM ainda é um assunto pouco conhecido e divulgado no Brasil. Isso ocorre provavelmente pelo fato de que o QRM é uma abordagem relativamente nova (nasceu de fato em 1998), comparado com os outros paradigmas de manufatura, tais como a Manufatura Enxuta ou a Manufatura em Massa. Neste contexto, o objetivo do presente trabalho é apresentar uma proposta de implementação do QRM no setor produtivo de uma empresa de materiais de escrita.

A proposta a ser apresentada foi elaborada com base nos princípios e ferramentas do QRM, cujo principal objetivo se concentra na redução do lead time. Além disso, é importante ressaltar que as melhorias obtidas por meio desta proposta foram avaliadas por meio de simulações realizadas no software MPX, criado pela empresa Network Dynamics (Suri, 1998, 2010). Tal software foi desenvolvido dentro da chamada RMT-Rapid Modelling Technology e se baseia na chamada Teoria de Filas (SURI, 1989; TREVILLE, 1984). Essas simulações mostraram que a implementação das melhorias propostas na empresa em questão tem o potencial de reduzir o nível médio de estoque em processo (WIP) em, aproximadamente, 68% e o lead time médio em, aproximadamente, 74%.

Para cumprir os objetivos apresentados, a pesquisa foi estruturada da seguinte forma: na seção 2, é apresentado um referencial teórico a respeito da abordagem Quick Response Manufacturing, na seção 3, encontra-se o estudo de caso e, na seção 4, são feitas as considerações finais do trabalho.

2 Referencial teórico: o Quick Response Manufacturing (QRM)

O QRM foi proposto em 1998, nos EUA, por Rajan Suri (SURI, 1998), tendo como objetivo alcançar a redução do lead time em ambientes com alta variedade de produtos. De acordo com os estudos já desenvolvidos pelo centro de pesquisa em QRM e seus parceiros, a aplicação dos princípios e técnicas do QRM permite alcançar importantes reduções de lead time. Essas reduções podem atingir até 75% no tempo de introdução de novos produtos e 90% no tempo gasto para preenchimento de ordem de produção de produtos já existentes (SURI, 1998, 2010).

Basicamente, o QRM propõe que a redução do lead time seja feita por meio da implementação de um projeto que segue uma metodologia composta por quatro fases: coleta e análise de dados; identificação das causas do longo lead time; proposta de melhorias baseadas nos princípios e ferramentas do QRM; simulações dos resultados esperados.

Referente à coleta e análise de dados, tem-se que o QRM utiliza uma série de técnicas e métodos costumeiramente empregados em trabalhos de Engenharia de Produção (tais como: ferramentas da qualidade, simulação discreta, dentre outros), bem como incluir os métodos propostos por Suri (1998) para serem utilizados dentro do escopo da abordagem do QRM. Dentre essas ferramentas, destacam-se algumas que foram utilizadas no presente trabalho:

  • Mapeamento do MCT: esta ferramenta é um mapa interfuncional que mostra uma visão de como o trabalho ocorre. Além disso, o MCT deve fornecer também o

    lead time do processo, dividindo as atividades em atividades produtivas e esperas (que não agregam valor ao processo). Dessa forma, é possível estabelecer que o MCT é a quantidade típica de tempo medida a partir da criação de uma ordem, passando pelo caminho crítico até que a primeira peça desta ordem seja entregue ao cliente (SURI, 1998, 2010; ERICKSEN; STOFLET; SURI, 2007);

  • Tagging: ferramenta que permite a coleta de dados de tempos; consiste em etiquetar o produto ao longo de todo o seu processo a fim de se verificar, dentro do

    lead time total, quais são as atividades produtivas e as esperas. Para mais detalhes dessa técnica, ver Suri (1998, 2010).

Já a identificação das causas do longo lead time e as propostas de melhorias para a redução do lead time são baseadas nos princípios e técnicas do QRM propostos por Suri (1998, 2010). Esses princípios e técnicas são divididos da seguinte forma: i) dez princípios gerais que norteiam a abordagem QRM; ii) princípios e técnicas propostas por Suri (1998) para a redução do lead time especificamente em quatro áreas da gestão da produção: produção (manufatura), escritório (áreas de apoio à produção), cadeia de suprimentos (fornecedores e clientes) e introdução de novos produtos. Os dez princípios fundamentais propostos por Suri (1998), que embasaram a proposta de implemetação do QRM são mostrados no Quadro 1.


