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ENSINO FUNDAMENTAL DE 9 ANOS: UM OLHAR DISCURSIVO SOBRE A INVISIBILIDADE NA ESCOLA

NINE-YEAR ELEMENTARY EDUCATION: A DISCURSIVE VIEW ON THE INVISIBILITY AT SCHOOL

EDUCACIÓN PRIMARIA DE NUEVE AÑOS: UNA MIRADA DISCURSIVA SOBRE LA INVISIBILIDAD EN LA ESCUELA

Resumo

Este texto trata da Política do Ensino Fundamental de 9 anos (EF9A) instituída pela Lei 11.274/2006. Objetivou-se analisar discursivamente a Política do EF9A; compreender a escola como lugar da/para a criança; apresentar reflexões e subsídios teóricos que contribuam com os profissionais do ciclo alfabetizador/anos iniciais. A hipótese é que a política do EF9A pode configurar-se como potencializadora de um processo de transformação da escola. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, documental e de campo, com abordagem dialética. Os sujeitos foram professores do ciclo alfabetizador de quatro Municípios da região AMUREL/SC. O dispositivo teórico-analítico é o da Análise de Discurso de linha francesa e autores da Educação que discutem a organização didático-pedagógica dos anos iniciais. Os resultados sinalizam a Lei 11.274/06 e as orientações pedagógicas decorrentes (2007) potências não só para superar a invisibilidade das crianças como também para reconfigurar a escola, se incorporada pelos sujeitos (professores/equipe pedagógica) e materializada na práxis.

Palavras-chave:
Escola; Ciclo alfabetizador; Ensino de 9 anos; Análise de Discurso; Criança/infância

Abstract

This text deals with the nineth-grade Elementary Education Policy (EF9A) established by Law 11.274/2006, to discursively analyze it, understand the school as a place of/for the child, and present reflections and theoretical subsidies that contribute to professionals in the literacy cycle/initial years. The hypothesis is that the EF9A policy can be configured as an enabler of a school transformation process. This is qualitative, documentary, and field research with a dialectical approach. The subjects were literacy cycle teachers from four AMUREL/SC municipalities. The analytical theoretical device is the French discourse analysis and education authors who discuss the school and its didactic-pedagogical organization for the initial years The results indicate that Law 11.274/06 and the resulting pedagogical guidelines (2007) have powers to overcome childrens’ invisibility and reconfigure the school if incorporated by the subjects (teachers/pedagogical team) and materialized in praxis.

Keywords:
School; Literacy cycle; Nine-year education; Discourse analysis; Children/childhood

Resumen

Este texto aborda la Política de Educación Primaria (EF9A) del noveno grado establecida por la Ley 11.274/2006, para analizarla discursivamente, comprender la escuela como un lugar de/para el niño y la niña, y presentar reflexiones y subsidios teóricos que contribuyan a los y las profesionales. en el ciclo de alfabetización/años iniciales. La hipótesis es que la política EF9A puede configurarse como un facilitador de un proceso de transformación escolar. Se trata de una investigación cualitativa, documental y de campo con un enfoque dialéctico. Los sujetos fueron docentes del ciclo de alfabetización de cuatro municipios de AMUREL/SC. El dispositivo teórico analítico son los autores franceses de análisis del discurso y educación que discuten la escuela y su organización didáctico-pedagógica durante los primeros años. Los resultados indican que la Ley 11.274/06 y las directrices pedagógicas resultantes (2007) tienen poderes para superar los problemas de invisibilidad de niños y niñas y reconfigurar la escuela, si incorporada por los sujetos (profesores/equipo pedagógico) y materializada en la praxis.

Palabras clave:
Escuela; Ciclo de alfabetización; Educación primaria de nueve años; Análisis del discurso; Ninõs/niñas/infancia

A história da alfabetização é a história da escola!

E se quisermos dar outro rumo à vergonhosa história

da alfabetização em nosso país, é à história da escola que temos

que dar outro rumo - é a escola que temos de transformar.

