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Algumas reflexões sobre a crítica textual na Itália: metodologias, fundamentos e desafios

Some reflections on textual criticism in Italy: methodologies, foundations and challenges

Resumo:

O presente ensaio tem como objetivo discutir a crítica textual a partir de três linhas gerais, desenvolvidas no contexto filológico italiano: sua fundamentação teórica, sua metodologia e os rumos da disciplina na era da informática. Para tal, serão levados em consideração três textos fundamentais: o clássico Principi di critica testuale, de D’Arco Silvio Avalle; Fondamenti di critica testuale, de Alfredo Stussi e Gli orizzonti dell’ecdotica, de Francisco Rico.

Palavras-chave:
crítica textual; filologia italiana; ecdótica; metodologias; fundamentação teórica

Abstract:

This essay aims to discuss textual criticism from three general lines, developed in the Italian philologic context: its theoretical foundation, its methodology and the course of the discipline in the information age. To this end, three fundamental texts will be taken into account: the classic Principi di critica testuale by D’Arco Silvio Avalle, Fondamenti di critica testuale by Alfredo Stussi and Gli orizzonti dell’ecdotica by Francisco Rico.

Keywords:
textual criticism; Italian philology; ecdotic; methodologies; theoretical foundation

Introdução

Entre o segundo e o terceiro milênio, a crítica textual parece ter alargado o seu campo de investigação ao enfrentar situações novas e complexas. O volume, organizado por Francisco Rico, em 2022RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica. Autori, testi, lettori. Roma: Carocci , 2022a.a, Gli orizzonti dell’ecdotica: autori, testi, lettori, introduz uma discussão detalhada sobre os rumos da crítica textual na contemporaneidade. Trata-se de uma antologia de contribuições publicadas pela revista Ecdotica, fundada em 2004, em Bolonha, por Gian Mario Anselmi e Emilio Pasquini. Rico chama a atenção para a definição de ecdótica, dada por Aurelio Roncaglia, em 1975, como simples sinônimo de crítica textual, já que, com este sintagma, se engloba, em geral, a disciplina que se ocupa da edição de textos, antigos e modernos, e da elaboração de problemas técnicos e de normas metodológicas. Roncaglia, porém, como lembra Rico (2022bRICO, Francisco. Introduzione. In: RICO, Francisco. Gli orizzonti dell’ecdotica. Autori, testi, lettori. Roma: Carocci , 2022b. p. 9-11., p. 9), considerava a noção de ecdótica mais ampla em relação à noção de crítica textual, por possuir todos os aspectos da técnica editorial: dos “internos” aos “externos” (como aqueles referentes ao título, ao uso de caracteres gráficos, de ilustrações, índices etc). Nesse sentido, a riqueza semântica do termo ecdótica compreende todos os elementos que marcam o caminho de um texto, do autor até os leitores. Na introdução, Rico, sinalizando as mudanças fundamentais ocorridas com a revolução digital, as quais trazem consequências no que diz respeito à produção e transmissão dos textos, elenca uma série de fenômenos que modificam o conceito de texto e das práticas ecdóticas: desde o fim da escrita manual e da epistolografia até a criação de arquivos digitais e de coleções imateriais de livros e documentos. Além do volume organizado por Francisco Rico, serão levados em consideração outros dois textos fundamentais, no contexto filológico italiano, para a reconstrução da metodologia e dos fundamentos da crítica textual: Principi di critica testuale (1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978.), de D’Arco Silvio Avalle, e Fondamenti di critica testuale (2006aSTUSSI, Alfredo (org.). Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006a.), organizado por Alfredo Stussi (1998).

Metodologias

O objetivo fundamental da crítica do texto ou ecdótica, segundo a terminologia de Henri Quentin (1872-1935), é a publicação de textos antigos e modernos, a partir de critérios rigorosamente científicos. A metodologia, segundo D’Arco Silvio Avalle (1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 21), não muda em função da tradição (seja a de textos da antiguidade clássica, ou orientais, ou românicos e assim por diante) ou em função das condições em que a tradição se desenvolveu (transmissão escrita ou transmissão parcialmente oral). Visto que qualquer transcrição, com a exceção de casos excepcionais, comporta normalmente uma quantidade, mais ou menos, grande do exemplar, a ecdótica é, no fundo, «uma aplicação da patologia da atenção» (Marichal, 1961MARICHAL, Robert. La critique des textes. In: MARICHAL, Robert. L’Histoire et ses méthodes, sous la direction de Charles Samaran. Encyclopédie de la Pléiade, vol. XI. Paris: Gallimard, 1961. p. 1247-1366., p. 1251).

A crítica textual, como técnica reconstrutiva, nasce no mesmo clima cultural em que surgem hipóteses sobre a forma primordial das obras literárias (como o Urnibelungenlied, trabalhado por Lachmann) e a reconstrução do indo-europeu. Particularmente notáveis são as afinidades com a linguística comparativa, seja pela tendência comum a determinar genealogias, seja pela semelhança dos procedimentos de descoberta. De fato, ao considerarmos um conjunto de línguas, identificamos uma família particular (ou subgrupo) na base de inovações comuns; paralelamente, o parentesco entre manuscritos é demonstrado pela presença daquele tipo particular de renovação que são os erros evidentes. Portanto, acrescenta Stussi, em ambos os casos a conservação do estado originário não indica relacionamentos precisos, porque ela pode se verificar independentemente; ao contrário, «são reveladores aqueles fenômenos inovadores cuja natureza torna inverossímeis as hipóteses poligenéticas» (Stussi, 2006bSTUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45., p. 31).

O relacionamento entre filologia e linguística sempre foi profícuo, do ponto de vista dos instrumentos de trabalho, como comprova o conceito de geografia linguística. A partir da regra segundo a qual as áreas periféricas conservam fases arcaicas precedentemente difundidas em todo o território, elaborou-se um critério análogo, válido para o estudo dos manuscritos. De fato, como lembra Stussi, a mesma lição atestada em manuscritos deslocados dos centros de cultura (pertencentes a áreas distantes uma das outras) pode ser mais arcaica (e, portanto, mais próxima do original) do que lições concorrentes atestadas no centro da área, no qual uma atividade copista mais intensa produziu inovações. Giorgio Pasquali manifestou interesse para com esse novo instrumento metodológico para avaliar a genuinidade de variantes equivalentes, sublinhando, porém, que ele deveria ser utilizado somente no caso em que seja bem conhecido o contexto histórico-cultural, ao qual se faz referência ao se falar de centro e periferia (Stussi, 2006bSTUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45., p. 32).

Sempre em relação ao encontro fecundo entre filologia e linguística, Cesare Segre utilizou o conceito de diassistema de Weinrich, elaborando-o a partir do estudo de contato linguístico e do estímulo exercitado pelo estruturalismo em Gianfranco Contini e Maurizio Perugi. Maurizio Perugi, na introdução à sua edição crítica das canções de Arnaut Daniel (1978PERUGI, Maurizio. Le canzoni di Arnaut Daniel. Edição crítica. Milano-Napoli: Ricciardi, 1978, 2 vol.), constatou que a margem reservada às inovações, mecânicas ou não, é extremamente exígua, e, ao mesmo tempo, prevalece uma adequação estrutural do código linguístico do modelo ao código do copista (caracterizado, nesse caso, somente por diversidades diacrônicas). Com a exclusão de fatos esporádicos, o estudo da transmissão de textos não deveria parar na identificação “atomística” de erros significativos, mas se encaminhar para a diacronia estrutural, identificando os fatores dinâmicos: tal seria, segundo Perugi, o hiato (considerado como diérese e dialefe ao mesmo tempo), neutralizado, de forma variada, pelos copistas.

