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A atualização histórica como ação contra-atualista: museus e monumentos entre a recordação e o esquecimento no Brasil contemporâneo

The historical update as a counter-updatism action: museums and monuments between remembrance and oblivion in contemporary Brazil

RESUMO

Na experiência de tempo atualista, o futuro nada mais é que uma nova versão do presente, como se o poder de agência dos sujeitos diminuísse. O presente artigo analisa dois tipos de ações que podem contribuir para o enfraquecimento de tal lógica: a preservação de acervos de museus através da digitalização e a discussão a respeito dos monumentos urbanos. A hipótese levantada é a de que a virtualização de museus e a modificação de monumentos possuem o potencial de atualizações históricas, desde que compreendam, assim como a narrativa historiográfica, os legados do passado e os projetos de futuro que fazem parte do presente, visando à defesa de valores democráticos e de uma sociedade mais igualitária. Conclui-se, por fim, que uma melhor compreensão do presente e a renovação de uma expectativa de futuro na qual sejamos agentes, e não apenas espectadores, pode ser alcançada através da narrativa histórica como ação contra-atualista, da incorporação de variadas percepções do tempo na historiografia e da abertura de possibilidades no futuro.

PALAVRAS-CHAVE
Monumento; Teoria da história; Atualismo

ABSTRACT

In the experience of the time called “updatism”, the future is nothing more than a new version of the present, as if the subject’s power of agency had decayed. This paper analyzes two actions that can help to attenuate this logic: the digitization of museum collections and the discussion about urban monuments. The hypothesis raised by us is that the virtualization of museums and the modification of monuments have potential as historical updates, as long as they comprehend, as well as the historiographical narrative, the legacies of the past and the projects for the future that are part of the present, aspiring to the defense of democratic values and a more egalitarian society. Finally, we concluded that a better understanding of the present and the renewal of an expectation of the future in which we are agents, and not just spectators, can be achieved through the historical narrative as a counter-updatism action, the incorporation of varied perceptions of the time in historiography and the opening of possibilities in the future.

KEYWORDS
Monument; History theory; Updatism

Introdução

Os aplicativos de mensagens, presentes na maioria dos smartphones, assim como os e-mails e as redes sociais, fazem muitos dos seus usuários sentirem que o tempo é curto demais para todas as demandas que lhes são feitas. A sensação de disponibilidade causada pelas mensagens instantâneas confunde os horários de trabalho e descanso, e o bombardeamento de notícias e notificações faz com que sintamos como se uma hora de desconexão já fosse tempo sufficiente para nos deixar atrasados e desinformados em relação aos nossos contemporâneos. Da mesma forma, a possibilidade de se comunicar com pessoas em qualquer parte do mundo – desde que ali haja conexão à internet – faz com que as distâncias espaciais não sejam mais um problema, criando novos espaços virtuais de sociabilidade, trabalho e lazer. Como uma pessoa pode estar presente simultaneamente em vários lugares graças ao digital, tornou-se necessário adicionar o adjetivo “real” à definição do tempo: o tempo real é aquele do “aqui e agora” (SIBILIA, 2005SIBILIA, Paula. El hombre postorgánico: cuerpo, subjetividad y tecnologías digitales, Buenos Aires: FCE, 2005., n. p.).

As atualizações constantes exigidas por nossos aparelhos eletrônicos e seus softwares, por sua vez, trazem a sensação de que, embora atualizados, os programas continuam os mesmos. No entanto, embora as mudanças sejam imperceptíveis, não há a possibilidade de não os atualizar, pois assim se tornariam obsoletos – afinal, de acordo com a temporalidade própria dos computadores, “existir” significa “estar atualizado” (CHUN, 2016CHUN, Wendy. Updating to remain the same: habitual new media. Cambridge: MIT Press, 2016., n. p.). Da mesma forma, essa lógica atualista parece ter se tornado uma experiência que ultrapassa o âmbito da informática, fazendo-se presente também na percepção contemporânea do tempo. Araujo e Pereira, ao perceberem a emergência da palavra “atualização” a partir da década de 1960, desenvolveram a categoria do “atualismo”, para identificar essa experiência do tempo, na qual passado e futuro parecem não ter um potencial transformador, e só são levados em consideração quando são atualizados e mobilizados de acordo com os propósitos de um presente autocentrado (ARAUJO; PEREIRA, 2016ARAUJO, Valdei; PEREIRA, Mateus H. F. Reconfigurações do tempo histórico: presentismo, atualismo e solidão na modernidade digital. Revista UFMG, Belo Horizonte, v. 23, n. 1 e 2, p. 270-297, jan./dez. 2016.; 2018ARAUJO, Valdei; PEREIRA, Mateus H. F. Atualismo 1.0: como a ideia de atualização mudou o século XXI. Ouro Preto: SBTHH, 2018.).

A ascensão de políticos como Trump, nos Estados Unidos, e Bolsonaro, no Brasil, parece intensificar essa experiência do tempo atualista, já que tais políticos, embora tenham sido eleitos dentro das regras democráticas, ameaçam o próprio sistema democrático através da manipulação da verdade, da disseminação – muitas vezes automatizada – de fake news, da desautorização de especialistas, como cientistas e historiadores, sob o argumento de que eles emitem apenas opiniões, e do fomento de teorias da conspiração que os coloquem como vítimas de um sistema político corrupto (ARAUJO; KLEM; PEREIRA, 2020ARAUJO, Valdei; PEREIRA, Mateus; KLEM, Bruna (org.) Do Fake ao Fato: (des) atualizando Bolsonaro. Vitória: Milfontes, 2020.). Esses políticos e seus apoiadores mobilizam uma nostalgia em relação a um passado idealizado, sem corrupção, sem “minorias”, ao mesmo tempo em que alimentam o medo em relação a um futuro no qual as maiorias seriam oprimidas pelas minorias, a democracia seria ameaçada e a identidade nacional seria perdida. Além de estimular essas ideias sobre um passado ideal e um futuro ameaçador, que só pode ser salvo por um herói ou “mito” eleito no presente, as extremas-direitas sabem se aproveitar das ondas de atualização, com a finalidade de evitar a responsabilização por falas e ações que tenham sido feitas no passado, mesmo que em um passado muito recente: algo dito hoje pode ser desdito amanhã, sob a justificativa de que apenas as notícias mais recentes são as que realmente representam a verdade (ARAUJO; MARQUES; PEREIRA, 2020ARAUJO, Valdei; MARQUES, Mayra; PEREIRA, Mateus. Almanaque da COVID-19: 150 dias para não esquecer, ou a história do encontro entre um presidente fake e um vírus real. Vitória: Editora Milfontes, 2020.; ARAUJO; PEREIRA, 2021ARAUJO, Valdei; PEREIRA, Mateus. Atualismo: Pandemia e historicidades no interminável 2020. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 47, n. 1, p. e39802, 22 mar. 2021.).