(Magda Becker Soares)

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Em julho de 2015, finalizei minha trajetória formativa no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Linguagem da Unisul - o Doutorado em Ciências da Linguagem. Depois de exaustivos quatro anos de estudos e pesquisas, finalmente, em 26 de julho de 2015, consolidava-se o sonho do doutorado, sonho coroado de êxito e de uma tese aprovada pela banca avaliadora com louvor. Esse percurso não fiz sozinha, mas acompanhada da minha orientadora Profa. Dra. Maria Marta Furlanetto. Em sua homenagem, dedico este texto, que traz parte das reflexões e achados de minha tese de doutoramento, elaborada sob sua preciosa orientação. Sinto-me privilegiada por ter sido sua orientanda. Foram anos de uma convivência dialógica, com muitos estudos e aprendizados conduzidos com muito respeito, amorosidade e generosidade.

A você, Maria Marta, minha Gratidão!

Neste texto, então, num gesto de homenagem, trago um pouco do seu legado que vive em mim cotidianamente. Com certeza, não conseguirei trazer tudo o que refletimos ao longo da formação e que resultou na tese intitulada “O Potencial da Lei do Ensino Fundamental de 9 Anos: entre o discurso político e o discurso pedagógico”1 1 De acordo com a Lei 11.274/06, o ciclo alfabetizador no EF9A é composto pelo primeiro, segundo e terceiro anos do Ensino Fundamental. . É difícil fazer um recorte entre tantas riquezas e possibilidades de discussão que poderia trazer, mas vou no fio da tese que defendi.

1 INTRODUÇÃO

Neste artigo, faz-se um recorte da tese “O Potencial da Lei do Ensino Fundamental de 9 Anos: entre o discurso político e o discurso pedagógico”, tratando especificamente da Lei do Ensino Fundamental de 9 anos (EF9A) como potência para reterritorializar a escola, em uma abordagem discursiva. Tal discussão vem na esteira do debate acerca da concepção do ser criança e das discussões sobre a infância, da antecipação da escolaridade como um processo democrático que garante o acesso ao ensino obrigatório para todas as crianças de 6 anos. No entanto, compreendendo-a como criança, exige-se da gestão dos processos escolares um olhar para suas especificidades e necessidades.

Assim sendo, em relação à criança, à infância e à educação, entendendo que essa é uma etapa fundante na vida, esse período não pode ser negligenciado. Pelo contrário, é a ocasião de olhar para o lugar social instituição que recebe as crianças, no sentido de garantir-lhes um trabalho pedagógico que responda a essas especificidades.

Para a discussão, foram buscadas contribuições de outras áreas do conhecimento, dentre elas a antropologia, a sociologia da infância, a filosofia e a história. Esse diálogo interdisciplinar também contribuiu para a compreensão de que: a) as crianças não são somente objeto de tutela, objeto da ação dos adultos, mas agentes de seu processo de socialização; b) deve-se garantir a dupla conscientização das crianças como sujeitos de direitos, ativos e participativos; c) os adultos devem ser promotores da necessidade de incentivar e construir espaços onde as crianças aprendam e se desenvolvam; e d) torna-se necessário superar a crença de que a pouca idade das crianças, vista como imaturidade, é fator inibidor de seu acesso ao exercício da cidadania.

Por outro lado, é preciso superar a concepção de que, ao serem matriculadas na instituição escola, as crianças deixam de ser apenas crianças e passam a integrar o lugar de aluno (Sacristàn, 2005). Existe, no imaginário social, uma visão adultocêntrica da escola, inclusive em profissionais da educação. Tal compreensão reverbera em uma proposta pedagógica ancorada na abordagem tradicional de educação e que remonta à instituição escolar de séculos.

Diante do exposto, questiona-se: há possibilidade de romper com essa tradição escolar a partir da Lei do EF9A? Como potencializar esse fato histórico a favor de uma instituição que respeite a criança como criança em sua singularidade?

Considerando tais questões, são objetivos neste texto: analisar, discursivamente, a política do EF9A como potência para reterritorializar a escola; trazer subsídios para a compreensão da escola como lugar da/para a criança; apresentar reflexões e subsídios teóricos que contribuam com os profissionais da Educação que atuam no ciclo alfabetizador/anos iniciais.

