Resumos
Apresenta-se uma experiência na formação para a docência do ensino superior nas disciplinas que compõem o Programa de Estágio Supervisionado de Capacitação Docente. Os principais desafios relatados pelos pós-graduandos no contato com seus estudantes foram: o conflito geracional, a aprendizagem empírica do fazer do professor e a frágil apropriação de conceitos educacionais. Os desafios das docentes na condução das disciplinas perpassam a mediação da aprendizagem na quebra de paradigmas; e o estímulo à prática reflexiva e à aprendizagem significativa. As disciplinas permitiram, na avaliação discente, a análise crítica do seu papel social; a gestão do processo educativo; a aproximação de conceitos e de estratégias educacionais; e mudanças na prática. Espera-se que este relato possa inspirar outros programas e apoiar iniciativas que considerem rever o papel da pós-graduação na formação para a docência.
Palavras-chave Formação docente; Ensino superior; Metodologias ativas; Aprendizagem significativa
Se presenta una experiencia en la formación para la docencia de la enseñanza superior juntamente con las asignaturas que componen el Programa de Pasantía Supervisada de Capacitación Docente. Los principales desafíos relatados por los alumnos de postgrado en el contacto con sus estudiantes fueron: el conflicto generacional, el aprendizaje empírico del quehacer del profesor, la frágil apropiación de conceptos educativos. Los desafíos de las docentes en la dirección de las asignaturas atraviesan la mediación del aprendizaje en la ruptura de paradigmas, el incentivo a la práctica reflexiva y al aprendizaje significativo. Las asignaturas permitieron, en la evaluación discente, el análisis crítico de su papel social, la gestión del proceso educativo, la aproximación de conceptos y estrategias educativas y cambios en la práctica. Se espera que este relato pueda inspirar otros Programas y dar apoyo a iniciativas que consideren la revisión del papel del postgrado en la formación para la docencia.
Palabras clave Formación docente; Enseñanza superior; Metodologías activas; Aprendizaje significativo
An experience in training for teaching in higher education is presented in the subjects encompassed by the Supervised Internship Program for Teacher Education. The main challenges reported by graduate students were: generational conflict; the empirical learning of the teacher’s doing; the fragile appropriation of educational concepts. The challenges faced by teachers in conducting the disciplines permeate the mediation of learning by breaking paradigms and encouraging reflection of the practice and meaningful learning. The subjects allowed, in the student evaluation, the critical analysis of their social role; the management of the educational process; the approximation of educational concepts and strategies; and changes in practice. It is hoped that this report can inspire other programs and support initiatives that consider reviewing the role of graduate studies in teacher education.
Keywords Teacher education; Higher education; Active methodologies; Meaningful learning
Introdução
A educação contemporânea e a formação do futuro docente para o ensino superior é um tema relevante e um debate em aberto. Identificam-se desafios em duas frentes: na atuação docente pela reprodução da forma de transmissão vertical dos conhecimentos para os discentes; e os cursos de pós-graduação, em sua maioria, que priorizam a formação de pesquisadores em detrimento da formação pedagógica1-8.
A preocupação da comunidade científica com a formação docente tem sido crescente dada a complexidade e os desafios sociais do século XXI, que demandam profissionais com mais ferramentas para resolver problemas e enfrentar a imprevisibilidade de situações; que integrem teoria e prática; e que favoreçam a transformação da realidade9-12.
A literatura traz à tona que a docência, a pesquisa, a extensão e a gestão são papéis a serem exercidos pelo professor, o que exige competências para a sua concretização e traduz a complexidade da formação nos programas de pós-graduação13-20. Também é possível perceber iniciativas exitosas que buscam superar as fragilidades da formação docente21-23 em articulação com momentos de exercícios práticos da docência24, a interprofissionalidade e a prática colaborativa20.
Buscamos apresentar a experiência na formação para a docência do ensino superior nas disciplinas que compõem o Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PPGCTS) que atendem ao Programa de Estágio Supervisionado de Capacitação Docente (PESCD). Além disso, pretendemos contribuir com a discussão de iniciativas educacionais inovadoras para a docência na pós-graduação stricto sensu apontando possibilidades factíveis de sua realização.