O foco deste trabalho é a área produtiva. Para tal setor da empresa, Suri (1998, 2010) propõe a utilização de três outros princípios mostrados a seguir:

a) alteração da estrutura organizacional do chão de fábrica: de acordo com esse princípio, o layout deve ser mudado de funcional para o celular; a gestão deve mudar de controle centralizado para controle descentralizado por times e trabalhos, com as pessoas sendo "proprietárias do processo" (ownership) nas células; os trabalhadores devem ser capacitados em um número maior de tarefas (cross-trained) ao invés de especializados; finalmente, a mentalidade da alta gerência deve passar de uma mentalidade focada na eficiência para uma mentalidade voltada à redução do lead time.

b) entender e explorar a dinâmica do sistema: esse princípio defende que o lead time é resultado da dinâmica e das interações entre os recursos, produtos e tarefas. Para esse entendimento, o QRM adota a lógica de autores como Hopp e Spearman (2002, 2008), que salientam a importância de desenvolver e utilizar a abordagem científica para o gerenciamento do chão de fábrica. Tanto para Hopp e Spearman (2002, 2008) quanto para Suri (1998), a ferramenta para se realizar essa gestão científica do chão de fábrica é trabalhar com os resultados da chamada Teoria de Filas, que é capaz de relacionar variáveis importantes do chão de fábrica (tais como o tamanho de lote, lead time, tempo de set up, utilização, variabilidade dos tempos, dentre outras).

Ainda dentro desse princípio, vale a pena destacar alguns comportamentos fundamentais dos sistemas de manufatura que advêm de sua dinâmica e que devem formar a base intuitiva de gerenciamento necessário a todo gerente de produção. Esses comportamentos são: o efeito da utilização no lead time; o efeito combinado da utilização e da variabilidade no lead time; o efeito do tamanho de lote no lead time e a influência que a redução de set up tem neste relacionamento. As curvas mostradas nas Figuras 1-4 ilustram estes comportamentos. Detalhes podem ser encontrados em Suri (1998, 2010) e Hopp e Spearman (2002, 2008).





As Figuras 1-4 permitem estabelecer importantes insights para o direcionamento das decisões no chão de fábrica, dentro da abordagem QRM. São eles:

  • A alta utilização é inimiga do baixo

    lead time, por isso os recursos devem ser programados para trabalhar com 70% a 80% de sua capacidade (2º princípio geral do QRM).

  • A variabilidade (nos tempos de serviço, tempos entre chegadas, nível de qualidade, dentre outros) faz com que o

    lead time seja maior. Dessa forma, a variabilidade ocasionada por esses tempos deve ser eliminada do processo (HOPP e SPERMAN, 2008).

  • Existe um tamanho de lote ótimo que leva à minimização do

    lead time. Este tamanho de lote pode ser encontrado por meio da Teoria de Filas ou de simulações.

  • Programas de redução de

    set up fazem com que a curva de tamanho de lote vs.

    lead time se desloque para a esquerda. Isso reduz ainda mais o tamanho do lote e, consequentemente, também o

    lead time. Além disso, a redução no tempo de

    set up e programas de melhoria em outras variáveis do chão de fábrica (tempo médio de reparo, tempo médio entre falhas, taxas de defeito, dentre outros) também têm potencial semelhante.

A consequência imediata dos itens (ii) e (iv) é que uma série de métodos já reconhecidos e utilizados pela literatura de gestão da produção (SMED-troca rápida de ferramentas), TPM (Manutenção Produtiva Total), Seis Sigma, padronização de atividades, dentre outros, podem e devem ser empregados. Isso visa à melhoria das variáveis do chão de fábrica e, consequentemente, à redução do lead time. Com relação a esse ponto, uma observação se faz necessária: apesar de sugerir a implementação de uma série de ferramentas e técnicas já reconhecidas e utilizadas em Gestão da Produção, o QRM defende que tais técnicas sejam aplicadas devidamente embasadas por simulações que justifiquem quantitativamente tais benefícios no tocante à redução do lead time. Essa é uma das importantes diferenças entre o QRM e outros paradigmas de gestão atualmente utilizados na prática, como por exemplo, a Manufatura Enxuta. Tais simulações podem ser feitas por meio da simulação tradicional (por exemplo, com o auxílio dos softwares Arena ou Promodel, dentre outros) ou, então, por meio do software denominado MPX. Esse foi desenvolvido dentro do escopo da chamada Tecnologia de Modelagem Rápida (RMT = Rapid Modeling Technology), que se baseia em modelos de teorias de filas e é capaz de relacionar variáveis importantes do chão de fábrica, tais como: tamanho de lote, lead time, tempo de set up, utilização, variabilidade dos tempos, dentre outras. Para mais detalhes a respeito do MPX e da RMT, ver Suri (1998), Hopp e Sperman (2002).

c) utilizar o sistema de Controle da Produção POLCA para coordenar e controlar a produção entre as células: este princípio sugere que a empresa utilize o sistema POLCA para controlar a produção. O funcionamento básico do sistema POLCA é o seguinte: geram-se autorizações de produção por meio de um sistema denominado HL/MRP (high-level material requirements planning system) que é muito parecido com os tradicionais MRPs. O cartão POLCA representa um quantum de capacidade disponível e acompanha o material em todas as etapas do processo, autorizando seu início. Nestes cartões são identificadas as células nas quais o processo vai ser iniciado, bem como o processo e a próxima célula para a qual se deve encaminhar o material relativo à próxima etapa. Para cada duas células são confeccionadas cartões POLCA. O operador de uma máquina só inicia a produção se três condições forem atendidas: a produção foi autorizada pelo HL/MRP, existe matéria-prima e existe um cartão POLCA. Para detalhes sobre o sistema POLCA, consultar Suri (1998); Suri e Krishnamurthy (2003), dentre outros.