Em termos metodológicos, as discussões resultam de reflexões sobre a política do EF9A, como potência para reconfigurar os anos iniciais do Ensino Fundamental, ancoradas na tese de Schlickmann (2015SCHLICKMANN, M. S. P. O potencial da lei do ensino fundamental de 9 anos: entre o discurso político e o discurso pedagógico. 2015. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) - Programa de Pós-graduação em Ciências da Linguagem, Universidade do Sul de Santa Catarina, 2015.). Esses fios são tecidos a partir das condições de produção do EF9A, em três instâncias discursivas: macro, meso e micro, que, conforme pontuado, são utilizadas, neste texto, apenas quando houver necessidade de explicação desse recorte.

Essas instâncias discursivas constituem-se no lugar social/empírico em que se manifestam as discursividades do EF9A: a) nível macro, de âmbito federal, em que se constitui o discurso político do EF9A; b) nível meso, no âmbito dos Conselhos de Educação (de onde emanam as normativas que regulam as políticas educacionais - nesse caso, o foco são as instruções normativas que definem a operacionalização da política do EF9A, nas instituições vinculadas aos respectivos sistemas estadual ou municipal); e c) nível micro que compreende as instituições educacionais nas quais a Lei é materializada2 2 Destaca-se que os conceitos teórico metodológicos que dão ancoragem para a metodologia da tese serão utilizados, neste texto, apenas no limite da necessidade para explicar este recorte. .

O estudo corresponde a uma pesquisa documental - texto da Política do EF9A - Lei 11.274/06 - com pesquisa de campo exploratória. Para este artigo, são feitos recortes da pesquisa de campo realizada em instituições educacionais do Sul de Catarina (Schlickmann, 2015SCHLICKMANN, M. S. P. O potencial da lei do ensino fundamental de 9 anos: entre o discurso político e o discurso pedagógico. 2015. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) - Programa de Pós-graduação em Ciências da Linguagem, Universidade do Sul de Santa Catarina, 2015.).

O referencial teórico e analítico tem suas bases na perspectiva histórica e dialética com abordagem qualitativa. Em termos teóricos, recorre-se, principalmente, aos conceitos da Análise de Discurso de linha francesa e de pesquisadores que têm buscado compreender os fenômenos discursivos à luz dessa teoria. Subsidiam as reflexões acerca do discurso pedagógico os documentos oficiais produzidos pelo Ministério da Educação como textos orientadores para inclusão da criança de seis anos na escola. Recorre-se também, quando necessário, a autores da área de alfabetização e da Educação com discussão interdisciplinar sobre a criança, infância e suas singularidades.

Em relação à estrutura, o presente texto está assim organizado: inicia-se com uma reflexão em que se busca analisar, discursivamente, a política do EF9A e seu impacto para a escola. Na continuidade, são problematizadas a Lei 11.274/06, as crianças e o lugar social escola, como possibilidade de sua reterritorialização. Finda-se com as considerações finais.

2 POLÍTICA DO EF9A E AS CRIANÇAS DE 6 ANOS NA ESCOLA

Com a Lei 11.274 de fevereiro de 2006, as crianças de 6 anos passaram a integrar o Ensino Fundamental de 9 anos (Brasil, 2006). A partir dessa Lei, municípios e estados, por meio dos sistemas de educação, necessitaram se adequar para recebê-las na escola. Por conseguinte, as crianças de seis anos, que antes estavam na Educação Infantil, agora devem ser matriculadas no primeiro ano do Ensino Fundamental de 9 anos.

Como já é de conhecimento, nem tudo o que está na LDB (Lei 9.394/1996) (Brasil, 1996), na Lei 11.274/06 (Brasil, 2006) e nas Diretrizes Curriculares para Educação Básica (Brasil, 2013), chega de forma discutida às instituições. Para visualizar melhor como esses discursos3 3 Para Pêcheux (2011, p. 35), “[...] o instrumento de transformação da prática política é o discurso, como sistema articulado que remete à prática social complexa - seja ela de Mito ou de sistema - compreende-se finalmente que a prática política tem por função transformar as relações sociais reformulando a demanda social por meio de um discurso. Dizendo isto, não pretendemos que a política se reduza ao discurso; mas que toda decisão, toda ‘medida’ no sentido político adquire seu lugar na prática política como uma frase em um discurso”. chegam à escola, em seu nível hierárquico, veja-se a Figura 1, a seguir (Schlickmann, 2015SCHLICKMANN, M. S. P. O potencial da lei do ensino fundamental de 9 anos: entre o discurso político e o discurso pedagógico. 2015. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) - Programa de Pós-graduação em Ciências da Linguagem, Universidade do Sul de Santa Catarina, 2015.)4 4 Os conceitos utilizados na Figura 1 serão explicitados adiante quando chamados no texto. :