O PESCD do PPGCTS: apresentando o contexto
O PPGCTS é um programa de pós-graduação voltado para a Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) e se constitui como um campo acadêmico de pesquisas e intervenções. Estuda as interações e determinações sociais da ciência e da tecnologia, em seus fatores sócio-históricos e culturais, que influenciam as mudanças científico-tecnológicas, conformando um campo interdisciplinar25.
O PESCD é destinado a aprimorar a formação de discentes de pós-graduação de mestrado e doutorado, oferecendo-lhes preparação pedagógica por meio de estágio supervisionado em atividades didáticas de graduação26. As duas disciplinas do PESCD no Programa são: a) Estágio Supervisionado de Capacitação Docente em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PESCD 1); e b) Prática de Ensino em Ciência, Tecnologia e Sociedade (PESCD 2). De 2007 a 2014, a atividade dos pós-graduandos consistia no estágio de docência por meio do acompanhamento das aulas de graduação com o docente supervisor conforme exigência da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES)27. A responsabilidade do PESCD era da coordenação do programa, que recebia os planos e relatórios dos bolsistas para arquivamento interno.
Desde 2015, enquanto docentes do programa, assumimos o PESCD após compreender que o desenho da disciplina outrora ofertada não alcançava a perspectiva da reflexão crítica da prática educacional. De modo geral, os pós-graduandos reproduziam formas de ensino fundamentadas no modelo tradicional de educação evidenciando uma profissionalização mecanicista, individualista, acrítica e reprodutiva do trabalho.
A partir desse contexto, sugerimos ao programa assumir as duas disciplinas e propusemos as seguintes mudanças: 1) De natureza da composição do grupo – a abertura para matrícula de pós-graduandos não bolsistas, a real integração entre mestrandos e doutorandos no mesmo semestre letivo e o limite de participantes para trabalho de pequeno-grupo; e 2) De natureza conceitual – introdução de encontros de reflexão coletiva sobre a prática docente com as facilitadoras entre os estágios práticos na graduação, a valorização da interdisciplinaridade28, a abordagem ética-dialógica de competência29 e o horizonte alicerçado pela transformação social30.
No ano de 2017, uma pós-doutoranda do programa foi convidada para compor o grupo de docentes por ter experiência prévia com metodologias ativas. Tal participação foi incorporada como atividade ao seu plano de trabalho de pós-doutorado desenvolvido no programa, resultando na escrita deste manuscrito.
O percurso metodológico
Trata-se de um relato de experiência nas disciplinas PESCD 1 e 2 do PPGCTS. O artigo foi construído por duas docentes e uma pós-doutoranda do programa, em um esforço reflexivo e analítico. Utilizamos como material de análise nossos diários de campo, compostos pelos registros escritos a partir das observações durante as disciplinas; e pelas impressões pessoais (significações, emoções, visões e percepções) após o término da atividade31.
Organizamos também perguntas disparadoras como rotas analíticas da experiência, tais como: Qual a aproximação dos pós-graduandos na integração das teorias educacionais com a prática centrada no estudante? Que mudanças verificamos nos pós-graduandos para facilitar o processo de ensino-aprendizagem? Que pistas encontramos na perspectiva de docentes críticos e reflexivos? Como a iniciativa educacional foi motor de mudanças da prática?
Buscamos trazer elementos do processo para construção dos saberes tecidos com os pós-graduandos nesta iniciativa educacional. Utilizamos o conceito de experiência que diz que “a experiência não é o caminho até um objetivo previsto que se conhece de antemão, mas uma abertura para o desconhecido”31 (p. 28).
A cada turma vislumbramos um caminho rumo ao desconhecido e a singularidade de cada uma delas não é a tônica deste texto. Pretendemos trazer uma síntese, apontando aspectos que foram comuns em todos os coletivos e que, a nosso ver, evidenciam um panorama da experiência.
A proposição apresentada é fruto de uma construção de repertório unificando vivências, conhecimentos, teorias e técnicas. Em algum momento podem parecer contraditórias, mas é na dialética que entendemos que há potência de construção, e não na proposição de uma única perspectiva. Buscamos ampliar ferramentas e estratégias para lidar com os inesperados e na integração buscamos coerência, reinvenção e flexibilidade para planejar ao longo do processo – chamando-o de processo educativo – a partir da essência de cada coletivo e do contexto vivenciado por todos.