Assim, na experiência do tempo atualista, o futuro nada mais é que uma nova versão do presente, que parece acontecer independentemente de nossas ações. A pandemia de Covid-19, declarada pela Organização Mundial da Saúde em 2020, levou todas as pessoas a uma maior dependência das mídias digitais e parece ter contribuído para essa sensação de atualização automática, já que, de forma paralela, outra epidemia contribuiu para a propagação do vírus: a infodemia, ou seja, o fuxo contínuo de informações, inclusive as falsas ou distorcidas, que circulam nos aplicativos de mensagens instantâneas e se sobrepõem a cada minuto. Tal sensação de enfraquecimento do poder de agência dos sujeitos históricos, no entanto, não impede que existam formas de agir que consigam sair da lógica atualista: em 2020 e 2021, ocorreram inúmeros protestos e manifestações em defesa da democracia, contra o racismo e contra as desigualdades socioeconômicas, vistos em países como Brasil, Estados Unidos e Chile.

Wendy Chun, ao analisar a forma como as tecnologias da informação possuem uma temporalidade própria, afrma que “redes são feitas de tempo: o tempo crônico dos hábitos (memória) e o tempo pontual da crise” (CHUN, 2016CHUN, Wendy. Updating to remain the same: habitual new media. Cambridge: MIT Press, 2016., n. p.). Esse tempo de crise pode ser caracterizado por momentos considerados como “pontos de virada”, nos quais há uma mudança considerável, e a frequente exigência de atualização faz com que a crise seja uma característica fundamental da temporalidade de tais mídias. Nesse sentido, talvez seja preciso compreender a crise como um momento de ação, ou seja, de retomada da agência que parecia impossível na experiência de tempo atualista. Walderez Ramalho, recuperando as diferentes formas de referência ao tempo na língua grega, nos lembra que o tempo pode ser, sim, o tempo cronológico, sequencial, mas também pode ser kairós, o momento oportuno para a ação (RAMALHO, 2021RAMALHO, W. Reinterpreting the “times of crisis” based on the asymmetry between chronos and kairos. História da Historiografa: International Journal of Theory and History of Historiography, Ouro Preto, v. 14, n. 35, p. 115-144, 29 mar. 2021.). Se a expectativa de atualização automática, na qual tudo se transforma ao mesmo tempo em que nada parece diferente, parece entorpecer a nossa capacidade de agência, a consciência de que o tempo não apenas passa, mas também pode ser o espaço propício para a ação é uma ferramenta importante na luta contra a desinformação e o negacionismo, e também uma forma de retomarmos o direito à liberdade e à contingência do futuro, ameaçado por um capitalismo de vigilância que rastreia nossas ações no presente para prever nossas formas de ação e consumo no futuro (ZUBOFF, 2019ZUBOFF, Shoshana. The Age of Surveillance Capitalism. London: Profle Books, 2019.).

Outro aspecto que pode colaborar com a percepção de uma falta de agência dentro da lógica atualista, muito influenciada pelo ritmo das tecnologias contemporâneas da informação, é o fato de a internet, ao mesmo tempo em que pode conectar pessoas ao redor do globo, também individualiza o que cada usuário quer saber ou como deseja se entreter, o que parece causar um enfraquecimento do tecido social à medida que os indivíduos não compartilham uma quantidade sufficiente de informações, de cultura e de interesses, difficultando a comunicação entre si (CASTELLS, 2011, p. 9CASTELLS, Manuel. Museus na era da informação: conectores culturais de tempo e espaço. Revista Musas, Brasília, ano VII, n. 5, 2011b, p. 8-21. Disponível em: https://bit.ly/32juh7n. Acesso em: 05 mar. 2021.
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). Dessa forma, segundo Manuel Castells, é preciso criar pontes de comunicação entre as pessoas, para que elas compartilhem alguns códigos de comunicação, o que o autor chama de protocolos de comunicação cultural. Um exemplo de ponte seria a arte, que consegue mobilizar pessoas de diferentes culturas, mesmo que elas não compartilhem muitas características entre si. Outro exemplo de protocolo de comunicação cultural seriam os museus, que também teriam o poder de nos lembrar dos limites entre o que já passou, o que vivemos e o que está por vir, retomando uma certa sequência temporal que pode ser compartilhada entre aqueles que os visitam.

Se o espaço de fuxos a-histórico da internet (CASTELLS, 1999, p. 467CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede, a era da informação: economia, sociedade e cultura, v. I. Trad. Roneide Venâncio Majer e Jussara Simões. São Paulo: Paz e Terra, 1999.) é propício para criar “universos paralelos”, podemos deduzir que a história, através da organização das temporalidades, identificando sincronias e diacronias, seja uma ferramenta importante para combater essa forma de desagregação do tecido social. Logo, assim como os museus, a narrativa historiográfica e as suas formas de organizar o tempo seriam, também, uma ponte criadora de sentido, um protocolo de comunicação cultural. De forma semelhante, a compreensão do presente como parte do tempo histórico, assim como os projetos de futuro que ele abriga e os passados que mobiliza, pode constituir-se em uma ação contra-atualista, na medida em que consiga reconhecer o poder de agência do sujeito histórico como transformador do presente, das interpretações sobre o que passou e dos projetos de futuro, refutando a percepção de que o presente se atualiza de forma linear e automática. Como apontam Araujo e Pereira:

Um caminho contra-atualista passa pela reivindicação do presente como parte incontornável do trabalho do historiador (resgatando, por exemplo, o legado dos Annales de uma história a partir do presente), mas com uma ênfase renovada na compreensão do passado e do futuro como tempos presentes, ativos, que não estão ao dispor do presente apenas, mas que formam uma parte de nosso ambiente existencial (ARAUJO; PEREIRA, 2021, p. 13ARAUJO, Valdei; PEREIRA, Mateus. Atualismo: Pandemia e historicidades no interminável 2020. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 47, n. 1, p. e39802, 22 mar. 2021.).

Assumindo a importância do ofício de historiador como uma estratégia contra-atualista que recupera nosso poder de agência, pretendo analisar dois tipos de ações, aqui entendidas como potenciais atualizações históricas, que podem atuar em favor da construção de histórias mais democráticas: a preservação de acervos de museus através da digitalização e a discussão a respeito dos monumentos, especialmente as estátuas, que devem ou não compor os espaços urbanos, a fim de representar uma sociedade plural. É importante frisar que essas ações de digitalização de documentos e remoção de estátuas não são, por si mesmas, necessariamente democráticas; veremos que elas podem colaborar tanto para a valorização de histórias quanto para o seu apagamento, a depender de como tais ações são planejadas e colocadas em prática. No entanto, há também a possibilidade de que sejam atualizações históricas, ou seja, atualizações que podem ser feitas de maneira honesta, fazendo uso da capacidade da historiografia em relacionar e analisar as temporalidades, e resgatar determinados passados, objetivando a criação de novos projetos de futuro. Ao perceber esse potencial contra-atualista dessas atualizações históricas, talvez possamos, como historiadores, pensar nessas ações e em outras que possibilitem a democratização do conhecimento, a defesa dos direitos dos mais variados grupos sociais e a preservação e o aprimoramento dos valores democráticos.