3 Estudo de caso

3.1 Metodologia utilizada

A pesquisa realizada neste trabalho utilizou os seguintes procedimentos: pesquisa teórico-conceitual (BERTO; NAKANO, 1998, 2000) e estudo de caso (YIN, 2005). A pesquisa teórico-conceitual, ou bibliográfica, foi realizada com o intuito de pré-orientação teórica a respeito do assunto QRM. O estudo de caso foi realizado em uma grande empresa de materiais de escrita, selecionada por meio de uma abordagem não probabilística e intencional (PATTON, 1990). Neste estudo, foram realizadas visitas, coleta de dados e entrevistas com gerentes e supervisores de produção da empresa em questão por um período de dois meses aproximadamente.

As fases da presente pesquisa seguiram os passos propostos por Suri (1998) para a realização de um projeto QRM: (1) coleta e análise de dado; (2) identificação das causas do longo lead time; (3) proposta de melhorias; (4) simulação dos resultados esperados. Nas fases (2) e (4), o software MPX foi utilizado a fim de auxiliar a identificação das causas do longo lead time e, também, avaliar e validar os resultados esperados.

Os principais dados de input utilizados para o MPX foram: demanda anual, tamanho do lote, tempo médio de processo, número de funcionários em cada linha, número de linhas, tempo médio entre falhas, tempo médio de reparo, tempo de set up, taxa de defeitos e variabilidades. Os dados de output do sistema mostram as seguintes variáveis e indicadores de desempenho: utilização dos setores, tamanho de lote, tempos de espera, nível de WIP e lead time. As seções, a seguir, mostram as quatro fases da pesquisa realizada na empresa estudada.

3.2 Fase 1: coleta e análise de dados

A empresa estudada atua no setor de materiais de escrita e por questões confidenciais terá seu nome preservado. No início da produção no Brasil, a unidade industrial estudada era responsável pela produção de cerca de 172.800 unidades de lápis/ano. Atualmente, alcança a marca de 1,8 bilhões de unidades de lápis/ano e cerca de outros 1.000 itens são exportados para mais de 70 países.

A produção de lápis, foco da presente pesquisa, é agrupada em sete famílias de produtos: lápis grafite, lápis Dry, ½ lápis, estojos de 12, 24, 36 e 48 cores. Estas famílias apresentam variações de cores, tamanhos, formatos, espessuras, graduações e acessórios, totalizando aproximadamente 3.000 modelos. Os modelos são, basicamente, constituídos de madeira e mina (parte interna do lápis que é constituída de grafite ou pigmentação colorida).

O levantamento do histórico de dados revelou que a família de produtos responsável pela produção dos estojos de 12 cores representa, aproximadamente, 37% da demanda dos mais de 3.000 modelos de lápis ofertados pela empresa. Isso permite identificar o grande percentual financeiro e estratégico dessa família para a empresa e, assim, defini-la como foco desta pesquisa.

Em relação ao processo de produção da família de estojos de 12 cores, é possível estabelecer o envolvimento de três setores: LAC, acabamento e embaladoras. Estes setores se relacionam da seguinte forma: o setor do LAC alimenta o acabamento que, por sua vez, encaminha os lápis até o "mercado" (estoque), onde as peças permanecem até a produção das doze cores. A Figura 5 mostra esse processo.


Uma breve descrição dos setores mostrados na Figura 5 é apresentada a seguir:

  • LAC: nesse setor, formado por 2 linhas de 4 funcionários cada, ocorre a junção da madeira e da mina, denominada pela empresa como "sanduíches". Em seguida, são separados e aparados, dando origem às unidades de lápis.

  • Acabamento: esse setor, formado por 4 linhas de produção com 4 funcionários em cada linha, os lápis de todas as cores recebem duas camadas de tinta e uma de verniz; em seguida, são carimbados com o número de série e a marca da empresa; após isso, os lápis são aparados e apontados.

  • Embalagens: nesse setor, formado por 5 linhas de 4 funcionários cada, os lápis são embalados em estojos de 12 cores. Logo em seguida, são selados com plástico de proteção e colocados em caixas maiores.

Nota-se, também, pela Figura 5, a existência de uma grande quantidade de estoque em processo (WIP) entre os setores de acabamento e embaladora. Esse WIP, denominado pela empresa como "mercado", foi projetado pela empresa para armazenar os produtos semiacabados para que esses, saídos do acabamento, possam alimentar as embaladoras.