Figura 1
Funcionamento discursivo do EF9A: dimensões macro, meso e micro

Como se pode perceber, existe um contexto discursivo em que os sentidos vão deslizando em uma “rede de memória” (Courtine, 2009COURTINE, J.-J. Análise do discurso político. O discurso comunista endereçado aos cristãos. Tradução: Vanice Sargentini (org.). São Carlos: EdUFSCar, 2009.)5 5 De acordo com Courtine (2009), essa rede de memória é que baliza a escolha das sequências discursivas (SD). É a partir dessa concepção que o conceito de sequência discursiva é utilizado para apresentar o dispositivo de análise. , no cotidiano dessas diferentes instâncias discursivas, e que denotam que se pode refletir sobre esse momento histórico, sobre os discursos e práticas que engendram esse sistema discursivo, assim como suas consequências para a instituição escolar.

Importa destacar que essas questões requerem, de todos os envolvidos, maior reflexão sobre o processo de ensino e de aprendizagem nessa faixa etária. Tais reflexões devem centrar-se, especialmente, nas dimensões pedagógica e estrutural de organização do cotidiano da escola de Ensino Fundamental. Trata-se de um período em que as crianças estão na fase inicial de apropriação da leitura e da escrita - primeiro ano do ciclo alfabetizador - mas ainda são crianças muito pequenas.

Diante desse fato histórico e dos discursos decorrentes, questiona-se: que efeitos de sentido são gerados pela Lei 11.274/06, nas instituições educacionais com a chegada das crianças de seis anos à escola? O que mudou na escola com a entrada das crianças de seis anos no Ensino Fundamental? Qual o lugar das crianças na escola e qual o lugar da escola na vida delas? O que essa política representa para as crianças e para a escola, para o processo educacional no EF9A?

Sabe-se, contudo, que essas e outras necessidades de adaptação da escola - de modo a torná-la um espaço que acolha as crianças e crie as condições para que vivam a infância de modo pleno e integral - exigem um olhar para outras variáveis implicadas no processo. Por exemplo, as condições de produção (CP) dos agentes envolvidos, em especial os sujeitos professores, sua formação e suas concepções sobre o processo de ensino e de aprendizagem, nessa fase inicial da escolarização. Isso aumenta ainda mais o nível de complexidade da organização do lugar social escola, do planejamento e a necessidade de maior compreensão sobre a Lei do EF9A, em suas dimensões política, histórica e pedagógica, fortalecendo o que se traz como primordial, para uma ruptura paradigmática desse lugar social onde as crianças foram colocadas, a partir da Lei 11.274/06.

Essas preocupações levaram à necessidade de maior reflexão em relação às formulações discursivas que funcionam entre o discurso proclamado6 6 A expressão ‘discurso proclamado’ é uma apropriação a partir de Charlot (2014, p. 39), quando faz referência às abordagens que sustentam as práticas pedagógicas dos professores brasileiros. e o discurso que se constrói em torno da materialização da Lei, o discurso realizado que ecoa o desdobramento de uma política proclamada como garantia do direito à educação7 7 Sobre a obrigatoriedade da educação, ver Cury e Ferreira (2010). para todos, discurso da democratização. Entretanto, se a política do EF9A traz em si a possibilidade de uma escola justa e democrática, como materializar esse discurso oficial no dia a dia da escola? Qual o preço para as crianças em processo de alfabetização?

Vale lembrar que a universalização do ensino não se institui com apelo ao acesso de todas as crianças na escola, mas com condições para que o acesso seja viabilizado (Kramer, 2007KRAMER, S. A infância e sua singularidade. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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). Entende-se, por isso, que essas condições implicam pensar/repensar o lugar da escola para a criança e, consequentemente, para seu desenvolvimento integral. No documento orientador da política do EF9A, organizado por Beauchamp, Pagel e Nascimento (2007NASCIMENTO, A. M. do. A infância na escola e na vida: uma relação fundamental. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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), há um alerta sobre a importância de se pensar na criança e não no aluno, sobre a necessidade de refletir a criança-infância, todavia fica a pergunta: como as instituições, os sujeitos nas suas diferentes posições-sujeito, percebem as crianças? Que condições o Estado assegura para que as instituições (professores) possam pensar a criança e o aluno?