Virtualizações emergenciais de museus e sua atualização midiática

Na segunda noite do mês de setembro de 2018, as imagens do incêndio do Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, eram televisionadas em diversos canais. O museu foi criado em 1818 por D. João VI, com o objetivo de “propagar os conhecimentos e estudos das ciências naturais do Reino do Brasil” (D. JOÃO VI apud SEREJO, 2020, p. 4SEREJO, Cristiana (ed.). Museu Nacional: Panorama dos Acervos. Passado, Presente e Futuro. Rio de Janeiro: Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2020.). Em 1946, ele foi agregado à Universidade do Brasil, que nos anos 1960 se tornaria a Universidade Federal do Rio de Janeiro, intensificando as suas atividades de pesquisa. Com o fim da monarquia e o início do período republicano, o Palácio de São Cristóvão, antiga morada dos imperadores Pedro I e Pedro II, passou a abrigar o Museu Nacional. E foi esse local que, no mesmo ano em que completava o seu bicentenário e sendo considerado uma das principais instituições de história natural e antropologia da América Latina, ardia em chamas para o Brasil inteiro ver.

Embora a conclusão jurídica seja a de que o que ocorreu foi um acidente, o descaso com que a memória é tratada no Brasil, desde o apagamento das culturas de comunidades quilombolas e indígenas até o abandono e falta de financiamento de prédios históricos e museus, faz com que algumas pessoas denunciem o acontecido como o grande exemplo do memoricídio que acontece em nosso país. Beiguelman (2019, p. 216)BEIGUELMAN, Gisele. Memória da Amnésia: políticas do esquecimento. São Paulo: Editora Sesc, 2019. retoma o apontamento feito por Huyssen (2014)HUYSSEN, Andreas. Culturas do passado-presente. Rio de Janeiro: Contraponto, 2014. de que a modernidade, especialmente após as catástrofes do século XX, não é capaz de deixar ruínas, apenas escombros. A ruína é um resquício de outros tempos, uma presentificação do passado; já os escombros são produtos de uma catástrofe e devem servir de alerta sobre um futuro ameaçador. O incêndio do Museu Nacional é, nesse sentido, uma catástrofe que escancarou o memoricídio brasileiro, impedindo que as gerações futuras tenham acesso às descobertas sobre o passado que a instituição abrigava.

O alerta sobre um futuro ameaçador simbolizado pela catástrofe pode ter sido prefigurado pelo descaso que um dos presidenciáveis demonstrou pelo incêndio. Enquanto outros candidatos lastimavam a perda de grande parte do acervo do Museu Nacional, Jair Bolsonaro se manifestou com um: “e daí? Já tá feito, já pegou fogo, quer que eu faça o quê? O meu nome é Messias, mas eu não tenho como fazer milagre” (CALGARO, 2018CALGARO, Fernanda. ‘Já está feito, já pegou fogo, quer que faça o quê?’, diz Bolsonaro sobre incêndio no Museu Nacional. G1, 04 de setembro de 2018. Disponível em: https://glo.bo/3ennSKz. Acesso em: 15 dez. 2021.
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, n. p.). Esse seria o futuro presidente do Brasil, que, em 2020, durante a pandemia de Covid-19, repetiria o mesmo argumento ao ser questionado sobre as (até então) mais de 5 mil mortes causadas pela doença no país: “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”, externalizando uma espécie de “ideologia da destruição” (VINHAS, 2020VINHAS, Luciana. O messias que não faz milagre: notas sobre a ideologia da destruição. Revista da ABRALIN, Sergipe, v. 19, n. 3, p. 455-474, 17 dez. 2020., n. p.).

Após o incêndio, uma tentativa de recuperar parte do acervo do Museu Nacional de forma digital se deu através da criação de um museu virtual. A Tencent, empresa multinacional chinesa de tecnologia, anunciou, em novembro de 2018, uma parceria com a instituição para a recuperação digital de seu acervo. Essa aliança se deu através do documento “Renascimento de Luzia – Museu Nacional Digital Brasileiro”, assinado na embaixada do Brasil em Pequim pelo diretor do Museu Nacional, Alexander Kellner, e por Ye Jun, vice-presidente de produtos de navegação móvel da Tencent. O projeto inclui a colaboração de turistas chineses que já visitaram o museu e que forneceram fotos e vídeos para que esses documentos sejam reproduzidos no museu digital, acrescidos de informações sobre os artefatos expostos.

Em setembro de 2019, o Museu Nacional Digital do Brasil passou a poder ser acessado pelos usuários do miniprograma MR. BOWU, pertencente à Tencent e acessível apenas através do navegador QQ Browser, da mesma empresa. Nessa versão do museu, o eventual visitante poderá ver imagens, vídeos e outros documentos, que totalizam 700 arquivos digitais – muitos deles versões digitais de artefatos atingidos pelo fogo, reproduzidos com base nas informações provenientes dos visitantes, constituindo-se na primeira versão do Museu Nacional apresentada em uma língua estrangeira.

Embora a digitalização possa ser vista como um dos principais meios de não permitir que Museu Nacional caia no esquecimento, é preciso dizer que o próprio diretor da instituição não acredita que isso seja o sufficiente. De acordo com Alexander Kellner, apesar de a reconstrução virtual do acervo ajudar a minimizar as perdas, o que o museu precisa mesmo é conseguir reconstruir as suas coleções. Em suas palavras: “é o material original que tem a mágica de capturar o interesse do visitante de um museu de história natural e antropologia!” (KELLNER, 2020, p. 117KELLNER, Alexander. Palavra do Diretor. In: SEREJO, Cristiana (ed.). Museu Nacional, panorama dos acervos: Passado, Presente e Futuro. Rio de Janeiro: Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2020. p. 116-119.). A dimensão material, então, é fundamental para atrair visitantes e pesquisadores aos museus, tendo em vista que o material digitalizado, caso esteja disponibilizado na internet, pode ser acessado de qualquer lugar do mundo sem que a pessoa precise ir ao museu. Para além da mera questão da visitação, é claro, há também o fato de que muitas pesquisas dependem da materialidade do objeto analisado, pois há características que nem sempre podem ser tão bem percebidas através de imagens computadorizadas, mesmo que em três dimensões.

Como demonstram as iniciativas de resgate, seja através da digitalização ou da restauração, a destruição parcial do Museu Nacional pelas chamas inspirou, em pesquisadores e visitantes do museu, a vontade de recuperar a memória da instituição como uma representante do desenvolvimento científico no Brasil, característica definida no próprio site do museu:

Criado por D. João VI, em 06 de junho de 1818 e inicialmente, sediado no Campo de Sant’Ana, serviu para atender aos interesses de promoção do progresso cultural e econômico do país. Como museu universitário, tem perfil acadêmico e científico. Suas exposições resultam da história da instituição e da excelência de suas atividades de pesquisa e ensino, cumprindo a finalidade precípua de produção e disseminação do conhecimento nas áreas de ciências naturais e antropológicas (MUSEU NACIONAL, 2021MUSEU NACIONAL. O Museu. Disponível em: https://bit.ly/3HbfTwz. Acesso em: 22 mai. 2021.
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).