Esta definição e o entendimento desses setores possibilitam a elaboração da próxima etapa, coleta e análise de dados. Esta etapa é iniciada pela elaboração do mapeamento do MCT, que foi obtido por meio de entrevistas não estruturadas e da técnica tagging (SURI, 1998, 2010). Essas técnicas permitiram o acompanhamento dos produtos em todas suas etapas de fabricação, o que possibilitou a identificação dos tempos de processo que agregam ou não agregam valor ao produto e a identificação do seu lead time total. A Figura 6 mostra a relação do lead time total do produto e seus tempos que agregam e não agregam valor, considerando os setores apresentados na Figura 6.


A Figura 6 permite estabelecer que um lote de estojos de 12 cores leva até 4,5 dias para percorrer os três setores analisados (LAC, acabamento, embaladoras). Além disso, identificou-se que, em apenas 319 minutos, ocorre agregação de valor (retângulos em branco). Os outros 6.113 minutos são tempos que não agregam valor ao produto (set up, quebra de máquina e espera (WIP)). A relação de ambos os percentuais com o lead time total do processo permitiu constatar que, em média, apenas 5% do tempo total agrega valor e os outros 95% não agregam. Verificou-se que o setor denominado pela empresa como "mercado" representa sozinho 90% do total de tempo que não agrega valor, ou seja, 5.760 minutos do MCT. Além dos tempos para a elaboração do MCT, outros dados a respeito da frequência dos tempos de set up e dos tempos de quebra de máquinas foram coletados.

Já em relação ao planejamento da produção da empresa estudada, seu início é estabelecido por meio de previsões de demanda e carteira de pedidos do mercado externo e interno. Após a realização de um planejamento agregado por um setor de Planejamento e Controle da Produção (PCP) centralizado, faz-se um programa Mestre de Produção (MPS) para quatro semanas no sistema ERP (Enterprise Resource Planning) da empresa. Esse MPS é enviado para o PCP do setor dos estojos de 12 cores, alocado no chão de fábrica.

O responsável do PCP setorial define as prioridades de produção e aloca os recursos diariamente, dando origem às ordens de produção. As prioridades de produção são definidas pelos prazos de entrega de cada pedido. Esses são divididos em lotes de produção, cujos tamanhos são de 120 grosas (medida de quantidade equivalente a doze dúzias) por cor. Aqui é importante destacar que as embaladoras só iniciam seu processo após a conclusão das 12 cores. Além disso, é necessário observar que existem dois tipos de set ups em cada setor: o primeiro ocorre pela troca do produto que é definido pela entrada de um novo pedido e o segundo é ocasionado pela troca de cor dentro de um mesmo pedido. Tendo em mãos os lotes de produção, o supervisor de produção controla por meio de cartões kanbans (cada cartão representa um lote de 120 grosas) a produção do seu setor e define o que ser produzido nos setores do LAC e acabamento. Além disso, o supervisor do setor de embalagens determina qual e em que quantidade os cartões kanbans devem ser utilizados e, também, o número de loops destes cartões. O funcionamento desse sistema PCP da empresa estudada é mostrado na Figura 7.


Com base na Figura 7, é possível identificar que as características evidenciadas na coordenação de ordens apresentam atributos de um sistema empurrado e puxado, ou seja, um sistema híbrido. As características do sistema empurrado são evidenciadas pela programação do último estágio produtivo (embalagens) e, as do sistema puxado são evidenciadas pela utilização dos cartões kanbans. Os loops dos cartões, a utilização da lista de pedidos e a programação do último estágio produtivo são características que aproximam teoricamente a coordenação utilizada pela empresa do sistema CONWIP H, descrito por Fernandes e Godinho Filho (2007, 2010).

Com relação ao número de cartões kanban, tem-se três cartões para cada cor do produto, conforme determinação da empresa. Isso significa que um estojo de 12 cores de um modelo X possui 3 cartões para cada uma das 12 cores, totalizando 36 cartões por variedade de produto. Esse é o total de cartões que circulam entre os três setores estudados. A totalidade de cartões representa um nível crítico de WIP (W) de 4.320 grosas (36 × 120). Isso significa que o nível crítico de WIP é a quantidade mínima de estoque necessária para o funcionamento do sistema e que o número de giros depende do tamanho do pedido a ser produzido.

Sabendo que a taxa média de produção do gargalo (LAC) é de 600 grosas/hora e que o nível crítico de WIP (W) para a situação descrita anteriormente é de 4.320 grosas, é possível aplicar a Lei de Little (HOPP; SPEARMAN, 2008). Essa lei é mostrada na Equação 1:

em que:

W é o nível crítico de WIP;

tg é a taxa média de produção do gargalo; e

Lsf é o lead time sem fila (tempo médio para que uma tarefa ou um lote atravesse as linhas de produção sem que esta tenha de esperar pelo processamento das outras tarefas).