A experiência educacional com metodologias ativas de ensino-aprendizagem
Intencionalmente organizamos as disciplinas utilizando metodologias ativas de ensino-aprendizagem de modo que os pós-graduandos pudessem vivenciar a experiência ao mesmo tempo que refletiam sobre ela e sua prática em campo; o papel do professor e a construção da sua identidade no século XXI; a aprendizagem construtivista em pequeno grupo; o foco centrado na aprendizagem do estudante; e as estratégias educacionais para sua futura atuação como docente.
As metodologias ativas proporcionam engajamento dos educandos no processo educacional a partir do desenvolvimento da capacidade crítica e reflexiva, da proatividade, da colaboração em equipe, da aprendizagem contextualizada e da intervenção na realidade32-34. Na teoria interacionista, o foco se dá entre o sujeito que aprende e o conhecimento, de modo que o processo de aprendizagem é influenciado multifatorialmente e o ganho é mediado pelos conhecimentos prévios e novos saberes atrelados à vivência de experiências significativas32-35.
As estratégias educacionais que propusemos (quadro 1) estão alicerçadas nas abordagens teóricas da aprendizagem35 da interação social de Lev Vygotsky; na aprendizagem significativa de David Ausubel; na aprendizagem pela experiência de John Dewey; e na pedagogia de Paulo Freire. Outros autores32,36-42 nos subsidiam na operacionalização das estratégias propostas, sendo muitas das fontes da área da Saúde, frutos da nossa origem de atuação.
O perfil dos estudantes do século XXI na visão dos pós-graduandos
Uma das discussões centrais trazidas pelos pós-graduandos refere-se à relação professor-estudante. Há desafios no conflito geracional baseado na referência do que é ser um estudante de graduação sob a ótica dos pós-graduandos: a geração 3D (dispersa, desfocada e distraída), tal como foi apelidada por uma das turmas diretamente relacionada às dificuldades para lidar com as tecnologias no ambiente escolar e estimular a proatividade do estudante.
As principais hipóteses explicativas dos pós-graduandos para esses problemas recaem no desconhecimento de como as tecnologias podem apoiar o docente; na descontinuidade de políticas e programas educacionais que dificultam o planejamento; na governabilidade limitada do docente às decisões macropolíticas; na organização curricular fragmentada; nas diferentes expectativas na relação professor-estudante; e na falta de formação prévia para a docência.
As inquietações dos pós-graduandos trazem também à tona a dificuldade em desvincular o papel do professor na centralidade do processo de ensino-aprendizagem e que a sua atuação é intuitiva. Os grupos apresentavam uma baixa apropriação e aplicação de conceitos educacionais à sua prática docente. Nas reflexões realizadas, constatou-se que boa parte das decisões foram autoritárias ou contraditórias.
Um estudo43 aponta que os programas educativos são organizados por meio de estruturas contraditórias, em que aspectos como metodologia, concepção teórica e questões burocráticas se fundem às outras demandas do professor, trazendo para a cena dilemas éticos durante as interações no ambiente de aula.
Estimular a quebra de paradigmas não é um processo simples de conduzir no papel de facilitadoras, pois envolve mediar a discussão, acolher as falas, trazer as emoções-afetos-atitudes, identificar a natureza dos problemas, possibilitar a aprendizagem significativa e incluir os erros como essência da aprendizagem. É necessário vencer a relação alienante e autoritária por meio do amor, da liberdade e do diálogo, em uma construção que possa fazer sentido a ambos30,44. A perspectiva é que os pós-graduandos sejam produtores criativos e críticos dos novos conhecimentos45, a partir do reconhecimento e de um exercício de metalinguagem sobre as emoções46.
A reflexão da prática docente: opção pedagógica no caminho para a práxis
A reflexão da prática é um espaço coletivo e protegido em que os pós-graduandos trazem e discutem elementos da prática da docência no estágio com a graduação, as colocam em análise, constroem novos conhecimentos e buscam ações e soluções para o retorno ao mesmo cenário. Os relatos são experiências, na perspectiva da pessoa que a vivenciou, e o grupo atua colaborativamente. É no momento de reflexão sobre a ação que se ganha consciência do processo, que se identificam crenças e que se desenvolve o próprio pensamento, estabelecendo a ligação entre teoria e prática39
É importante salientar que fazemos distinção da reflexão na prática e da prática. Elas se diferenciam pelo momento em que acontecem: a reflexão na prática ocorre durante a ação, sendo que a reflexão da prática ocorre em um momento posterior ao acontecimento. Compreendemos que a reflexão da prática é mais potente porque ela pressupõe distanciamento de quem viveu determinada situação, permitindo associações e processos cognitivos e emotivos distintos. Além disso, o apoio problematizador das facilitadoras e a contribuição dos demais colegas do grupo podem agregar outras visões de mundo e estimular novas conexões.