A valorização da pesquisa científica foi um tema de bastante relevância durante o ano de 2020, devido à pandemia de Covid-19. A necessidade de desenvolver de forma rápida uma vacina e, ao mesmo tempo, combater as desinformações a respeito dessa doença, como curas milagrosas e medicamentos de eficácia duvidosa, que eram propagadas até mesmo por governantes como Donald Trump e Jair Bolsonaro, fez com que, seja para criticar ou apoiar, a população em geral voltasse sua atenção para a forma como as pesquisas científicas se desenvolviam. Nesse sentido, a recuperação digital de parte do acervo de um museu que é símbolo da pesquisa científica no Brasil pode ser considerada uma forma de atualização histórica, já que não apenas contribui para o maior conhecimento a respeito do passado do país, utilizando-se das tecnologias disponíveis para recuperar parte do que foi perdido, mas também tem grande significado para o momento atual, contribuindo para a perspectiva de que a pesquisa científica seja cada vez mais valorizada no futuro.

No entanto, alguns representantes políticos viram no incêndio e na reconstrução do Museu Nacional uma oportunidade para atualizar a identidade desse museu de outra forma. Ernesto Araujo, quando ainda Ministro das Relações Exteriores do governo de Jair Bolsonaro, unido a outros apoiadores do governo e entusiastas da monarquia, como o deputado Luiz Philippe Orleans e Bragança, tetraneto de D. Pedro II, e Olav Schrader, superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) no Rio de Janeiro, iniciaram um movimento de reivindicação do Palácio de São Cristóvão para a instalação de um Palácio Imperial. O museu seria, então, alienado da Universidade Federal do Rio de Janeiro e administrado pelo Governo Federal, o que implicaria na realocação de todo o acervo proveniente de pesquisas, assim como as próprias atividades de pesquisa, para outro prédio.

Além do prejuízo para as pesquisas desenvolvidas na instituição, a iniciativa ofuscaria o Museu Imperial, em Petrópolis, que já é dedicado aos tempos de monarquia. Embora tenha causado comoção, a proposta parece não ter se desenvolvido, mostrando-se apenas mais uma polêmica típica da agitação atualista (PEREIRA; ARAUJO, 2020aPEREIRA, Mateus; ARAUJO, Valdei. O primeiro debate presidencial nos EUA e a crise da democracia. Jornalistas Livres, 01 de outubro de 2020a. Disponível em: https://bit.ly/3myWyNZ. Acesso em: 31 ago. 2021.
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; 2020bPEREIRA, Mateus; ARAUJO, Valdei. O show de Trump: renovação ou cancelamento? Jornalistas Livres, 06 de novembro de 2020b. Disponível em: https://bit.ly/3JmZ0AP. Acesso em: 31 ago. 2021.
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) promovida por apoiadores do atual governo; ela é uma demonstração, no entanto, de que mesmo uma instituição tão antiga como o Museu Nacional, reconhecida não apenas por preservar um acervo acumulado ao longo de 200 anos, mas também por manter diversas pesquisas científicas em seu interior, pode ser alvo de uma forma de atualização atualista – entendida aqui como diferente de uma atualização histórica – que pretende fazer uso do passado de acordo com interesses políticos do presente, promovendo ativamente o esquecimento de uma determinada memória em prol de outra.

Outro museu ameaçado pelas chamas foi o Museu de História Natural e Jardim Botânico da Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte, que havia completado 50 anos em 2019. O incêndio ocorreu em 15 de junho de 2020, menos de dois anos após o incidente no Museu Nacional, atingindo uma de suas reservas técnicas. Parte do acervo de arqueologia, entomologia e paleontologia foi perdido ou muito danificado, o que exigiu um trabalho com técnicas de escavação arqueológicas para recuperar o que fosse possível. No dia 13 de janeiro de 2021, durante o evento “Museus universitários: desafios e oportunidades”, foi lançada a campanha Renasce Museu, com o objetivo de criar uma plataforma digital com fotos e informações sobre o acervo. Durante a live do evento, Carolina Vilas Boas, diretora do Departamento de Processos Museais do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), observou que a maioria dos projetos de digitalização de acervos são feitos “de improviso”, e que é necessário que se invista nesta área (CAC UFMG, 2021CAC UFMG. Museus universitários: desafios e oportunidades. Youtube, 13 de janeiro de 2021. Disponível em: https://bit.ly/3FwMdtd. Acesso em 22 mai. 2021.
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). Tanto a iniciativa do Renasce Museu quanto a fala de Vilas Boas indicam uma percepção do armazenamento e da exposição digitais como meios de preservação dos acervos. No entanto, a digitalização de acervos não deve ser entendida como uma atualização automática contra o risco da perda; algumas vezes, a remidiação1 1 Optou-se por traduzir remediation (BOLTER; GRUSIN, 2000) como ‘remidiação’ para facilitar a compreensão. Para uma discussão sobre o conceito, seu uso e sua tradução, Cf. BOLTER; GRUSIN, 2000; GRUSIN, 2004; SANTAELLA, 2007; MANOVICH, 2006 e SAAD CORRÊA, 2013. para o digital pode ser uma justificativa para promover o apagamento de originais, como veremos a seguir.

Em 2017, o então senador Magno Malta, fliado ao Partido Liberal (PR) no Espírito Santo apresentou o Projeto de Lei 7.920/2017 que possuía a finalidade de alterar a lei 12.682, que dispunha sobre a digitalização de documentos. Além de garantir o valor legal dos documentos digitalizados, essa alteração permitiria que os documentos originais fossem eliminados após a sua digitalização. Por isso, quem se opunha a esse PL se referia a ele como “PL da Queima de Arquivo”. Historiadores e arquivistas se organizaram prontamente contra tal projeto de lei através da campanha “Queima de Arquivo Não”, da qual participavam organizações como a Associação Nacional de História (ANPUH), o Conselho Nacional de Arquivos (CONARQ), a Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários, Cientistas da Informação e Instituições (FEBAV), entre outras.

Mesmo com a resistência de instituições especializadas na gestão de arquivos, em 2019, o presidente Jair Bolsonaro sancionou uma lei conhecida como Lei de Liberdade Econômica, oriunda da Medida Provisória 881/19, na qual, dentre outras ações, estava permitida a eliminação dos documentos originais após a sua digitalização. Para o professor de Gestão Arquivística da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), Charlley Luz, essa MP “aparenta ser um colado de várias leis ajustadas” que “institui a ‘Queima de Arquivos’ na calada da noite e autoriza a destruição do patrimônio documental brasileiro” (LUZ, 2019LUZ, Charlley. Medida Provisória n. 881/19. AABA – Associação dos Arquivistas da Bahia, 07 de maio de 2019. Disponível em https://bit.ly/3yWVzMB. Acesso em 22 mai. 2021.
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, n. p.).