E, portanto, para o caso analisado tem-se (Equação 2):

A aplicação dessa fórmula resulta no menor lead time que a empresa pode atingir a cada giro de três cartões, estimado em 7,2 horas. Essa situação mostra o melhor caso para o sistema, pois não são consideradas as variabilidades nos tempos de processamento e nos tempos de chegada. Os autores Hopp e Spearman (2008) denominam essa situação como Best-Case Performance (melhor desempenho possível). Comparando-se o melhor caso com o caso real da empresa (4,5 dias), calculado por meio do mapeamento do MCT, vê-se a grande diferença que representa uma grande oportunidade de melhoria por meio da implementação do QRM.

3.3 Fase 2: identificação das causas do longo lead time

Após a coleta e análise dos dados, passou-se para a fase de levantamento das causas do longo lead time para a família de estojos de 12 cores. Para se identificar tais causas, foi realizada a simulação da situação inicial da empresa (cenário 1) via a utilização do software MPX.

De forma sintetizada, o cenário 1, situação atual da empresa, pode ser dividido em dois casos:

  • Produção de pedidos "pequenos": 1 LAC, 1 acabamento e 1 embaladora são destinados para os pedidos inferiores a 8.000 grosas, sendo que o produto final deste processo é tratado nesta pesquisa como "pequenos".

  • Produção de pedidos "grandes": 1 LAC, 3 acabamentos e 4 embaladoras são destinados para pedidos superiores a 8.000 grosas, cujos produtos finais são aqui tratados como "grandes".

Neste ponto é importante ressaltar que os pedidos "grandes" representam a grande maioria dos pedidos, 80% do volume total. Já os pedidos "pequenos", cujos longos lead times comprometem a rapidez, a confiabilidade e fidelidade dos clientes, representam os 20% restantes do volume anual de produção da empresa.

A justificativa dada pela empresa para o emprego dessa política é que sua utilização ameniza os atrasos nas entregas dos pedidos "grandes". Estes contam, ainda, com a utilização das rush orders. Isso significa que os recursos originalmente destinados aos pedidos "pequenos" são alocados para a produção dos lotes que constituem os pedidos "grandes", o que aumenta ainda mais o lead time dos pedidos "pequenos" (SURI, 1998). Ambos os casos, pedidos grandes e pequenos, foram simulados no MPX e uma síntese dos resultados encontra-se na Tabela 1.

A síntese apresentada na Tabela 1 revelou um WIP total para o cenário 1 (soma do WIP dos pedidos "pequenos" com os "grandes") de 18.000 grosas. Além disso, foi possível notar que o lead time para os pedidos "pequenos" é exatamente igual ao encontrado no mapeamento do MCT, o que atesta e valida os dados coletados pelos pesquisadores na empresa. Já o lead time dos pedidos "grandes" é bem menor, aproximadamente 0,75 dia ou 18 horas. Para o cálculo do lead time médio foi utilizado uma média ponderada, tendo como base os volumes de produção dos pedidos "grandes" e "pequenos" (20% para os pedidos pequenos e 80% para os pedidos grandes). O resultado encontrado foi de aproximadamente 35,8 horas, ou seja, 1,5 dias.

Com base nesses resultados, nas políticas empregadas pela empresa, nas entrevistas e nas observações feitas in loco, foi possível apontar as quatro causas principais do longo lead time. São elas:

  • Causa Raiz 1 - alocação de recursos em função do tamanho do pedido com utilização de rush orders: esta política gera uma alta utilização nos recursos destinados aos pedidos "pequenos" (ver

    Tabela 1) fazendo com que seu

    lead time seja muito alto;

  • Causa Raiz 2 - frequência alta de quebra de máquinas: as interrupções no processo produtivo decorrentes da quebra de máquinas apresentaram uma frequência muito alta em todos os setores analisados. No setor do LAC, em média, a cada 156 minutos uma das linhas é interrompida por problemas mecânicos, ou seja, em um dia de trabalho ocorrem nove interrupções. No acabamento, foi possível observar que a produção de uma das quatro linhas é interrompida a cada 500 minutos, o que significa três paradas por dia. Uma das cinco embaladoras precisa de ajuste a cada 55 minutos, totalizando, em média, 24 paradas por dia. O tempo de reparo por quebra de máquina é estimado para cada linha do LAC em 30 minutos, 20 minutos para o acabamento e 5 minutos para a embaladora. As situações relatadas mostram, claramente, a ausência de políticas de Manutenção Preventiva ou práticas TPM, que foi confirmada pelas entrevistas realizadas. Os relatos dos entrevistados mostram grande irritabilidade frente a essas situações, uma vez que os problemas são solucionados apenas por meio de ações emergenciais;