Como disparador, utilizamos a técnica do incidente crítico, sendo este:
[...] um acontecimento delimitado no tempo e no espaço que, ao ultrapassar um determinado limite emocional do professor, coloca em crise ou desestabiliza o seu modo de agir convencional39.
(p. 60)
Utilizamos o caminho descrito por Domingos39 em três momentos: 1) o pós-graduando situa o incidente crítico no contexto, definindo seu significado e demais elementos que julgar importante para a compreensão; 2) o grupo analisa o desenvolvimento do incidente crítico, por meio dos motivos desestabilizadores, dos comportamentos, das decisões tomadas e das emoções e sentimentos provocados e as consequências destes; e 3) a reflexão retorna para o pós-graduando que trouxe a situação para nova interpretação ao sucedido. Abrimos espaço para as diversas possibilidades de incidentes: didáticos, organizativos, na relação docente-discente e em relação aos aspectos afetivos.
Os pós-graduandos revelaram que o papel do docente e as metodologias de ensino e de avaliação eram pouco ou não eram discutidos no estágio com o supervisor. De modo geral, as vivências se deram com o acompanhamento e/ou substituição do supervisor nas atividades com os estudantes de graduação. A principal e mais recorrente estratégia de ensino utilizada eram as aulas expositivas, com abertura para tirar dúvidas ao final. Alguns pós-graduandos tiveram a experiência de assumir a aula sem prévio contato com a turma.
Os incômodos e conflitos fizeram parte tanto na perspectiva individual, do pequeno-grupo, quanto institucional, visto que a cultura avaliativa e a autoavaliação se faziam pouco presentes na experiência dos pós-graduandos e na de seus supervisores. Diferentes situações foram levantadas, como conflitos com o supervisor quando questionado sobre sua prática. Além disso, alguns pós-graduandos arriscaram mudar o planejamento prévio da aula com a oferta de outras estratégias de ensino-aprendizagem; outros relataram não conseguir porque o estudo do conteúdo a ser ministrado tomava todo o tempo do planejamento; outros pensaram em mudar, mas não conseguiram devido à natureza do conteúdo ser muito operacional. Esses elementos aparecem em consonância com a literatura, na perspectiva de que somente o domínio dos saberes específicos não é suficiente para que os futuros docentes possam dar conta das incertezas de suas ações em situação de trabalho e que o modelo tradicional de ensino por meio da transmissão de conhecimentos ainda é utilizado por muitos professores universitários1,12,16,47.
Verificamos que as reflexões dos pós-graduandos se iniciaram em um nível mais superficial traduzido em aspectos do acontecimento em si, aumentando em profundidade de modo proporcional à quantidade de encontros, como as competências e a identidade profissional do docente.
O papel docente na transformação da realidade: um caminho a ser percorrido
Sob a ótica do exercício como prática social, a profissionalização do professor universitário foi avaliada pelos pós-graduandos como uma das estratégias para repensar o cotidiano do fazer e do seu papel na sociedade.
É costumeiro, nos primeiros encontros, ouvir dos pós-graduandos relatos sobre o cansaço e a frustração, mesmo sendo iniciantes na carreira acadêmica. Um dos primeiros fatores que apresentam é o trabalho solitário do professor. Os fazeres cotidianos não encontram espaço para a troca e o compartilhamento de ideias, metodologias de ensino e tomada de decisão com seus colegas. Além disso, apresentam relativa desesperança na docência devido à precariedade e à baixa valorização da educação no país.
Pensar em mudança da educação tradicional para uma perspectiva progressista demanda interação entre os docentes14, visto que as estruturas materiais e formativas nem sempre têm acompanhado as exigências contemporâneas da docência43.