Para Renato Venâncio e Bruno Feitler, a falta de definições claras sobre quais documentos serão considerados “de valor histórico” e, por isso, destinados à guarda permanente, faz com que a “Lei da Queima de Arquivo” possa ser usada como um instrumento de preservação de documentos totalmente sujeito às necessidades políticas dos diferentes governos ao longo dos anos (FEITLER; VENÂNCIO, 2018, p. 9VENANCIO, Renato Pinto; FEITLER, Bruno. Arquivos sob ameaça: os perigos de umapolítica antiarquivística. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 38, n. 78, p. 7-14, ago. 2018. Disponível em: https://bit.ly/3Hcxbt7. Acesso em: 15 de mai. 2021.
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). Outros problemas nesta lei incluem a falta de um plano de preservação dos documentos digitais – pois, se os originais físicos são destruídos e a versão digital desaparece, a perda é irreparável -; e o desrespeito aos órgãos arquivísticos competentes que, tradicionalmente, fornecem as bases para a conservação e o descarte de documentos, como é o caso das tabelas de temporalidade e das três idades do arquivo (ARAUJO; SANTOS; OLIVEIRA, 2020ARAUJO, Claudialyne; SANTOS, Monica; OLIVEIRA, Danielle. Impactos do Projeto de Lei nº 7.920/2017 nos processos de gestão documental nos arquivos brasileiros: reflexões e posicionamentos. Ci. Inf. Rev., Maceió, v. 7, n. 1, p. 86-104, jan./abr. 2020.).

Os exemplos citados mostram que a digitalização dos acervos ou a virtualização de museus pode tanto contribuir para a sua permanência quanto para o seu desaparecimento, para a memória ou para o esquecimento, a depender das intenções de quem organiza esse processo e da forma como ele é feito. Diferencio, aqui, a digitalização da virtualização, por compreender que a digitalização é uma cópia de um objeto ou documento físico, ao passo que a virtualização de um museu, por exemplo, implica na criação de um espaço virtual para esse aparelho cultural (MARQUES, 2021MARQUES, Mayra. Quantos espaços pode ocupar um museu? A atuação do Museu da Música de Mariana como arquivo, museu e páginas da web. Temporalidades, Belo Horizonte, n. 1, v. 13, ed. 35, p. 729-750, jan./jun. 2021.). Assim, a simples atualização midiática, ou seja, ‘remidiar’ (transferir a outra mídia) o acervo através das tecnologias de digitalização e difusão da informação, não garante que o acervo estará a salvo do desaparecimento nem que o seu acesso estará democratizado. Vera Dodebei diz que “a digitalização é ao mesmo tempo a salvação e a destruição dos patrimônios da humanidade” (DODEBEI, 2006, p. 8DODEBEI, V. Patrimônio e memória digital. Morpheus: Revista Eletrônica em Ciências Humanas, Rio de Janeiro, v. 4, n. 8, 2006. p. 1-13. Disponível em: https://bit.ly/33YWVLn. Acesso em: 10 mar. 2021.
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). Enquanto a digitalização pode ser um meio eficaz de difundir a informação sem prejudicar a conservação dos documentos, o excesso de informação causado pela digitalização faz com que o pesquisador possa se sentir perdido, ou mesmo ansioso, ao lidar com a vasta documentação disponível. Além disso, há sempre a possibilidade de, repentinamente, toda a documentação contida em um site desaparecer devido a algum problema técnico.

A digitalização de acervos é o objetivo do programa Memória do Mundo da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), para que o conjunto das obras possa não apenas ser preservado, em alguma medida, em casos de sinistro, mas também para aumentar a sua acessibilidade, permitindo que pessoas ao redor do mundo possam conhecê-los. No entanto, o programa reconhece que “as reproduções digitais não são o equivalente dos suportes originais” (UNESCO, 2002, p. 12UNESCO. Memória do Mundo: diretrizes para a salvaguarda do patrimônio documental. 2002. Disponível em: https://mowlac.fles.wordpress.com/2012/07/diretrizes-para-a-salvaguarda-do-patrimc3b4nio-documental.pdf. Acesso em: 07 abr. 2022.
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). É curioso, para não dizer trágico, pensar que a Unesco e outras instituições de memória se preocupam em manter ao menos algum vestígio de documentos que já não existem mais, enquanto o governo brasileiro aprova leis como a “Lei da Queima de Arquivo”, que permitem a eliminação dos documentos originais após a sua digitalização.

Tomando por base o documento da Unesco sobre a importância do patrimônio digital, assim como os exemplos dos museus incendiados e do projeto de lei da “Queima de Arquivo”, destaco alguns pontos principais no que diz respeito aos processos de virtualização emergencial nesses casos: 1) a digitalização / virtualização é, muitas vezes, vista como uma forma de diminuir os impactos da perda dos acervos diante da falta de investimentos na preservação dos prédios e dos acervos físicos de museus e arquivos; 2) a digitalização é associada, quase que automaticamente, à disponibilização e, por conseguinte, à democratização dos acervos. No entanto, é preciso manter um olhar crítico sobre esses dois pontos.

Levando em conta a característica do tempo atualista de valorar o que é mais novo, mais atual, como melhor ou mais verdadeiro, não podemos incorrer na ingenuidade de pensar que a digitalização ou a virtualização, por si só, contribuem para a preservação de memórias e para a democratização de histórias. O entendimento da ‘remidiação’ em formato digital como uma solução para o problema da destruição de acervos ignora o fato de que a falta de suportes duradouros para os documentos digitais também pode levar ao seu desaparecimento, muitas vezes de forma irreversível. Além disso, em alguns casos, como vimos no projeto de lei do senador Magno Malta, a digitalização pode servir de pretexto para a destruição deliberada de documentos físicos originais, o que pode facilitar o apagamento de informações importantes. Em relação à digitalização como meio de difusão dos acervos, essa é uma característica do ambiente virtual valorizada por várias instituições de memória. No entanto, a digitalização não provê a democratização do acesso de forma automática; basta lembrar que o acesso à internet ainda é ausente em muitas casas e que há formas de se restringir o que está online, como através de exigências de pagamento ou mesmo de restrições de acesso – como o caso da versão virtual do Museu Nacional que, embora se trate de um museu brasileiro, só pode ser acessado pelos usuários do browser produzido pela empresa que empreendeu esse projeto e que compreendam chinês.

Assim, é preciso que compreendamos o trânsito entre o digital e analógico como qualquer outro tipo de atividade humana: sem naturalizá-lo como algo proveniente da passagem do tempo, como se fosse uma atualização automática e como se não houvesse, nesse processo, intenções políticas, econômicas ou ideológicas. Nesse sentido, podemos destacar como, nos casos analisados, houve oportunidades para atualizações atualistas e atualizações históricas: a digitalização de acervos e/ou a criação de espaços virtuais para os museus pode ser entendida como atualização histórica, quando contribui para um projeto de futuro mais democrático, com maior acesso à informação e com a valorização da ciência e dos variados grupos que compõem o tecido social; por outro lado, há o risco de atualizações atualistas, como no caso da “Lei da Queima de Arquivo”, que compreende a digitalização como forma de atualizar informações que, em seu formato original, poderiam ser destruídas, possibilitando a manipulação e o ocultamento de fatos históricos importantes.