Convém reiterar que pensar o Ensino Fundamental de nove anos exige discutir a lógica organizacional dos tempos e espaços escolares, ainda organizados na perspectiva da transmissão do conhecimento, da linearidade do processo de ensino-aprendizagem, da homogeneidade e enquadramento social - uma lógica na perspectiva da alunância, adultocêntrica, que coloca sua centralidade no adulto, em uma perspectiva da criança frágil, incompleta e sem razão (Souza, 1996SOUZA, S. J. Ressignificando a psicologia do desenvolvimento: uma contribuição crítica à pesquisa da infância. In: KRAMER, S.; LEITE, M. I. (org.) Infância: fios e desafios da pesquisa. Campinas: Papirus, 1996.).

A preponderância dessas concepções reacende a emergência de discussões nos coletivos escolares que possam refletir/repensar o modo como as escolas lidaram e vêm lidando com a presença das crianças de seis anos, nos anos iniciais, e se suas singularidades estão sendo respeitadas. Entende-se que essas questões precisam ser problematizadas de modo concomitante às questões legais e administrativas que constituem a política do EF9A. Portanto, é essencial avaliar constantemente esse processo e criar as condições para que as crianças tenham suas necessidades atendidas o que, necessariamente, inclui reorganizar esse lugar.

Em vista disso, o que se vislumbra é tratar o texto da Lei 11.274/06 (Lei do EF9A) articulado às dimensões pedagógicas travadas, no processo de alfabetização, no interior da instituição escola (Goulart, 2007GOULART, C. A organização do trabalho pedagógico: Alfabetização e Letramento como eixos organizadores. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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; Nascimento, 2007NASCIMENTO, A. M. do. A infância na escola e na vida: uma relação fundamental. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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; Kramer, 2007KRAMER, S. A infância e sua singularidade. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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). É esse contexto de observação da política do EF9A e de seus desdobramentos das práticas escolares e das discursividades daí decorrentes que se torna fundamental problematizar.

Deste modo, os impactos da implantação da Política do EF9A, no cotidiano escolar, e, por conseguinte, na vida das crianças a partir da Lei 11.274/06, requerem mobilização constante por parte de todos que vivem nesse lugar.

Soares e Tomás (2005SOARES, N. F.; TOMÁS, C. Da emergência da participação à necessidade de consolidação da cidadania da infância: os intrincados trilhos da acção, da participação e do protagonismo social e político das crianças. In: SARMENTO, M. J.; CERISARA, A. B. (org.). Crianças e miúdos: perspectivas sociopedagógicas da infância e educação. Portugal: Asa, 2005. p. 135-162.) afirmam que pensar as singularidades das crianças exige reconhecer e compreender que elas vivem de modo diverso sua infância. As infâncias variam, “[...] quer de sociedade para sociedade, quer mesmo dentro de uma mesma comunidade ou até mesmo dentro de uma família. Por conseguinte, podemos afirmar a existência de infâncias e não de uma única infância” (Soares; Tomás, 2005, p. 138).

A partir desse cenário, pergunta-se: Qual é o lugar que ocupam as infâncias e as crianças, no EF9A, na escola? Qual a relação do(a)s professores(a)s com os conhecimentos provenientes dos documentos orientadores da ação docente para o período inicial de escolarização, de acordo com essa política? A escola como lugar social tem seu espaço organizado para as crianças viverem suas infâncias integralmente? As crianças são ouvidas, na escola? Que espaços elas possuem para se expressar por meio das diferentes linguagens? Como esse lugar está organizado esteticamente? Organização e planejamento são pensados para a criança ou para a alunância?

Esses questionamentos fazem repensar a necessidade de transgredir uma lógica temporal e espacial sedimentada que privilegia a alunância em detrimento da infância, a homogeneidade em detrimento da heterogeneidade.