Como sinaliza Avalle, o editor que tem a intenção de publicar criticamente um texto antigo ou moderno, deve proceder preliminarmente ao exame (recensio) da sua tradição manuscrita ou impressa, direta ou indireta. Tal exame consiste na análise comparativa (collatio codicum) da «varia lectio», do complexo das lições ou das variantes, caso a obra tenha sido transmitida através de um ou mais testemunhos. Quando, ao contrário, a tradição se identifica com o «codex unicus», o exame irá se basear no escrutínio pontual e rigoroso do único testemunho que conservou a obra em questão (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 21). A «recensio», no primeiro caso, pode levar à constituição do estema. Segundo Stussi (2006STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.b, p. 16), a «recensio» é sempre indispensável, tendo representado historicamente um passo adiante em relação às edições baseadas na vulgata, ou através de um testemunho emendado «ope ingenii» (ou seja, por conjectura), ou «ope codicum» (isto é, através do recurso acrítico a outros testemunhos). Se a «varia lectio» não apresenta elementos adequados para tal finalidade, será oportuno que o editor explicite tal ocorrência. De todo modo, «o editor escrupuloso deverá evitar constituir estemas com estratagemas, como, por exemplo, inovações, lições adiáforas, trivialidades poligenéticas e assim por diante» (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 22). O termo «tradição» (ou «recensão»), por sua vez, indica dois conceitos diferentes: 1) o complexo das lições que caracterizam um manuscrito ou uma família de manuscritos; 2) o complexo dos testemunhos de uma obra, dividida em tradição direta -que compreende os manuscritos e as impressões nas quais ela se conservou de forma explícita - e em tradição indireta, que compreende as citações, as traduções, e todas as atestações, mesmo de segunda mão, que remetem a ramos da tradição direta, diferentes daqueles conhecidos. As recensões, também, se dividem em dois tipos: 1) as recensões para as quais valem critérios mecânicos de reconstrução derivados do método «lachmanniano», baseados na «lei da maioria» e 2) as recensões para as quais, ao contrário, é necessário recorrer a critérios internos, «lectio difficilior», «usus scribendi» e, em geral, o «iudicium». Giorgio Pasquali, desde a Storia della tradizione e critica del testo, publicada em 1934, propôs chamar esses dois tipos de tradição com os termos «recensão fechada» e «recensão aberta». A recensão é «fechada» quando é incontaminada e a lição do arquétipo ou do original é reconstruível através da «lei da maioria»; uma recensão é «aberta» quando é contaminada e as lições concorrentes são adiáforas e, portanto, a «lei da maioria» não é aplicável.

O confronto (ou colação) das várias atestações manuscritas e impressas da obra que se deseja publicar é geralmente indicado com o termo «collatio codicum». Segundo Avalle:

Tal operação, que é a primeira na ordem dos trabalhos relacionados à configuração material da edição, implica determinada responsabilidade por parte de quem a realiza, sobretudo do ponto de vista da correção da transcrição. Cada erro de colação pode ter repercussões de diversa natureza sobre a «recensio» e, consequentemente, sobre a «restitutio textus». Portanto, para evitar riscos, hoje se observa certa tendência a encarregar tal operação às máquinas, sobretudo com textos de certa extensão (para textos breves a operação seria antieconômica). Isso, porém, não exclui que a escolha e a classificação das lições dependam, em última análise, do operador, sobretudo quando as variantes de forma são tão numerosas que obrigam a máquina a transcrever praticamente quase o texto inteiro de cada manuscrito (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 24-25).

Quando uma obra é transmitida através de um único manuscrito, tal manuscrito é indicado com o nome de «codex unicus». Trata-se de um caso bastante frequente, quase normal, para as obras mais antigas das literaturas românicas. As tradições baseadas no «codex unicus» representam, segundo Avalle (1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 26), uma grande responsabilidade para o editor. De fato, é mais fácil publicar um texto do qual possuímos dois ou mais manuscritos do que um texto transmitido através de um único manuscrito. Nesses casos, os editores costumam transitar entre um «prudente conservadorismo» - ao realizar edições diplomáticas ou semidiplomáticas, quando o texto é breve e tem importância histórica - a um maior senso de responsabilidade crítica, quando é possível consertar os erros com certeza e o texto pode ser ajustado sem prejudicar a situação originária do códice.

Antes da chamada época lachmanniana, os critérios utilizados para a constituição do texto eram os seguintes, conforme indica Avalle: 1) o critério do «codex optimus»; 2) o critério dos «codices plurimi» e 3) o critério do «textus receptus». Os dois primeiros eram critérios utilizados normalmente pelos humanistas, já o terceiro era usado, sobretudo, na edição da Bíblia; o «textus receptus» é o texto da vulgata («ne varietur»), adotado pelos órgãos oficiais da Igreja, conforme foi se formando ao longo da tradição. O «codex optimus» é geralmente identificado com o «codex vetuistissimus». A partir do momento que hoje considera-se que um códice vale somente pela posição ocupada no estema, o critério do «codex optimus» não é mais utilizado do ponto de vista teórico. Isso não impede, acrescenta Avalle (1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 27), que, sobretudo na filologia clássica, tal identificação seja ainda aceita pela maioria dos editores. O pressuposto é que não seja possível confiar nas cópias mais recentes, por exemplo, aquelas de 1400 e de 1500, a causa do hábito dos humanistas de intervir no texto copiado com conjecturas e correções de todo o tipo. Tal pressuposto, ressalta ainda Avalle (1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 27), não nos deve eximir da obrigação de controlar também os «recentiores», a partir do momento que não se deve excluir que lições genuínas tenham sido conservadas em manuscritos tardios. Códices «antigos», como, por exemplo, os papiros para a literatura grega, demonstram que a contaminação é um fenômeno difundido desde o início da história de um texto e que muitas edições de códices «antigos» são piores do que as tradições que dependem de códices mais «recentes».

O consenso da maioria dos testemunhos («codices plurimi») foi considerado, por muito tempo, o critério de base para a escolha das lições a serem adotadas na edição. Nesse princípio, existe, segundo Avalle (1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 29), uma espécie de pressentimento dos cânones probabilísticos nos quais se baseia a atual estemática. Com a diferença, porém, acrescenta o filólogo, que, na atual estemática, a «lei da maioria» foi transferida, mais corretamente, da soma material dos textos à nossa disposição para a soma dos «codices interpositi», descendentes diretamente do arquétipo ou, eventualmente, do original. Um número indefinito de textos transcritos de um mesmo exemplar (a) não possui mais autoridade do que um só texto pertencente à outra tradição (b).

Com o termo «textus receptus» se entende o texto da edição corrente («vulgata») de uma obra aceita pela maioria dos editores em obséquio à tradição, sem que seja levada em consideração a qualidade da lição:

A autoridade do «textus receptus» foi colocada em dúvida pela primeira vez em 1600, 1700, pelos teólogos protestantes, a propósito da Bíblia. Hoje uma edição é crítica na medida em que exclui, a priori, qualquer conceito de imposição. Naturalmente, isso não exclui que nas edições comerciais e escolares ainda hoje se recorra à edição considerada mais prestigiosa. Resistências em relação às edições «modernas» sempre existiram, desde a versão da Bíblia de São Jerônimo (combatida por vários motivos pelas comunidades mais sensíveis aos valores da «Vetus») até a edição nacional das Obras de Dante (1921), acolhida então com ceticismo, ou, até escândalo, por suas novidades gráficas e morfológicas (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 30).

Portanto, o conceito de edição crítica comporta a utilização de elementos de avaliação por parte do editor desde o início de suas atividades, ou seja, antes do início da constituição do cânone. Nesse sentido, se fala em «interpretatio», mesmo que o termo seja utilizado para indicar, por extensão indevida, operações de natureza completamente diferente. Antes de qualquer coisa, devem ser levados em consideração: a avaliação (A) da relevância que as lições individuais possuem para os fins da constituição do estema; a avaliação (B) do peso, significado, ou valor das lições individuais atestadas pela tradição manuscrita em relação ao estema, e a avaliação (C) das variantes de igual autoridade estemática, no campo da «selectio». Sempre com o termo «interpretatio» se indica, geralmente, a operação de esclarecimento do texto através da separação das palavras e dos parágrafos, a colometria, a interpunção, as letras inicias maiúsculas etc (Maas, 1952MAAS, Paul. Critica del testo. Tradução de Nello Martinelli e prefácio de Giorgio Pasquali. Firenze: Le Monnier, 1952. , p. 32). Avalle afirma que as operações conectadas com a «interpretatio», assim como com a «examinatio», são particularmente delicadas, a partir do momento que podem determinar desvios relevantes no plano das impressões subjetivas («iudicium»). Nesse sentido, se enquadra a importância cada vez maior atribuída atualmente à escolha dos elementos de avaliação: em primeiro lugar, no momento da «recensio», no que diz respeito ao conceito de erro significativo; em segundo lugar, no momento da «selectio», durante o qual são relevantes os princípios do «usus scribendi» e da «lectio difficilior» e, sobretudo, dos limites de sua aplicabilidade e de sua mútua exclusão. Como lembra Avalle (1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 31), se, na época de Lachmann, o «iudicium» representava um grande obstáculo no caminho do progresso científico e, nesse sentido, se explica o seu ideal de «recensio sine interpretatione», hoje, insistir, a partir da influência de Quentin, em tal pressuposto, significa ignorar os enormes progressos obtidos no campo da «interpretatio», no que diz respeito à racionalização de seus instrumentos e procedimentos lógicos.

Para Avalle, o conceito de original, no sentido de texto autêntico que exprime a vontade do autor, é um dos mais ambíguos da crítica textual. Isso porque o texto crítico apresenta, frequentemente, um aspecto muito problemático e, em alguns casos, até aleatório.