Derrubada e remoção de estátuas como atualizações históricas

25 de maio de 2020. Enquanto inúmeras pessoas ao redor do mundo temiam que seu direito fundamental à respiração (MBEMBE, 2020MBEMBE, Achille O direito universal à respiração. Instituto Humanitas Unisinos, 17 de abril de 2020. Disponível em: https://bit.ly/3HhzjQz. Acesso em: 31 ago. 2021.
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) fosse violado pela Covid-19, um homem morria sufocado por um policial na cidade de Minneapolis, nos Estados Unidos. A morte de George Floyd se tornou um símbolo, uma metonímia de muitas outras mortes de pessoas negras que ocorreram e ainda ocorrem devido à violência policial estruturalmente racista. Racismo que tenta se esconder, muitas vezes, sob o silenciamento das histórias de pessoas não brancas. Esse silenciamento está presente também nos monumentos que fazem parte do cotidiano das cidades, que celebram personagens históricos os quais, muitas vezes, se tornaram famosos às custas da escravização de seus contemporâneos.

A predominância de estátuas e monumentos que homenageiam homens brancos colonizadores evidencia duas exclusões históricas que se imbricam em seus significados: de um lado, elas transmitem para a posteridade a recordação desses personagens como exemplos de empreendedorismo, intelectualidade, honradez ou bondade, a despeito de serem favoráveis à escravização de outros seres humanos; de outro, a ausência de estátuas e monumentos que enaltecem mulheres, negros, indígenas e outros grupos oblitera a agência desses sujeitos na história da comunidade ou do país ao qual fizeram parte, relegando-os ao esquecimento. Assim, o assassinato de George Floyd tornou-se o gatilho para movimentos antirracistas nos Estados Unidos e em outras partes do mundo, incluindo o Brasil, movimentos que encontraram na derrubada ou modificação de estátuas uma forma, pode-se dizer catártica, de reivindicar não apenas o lugar desses sujeitos históricos apagados, mas também o seu próprio lugar no presente como pessoas que merecem viver sem terem suas vidas colocadas em risco pelo racismo.

A remoção de monumentos e estátuas não é algo novo nem exclusivo de manifestações antirracistas. Em Budapeste, na Hungria, o Memento Park abriga as estátuas que simbolizavam o poder soviético e que foram retiradas da cidade após o desmantelamento da URSS. No entanto, mesmo antes da criação deste “cemitério de estátuas” (MAGALHÃES, 2020MAGALHÃES, Aline. Um cemitério de estátuas indesejadas. Exporvisões, 2020. Disponível em: https://bit.ly/3FGU9YU. Acesso em: 31 ago. 2021.
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, n. p.), fruto de uma política de memória planejada, alguns monumentos foram derrubados pela própria população, como é o caso da gigantesca estátua de Stalin, posta abaixo durante a Revolução Húngara, em 1956. Mais recentemente, em 2003, uma estátua de Saddam Hussein localizada na Praça Firdos foi derrubada na capital do Iraque por opositores ao regime e soldados estadunidenses quando os Estados Unidos invadiram o país. No Brasil, a retirada do busto de Costa e Silva em Taquari, no Rio Grande do Sul, cidade natal do ex-ditador, no ano de 2014, causou polêmica. Embora o prefeito da cidade intencionasse realocar o busto em um museu, com uma inscrição que fizesse uma referência às violências cometidas no período ditatorial brasileiro, o Ministério Público exigiu que a estátua voltasse a seu lugar de origem.

Nem sempre a motivação para o deslocamento ou a destruição de monumentos é de cunho estritamente político. Entre dezembro de 2015 e abril de 2016, a artista e curadora de arte Giselle Beiguelman exibiu o projeto Memória da Amnésia, no qual monumentos da cidade de São Paulo que estavam guardados (ou, em alguns casos, abandonados) em depósitos foram realocados no Arquivo Histórico de São Paulo. Segundo Beiguelman, geralmente são três as razões para a retirada ou o realojamento de monumentos na cidade: “obras urbanas, questões orçamentárias e argumentos de cunho ideológico e moral” (BEIGUELMAN, 2019, p. 79BEIGUELMAN, Gisele. Memória da Amnésia: políticas do esquecimento. São Paulo: Editora Sesc, 2019.). O projeto incluiu, além da exibição dos monumentos, um mapeamento do deslocamento desses objetos pela cidade ao longo dos anos, gerando o Guia dos Monumentos Nômades.2 2 Disponível em: www.desvirtual.com/mda/guia-dos-monumentos-nomades/ Acesso em: 16 mai. 2022. Partindo da relação feita por Jacques Le Gof entre o documento e o monumento (LE GOFF, 1996), a exposição Memória da Amnésia pretendia transformar os monumentos paulistanos levados ao ostracismo em documentos:

Levar monumentos para dentro de um arquivo e deitá-los em seu saguão principal significava inverter, propositalmente, duas lógicas. A primeira é a da relação de horizontalidade e verticalidade da memória, postuladas pelas configurações tradicionais de documento e monumento. A outra, a dos espaços consagrados aos monumentos – as praças públicas – e aos documentos – o sossego dos recintos fechados dos arquivos (BEIGUELMAN, 2019, p. 86BEIGUELMAN, Gisele. Memória da Amnésia: políticas do esquecimento. São Paulo: Editora Sesc, 2019.).

Esses monumentos documentam, assim, uma política do esquecimento colocada em prática pelos governantes e também pelos moradores que conviveram com as peças que, um dia, foram expostas em praças públicas. Essa relação entre os monumentos que são vistos cotidianamente pelas pessoas e os documentos resguardados nas gavetas dos arquivos pode ser melhor analisada, se adotarmos as definições de cânon e arquivo propostas por Aleida Assmann (2008)ASSMANN, Aleida. Canon and archive. In: ERLL, Astrid; NÜNNING, Ansgar. Cultural memory studies: an international and interdisciplinary handbook. Berlin; New York: Walter de Gruyter, 2008. p. 97-108.. O cânon seria uma forma ativa de lembrança, como as peças que ficam expostas em um museu; já a forma passiva da memória cultural seria o arquivo, aquelas peças ou documentos do museu que não estão expostas ao público, mas guardados em arquivos ou reservas técnicas. Uma é a memória selecionada, um pouco do passado que se faz presente através de sua exposição; a outra é a memória acumulada, armazenada, identificada como algo do passado. Cânon e arquivo se alimentam e mudam de status entre si: uma peça pode sair da reserva técnica para ser exibida ao público, e vice-versa. Os monumentos relegados aos depósitos e selecionados por Beiguelman, no entanto, não estavam nem mesmo na condição de arquivo, e sim ocultados, propositalmente ostracizados, socialmente esquecidos.

Os monumentos, criados para homenagear personagens históricos ou lembrar de forma artística fatos relevantes para uma determinada comunidade ou país, podem terminar por exercer mal a sua função quando são ignorados pelas pessoas que por eles passam e nem os percebem. Muitas vezes, uma estátua passa a ser simplesmente um ponto de referência ao marcar um encontro entre amigos, e nada mais. Quando esses monumentos sofrem algum tipo de intervenção, como o seu realojamento, sua derrubada ou alguma outra modificação, seu reconhecimento como parte da memória local parece voltar à tona nos debates entre os que defendem a sua manutenção ou a sua modificação. Um exemplo é a estátua do bandeirante Borba Gato, em Santo Amaro, São Paulo, incendiada em julho de 2021 por manifestantes. Devido à relação entre o bandeirantismo e a escravização e morte de indígenas, o monumento já havia passado por outros tipos de intervenções, como a colocação de réplicas de crânios à sua frente, em 2020, que também foram colocados em frente ao Monumento às Bandeiras, também em São Paulo.