Discursos que apagam a infância tornam as crianças invisíveis. Nascimento (2007NASCIMENTO, A. M. do. A infância na escola e na vida: uma relação fundamental. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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, p. 28) pondera: “Refletir sobre a infância em sua pluralidade dentro da escola é, também, pensar nos espaços que têm sido destinados para que a criança possa viver esse tempo de vida com todos os direitos e deveres assegurados”.

Nessa reflexão, Nascimento (2007NASCIMENTO, A. M. do. A infância na escola e na vida: uma relação fundamental. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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) não apenas interroga a escola como também faz uma provocação com relação ao que se pode constituir um diálogo aberto e produtivo sobre a complementaridade e a aproximação entre escola e Educação Infantil. Para ela, esse pode ser um momento para superar paradigmas e, quem sabe, conseguir enxergar com outra lente as crianças que integram os anos iniciais. Afinal, elas não deixam de ser crianças quando entram no primeiro ano.

Reconhecer o papel da Educação Infantil e que ela pode ter um papel importante na transição das crianças para o Ensino Fundamental pode ser uma boa estratégia. Entretanto, é preciso criar as condições de diálogo entre essas duas etapas da Educação Básica.

Concorda-se com Kramer (2007KRAMER, S. A infância e sua singularidade. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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, p. 20), ao afirmar que “[...] o trabalho pedagógico precisa levar em conta a singularidade das ações infantis e o direito à brincadeira, à produção cultural tanto na educação infantil quanto no ensino fundamental”.

Diante do exposto, ressalta-se que há discursos que constituem elementos fundamentais para organização didático-pedagógica do ciclo alfabetizador nessa perspectiva no documento orientador do EF9A (Brasil, 2007). Nesse documento, Kramer (2007KRAMER, S. A infância e sua singularidade. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
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) salienta que as crianças devem ser reconhecidas por suas capacidades criativas, lúdicas, imaginativas, por meio das quais elas expressam seus sentimentos, emoções, saberes mediante múltiplas linguagens, como sujeitos que experienciam o mundo de um modo particular. Isso requer diálogo constante, dentro e fora da escola, entre as diferentes instituições onde coletivamente são construídas alternativas curriculares que privilegiem a infância no lugar da escola, em sua função social.

Posto isso, para discutir e transformar a escola e, especificamente, as condições e estratégias pedagógicas que colaboram para a emancipação das crianças que frequentam o EF9A, faz-se importante trazer para o debate a desnaturalização/desconstrução de um modelo de educação centralizado no professor e fundamentado na perspectiva do tempo cronológico da infância, da incompletude, da fragilidade, da carência das crianças pequenas e de suas famílias, e buscar dar visibilidade para todas as crianças.

Tal compreensão reflete os sentidos que atravessam a história pelo imaginário dos sujeitos que integram o lugar da escola; esses sujeitos, pela própria inscrição na língua, estão impregnados de seus “efeitos na história” (Pêcheux 1997PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Tradução de Eni P. Orlandi et al. 3. ed. Campinas: Editora da Unicamp, 1997 [1982]., apudOrlandi, 2012ORLANDI, E. P. Discurso e texto: formulação e circulação dos sentidos. 4. ed. Campinas: Pontes, 2012., p. 20). Isso reflete no que se tem como realidade da escola, na contemporaneidade.

Ainda sobre a organização dos espaços, que também é objeto da Lei 11.274/06, vale enfatizar que, mesmo depois de quase duas décadas da aprovação dessa lei, essas questões ainda representam um desafio às instituições escolares.

Em consonância com pesquisas desenvolvidas no GEPPHAE8 8 Grupo de estudos e pesquisas em políticas educacionais, história e alfabetização na Educação Básica, coordenado pela pesquisadora. e o que se tem percebido na disciplina de Estágio em Alfabetização, do Curso de Pedagogia, ministrada pela pesquisadora, tal realidade não mudou. No momento histórico atual, quando se vive o agravante das “dívidas” deixadas para as crianças pelas consequências da pandemia de Covid-19, a discussão se torna ainda mais necessária e atual.

A partir desse cenário, tem-se, de um lado, a Lei 11.274/06 e as crianças que, com a vigência dessa lei, chegaram à escola, um ano mais cedo; de outro, uma escola que continua atuando, em conformidade com um paradigma tradicional, repleto de discursos autoritários9 9 O conceito de discurso autoritário é utilizado neste texto a partir de Orlandi (2011). , sem preocupação com as necessidades e especificidades das crianças.