A impressão é que o original, assim como geralmente o entendemos, ou seja, como texto perfeito em todas as suas partes, nunca existiu. De fato, o conceito de original deriva de uma visão estática, exemplar, da obra literária, enquanto as obras individuais de um escritor constituem, a rigor, uma seção, às vezes, casual e provisória [...] daquele fluxo contínuo de adaptações e transposições sucessivas, através das quais se exprimem as tendências fundamentais de um sistema literário (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 33-34).

Geralmente, como lembra Avalle, consideramos original o primeiro rascunho do autor. Nem sempre, porém, esse rascunho representa o original, mas se trata «de uma cópia (exatamente como qualquer manuscrito redigido por alguém diferente do autor), ou melhor, a primeira cópia em absoluto de um texto que foi sendo elaborado lentamente na mente do escritor» (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 34). Na cópia de autor, é possível encontrarmos erros de estilo, de sintaxe, de desatenção, de confusão no que diz respeito a acontecimentos históricos e assim por diante. Nos rascunhos, as variantes de autor podem ser atestadas diretamente pelos autógrafos ou por outras provas históricas, ou, indiretamente, por testemunhos da tradição histórica manuscrita. A variante de autor, na realidade, representa o próprio conceito de atividade artística, a partir do momento que nem sempre é fácil distinguir, no fluxo artístico-compositivo de um autor, entre as variantes de uma mesma obra e a série das obras que pertencem à sua produção. Segundo Alberto Varvaro:

Para a reconstrução da história da tradição de um texto é fundamental individuar os erros presentes nos testemunhos, porque é a coincidência do erro que atesta a descendência de um ascendente comum. Que os testemunhos tenham em comum lições corrigidas não demonstra nada sobre os seus relacionamentos: a lição corrigida pode, de fato, derivar do autor e, portanto, do patrimônio original da tradição, comum a todos os seus ramos. É o erro comum que é indício de parentesco entre dois testemunhos. Basta fazer a comparação com os testemunhos relativos a um acontecimento. Se dois testemunhos diferentes contam o que aconteceu exatamente, isso não permite deduzir que entre os dois houve contato, mas se duas pessoas diferentes nos dão as mesmas informações falsas, então é provável ou certo que combinaram de nos enganar (Varvaro, 2012VARVARO, Alberto. Prima lezione di filologia. Bari: Laterza, 2012., p. 77).

Para Avalle, os desvios do original ou do exemplar, que não obstruem a correção formal do texto análogo, são chamados geralmente de «inovação»: «Uma vez que toda inovação, ao modificar o texto transmitido, constitui um erro, acontece frequentemente que editores, non suficientemente desconfiados da “force dichotomique, acabem utilizando também as lições adiáforas para estabelecer parentesco entre códices e famílias de códices » (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 42). O conceito de lição ou de variante é relativo, segundo Avalle, na medida em que se relaciona um manuscrito com outro manuscrito:

Portanto, pode-se dizer que um manuscrito apresenta em um ponto (constituído por uma ou mais palavras) uma lição variante em relação a outro manuscrito, quando o seu conteúdo divirja deste manuscrito. O conceito de lição ou variante é fundamental nas tradições manuscritas nas quais falte o autógrafo (original). Naturalmente, vale o mesmo discurso também para o autógrafo, mas sempre em relação a outros textos, por exemplo seus eventuais apógrafos ou cópias (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 43).

Avalle define a lição característica como aquela que pertence a uma família de manuscritos e como resultado da iniciativa do amanuense que redigiu o seu arquétipo. A lição característica representa, portanto, uma inovação e não é suficiente por si só para demonstrar a existência de uma família, sendo acompanhada por, pelo menos, um erro significativo. Avalle dedica uma atenção particular à definição de erro:

Na justificativa do estema, as lições características devem ser mantidas distintas dos erros, pelo menos nos níveis altos do estema. Por isso, elas devem ser registradas separadamente após o elenco dos erros. Por erro entende-se qualquer tipo de desvio da lição do original. Visto que o erro inova o texto do autor, ele representa o único elemento que comprova as relações entre códices que nos transmitiram a mesma obra. O erro, de fato, em quanto desvio, contradistingue todos os manuscritos derivados do códice onde tal desvio ocorreu, reunindo-os em famílias ou sistemas homogêneos. (Avalle, 1978, p. 44).

Nem todos os erros - fora os erros do autor, as lacunas e as transposições com certa extensão - podem ser utilizados para definir uma tradição manuscrita. Avalle distingue os «erros conjuntivos» dos «erros separativos». Os «erros conjuntivos» servem para provar a conexão entre dois ou mais manuscritos, em oposição a outros manuscritos. Os «erros separativos» servem para provar a independência de um manuscrito em relação a outro manuscrito. Nesse sentido, há critérios objetivos para julgar a maior ou menor perspectiva em que um erro pode provar conexão entre dois ou mais testemunhos. Os «erros separativos» mais comuns são as lacunas que tornam o texto ininteligível e que nenhum copista e nenhum editor moderno conseguiria preencher por conjectura, fora casos fortuitos. As lacunas, que interessam o trecho de um texto compreendido entre duas palavras idênticas ou quase idênticas, são chamadas de «homeoteleuto».

Por «trivialidade poligenética» ou «desenvolvimento idêntico por convergência» se entende o fenômeno pelo qual algumas estruturas morfológicas, sintáticas ou lexicais, se modificam de forma igual mesmo em ambiente e épocas diferentes:

Tal tendência se direciona para o camimho da corrupção e da banalização. Isso não exclui que em alguns casos ela apresente oscilações de tipo sinonímico ou parasinonímico. Naturalmente a trivialização poligenética acontece somente na medida em que o estímulo à modificação é in re. Pertencem a esta categoria, portanto, a «omissio ex homeoteleuto», a «lectio facilior», as repetições em geral, inclusive as chamadas «antecipations de la diction intérieure» e assim por diante, com uma variedade de usos e de adaptações tanto maior quanto mais a obra estiver exposta por natureza aos riscos da memorização e da iteratividade. Nenhuma destas modificações, incluídas as sinonímicas, vale como erro conjuntivo. (Avalle, 1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 51).

A contaminação é o fenômeno no qual um amanuense corrige o texto do seu exemplar através de outros manuscritos pertencentes a uma tradição diferente. Tal correção pode ser feita pelo próprio amanuense através da colação de mais exemplares ou, caso mais frequente, com a ajuda de variantes já sinalizadas à margem ou na entrelinha de seu exemplar. Por «editio variorum» ou coletor de variantes se entende um manuscrito, não necessariamente depositado num scriptorium, fornecido de variantes marginais ou interlineares. Conforme lembra Avalle, a existência de tais códices, definidos com o nome de «arquétipos com variantes» já foi demonstrada, há tempo, em relação às obras clássicas. Quase nenhuma «editio variorum» chegou até nós. No entanto, a sua existência pode ser reconstruída, em parte, através da análise comparativa da «varia lectio» dos códices ligados uns aos outros por relacionamentos de afinidade genética (como havia sido feito por Lachmann, por exemplo, em relação ao arquétipo de Lucrécio) e, em parte, com a ajuda de manuscritos onde as lições concorrentes (aquelas, por exemplo, do texto base e as outras transcritas nas entrelinhas ou nas margens da «editio variorum») foram, em seguida, recopiadas, sem que houvesse preocupação pela correção e pelo significado do texto.

Uma lição pode ser interpretada, corrigida ou deformada de maneira diferente pelos copistas que a transcreveram, seja por razões inerentes à sua estrutura morfológica e semântica («lectio difficilior»), seja pelo particular aspecto paleográfico do exemplar onde ela comparece. Quando uma lição se reparte em cópias se diz que há «difração», segundo a terminologia utilizada por Gianfranco Contini em 1955. Avalle lembra (1978AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale. Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978., p. 57) que não é importante tanto o erro quanto a dispersão das variantes. Segundo Contini, a difração pode ser em ausência ou em presença. Em ausência, quando a «lectio difficilior» não se conservou em nenhum dos manuscritos existentes. O caso já havia sido apresentado por Paul Maas, ao falar de variantes que «podem ser interpretadas como erros que foram determinados pela própria lição do arquétipo» (Maas, 1952MAAS, Paul. Critica del testo. Tradução de Nello Martinelli e prefácio de Giorgio Pasquali. Firenze: Le Monnier, 1952. , p. 24). A difração em presença é o fenômeno pelo qual um dos manuscritos conserva a «lectio difficilior» (ou o erro) que provocou a difração nos outros manuscritos. Essa ocorrência já havia sido prospectada por Maas, quando descreveu o caso típico em que, de duas variantes, «uma pode ser explicada como erro que pressupõe como lição do arquétipo a outra variante» (Maas, 1952MAAS, Paul. Critica del testo. Tradução de Nello Martinelli e prefácio de Giorgio Pasquali. Firenze: Le Monnier, 1952. , p. 23). Portanto, erros significativos revelam o grau de afinidade ou de parentesco entre testemunhos de uma tradição. Família ou grupo indica um conjunto de manuscritos, que descendem de um mesmo antepassado ou «codex interpositus», arquétipo ou subarquétipo.