A derrubada de estátuas nos Estados Unidos, no Brasil e em outros países com histórico de escravização da população negra foi intensificada após a morte de George Floyd, como uma forma não apenas de negar homenagens àqueles que foram algozes dos ancestrais de parte da população, mas também de reivindicar a presença de outros sujeitos históricos que lutaram pelos seus direitos e contribuíram para a formação do país, como indígenas, negros e mulheres, parcamente representados nos monumentos espalhados pelas cidades. A ação dos movimentos que optaram por fazer intervenções, derrubar ou incendiar estátuas não pode ser compreendida como mero vandalismo, como muitas vezes acontece. Ela pode ser inserida nas dinâmicas da memória cultural, a qual se forma não apenas por meio de monumentos e documentos de arquivo, mas também de performances que atualizam o significado dessas memórias (TAYLOR, 2013). A derrubada enquanto performance faz parte de uma atualização histórica efetuada em um momento catártico que busca denunciar os efeitos da colonização e da escravidão que ainda são presentes nessas sociedades, como o racismo estrutural e a violência policial contra a população negra.

Embora a derrubada ou a destruição de monumentos possa ser uma forma legítima de atualização histórica, na qual diversos atores sociais contribuem para a elaboração de historicidades mais democráticas (ABREU; PEREIRA; BIANCHI, 2018ABREU, Marcelo; BIANCHI, Guilherme; PEREIRA, Mateus. Popularizações do passado e historicidades democráticas: escrita colaborativa, performance e práticas do espaço. Tempo e Argumento, Florianópolis, v. 10, n. 24, p. 279-315, abr./jun. 2018.), o apagamento dessas homenagens não é a única possibilidade de atualização histórica que pode ser aplicada a estátuas que homenageiam ditadores, escravocratas ou colonizadores. Marcelo Abreu, referindo-se ao potencial mobilizador que as comemorações têm, como no caso do dia 7 de setembro, quando se comemora a Independência do Brasil, diz que essas datas: “catalisam os atos e meios de memória, colocando o arquivo e o repertório em compasso na recriação da história e da própria celebração como um novo evento histórico” (ABREU, 2021, p. 265ABREU, Marcelo. Comemorações, linguagem histórica e a linguagem nacional. In: CALDEIRA, Ana Paula; MARCELINO, Douglas (org.). Lugares e práticas historiográficas: escritas, museus, imagens e comemorações. Curitiba: CRV, 2021. p. 251-274.). No caso da mobilização em torno das estátuas que se relacionam ao racismo, o agente catalisador não foi necessariamente uma data comemorativa, mas uma morte que simboliza várias outras mortes que já haviam acontecido anteriormente devido à discriminação racial e à desigualdade social. Assim, cada intervenção feita em um monumento assemelha-se a uma rememoração dessas mortes, que já ocorrem há séculos. A aparente demora em reagir a tais violências pode ser compreendida se, mais uma vez, retomarmos as características do tempo atualista:

Enquanto o sujeito moderno poderia se entender como acelerador ou desacelerador do tempo histórico, a depender de suas posições político-existenciais, o sujeito atualista parece não esperar mais ter controle sobre esse tempo. Frente a um presente que continuamente se reproduz, ele é levado a estar ou atualizado ou obsoleto, com diversas possibilidades de modulação. Nesse sentido, a condição atualista é caracterizada por uma percepção de que a realidade se reproduz automaticamente. É uma situação que cria a ilusão de que a ação não vale a pena, não é possível ou necessária. [...] Neste caso, as reações populares contra a violência policial, o racismo e outras formas de discriminação parece ser um movimento contra-atualista; mas, ao mesmo tempo, o que esses movimentos reivindicam é uma atualização do patrimônio, dos monumentos e da história. (ARAUJO; MARQUES; PEREIRA, 2021, p. 66ARAUJO, Valdei; MARQUES, Mayra; PEREIRA, Mateus. Obsolescência e atualização de monumentos: derrubar estátuas e comemorar a história. In: FRANZINI, Fábio; LIMA, Luís Filipe Silvério (org.). Olhar o abismo: visões sobre o passado e o presente do Brasil atual. Vitória: Editora Milfontes, 2021. p. 51-84.).

A derrubada e/ou a destruição de monumentos, então, são legitimadas pelo elemento catalisador da morte de George Floyd, em um momento no qual outras crises, para além do reconhecimento do racismo, estavam em curso devido à pandemia de Covid-19, que escancarou diversos problemas econômicos e sociais no Brasil e no mundo (ARAUJO; MARQUES; PEREIRA, 2020ARAUJO, Valdei; MARQUES, Mayra; PEREIRA, Mateus. Almanaque da COVID-19: 150 dias para não esquecer, ou a história do encontro entre um presidente fake e um vírus real. Vitória: Editora Milfontes, 2020.). No entanto, em momentos menos turbulentos, o ideal é que exista um diálogo na sociedade sobre a manutenção, retirada ou modificação de monumentos que representem ou não os valores da comunidade na qual estão inseridos. Realocar estátuas em museus e em depósitos, destruí-las ou contextualizá-las com placas e intervenções artísticas – nenhuma dessas alternativas pode ser considerada como uma solução que poderá ser aplicada automaticamente a monumentos polêmicos. A atualização histórica desses locais de memória só pode acontecer a partir da análise de cada caso, levando em consideração o passado, suas consequências no presente e como ele pode colaborar para projetos de futuro que contribuam para o fim do racismo e de outras desigualdades sociais.

Considerações finais

Michel de Certeau, quando definiu as características da operação historiográfica, apontou a história como a responsável por organizar as temporalidades, distanciando passado, presente e futuro através das narrativas. A operação historiográfica historiciza o atual, representa o passado como aquilo que falta e, com isso, abre espaço para um futuro; é ela quem estabelece os limites entre essas temporalidades (CERTEAU, 1982CERTEAU, Michel de. A operação historiográfica. In: CERTEAU, Michel. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1982. p. 56-108.). Dessa forma, a historiografia poderia atuar como um “protocolo de comunicação” (CASTELLS, 2011CASTELLS, Manuel. Museus na era da informação: conectores culturais de tempo e espaço. Revista Musas, Brasília, ano VII, n. 5, 2011b, p. 8-21. Disponível em: https://bit.ly/32juh7n. Acesso em: 05 mar. 2021.
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) ou como uma ação contra-atualista (ARAUJO; PEREIRA, 2021ARAUJO, Valdei; PEREIRA, Mateus. Atualismo: Pandemia e historicidades no interminável 2020. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 47, n. 1, p. e39802, 22 mar. 2021.), contribuindo para a identificação dos entrelaçamentos entre passado, presente e futuro, complexificando os fatos e as disputas por memórias que, muitas vezes, parecem ressurgir de formas atualizadas no presente sem muita profundidade.