A problematização que trazíamos a partir do relato dos pós-graduandos sobre o modelo de ensino que adotavam era recorrente e sua compreensão foi sendo sedimentada por meio da perspectiva do aprendizado em espiral35, acessando diferentes camadas de conhecimentos e aprofundando-os a cada retomada.
Essas sucessivas aproximações permitiram ir além do discurso de redução da prática docente vinculada ao modelo de seus mestres, a baixa transposição dos conteúdos repassados, a falta de sentidos e a dissociação entre teoria e prática, proporcionando compreensões de que: a) a relação professor-estudante deve ser dialógica; b) o professor também aprende; c) é importante a atenção às singularidades para a aprendizagem; d) a permanência estudantil é relevante, considerando as exclusões sociais e as diversidades; e e) é relevante a intersecção entre emoções e racionalidades.
Nossa autoavaliação: limites e possibilidades da proposta
A proposta apresentada foi pensada a partir da análise de que a qualificação para a docência nos cursos de pós-graduação do Brasil tem permanecido em segundo plano, sendo o PESCD uma das poucas ofertas.
Avaliamos que o PESCD 1 funciona como disparador para uma primeira aproximação dos temas, apresentando limitações quanto à profundidade da natureza da mudança do papel docente quando o pós-graduando se inscreve apenas no PESCD 1. A maior parte dos estudantes decidem continuar os estudos no PESCD 2. Apesar da obrigatoriedade de cursar a disciplina seja dos bolsistas de doutorado, estudantes do programa se interessam e a realizam como optativa. Avaliamos que no PESCD 2 os pós-graduandos avançam no ganho de consciência e permanência temporal da mudança nas práticas.
Embora sejamos docentes da área da Saúde e, por vezes, desconheçamos as especificidades técnicas das outras áreas, avaliamos que isso pouco interferiu, já que nosso papel foi de facilitação do processo de ensino-aprendizagem. Assumir e desenvolver esse papel não é simples porque exige planejamento contínuo, flexibilidade e mediação dos estranhamentos iniciais dos pós-graduandos com a metodologia. Além disso, há a necessidade de formação e desenvolvimento docente permanente para exercer o papel de facilitador de processos centrados na aprendizagem do estudante.
Temos feito muitas críticas ao modismo das metodologias ativas na forma de aplicação de técnicas e métodos mais dinâmicos, porém, traduzido em práticas ainda reprodutoras da soberania docente e/ou aplicação instrumental dos conteúdos apresentados. Compreendemos que a aplicação de metodologias ativas sem a devida compreensão teórico-metodológica que as subsidiam pode gerar a sobreposição de estratégias fragmentadas e que não buscam processos educacionais dialógicos, emancipatórios e transformadores da realidade.
É nosso consenso que o conhecimento é um processo construído ao longo do tempo, com as experiências vividas e reflexão crítica de si mesmo e do seu entorno. Por esse motivo, as disciplinas possuem limitações e essa iniciativa isolada não garante as mudanças de práticas dos futuros docentes.
Outra fragilidade que reconhecemos é o de ainda não haver um espaço de interlocução direta com os docentes supervisores do PESCD. O fato destes terem origem em diferentes campos do conhecimento e centros da universidade pode ser uma hipótese explicativa, mas a mais provável é que, nesse processo historicamente complexo, ainda não tenha chegado o momento de maior aproximação.
No entanto, os desafios enfrentados com essa proposta estão alicerçados no nosso compromisso e no imperativo ético de contribuir com a educação do país. É preciso resistir e sermos criativas, mesmo em contextos difíceis. Parafraseando uma das nossas experiências com um coletivo de formadores em processos educacionais na saúde, é preciso gás na resistência! Esperamos que esse trabalho possa inspirar outros programas e apoiar novas iniciativas que considerem rever o papel da pós-graduação na formação para a docência.
Agradecimentos
Ao Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos e ao Prof. Dr. Wilson José Alves Pedro pelo apoio durante o estágio de pós-doutorado e para a realização deste artigo.
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Financiamento
A primeira autora foi bolsista pelo Programa Nacional de Pós-Doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
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Editado por
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EditoraVera Lúcia GarciaEditor associadoFlavio Adriano Borges
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
04 Abr 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
-
Recebido
19 Maio 2021 -
Aceito
09 Dez 2021