  • Causa Raiz 3 - altos tempos médios de set up e alta variabilidade nesses tempos: as políticas de redução do

    set up também não existem; existem apenas tentativas de administrar esses tempos. As tentativas se evidenciam na organização de pedidos e lotes de produção. Os pedidos são organizados por meio das semelhanças dos produtos: clientes, formato dos lápis (sextavado, redondo, hexagonal), carimbo, tamanho da ponta, diâmetro da mina, entre outras. Esta organização busca, primeiramente, reduzir o

    set up ocasionado pela mudança de produto (ajuste das máquinas de todos os setores e troca de carimbo), que é estimado em 30 minutos com variação de até 20 minutos. Esta variação, nesse primeiro tempo de

    set up, é resultado, em grande parte, do nível de habilidade e experiência do trabalhador na fase de ajuste das máquinas. A rotatividade de funcionários é um agravante dessa situação. Já a segunda forma de organização dos lotes de produção agrupa os produtos em cores para a formação dos estojos, conforme discutido anteriormente. Assim, a produção é sequenciada para produzir alternadamente um lote de cada cor, o que acarreta, no

    set up, mudança de cor do produto. Este segundo tempo de

    set up é estimado para os setores estudados (LAC, acabamento e embaladora) em, aproximadamente, 6 minutos. Essas análises e os processos investigativos realizados constataram que as tentativas de administrar os tempos de

    set up estão erroneamente apoiadas na crença de que grandes lotes de produção reduzem o tempo de

    set up (SURI, 1998);

  • Causa Raiz 4 - utilização de tamanhos de lotes grandes: os tempos de espera por lote, identificados via simulação, estão diretamente relacionados ao tamanho do lote de produção. Esta relação é explorada por Suri (1998), que mostra a existência de um tamanho de lote ótimo que leva à minimização do

    lead time. Aqui é importante observar que a política da empresa de adotar tamanhos de lotes grandes (120 grosas) gera um impacto ainda maior em virtude da restrição do funcionamento das embaladoras. Esta restrição determina a permanência dos produtos semiacabados no "mercado" até que as 12 cores dos lápis sejam formadas e possam ser consumidas pelas embaladoras. Além disso, é importante observar que o tamanho de lote adotado pela empresa está associado aos altos tempos de

    set ups, conforme mencionado anteriormente.

Tais causas propiciam uma série de efeitos negativos ao sistema de manufatura analisado, mais especificamente em três variáveis fundamentais do sistema:

  • Utilização dos setores: as causas raízes 1, 2 e 3 geram alta utilização dos setores que é extremamente prejudicial ao

    lead time.

  • Variabilidade nos tempos de processamento e nos tempos de chegada dos lotes de produção entre os setores: esta variabilidade é de, aproximadamente, 50%. Isso foi verificado pela pesquisadora in loco por meio das variações de tempos de processamento, de

    set up, de quebra de máquinas e de reparo. Além disso, as políticas da empresa de alocar os recursos em função do tamanho dos pedidos e as

    rush orders (causa raiz 1), a alta frequência de quebra de máquinas (causa raiz 2) em conjunto com a variabilidade no alto tempo de

    set up (causa raiz 3) causam interrupções frequentes no fluxo do processo, gerando alta variabilidade nos tempos de processamento e nos tempos de chegadas de ordens de produção nos setores.

  • WIP: conforme mostra a teoria a respeito do comportamento de sistemas de manufatura (HOPP; SPEARMAN, 2008; SURI, 2010), a alta utilização, a alta variabilidade nos tempos de processamento e nos tempos de chegada e a utilização de lotes grandes geram altos níveis de WIPs. É isso exatamente o que ocorre no caso estudado, ocasionado principalmente pela causa raiz 3.

A Figura 8 ilustra a relação entre as causas raízes do longo lead time e as variáveis do chão de fábrica focadas neste estudo.


3.4 Fases 3 e 4: propostas de melhorias e resultados esperados

As propostas de melhorias se concentram principalmente nas quatro causas raízes já identificadas. Aqui é importante observar que as causas 3 e 4 serão tratadas em conjunto, de acordo com as recomendações feitas por Suri (1998, 2010). Além disso, esta seção também faz uma análise dos resultados esperados destas propostas. Para isso, a estrutura desta seção (bem como as melhorias a serem propostas) foi dividida de acordo com cada uma das causas raízes.

3.4.1 Melhorias relativas à causa raiz 1 - proposta de criação de células

A proposta de criação de células no chão de fábrica está apoiada em uma série de benefícios expostos por Suri (1998, 2010) que serão investigados e aplicados por meio das simulações realizadas. Para a criação das células dos estojos de 12 cores, foi necessário identificar as características comuns a todos esses produtos e, assim, combinar os processos e elencar as famílias (BURBIDGE, 1996; GROOVER, 2001). A participação dos gerentes de produção e de vendas foi essencial para possibilitar a formação das famílias. Essas participações ocorreram por meio de brainstormings e das análises da lista técnica dos produtos.

O resultado dessas atividades foi a definição de uma característica comum a todos os produtos estudados: o diâmetro das minas. As análises revelaram que 48% dos produtos apresentam um diâmetro de 2,4 mm e 52% possuem um de, aproximadamente, 3,0 mm. Dessa forma, tem-se que a família de estojos de 12 cores pode possuir duas células de produção. Essas serão responsáveis pela produção de duas famílias de produtos, sendo cada uma responsável por processar produtos com diâmetros de minas diferentes.