Essa constatação reforça as inquietações aqui apresentadas, gerando a necessidade de contribuir para se (re)pensar o cenário escolar, de forma a transformá-lo em um espaço da infância e para a infância, uma necessidade também tratada na Lei 11.274/06.

Contudo, é importante destacar que, ao se desenvolver a presente temática e buscar reunir reflexões/pistas que possam contribuir com os profissionais docentes para aprimorar o fazer pedagógico, no ciclo alfabetizador, em nenhum momento isso pressupõe culpabilizar os sujeitos professores, individualmente, quando, na verdade, eles não possuem tais conhecimentos. É preciso atentar aos discursos e fazeres pedagógicos desenvolvidos por esses sujeitos, para os limites do trabalho docente, na escola, e suas condições de trabalho.

Conforme Sacristán (1998SACRISTÁN, G. J. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3. ed. Porto Alegre: ArtMed, 1998., p. 166-167):

A atividade dos professores é uma ação que transcorre dentro de uma instituição. Por esta razão, sua prática está inevitavelmente condicionada. [...] as possibilidades de escolher estão prefiguradas de algum modo dentro do campo que atuam. O professor não decide sua ação no vazio, mas no contexto da realidade de um local de trabalho, numa instituição que tem suas normas de funcionamento marcadas às vezes pela administração, pela política curricular, pelos órgãos de governo de uma escola ou pela simples tradição que se aceita sem discutir.

O desafio parece ser, então, o de criar as condições para que os docentes, a partir de um percurso continuado de formação, apropriem-se dos conhecimentos necessários para o desenvolvimento das competências científica, técnica e política, necessárias para transformar os argumentos, as teorizações e toda discursivização que aparecem nas orientações para o EF9A, para que elas sejam reconhecidas e legitimadas no dia a dia das escolas, da vida dos professores e das crianças/alunos dos anos iniciais.

Entende-se, à vista disso, que se a política do EF9A for compreendida pelos sujeitos que a materializam e se a prática pedagógica estiver ancorada em pressupostos que possam alicerçar o fazer docente de modo a respeitar a infância, pode-se vislumbrar, na perspectiva da Lei, um modo de potencializar a metamorfose da escola. Na sequência, discorre-se sobre essa possibilidade.

3 A POLÍTICA DO EF9A COMO POTÊNCIA PARA RETERRITORIALIZAR A ESCOLA

[...] A língua vai onde o dente dói.

(Michel Pêcheux)

Essa reflexão é desenvolvida a partir do contato com sujeitos, no lugar social escola, ao se fazer a escuta de vozes em diferentes posições-sujeito. Foi o momento de perceber o modo como os sujeitos da escola, na dimensão discursiva micro, significam suas práticas a partir das implicações da política do EF9A, seus desdobramentos e o que isso pode suscitar. Como anteriormente mencionado, esses sentidos estão, discursivamente, ancorados no imaginário social de escola.

Transformar esse espaço, sedimentado pelo imaginário social, requer uma ruptura paradigmática desse lugar, historicamente sustentado por uma cultura escolar de séculos.

Conforme Viñao Frago e Escolano (1998, p. 26):

[...] a arquitetura escolar é [...] por si mesma um programa, uma espécie de discurso que institui na sua materialidade um sistema de valores, como os de ordem, disciplina e vigilância, marcos para a aprendizagem sensorial e motora e toda uma semiologia que cobre diferentes símbolos estéticos, culturais e também ideológicos. [Neste sentido] o espaço escolar tem de ser analisado como um constructo cultural que expressa e reflete, para além de sua materialidade, determinados discursos.

Segundo os autores, o espaço escolar é também um ambiente de aprendizagem e, por isso, ele deve fazer parte do currículo, do planejamento, da aula. Isso vem ao encontro do que se postula sobre as instituições escolares como espaço educativo de aprendizagem que, para Viñao Frago e Escolano (1998), é “uma espécie de discurso” que representa as concepções que sustentam o fazer pedagógico na escola.

Assim sendo, pode-se dizer que toda a escola, bem como a organização de seu cotidiano, incluindo todos os espaços, constituem lugares que produzem sentidos para as crianças e que, refletem discursivamente a posição-sujeito de quem ocupa esse lugar social.