Fundamentos

Embora a filologia tenha sempre existido, foi, segundo Gianfranco Contini (1992CONTINI, Gianfranco. Breviario di ecdotica. Torino: Einaudi, 1992., p. 6), no Romantismo que certas metodologias começaram a ser introduzidas. De fato, nesse período histórico, a filologia desembocou na crítica textual, denominação, universalmente aceita, que descende da tradução do alemão Textkritik. Contini indica na edição de La vie de saint Alexis (1872), realizada por Gaston Paris (1839-1903), através do método lachmanniano, a fundação da crítica textual em âmbito românico. Elemento renovador fundamental, nesta edição, foi, segundo Contini, a distinção entre «critique des leçons» e «critique des formes»:

Por definição, as informações linguísticas parecem ser de responsabilidade da «critique des formes». Mas aqui é necessário um esclarecimento preliminar: tais informações, sendo pertinentes ao original, são obtidas a partir de dados objetivamente comprováveis pela crítica das formas (como no caso da métrica), mas é plausível que interessem ao historiador da língua, como já foi observado, todos os dados do percurso diacrônico, e não somente os autênticos. Portanto, a crítica das formas contém, e fornece ao linguista, os extremos opostos: o dado mais consistente e o mais momentâneo e lábil. (Contini, 1992CONTINI, Gianfranco. Breviario di ecdotica. Torino: Einaudi, 1992., p. 150).

De fato, a «critica delle lezioni» contém elementos linguisticamente fundamentais, aqueles que podem ser obtidos através da «lectio difficilior», ou seja, próprio através de um dos critérios que subtraem a constituição textual ao automatismo do método de Lachmann:

Se deduz que a aparente coincidência do campo de interesse linguístico com a crítica das formas é puramente negativa; aquele campo exclui somente o que está sujeito ao escrutínio no âmbito do automatismo da maioria. Como acontece com a crítica das formas (e isso serve a sublinhar que a indiscutível polaridade das duas categorias não pode conduzir a um absurdo divórcio), também no âmbito da crítica das lições ocorre que variantes não acolhidas (ou seja, em hipótese alguma, reconduzíveis ao original) podem solicitar a atenção do linguista: o qual enriquecerá as suas pesquisas quanto menos o aparato for seletivo, já que seus resultados mais profícuos acontecerão entre as lectiones singulares, aquelas exatamente das quais o método lachmanniano proclama a primeira eliminatio. (Contini, 1992CONTINI, Gianfranco. Breviario di ecdotica. Torino: Einaudi, 1992., p. 150).

Segundo Alfredo Stussi (2006STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.b, p. 7), ao se trabalhar na edição de um original autógrafo, por maior que seja o medo de desrespeitar a vontade do autor, no entanto, resta a confortante certeza de ter diante de si a obra autêntica em sua totalidade; se, ao contrário, falta esse pressuposto e, portanto, estamos lidando com cópias, ocorre a pergunta preliminar se podemos confiar e em que medida. Para responder a essas perguntas existe um conjunto de procedimentos que constitui a crítica textual.

O método editorial fundado na «recensio» se chama «método de Lachmann», já que foi o próprio Karl Lachmann (1793-1851) a definir algumas formulações, embora não o tenha aplicado intensamente. Assim como a linguística histórico-comparativa nasceu em campo indo-europeu e, em seguida, passou para a romanística, do mesmo modo, o «método de Lachmann», primeiro foi aplicado na filologia clássica, na germânica e, em seguida, na filologia românica, ou mais precisamente, na filologia francesa. Com tal método, se encerra o uso, mantido até o século XIX, da reprodução de um manuscrito através de retoques realizados através de outros manuscritos. Joseph Bédier, formado na escola de Gaston Paris, publicou, em 1889, o Lai de l’Ombre de Jean Renart, ao seguir o método do mestre, até o momento em que o colocou em discussão. Segundo Stussi, Bédier se distancia de Paris da seguinte maneira:

[...] O mecanicismo do procedimento lachmanniano é ilusório porque, sendo a maioria dos estemas bipartida, as escolhas decisivas dependem exclusivamente da vontade do filólogo, o qual acaba por juntar lições de proveniência diferente criando um texto novo, que nunca existiu na realidade; convém, portanto, escolher um «bom manuscrito», possivelmente o «melhor», e limitar-se a reproduzi-lo introduzindo somente correções óbvias e indispensáveis porque somente assim teremos certeza de estar lendo algo que teve uma existência histórica, e não o produto subjetivo do gosto combinatório de um estudioso moderno. Assim, o Lai de l’Ombre foi republicado em 1913 seguindo o melhor manuscrito e com um prefácio que já contém os argumentos que serão desenvolvidos no artigo de 1928. (Stussi, 2006STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.b, p. 24).

Segundo Cesare Segre, na Itália, por volta dos anos 1940, graças a Gianfranco Contini, realizou-se uma renovação dos estudos de filologia românica, sobretudo de crítica textual. Tal renovação implicava uma revisão do método utilizado - para as edições críticas, sobretudo de textos gregos e latinos - por Karl Lachmann e seus seguidores (no campo da romanística, por Gustav Gröber e Gaston Paris). Essa revisão se tornava necessária, segundo Segre, após a contestação ao método lachmanniano por parte do aluno de Paris, Joseph Bédier, o qual o havia aplicado por um longo período. Essa contestação havia se transformado numa verdadeira guerra entre filólogos: guerra que persiste ainda hoje, com implicações nacionais, a partir do momento que Bédier teve seguidores, sobretudo, na Inglaterra, em parte nos Estados Unidos e, claro, na França, onde, segundo Segre, falar mal dele significa «ofender a pátria ou a bandeira» (Segre, 1998SEGRE, Cesare. Esperienze di un editore critico. In: SEGRE, Cesare. Ecodtica e comparatistica romanza. Milano- Napoli: Ricciardi, 1998. p. 11-21., p. 12); enquanto, em geral, se posicionaram de forma contrária ao seu método a Itália, a Bélgica, a Alemanha e a Espanha. É importante notar o fato de que os filólogos clássicos, os primeiros a elaborarem o método lachmanniano, permaneceram indiferentes às objeções de Bédier. Os motivos dessa divergência, quase violenta, devem ser procurados, segundo Segre, na percepção de Bédier de que muitos editores lachmannianos de textos românicos apresentavam, como edições críticas, textos tão reconstruídos que se diferenciavam claramente de todos os manuscritos conservados; textos cujo aspecto linguístico era o conjecturado, até mesmo com grande competência, pelo filólogo, mas afastado da realidade documental que os manuscritos nos transmitem. Se Bédier tivesse se restringido a essas observações, naturalmente, estaria certo, segundo Segre, e teria sido necessário elaborar um método de edição menos dominado pela “libido conjectural” dos filólogos, e mais fiel à atestação linguística dos textos, já que o filólogo moderno:

Por mais valente que seja, nunca terá uma competência linguística maior do que a de um copista da época, mesmo, claro, que seus conhecimentos etimológicos e históricos sejam muito superiores. Infelizmente, Bédier, com seu gosto dialético e esprit de système, foi muito além. Ele tentou demonstrar que os estemas não realizam, como se pensava, uma hipótese de trabalho de caráter lógico, mas são o resultado de inconscientes tentativas subjetivas dos filólogos; ele afirmou, mesmo contra a evidência, que é melhor transcrever um bom manuscrito antigo, com todos os seus prováveis erros, do que realizar sofisticados procedimentos para se aproximar do modelo do qual os manuscritos conservados descendem, ou seja, do arquétipo. As reflexões de Bédier, sempre alimentadas por uma viva inteligência, são um bom incentivo a um exame de consciência para o filólogo; propostas, ao contrário, como programa de trabalho, podem fornecer um pretexto para a preguiça e a tautologia. Elas favorecem, sobretudo, o abandono do imperativo ético de dedicação de todo o esforço para compreender a realidade, no nosso caso, a realidade textual. Não utilizar todos os manuscritos de uma obra, não se esforçar para individuar os seus relacionamentos e a sua genealogia é como, para um historiador, decidir menosprezar todo um bloco de documentos, e renunciar a avaliar o seu testemunho (Segre, 1998SEGRE, Cesare. Esperienze di un editore critico. In: SEGRE, Cesare. Ecodtica e comparatistica romanza. Milano- Napoli: Ricciardi, 1998. p. 11-21., p. 12-13).