A proposta de formação dessas duas células, o roteiro e os setores destinados para essas novas famílias podem ser visualizados na Figura 9. A Figura 9 mostra as células A e B. Na primeira, é produzida a família de produtos em que o diâmetro da mina é de 2,4 mm e, na segunda, a de diâmetro da mina de 3,0 mm. Para cada uma das células são destinados os mesmos recursos, uma vez que os volumes de produção das famílias são semelhantes (48% célula A e, 52% célula B). Além disso, uma linha de embalagens (embaladora 3) é compartilhada por ambas as células por meio da técnica time slicing (repartição planejada do tempo disponível da embaladora 3 (SURI, 1998)). A implementação dessas duas células e o uso da técnica time slicing propiciaram um balanceamento na utilização dos recursos, eliminando a necessidade das rush orders. Para verificar e quantificar os benefícios da criação dessas duas células, foram realizadas mais duas simulações, dando origem a outros dois cenários: 2 e 3.


No cenário 2, os recursos não são mais alocados em função do tamanho do pedido, o que permite ao sistema processar apenas um pedido a cada momento e utilizar todos os recursos disponíveis. Aqui é importante observar que as células ainda não foram criadas, mas as rush orders já foram eliminadas. Esta decisão busca avaliar e analisar as possíveis vantagens da implementação da manufatura celular (cenário 3, a ser apresentado), quando comparada aos demais cenários 1 (situação atual da empresa) e 2 (cenário 2). O cenário 3 considera a formação das duas células e, também, a eliminação das rush orders. Em ambas as simulações, cenários 2 e 3, foram utilizados os mesmos dados de entrada do cenário 1. Os resultados encontram-se na Tabela 2.

Comparando-se os cenários 2 e 1, tem-se que o percentual de utilização dos setores reduziu em média 2,71% e o nível de WIP reduziu, aproximadamente, 41,3%. Em relação ao lead time médio, a redução obtida foi de 44,1%. Já o cenário 3 apresenta, em relação ao cenário 1, uma redução média de 8% na utilização dos setores; uma redução média de 55% no WIP; uma redução média de, aproximadamente, 58% no lead time médio. Dessa forma, os dados apresentados na Tabela 2 atestam quantitativamente os benefícios da manufatura celular. Isso confirma as vantagens da criação de células apresentadas por diversos autores (SURI, 1998; HOPP e SPEARMAN, 2008; BURBIDGE, 1996).

Os resultados apresentados revelaram significativas melhorias; no entanto, notou-se, pelo uso das simulações, que existe espaço para melhorias ainda maiores no nível de WIP e no lead time. Isso ocorre em razão da alta utilização dos setores, resultado direto dos altos tempos de set ups e de reparos nas máquinas e, também, dos altos tempos de espera por equipamentos e lotes.

Diante disso, esta pesquisa foca as outras três causas raízes, a fim de solucionar os problemas associados ao longo lead time. Aqui é importante observar que, diante dos benefícios da criação de células, os demais cenários criados serão analisados com base nas duas células de manufatura.

3.4.2 Melhorias relativas às causas raízes 2, 3 e 4: proposta de aplicação de políticas de TPM, de redução nos tempos de set up e busca pelo tamanho de lote mais adequado à redução do lead time

A empresa estudada não apresenta nenhuma política de TPM. Existem apenas projetos que estão aguardando aprovação da diretoria em razão de seu custo de implementação. Dessa forma, não existem dados concretos em relação às possíveis reduções de quebra de máquinas e seus tempos de reparo.

A ausência desses dados fez com que a magnitude esperada das melhorias no tempo entre falhas de equipamentos e tempo de reparo fosse baseada nos estudos de Hopp e Spearman (2008). Esses estudos apontam que a implementação de uma política de TPM atinge uma redução mínima de 25% a 35% nessas variáveis. Com base nessas informações, a melhoria estimada após a implementação dessa política na empresa foi considerada de 30% para os tempos de falhas e para os tempos de reparo. Tal magnitude de melhoria foi apresentada para a empresa e considerada factível pelos gerentes de manufatura entrevistados. Essa melhoria foi simulada, dando origem ao cenário 4.

Com relação aos tempos de set up, tem-se que na empresa estudada não existem dados concretos sobre as possíveis reduções nos tempos set ups. Dessa forma, foram adotados os mesmos recursos utilizados na seção anterior, ou seja, os estudos de Hopp e Spearman (2008). A aplicabilidade desses estudos aponta que políticas de redução nos tempos de set ups possam atingir reduções entre 25% e 35%, assim como as do TPM. Dessa forma, o cenário 5 propõe uma redução de 30% no tempo de set up de todas as máquinas dos três setores. Assim como no caso do TPM, também essa magnitude de melhoria no set up foi considerada factível pelos gerentes da empresa. O cenário 5 inclui também as melhorias do cenário 4 (TPM). Após a redução de set up, o próximo passo é a identificação de um tamanho de lote mais adequado à redução do lead time, conforme simulação realizada no cenário 6.