A historiografia como estratégia contra-atualista, no entanto, precisa repensar a forma como o tempo histórico é compreendido na contemporaneidade. A narrativa historiográfica, que produz linguisticamente a diferença entre o que ainda é presente e o que já passou (KOSELLECK, 2006, p. 116KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. São Paulo: Contraponto, 2006.), colabora para que a sensação de rapidez e “curto prazo” do presente seja problematizada. Para Guldi e Armitage, as rápidas mudanças vivenciadas no presente provocam a perda de uma noção de longa duração e de planejamento do futuro. Dessa forma, a narrativa historiográfica pode colaborar para nos lembrar das imbricadas relações entre o passado, o presente e o futuro, se apropriando, inclusive, da grande disponibilidade de informação possibilitada pelas novas tecnologias, tendo como exemplo o Big Data (ARMITAGE; GULDI, 2015). A crítica historiográfica, nesse sentido, permite que compreendamos os eventos dentro de seus contextos temporais, ao mesmo tempo em que trata o próprio presente historicamente (WHITE, 2007, p. 223WHITE, Hayden. Afterword: Manifesto time. In: JENKINS, K.; MORGAN, S; MUNSLOW, A. (ed.). Manifestos for History. Abingdon: Routledge, 2007. p. 220-231.).

As transformações provocadas pelas novas mídias em nossa relação com o tempo e a diferenciação entre passado, presente e futuro demandam dos historiadores uma atenção maior sobre os possíveis regimes de historicidade (HARTOG, 2015HARTOG, F. Regimes de historicidade: presentismo e experiências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015) que estão convivendo na contemporaneidade. A própria noção de regimes de historicidade, por parecer um tanto quanto limitante, pode já não dar conta da experiência de tempo atualista e das simultaneidades que estamos vivendo. Levar em conta outras noções além do tempo cronológico, linear e dividido em épocas é fundamental para compreendermos a nossa experiência de tempo atual e fomentar atualizações históricas. Rodrigo Turin sugere que ser contemporâneo se relaciona menos com o instante cronológico no qual as pessoas e as coisas existem, “mas diz respeito à posse do elemento que singulariza um determinado presente, distinguindo-o dos outros tempos que são por ele, no mesmo movimento, englobados e hierarquizados” (TURIN, 2019, p. 10TURIN, Rodrigo. Tempos precários: aceleração, historicidade e semântica neoliberal. Copenhagen: Zazie, 2019.). Dessa forma, seria melhor pensarmos em uma ‘contemporalidade’, cuja principal característica é a multiplicidade de experiências, que pode favorecer a democratização das narrativas sobre memória através de suas negociações e disputas.

Algumas ações podem colaborar para uma melhor compreensão de nosso próprio tempo e para a renovação de uma expectativa de futuro na qual sejamos agentes, e não apenas espectadores: 1) o entendimento da narrativa histórica como ação contra-atualista e criadora de pontes de sentido que favorecem o diálogo entre os diferentes grupos sociais através do seu potencial de organizar o tempo, já que passado, presente e futuro são construções dessa própria narrativa; 2) a incorporação nas narrativas históricas de outras formas de tempo, que não apenas a cronológica, como é o caso do tempo kairológico; 3) a defesa do direito à imprevisibilidade do futuro, assim como da incorporação de variadas memórias e epistemologias à historiografia, para que a potencialidade democrática das atualizações históricas e outras formas de ações contra-atualistas se sobreponham aos negacionismos e às narrativas que não contemplam a pluralidade da sociedade contemporânea.

AGRADECIMENTO

Agradeço à CAPES, pelo financiamento da pesquisa; ao meu orientador Mateus Pereira, assim como aos professores Valdei Araujo, Marcelo Abreu, Anita Lucchesi e ao colega Walderez Ramalho pelas indicações de bibliografa, pela leitura de alguns trechos deste artigo e pela oportunidade de intercambiarmos ideias. Por fim, mas não menos importante, agradeço a Thiago Oshiro, Ercimar de Souza Reis, Ricardo Alves, Jumara Pedruzzi, Stephanie Martins, Leonardo Queiroz, Aline Machado, Marcos Sousa e Letícia Ferraz pela ajuda em algumas questões relativas à traduções, bibliografa, conceitos e outros elementos necessários para a produção deste trabalho.

  • 1
    Optou-se por traduzir remediation (BOLTER; GRUSIN, 2000BOLTER, Jay; GRUSIN, Richard. Remediation. Understanding new media. Cambridge: MIT Press, 2000.) como ‘remidiação’ para facilitar a compreensão. Para uma discussão sobre o conceito, seu uso e sua tradução, Cf. BOLTER; GRUSIN, 2000BOLTER, Jay; GRUSIN, Richard. Remediation. Understanding new media. Cambridge: MIT Press, 2000.; GRUSIN, 2004GRUSIN, Richard. Premediation. Criticism, Detroit, v. 46, n. 1, p. 17-39, 2004. Disponível em: https://bit.ly/3Hb3lVY. Acesso em 23 dez. 2021.
    https://bit.ly/3Hb3lVY...
    ; SANTAELLA, 2007SANTAELLA, Lúcia. As linguagens como antídotos ao midiacentrismo. MATRIZes, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 75-97, 2007. Disponível em: https://bit.ly/33ZTVhO Acesso em: 23 dez. 2021.
    https://bit.ly/33ZTVhO...
    ; MANOVICH, 2006MANOVICH, Lev. After effects, or velvet revolution in modern culture. Part I. 2006. Disponível em: https://bit.ly/3qkYKd0. Acesso em: 23 dez. de 2021.
    https://bit.ly/3qkYKd0...
    e SAAD CORRÊA, 2013SAAD CORRÊA, Elizabeth. De remediação à premediação: ou de como a sensação de imediatismo da sociedade digital dos anos 1990 evoluiu para um clima de contínua antecipação do futuro no século XXI. MATRIZes, São Paulo, v. 7, n. 2, p. 163-172, julho-dezembro 2013..
  • 2
    Disponível em: www.desvirtual.com/mda/guia-dos-monumentos-nomades/ Acesso em: 16 mai. 2022.
  • FINANCIAMENTO
    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Número do processo: 88882.469653/2019-01
  • APROVAÇÃO NO COMITÊ DE ÉTICA
    Não se aplica.
  • MODALIDADE DE AVALIAÇÃO
    Duplo-cega por pares.
  • CONTEXTO DA PESQUISA
    Este trabalho está inserido no contexto das pesquisas relativas aos grupos Historicidades Democráticas e Atualismo, ambos da UFOP, assim como se relaciona, também, com a produção dos livros Almanaque da Covid-19 (PEREIRA, Mateus; ARAUJO, Valdei; MARQUES, Mayra. Milfontes, 2020) e Bolsotrump: realidades paralelas (PEREIRA, Mateus; ARAUJO, Valdei; MARQUES, Mayra; RAMALHO, Walderez. FGV, 2022).
  • PREPRINT
    O artigo não é um preprint.
  • DISPONIBILIDADE DE DADOS DE PESQUISA E OUTROS MATERIAIS
    Os conteúdos subjacentes ao artigo estão nele contidos.
  • DIREITOS AUTORAIS
    Copyright © 2022 Mayra de Souza Marques.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Out 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    01 Set 2021
  • Revisado
    13 Dez 2021
  • Aceito
    03 Jan 2022
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