Dom Henri Quentin, por exemplo, se posiciona de forma contrária às teses de Bédier, ao discutir, inclusive, o caso específico do Lai. Nos Essais de critique textuelle (Ecdotique), de 1926, Quentin elabora um método de reconstrução do arquétipo baseado em cálculos estatísticos aplicados à distribuição das variantes. Na categoria das variantes, Quentin insere lições certamente justas e erros, porque considera que, no início, é necessário, sem emitir julgamentos, levar em consideração que existem lições diferentes. Segundo Stussi (2006bSTUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45., p. 24), distinguir entre conservação de lições justas e inovação, ou mesmo, entre diferentes tipos de inovação, pode ser questionável; ao eliminar esse tipo de distinção, Quentin elimina qualquer interferência de opinião subjetiva: mas se trata de um rigor aparente, para Stussi, pois a quantidade dos fatos é, erroneamente, privilegiada em detrimento de sua qualidade: «dois testemunhos que pertencem a famílias diferentes podem ter em comum dezenas de lições certamente justas ou erros poligenéticos produzidos independentemente em cada um: portanto, basear, neles, um relacionamento de filiação ou de contiguidade seria arbitrário» (Stussi, 2006bSTUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45., p. 24). Tal objeção vale também para aqueles estudiosos que avançaram na pesquisa de procedimentos algorítmicos e na utilização de calculadores partindo de hipóteses quentinianas ou análogas. Stussi afirma que a eficácia de certas objeções antilachmannianas de Bédier determinaram várias adesões ao método do «bom manuscrito». Assim, uma grande quantidade de edições foi realizada nos anos 1930 a partir de um único códice, ao serem consideradas autênticas as lições de responsabilidade não do autor, mas dos copistas. Stussi sinaliza como essa tendência perigosa levou Alexandre Micha a elaborar uma correção ao «bediérismo renunciatário»: ao serem estabelecidas, até mesmo de forma aproximativa, as famílias de testemunhos, cria-se uma hierarquia no interior de cada uma, leva-se em consideração o manuscrito melhor em absoluto como manuscrito-base, submetendo-o, porém, ao controle dos manuscritos melhores das outras famílias. Apesar do aparente bom senso, tal procedimento não impede que a edição seja, ao mesmo tempo, «subjetivamente compósita e recheada de lições espúrias» (Stussi, 2006bSTUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45., p. 25). Já Eugene Vinaver propôs de fixar os princípios da emenda, para que sejam evitados excessos de conservadorismos ou modificações muito subjetivas. Comenta Stussi:

[...] Pode ser considerada errada uma lição suspeita (e daí emendá-la), quando é possível indicar em modo verossímil a gênese do erro. A casística é, sem dúvida, útil e interessante para os fins da crítica conjectural, sobretudo no caso em que o manuscrito de fato é único, não por escolha do editor. Permanecem válidas, no entanto, duas objeções: por um lado não dá para reconhecer e eliminar lectiones singulares aparentemente aceitáveis, por outro, é desejável que a correção explique também a gênese do erro, mas é antes de tudo necessário que satisfaça exigências de senso, língua, estilo etc. As tentativas de impor regras ao bédierismo estão expostas a numerosas objeções de princípio, e de fato são muito pouco eficazes; com razão, portanto, observou-se que «après comme avant 1939, le ‘meilleur manuscrit’ a continué d’imposer ses leçons les moins heureuses». (Stussi, 2006STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.b, p. 26).

Na Itália, a influência de Lachmann chegou no final do século XIX: primeiro Giuseppe Vandelli com a edição de I Reali di Francia (1892-1900), em seguida, com maior convicção, Pio Rajna, editor do De vulgari eloquentia (1896) e Michele Barbi, editor de La Vita Nuova (1907). Figuras relevantes foram, também, Santorre Debenedetti, editor do Orlando Furioso (1928) e Giorgio Pasquali, cujo livro mais famoso, Storia della tradizione e critica del testo (1934), indica como a tradição é objeto de estudo histórico não subalterno à crítica do texto:

Cada testemunho não é um mero conjunto de erros e variantes, mas tem uma específica fisionomia cultural: conhecê-los melhor individualmente significa não somente fazer história da cultura, mas descobrir algo útil para a própria crítica textual. Dela Pasquali recusa não o rigor, mas a rigidez, já que cada problema requer soluções particulares e não há uma chave que abra todas as portas. O lachmannismo ortodoxo não foi contestado com argumentos bédierianos, mas sendo declarado não-idôneo a resolver muitos problemas que na realidade concreta se apresentam ao editor, como no caso de uma recensio aberta, com fenômenos de contaminações, com variantes de autor. Sobre as variantes, a atenção de Pasquali se concentrou com interesse especial e consequências notáveis no desenvolvimento ulterior dos estudos: a ideia de que certas variantes possam ser atribuídas não aos copistas, mas ao próprio autor, abre novos horizontes à crítica do texto. (Stussi, 2006STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.b, p. 28).

Nesse sentido, é necessário pensar a um original estratificado ou em movimento e a edições que estejam à altura dessa complexa situação, ao registrar não somente as variantes de tradição, mas também as genéticas e evolutivas. Para tais desenvolvimentos, contou, certamente, a experiência com obras literárias modernas das quais se conservam variantes autógrafas ou até fases diferentes de elaboração. Não é por um acaso, portanto, acrescenta Stussi, se mais ou menos contemporâneos de Pasquali são os estudos de Michele Barbi dedicados aos textos italianos nos quais a existência de variantes redacionais estava no centro da atenção. Não somente o ensino de Barbi, mas também o de Pasquali, teve grande influência nos estudiosos italianos de filologia românica, come resulta evidente a partir de um confronto com a obra de Gianfranco Contini, Aurelio Roncaglia, D’Arco Silvio Avalle, Cesare Segre e Alberto Varvaro:

Próprio Contini foi responsável por uma das mais importantes resenhas à Storia della tradizione, definida imediatamente «obra magistral», relevante para o romanista «não somente porque a tradição dos clássicos é sobretudo tradição medieval, e, por esse motivo, o estudo daquela tradição se torna história da cultura medieval... não somente porque o autor apresenta como amplos termos de confronto o Milione, Petrarca, Boccaccio..., mas sobretudo porque aqui foram expostos refinadíssimos problemas de método». (Stussi, 2006STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.b, p. 30).

Trata-se de uma tendência compartilhada, na Itália, por editores de textos românicos (não somente medievais), em particular, de obras literárias italianas. Tal exemplo se difundiu, também, na Espanha, tradicionalmente refratária à crítica textual. Segundo Segre (1998SEGRE, Cesare. Esperienze di un editore critico. In: SEGRE, Cesare. Ecodtica e comparatistica romanza. Milano- Napoli: Ricciardi, 1998. p. 11-21., p. 41), é importante notar que, em 1968, Gianfranco Contini apresentou o ensaio Rapporti tra la filologia (come critica testuale) e la linguistica romanza e, em 1971, Maurice Delbouille, La philologie médiévale et la critique textuelle. Naquele período era ainda nítida a contraposição entre as duas posições, definidas, impropriamente, neolachmanniana e bédieriana. Contini, segundo Segre, recorreu a uma estratégia que, por um lado, se baseava na solidez do método de Lachmann para a restituição das variantes substantivas, por outro, mostrava os elementos necessários para a individuação dos traços linguísticos originários, que nunca permite, como pensava Gaston Paris, uma reconstrução completa do texto (Segre, 1998SEGRE, Cesare. Esperienze di un editore critico. In: SEGRE, Cesare. Ecodtica e comparatistica romanza. Milano- Napoli: Ricciardi, 1998. p. 11-21., p. 41). Delbouille, ao contrário, usou uma estratégia frontal, ao oferecer um impressionante elenco de restituições textuais indiscutíveis, fundadas na comparação dos manuscritos, e ao recorrer, com habilidade, às declarações dos bédierianos que podiam ser úteis, inclusive, como aliados. Entre os dois “exércitos”, segundo Segre, ainda hoje há contraposições, embora haja certa trégua. Para Segre, Bédier teve sucesso em algumas questões metodológicas, tais como: a crítica às restaurações ‘paleontológicas’ dos textos; a crítica à reconstrução de um hipotético aspecto linguístico originário; o convite implícito, para além dos paradoxos, a fundar, com mais rigor, os estemas dos códigos e a difusão de uma dúvida metodológica sã sobre o uso deles. Mas, enquanto uma parte dos filólogos (os chamados bédierianos) o seguiu no retorno ao critério do «codex optimus», outro grupo, o lachmanniano, foi estimulado a controlar e a fundar com mais solidez as bases do método, por exemplo, interrogando-se sobre a famosa questão das árvores dicotômicas; ou sublinhando, mais nitidamente do que antes, que os agrupamentos de manuscritos devem ser baseados em erros, ou melhor, erros conjuntivos ou disjuntivos; enfim, propondo correções para aquelas contaminações que Paul Maas considerava irreparáveis (Segre, 1998SEGRE, Cesare. Esperienze di un editore critico. In: SEGRE, Cesare. Ecodtica e comparatistica romanza. Milano- Napoli: Ricciardi, 1998. p. 11-21., p. 42). Dante Isella indicou as linhas fundamentais da crítica das variantes de Contini, a partir de seu ensaio, de 1937, Come lavorava l’Ariosto:

Edições de textos, sobretudo com iniciativas extremamente novas no setor da “fenomenologia do original” (fato que comporta contatos diretos com as fontes manuscritas e com os documentos de arquivo); elaboração de técnicas próprias de uma ecdótica diferenciada em relação às técnicas já afirmadas da “fenomenologia da cópia”; definição de critério de formalização do aparato e de sistemas capazes de melhorar (em todas as suas fases internas, oportunamente distintas e relacionadas) o processo elaborativo do escritor seja nos manuscritos seja nas impressões; indicação, num segundo momento, das concordâncias, manualmente criadas ou elaboradas mecanicamente; e, por fim, introdução, pelo momento somente por capítulos ou por parágrafos, de uma história literária concebida não mais como história moral, «mero esquema empírico direcionado a habilitar ao conhecimento de cada mundo poético», mas «aquela história da cultura linguística», e isso «a partir da aproximação mais provável ao ato expressivo». (Isella, 2009ISELLA, Dante. Le varianti d’autore. In: ISELLA, Dante. Le carte mescolate vecchie e nuove. Organização de Silvia Isella Brusamolino. Torino: Einaudi , 2009. p. 7-28., p. 28).

Segundo Stussi, o retorno, na filologia românica, a um quadro de referência lachmanniano revisto e atualizado foi acompanhado pela discussão sobre a legitimidade das objeções de Bédier e por um aprofundamento metodológico:

Ao homenagear o mestre francês logo após a sua morte, Contini escrevia em 1939 que «o defeito de Bédier foi evidentemente não ter percebido que uma edição crítica é, como todo ato científico, uma mera hipótese de trabalho, a mais satisfatória (ou seja, econômica) que conecte um sistema de dados». Nos anos seguintes, discutiu-se o argumento mais venenoso usado contra a construção de estemas, vale dizer, a surpreedente frequência de bipartidos e foram elaboradas hipóteses explicativas que desmistificam a incontrolável e irracional «força dicotômica», diante da qual Bédier havia deposto as armas. (Stussi, 2006STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.b, p. 31).

Desafios

Paul Eggert resumiu alguns pontos fundamentais do livro Theories of the Text (1999) de David Greetham, ao indicar que a filologia entrou em crise a partir do momento que foram contestados seus três fundamentos de marca positivista. O primeiro pilar a ruir é a linguagem, considerada, por parte dos estudos filológicos, sobretudo, em termos diacrônicos, em contraposição ao sistema sincrônico de Saussure. De fato, segundo Eggert, no momento em que surge, o estruturalismo se predispõe, sem o aporte de uma sólida abordagem diacrônica, a abarcar a totalidade das questões linguísticas. O segundo elemento contestado foi o meio crítico, «o conceito de alteridade ou o gap cultural rejeitado pelo formalismo em geral e pelo New Criticism em particular e, em seguida, rebaixado pela asserção pós-estruturalista segundo a qual toda escrita (écriture) “já foi escrita”, sendo nada mais do que um entrelaçamento de associações intertextuais» (Eggert, 2022, p. 47). Tal negação eliminava, segundo Eggert, qualquer consciência individual, histórica e autoral. O terceiro pilar é o método editorial, ou seja, «a eclética divinatio di Lachmann, na qual o estudioso conjectura a verdade de uma lição ao se identificar trans-historicamente com o autor» (Eggert, 2022EGGERT, Paul. Questi tempi postfilologici... In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica. Autori, testi, lettori. Roma: Carocci, 2022. p. 43-65., p. 47); tal método foi colocado em discussão pelo relativismo, pela fragmentação e pelo revisionismo, típicos de diferentes práticas textuais.

Neil Harris não vê com preocupação a crise do livro no futuro e sim a sobrevivência do livro do passado, impresso com os caracteres móveis, porque, «com a exceção de alguns resíduos artesanais, se trata de um capítulo produtivo já encerrado», segundo ele (Harris, 2022HARRIS, Neil. La sopravvivenza del libro, ossia appunti per una lista della lavandaia. In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica. Autori, testi, lettori. Roma: Carocci , 2022. p. 24-65., p. 67). Para McGann, a crítica textual absolveu duas críticas fundamentais, uma de tipo editorial, outra de tipo interpretativo. Nos últimos dois séculos, o surgimento da moderna filologia provocou a ruptura da união simbiótica entre essas duas perspectivas, a primeira definida «extrínseca» por McGann (ecdótica), a segunda, «intrínseca» (hermenêutica); tal processo histórico, segundo ele, enfraqueceu o valor de métodos e procedimentos consolidados (Mcgann, 2022MCGANN, Jerome J. I monaci e i giganti. Gli studi filologici e bibliografici e l’interpretazione della letteratura. In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica. Autori, testi, lettori. Roma: Carocci , 2022. p.147-169., p. 147).

Nos últimos anos, como lembra Stussi (2006STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.b, p. 43), abriram-se interessantes perspectivas quanto ao uso do computador, que oferece vantagens como a facilidade de apagar, cortar e colar. Outra facilitação, certamente, está conectada com o fato de que um texto adquirido através de um suporte magnético pode extrair em modo rápido e seguro informações que um tempo necessitavam de um longo e cansativo trabalho manual. Há uns cinquenta anos, alguns estudiosos estão tentando desenvolver formas de colaboração nas quais o computador deveria substituir até o filólogo, quanto a escolhas qualitativas, como a distinção entre erros e variantes adiáforas, a identificação de erros conjuntivos e/ou separativos, os recursos a «lectiones difficiliores». A ideia seria que uma máquina instruída adequadamente executasse operações de tipo lachmanniano com rigor e sem imperfeições humanas. Para Stussi, é possível que no futuro se alcance tal resultado mas hoje nada de significativo foi ainda realizado. Os inventores da New Philology, definidos por Stussi «filólogos improvisados», ao invés de aceitar tal falência momentânea, escolheram o caminho de adequar a edição crítica aos limites do computador: a partir do momento que o computador não consegue realizar tal tarefa, foi indicado que não serve distinguir entre erros e variantes; como o computador não é capaz de reconstruir, a partir dos testemunhos conservados, o original perdido, afirmou-se que o objetivo do editor é limitar-se à apresentação de tais testemunhos na sua individualidade, deixando que cada utente os manuseie subjetivamente na tela eletrônica (Stussi, 2006bSTUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45., p. 43).

Segundo Andrea Bozzi, a «edição eletrônica» é uma expressão que indica acepções diferentes, a ponto de se tornar ambígua. De fato, por um lado se refere a textos publicados em suporte informático através da utilização de sistemas de hipertextos e multimídias; por outro lado, recentemente, adquiriu um significado mais técnico, ao denotar um conjunto de atividades relativas ao desenvolvimento de programas que sejam capazes de favorecer a interação entre o editor crítico e o calculador. Nesse sentido, o significado se estendeu até compreender os componentes software presentes em aplicações específicas, nas quais «a possibilidade de consultar arquivos de fontes registradas na memória de um computador é integrada por instrumentos capazes de ajudar o estudioso em muitas fases da prática editorial: do âmbito da filologia eletrônica passa-se, assim, para aquele da filologia computacional» (Bozzi, 2006BOZZI, Andrea. Edizione elettronica e filologia computazionale. In: STUSSI, Alfredo (org.). Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino, 2006. p. 207-232., p. 208).