A realização desse cenário foi elaborada de acordo com os estudos de Suri (1998, 2010), que apontam um comportamento característico para os sistemas de manufatura, os quais podem ser analisados por meio da curva lead time vs. tamanho de lote ótimo (Figura 3). O entendimento dessa interação entre essas variáveis permite identificar um tamanho de lote que leva à maior redução do lead time. Para a empresa estudada, foi definido via simulação um tamanho de lote de 80 grosas. Isso representa uma redução de, aproximadamente, 33% do tamanho de lote adotado pela empresa (120 grosas).

A Tabela 3 apresenta os resultados das simulações dos cenários 4, 5 e 6 e, também, os resultados dos cenários 1, 2 e 3 (analisados na seção 3.3). Isso permite analisar os resultados das novas simulações em comparação com os resultados do cenário 1 (situação atual da empresa).

As análises obtidas pela Tabela 3 permitem identificar as seguintes melhorias quando comparadas ao cenário 1:

  • Cenário 4: este cenário apresenta uma redução de 8,74% na utilização média dos setores, de 56,66% no nível de WIP e de e 61% no

    lead time médio;

  • Cenário 5: este cenário apresenta uma redução de 11, 54 % na utilização média dos setores, redução de 68,13% no nível de WIP e uma redução de 61% no

    lead time médio (a mesma melhoria encontrada no cenário 4);

  • Cenário 6: este último cenário revelou uma redução de 8,64% na utilização média dos setores, redução de 68, 13% no nível médio deSWIP e redução de, aproximadamente, 74% no

    lead time médio.

4 Conclusões

O presente trabalho teve por objetivo mostrar uma proposta de implementação da abordagem QRM no setor produtivo de uma grande empresa de materiais de escrita. As melhorias sugeridas foram avaliadas e validadas por meio de simulações realizadas pelo software MPX. Tais simulações mostram que a implementação das melhorias propostas na empresa em questão tem o potencial de reduzir o nível médio de estoque em processo (WIP) em, aproximadamente, 68% e o lead time médio em, aproximadamente, 74%.

As propostas apresentadas seguiram alguns dos princípios do QRM. Em relação aos princípios gerais, tem-se o princípio 2 como um importante direcionador das propostas apresentadas. Este princípio estabelece que o planejamento da capacidade dos recursos críticos deve apresentar um percentual de utilização entre 80% ou mesmo 70%, gerando, assim, menores lead times. Isso pode ser verificado na presente pesquisa pelos indicadores de utilização apresentados no cenário 6. Além desse princípio, destaca-se neste estudo de caso o princípio 1. Este estabelece a busca por uma maneira nova de executar as tarefas para uma maior redução do lead time, o que levou ao uso de técnicas de identificação de tempos (MCT, tagging) e de métodos para redução de tempos que não agregam valor (SMED, TPM). Os demais princípios gerais, apresentados na seção 2, conduziram ao entendimento da abordagem QRM, ressaltando a importância da implementação para o sucesso prático das propostas apresentadas.

Já em relação aos princípios aplicáveis à área de produção, foi proposta a implementação de dois dos três princípios apresentados na seção 2. São eles: a alteração da estrutura organizacional que determinou a criação de células; e o entendimento e exploração da dinâmica dos sistemas que estabeleceu o entendimento das interações das variáveis do chão de fábrica e seus impactos no lead time, além de promover o uso do software MPX. O terceiro princípio, uso do sistema POLCA, não foi explorado nesta pesquisa, tornando-se, portanto, um assunto interessante para pesquisas futuras.

Com base nos princípios, nas ferramentas e nos resultados apresentados, pode-se dizer que o presente estudo quantificou os benefícios referentes a uma série de práticas atuais encontradas em gestão da produção, tais como: implementação de células, TPM, redução de set up, determinação do tamanho de lote, dentre outros. Essas práticas são bastante conhecidas e divulgadas em outros paradigmas de gestão (tal como: a Manufatura Enxuta); no entanto, a maioria desses trabalhos foca incluir as suas aplicações sem se preocupar na quantificação dos benefícios e interações nas variáveis do chão de fabrica. Isso torna este assunto um interessante gap a ser explorado, conforme mostrou a presente pesquisa.

Dessa forma, o presente trabalho motiva, por meio da apresentação de importantes resultados, a realização de outros estudos e aplicações práticas que avaliem, via simulação, o efeito de programas de melhoria em variáveis do chão de fábrica. Isso contribui para divulgação e motivação da implementação do QRM no Brasil, assunto ainda carente de pesquisas.

Recebido em 15/10/2010 - Aceito em 10/3/2011

Suporte financeiro: CAPES.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Out 2011
    • Data do Fascículo
      2011

    Histórico

    • Recebido
      15 Out 2010
    • Aceito
      10 Mar 2011
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