Segundo Paola Italia, a crise dos últimos vinte anos do conceito de «última vontade do autor» acarretou consequências seja na teoria ecdótica que na concreta praxe editorial. Se no início dos anos 1990, era possível afirmar que o prestígio da última impressão podia ser colocado em crise e, ao decidir qual edição realizar, o filólogo partia da última vontade do autor, nas últimas décadas foi possível assistir ao percurso contrário: ele se pergunta, antes de qualquer coisa, qual lição seria a melhor para se apresentar ao leitor para aquela edição específica. Em primeiro lugar, não está mais a última vontade do autor, mas o reconhecimento de múltiplas vontades que ele manifestou em momentos diferentes de seu percurso poético. Tal fato permitiu também reconhecer e valorizar a identidade cultural das diferentes fases do percurso, que representam a ideia de literatura expressa passo a passo, pelo autor (Italia, 2022ITALIA, Paola. «As you like it». Ovvero di testi, autori, lettori. In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica. Autori, testi, lettori. Roma: Carocci , 2022. p. 129-141., p. 171). Para Peter Robinson, se, por um lado, a revolução informática impulsionou uma multiplicação praticamente infinita de textos, por outro, introduziu uma grande quantidade de instrumentos para a sua análise, confronto e visualização. Segundo Robinson, se levarmos em consideração duas, entre as tantas edições críticas, dos Canterbury Tales de Chaucer, é possível obter uma visualização gráfica que as confrontem, assim como observar a distribuição das palavras em cada texto, contar as ocorrências de uma palavra num texto em relação a outros recorrendo a Google Ngram Viewer. É possível também confrontar alguns testemunhos e averiguar os resultados; recorrer a diferentes técnicas - inclusive algumas que descendem da biologia evolutiva (filogênese) - para criar uma hipotética árvore genealógica dos testemunhos, com um antepassado para cada família e individuar com precisão o conteúdo (Robinson, 2022ROBINSON, Peter. Il concetto di opera nell’era digitale. In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica. Autori, testi, lettori. Roma: Carocci , 2022. p. 221-254., p. 241). Andrea Bozzi indica alguns fatores positivos, no que diz respeito à edição eletrônica: no caso, por exemplo, de fontes documentais em formato digital, se o processo de conversão e memorização foi realizado de forma apropriada, temos um valor adjunto constituído pelos seguintes fatores: em primeiro lugar, a transferência fácil de cópias digitais através de redes telemáticas; em segundo lugar, a possibilidade de intervir sobre elas para aumentar a legibilidade dos dados, no caso em que os suportes materiais sejam danificados ou o desvanecimento da tinta e a acidificação do papel comprometam a leitura; enfim, a possibilidade de usar programas específicos de elaboração que, colocando em relação imagens e transcrição, facilitem o trabalho editorial (Bozzi, 2006BOZZI, Andrea. Edizione elettronica e filologia computazionale. In: STUSSI, Alfredo (org.). Fondamenti di critica testuale. Bologna: il Mulino, 2006. p. 207-232., p. 209). Segundo Paola Italia e Giulia Raboni:

Grandes vantagens foram produzidas, também, pela tecnologia digital na fruição das edições críticas, seja do ponto de vista da aprendizagem didática que do estudo especializado, pela imediata disponibilidade das edições realizadas on-line, que podem ser visualizadas e estudadas ou - se habilitadas - baixadas no próprio computador. Não devemos esquecer que a filologia de autor sempre foi a prerrogativa de uma editoração alta, muito elegante (inclusive pelas refinadas técnicas tipográficas utilizadas), mas também muito cara, e essa maior fruição dos instrumentos de estudo constitui uma verdadeira revolução democrática. Outra vantagem é constituída pela disponibilidade e pela consulta mais fácil de edições realizadas em nível internacional, que conduzem a filologia de autor italiana a se confrontar com as técnicas de representação e o estudo das variantes de autor elaboradas em outros países, não somente europeus, acionando um circuito virtuoso de comunicação que irá permitir a essa disciplina de sair do isolamento em que viveu até agora e à comunidade científica internacional de elaborar protocolos e técnicas de representação cada vez mais compartilhadas, verdadeiro fundamento de um método científico (Italia; Raboni, 2010ITALIA, Paola; RABONI, Giulia. Che cos’è la filologia d’autore. Roma: Carocci , 2010. , p. 36-37).

Segundo Stussi, é necessário prudência para não suscitar perigosas ilusões sobre a contribuição que a tecnologia informática pode fornecer à crítica textual: trata-se de um precioso suporte que diminui os tempos de algumas operações filológicas, tornando-as mais fáceis e seguras; é evidente, também, que substituindo ao suporte impresso o eletrônico, há vantagens seja para o produtor que para o usuário de alguns tipos de edição. No entanto, na crítica do texto, sobretudo, quando são utilizados procedimentos lachmannianos, nenhuma das operações decisivas pode ser delegada ao computador; segundo Stussi, não são excluídos passos adiante em tal direção, mas «até agora não há máquinas com a capacidade de realizar escolhas qualificativas, como, por exemplo, distinguir, entre as variantes, as erradas, com certeza, ou identificar uma lectio difficilior, ou produzir conjecturas» (Stussi, 2015STUSSI, Alfredo. Introduzione agli studi di filologia italiana. Bologna: il Mulino , 2015., p. 9).

Para concluir, podemos afirmar que existe certo ceticismo por parte dos estudiosos em relação à eficácia da aplicação dos sistemas informáticos à crítica textual e, de fato, um número baixo de edições foi produzido através das novas tecnologias. A situação atual, nesse sentido, apresenta dois fenômenos em contraposição: uma tendência positiva e constantemente crescente em relação às aplicações direcionadas à edição genética de obras de autores modernos e contemporâneos; e uma permanência “no limbo da experimentação” para aplicações direcionadas a edições realizadas através de critérios lachmannianos.

Referências

  • AVALLE, Silvio D’Arco. Principi di critica testuale Segunda edição revista e corrigida. Padova: Editrice Antenore, 1978.
  • BOZZI, Andrea. Edizione elettronica e filologia computazionale. In: STUSSI, Alfredo (org.). Fondamenti di critica testuale Bologna: il Mulino, 2006. p. 207-232.
  • CONTINI, Gianfranco. Breviario di ecdotica Torino: Einaudi, 1992.
  • EGGERT, Paul. Questi tempi postfilologici... In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica Autori, testi, lettori. Roma: Carocci, 2022. p. 43-65.
  • HARRIS, Neil. La sopravvivenza del libro, ossia appunti per una lista della lavandaia. In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica Autori, testi, lettori. Roma: Carocci , 2022. p. 24-65.
  • ISELLA, Dante. Le varianti d’autore. In: ISELLA, Dante. Le carte mescolate vecchie e nuove Organização de Silvia Isella Brusamolino. Torino: Einaudi , 2009. p. 7-28.
  • ITALIA, Paola; RABONI, Giulia. Che cos’è la filologia d’autore Roma: Carocci , 2010.
  • ITALIA, Paola. «As you like it». Ovvero di testi, autori, lettori. In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica Autori, testi, lettori. Roma: Carocci , 2022. p. 129-141.
  • MARICHAL, Robert. La critique des textes In: MARICHAL, Robert. L’Histoire et ses méthodes, sous la direction de Charles Samaran Encyclopédie de la Pléiade, vol. XI. Paris: Gallimard, 1961. p. 1247-1366.
  • MAAS, Paul. Critica del testo Tradução de Nello Martinelli e prefácio de Giorgio Pasquali. Firenze: Le Monnier, 1952.
  • MCGANN, Jerome J. I monaci e i giganti. Gli studi filologici e bibliografici e l’interpretazione della letteratura. In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica Autori, testi, lettori Roma: Carocci , 2022. p.147-169.
  • PERUGI, Maurizio. Le canzoni di Arnaut Daniel Edição crítica. Milano-Napoli: Ricciardi, 1978, 2 vol.
  • RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica. Autori, testi, lettori Roma: Carocci , 2022a.
  • RICO, Francisco. Introduzione. In: RICO, Francisco. Gli orizzonti dell’ecdotica Autori, testi, lettori Roma: Carocci , 2022b. p. 9-11.
  • ROBINSON, Peter. Il concetto di opera nell’era digitale. In: RICO, Francisco (org.). Gli orizzonti dell’ecdotica Autori, testi, lettori Roma: Carocci , 2022. p. 221-254.
  • SEGRE, Cesare. Esperienze di un editore critico. In: SEGRE, Cesare. Ecodtica e comparatistica romanza Milano- Napoli: Ricciardi, 1998. p. 11-21.
  • STUSSI, Alfredo (org.). Fondamenti di critica testuale Bologna: il Mulino , 2006a.
  • STUSSI, Alfredo. Introduzione. In: STUSSI, Alfredo. Fondamenti di critica testuale Bologna: il Mulino , 2006b. p. 7-45.
  • STUSSI, Alfredo. Introduzione agli studi di filologia italiana Bologna: il Mulino , 2015.
  • VARVARO, Alberto. Prima lezione di filologia Bari: Laterza, 2012.
  • 1
    A tradução do italiano deste trecho e de todos os seguintes é de minha autoria.
  • 2
    No original: “Dato però che ogni innovazione, in quanto modifica il testo tràdito, costituisce errore, succede molto spesso che editori non sufficientemente premuniti contro la «force dichotomique» del metodo, finiscano con l’utilizzare anche le lezioni adiafore per stabilire parentela fra codici e famiglie di codici”.
  • 3
    No original: “Si dirà quindi che un manoscritto presenta in un luogo (costituito da una o più parole)una lezione variante nei confronti di un altro manoscritto, quando il suo contenuto diverga da quest’ultimo. Il concetto di lezione o variante è fondamentale nelle tradizioni manoscritte per cui manchi l’autografo (originale). Naturalmente gli stessi termini possono essere usati anche per l’autografo, ma sempre in rapporto con altri testi, ad esempio i suoi eventuali apografi o copie”.
  • 4
    No original: “Nella giustificazione dello stemma le lezioni caratteristiche vanno tenute distinte dagli errori, quanto meno per i piani alti dello stemma. Per tanto esse andranno registrate a parte dopo l’elenco degli errori. Per errore si intende qualsiasi tipo di deviazione dalla lezione dell’originale. Dato che l’errore innova nei confronti del testo dell’autore, esso costituisce l’unico elemento di prova per quel che riguarda i rapporti fra i codici che ci hanno trasmesso una stessa opera. L’errore infatti, in quanto deviazione, contrassegna tutti i manoscritti derivati dal codice dove tale deviazione ha avuto luogo, raggruppandoli in famiglie o sistemi omogenei”.
  • 5
    No original: “Tale tendenza va per lo più nel senso della corruzione e della banalizzazione. Questo però non toglie che in alcuni casi essa comporti oscillazioni di tipo sinonimico o parasinonimico. Naturalmente si dà trivializzazione poligenetica solo nella misura in cui l’incoraggiamento alla modificazione sia in re. A tale categoria appartengono per tanto l’«omissio ex homeoteleuto», la «lectio facilior», le ripetizioni in genere, comprese le cosiddette «antecipations de la diction intérieure» e così via, con una varietà di mpieghi e di adattamenti tanto maggiore quanto più l’opera è esposta per sua natura ai rischi della memorizzazione e della iterabilità. Nessuna di queste modificazioni, comprese le sinonimiche, vale come errore congiuntivo”.
  • 6
    No original: “Per definizione le informazioni linguistiche sembrano dunque spettare alla «critique des formes». Ma qui s’impone un chiarimento preliminare: tali informazioni, in quanto pertinenti all’originale, si ricavano dai dati oggettivamente accertabili della critica delle forme (per esempio da quelli metrici), ma si può senz’altro anticipare che allo storico della lingua possono interessare, come bene è stato osservato, tutti i dati del percorso diacronico, e non unicamente quelli autentici. Ne consegue che la critica delle forme contiene, e fornisce al linguista, proprio gli opposti estremi: il dato più consistente e il più momentaneo e labile”.
  • 7
    No original: “Se ne conclude che l’apparente coincidenza della sfera d’interesse linguistico con la critica delle forme è puramente negativa; quella sfera esclude solo quanto è soggetto a scrutinio nell’àmbito dell’automatismo di maggioranza. Come poi per la critica delle forme (e questo serve a ribadire che l’indiscutibile polarità delle due categorie non può equivalere a un assurdo divorzio), anche ell’àmbito della critica delle lezioni si anticipa che varianti non accolte, cioè in nessun modo riferibili all’originale, possono sollecitare l’attenzione del linguista: questi tanto più arricchirà le sue raccolte quanto meno l’apparato sarà selettivo, poiché le sue battute più profittevoli avranno luogo tra le lectiones singulares, quelle precisamente di cui il metodo lachmanniano proclama la prima eliminatio”.
  • 8
    No original: “[...] La meccanicità del procedimento lachmanniano è illusoria perché, essendo bipartita la grande maggioranza degli stemmi, le scelte decisive dipendono esclusivamente dalla volontà del filologo, il quale finisce col mettere insieme lezioni di provenienza diversa creando un testo nuovo, mai esistito in realtà; conviene dunque scegliere un «buon manoscritto», possibilmente «il migliore», e limitarsi a riprodurlo introducendo solo correzioni ovvie e indispensabili perché soltanto così saremo certi di leggere qualcosa che ha avuto un’esistenza storica, e non il prodotto soggettivo del gusto combinatorio di uno studioso moderno. Il Lai de l’Ombre viene dunque ripubblicato nel 1913 seguendo il miglior manoscritto e con una prefazione che già contiene gli argomenti che saranno sviluppati nell’articolo del 1928”.
  • 9
    No original: “[...] Si può ritenere erronea una lezione sospetta (e quindi emendarla), quando si riesce a indicare in modo verosimile la genesi dell’errore. La casistica è senza dubbio utile ed interessante ai fini della critica congetturale, soprattutto là dove il manoscritto è unico di fatto, non per scelta dell’editore. Restano tuttavia valide almeno due obiezioni: da un lato non c’è modo di riconoscere ed eliminare lectiones singulares apparentemente accettabili, dall’altro è certo auspicabile che la correzione spieghi anche la genesi del guasto, ma è prima di tutto necessario che soddisfi esigenze di senso, lingua, stile ecc. I tentativi di imporre regole al bédierismo prestano il fianco a numerose obiezioni di principio, e di fatto sono molto poco efficaci; con ragione è stato dunque osservato che «après comme avant 1939, le ‘meilleur manuscrit’ a continué d’imposer ses leçons les moins heureuses»”.
  • 10
    No original: “I singoli testimoni non sono meri portatori di errori e varianti, ma hanno una loro pecifica fisionomia culturale: conoscerli meglio come individui significa non solo fare storia della cultura, ma scoprire qualcosa di utile per la stessa critica testuale. Di quest’ultima Pasquali rifiuta non il rigore, ma la rigidità, poiché ogni problema richiede soluzioni particolari e non c’è una chiave che apra tutte le porte. Il lachmannismo di stretta osservanza non viene constestato con argomenti bédieriani, ma piuttosto dichiarato inidoneo a risolvere molti problemi che nella realtà concreta si presentano ll’editore, come quando ha a che fare con una recensione aperta, con fenomeni di contaminazioni, con varianti d’autore. Su queste ultime l’attenzione di Pasquali si è soffermata con interesse speciale e conseguenze notevoli sullo sviluppo ulteriore degli studi: l’idea che certe varianti possano risalire non ai copisti, ma allo stesso autore, apre nuovi orizzonti alla critica del testo”.
  • 11
    No original: “Proprio a Contini si deve una delle più importanti recensioni alla Storia della tradizione, definita subito «opera magistrale», rilevante per il romanista «non soltanto perché la tradizione dei classici è soprattutto tradizione medievale, e perciò lo studio di quella tradizione diventa storia della cultura medievale... non soltanto perché l’autore adduce come ampi termini di confronto il Milione, il Petrarca, il Boccaccio..., ma specialmente perché sono posti qui raffinatissimi problemi di metodo». Anche se Contini offre numerose verifiche di area romanza in appoggio a quel «nuovo metodo non lachmanniano», tende a vedere elementi di continuità «nell’ordinaria amministrazione» (dirà in seguito), e in ciò concorda con un altro autorevole recensore, Alphonse Dain. Successivamente proprio Contini è diventato protagonista di un ritorno a Lachmann in lavori che riguardano tra l’altro La vie de saint Alexis, circa un secolo dopo il memorabile intervento di Paris”.
  • 12
    No original: “Edizioni di testi, innanzi tutto, con iniziative estremamente nuove nel settore della “ fenomenologia dell’originale” (ciò che comporta contatti diretti con le fonti manoscritte e con i documenti d’archivio); elaborazione di tecniche proprie di un’ecdotica differenziata rispetto a quelle ormai ollaudate della “ fenomenologia della copia”; messa a punto di criterio di formalizzazione dell’apparato e di sistemi capaci di rendere al meglio (in tutte le sue fasi interne, opportunamente distinte e correlate) il processo elaborativo dello scrittore sia sui manoscritti sia sulle stampe; approntamento, in secondo luogo, di concordanze, manualmente allestite o elaborate meccanicamente; e infine avvio, per il momento solo per capitoli o paragrafi, di una storia letteraria intesa non più come storia morale, «mero schema empirico vòlto ad abilitare alla conoscenza dei singoli mondi poetici», ma «quale storia della cultura linguistica», e ciò «secondo l’approssimazione più probabile all’atto espressivo»”.
  • 13
    No original: “Rendendo omaggio al maestro francese subito dopo la sua morte Contini scriveva nel 1939 che «il difetto di Bédier è evidentemente quello di non accorgersi che un’edizione critica è, come ogni atto scientifico, una mera ipotesi di lavoro, la più soddisfacente (ossia economica) che colleghi un sistema di dati». In seguito è stato discusso l’argomento più velenoso usato contro la costruzione di stemmi, cioè la sorprendente frequenza di quelli bipartiti, e sono state elaborate zipotesi esplicative che smitizzano la inarrestabile e irrazionale «forza dicotomica», di fronte alla quale Bédier aveva ceduto le armi”.

Editado por

Editor-chefe dos Estudos de Literatura

Silvio Renato Jorge

Editores convidados

Manoel Mourivaldo Santiago
Ceila Maria Ferreira Batista

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2024

Histórico

  • Recebido
    25 Jun 2023
  • Aceito
    20 Fev 2024
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