Pelos dados da pesquisa, foi possível perceber que as marcas discursivas da escola tradicional, tal como constituída historicamente, continuam presentes, e que, em geral, não houve mudança perceptível no espaço físico da escola para receber as crianças. Os professores deixaram essa preocupação assinalada, quando perguntados sobre as dificuldades encontradas no processo de implantação e implementação do EF9A sobre a chegada das crianças de 6 anos à escola10 10 Utiliza-se SD (sequência discursiva) para identificar os dizeres dos participantes desta pesquisa. :

SD 13011 11 A numeração das SD aqui em análise, segue a mesma numeração da tese de Schlickmann, 2015. : Uma das dificuldades, acredito eu, que era o espaço, a estrutura para um ensino de qualidade. (MUNICÍPIO A, ESCOLA A, PROFESSOR B, 2014).

SD 131: Espaço físico e mobiliário adequado (parque, lazer); material didático (jogos pedagógicos); entendimento de como articular a prática; organização do ambiente físico (sala de aula e os materiais). (MUNICÍPIO C, ESCOLA C, COORDENADORA PEDAGÓGICA, 2014).

SD 132: Nosso espaço já era difícil, com o ensino de 9 anos só fez se agravar mais. (MUNICÍPIO B, ESCOLA B, PROFESSOR A, 2014).

SD 133: No espaço escolar nada mudou. (MUNICÍPIO B, ESCOLA B, PROFESSOR B, 2014).

SD 134: Quanto ao espaço deveria ter o parque para as crianças das séries iniciais (MUNICÍPIO C, ESCOLA C, PROFESSOR B, 2014).

SD 135: Houve a reorganização do espaço nos anos iniciais do ensino fundamental (salas de aula) cantinho da leitura, da exposição dos trabalhos em sala. No espaço fora da sala pouco se tem além do pátio. (MUNICÍPIO C, ESCOLA C, COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA, 2014).

SD 136: Nosso espaço físico é reduzido. Ou seja: muitos alunos matriculados para um espaço tão pequeno. As salas de aula são cheias e pequenas. (MUNICÍPIO B, ESCOLA B, DIREÇÃO, 2014).

SD137: Não houve mudança. (MUNICÍPIO D, ESCOLA D, DIREÇÃO, 2014).

Analisando os recortes e sua relação com a escola, que precisou planejar ou, pelo menos, deveria ter planejado, para receber as crianças de seis anos, eles ressoam como uma forma de denúncia, pois reforça a voz da escola, clamando por um ressignificar do processo educativo, no ciclo alfabetizador.

Essas manifestações remetem ao desafio da proposição sobre como se pode repensar a escola, em uma concepção ampla, que vai além do ensinar e aprender, na lógica tradicional. Essa concepção inclui refletir a dimensão pedagógica, repensando esse lugar social como um local para as crianças, para a infância.

Segundo Viñao Frago e Escolano (1998, p. 28), “[...] não só o espaço-escola, mas também sua localização, a disposição dele na trama urbana dos povoados e cidades, tem de ser examinada como um elemento curricular”, uma vez que a escola não está descolada da sociedade, muito pelo contrário:

[...] a configuração da escola na cidade moderna, mais uma vez, segue o conflito, em vez de responder a critérios de humanização. A relação da criança com o espaço urbano não é um episódio isolado, mas um corolário que se acrescenta ao modo de construir as cidades em nossas sociedades (Viñao Frago; Escolano, 1998, p. 29).

Nessa acepção, é preciso que “[...] rompamos os muros da escola, [que] levemos a criança ao campo, à oficina, ao museu” (Viñao Frago; Escolano, 1998, p. 31). Ou melhor, é preciso que se pense a instituição escola em outra lógica. Não se trata de um espaço infantilizado, cheio de imagens, figuras de personagens do mundo infantil criadas pelos adultos, como ainda se encontra em algumas instituições. Trata-se, sim, de ambientes organizados de modo a favorecer a fruição estética da arquitetura à organização do cotidiano da escola. Tudo isso em uma proposta que contemple as diferentes linguagens como dimensão pedagógica, visto que, no ciclo alfabetizador, que integra os anos iniciais do Ensino Fundamental, o mesmo professor trabalha com todas as áreas do conhecimento ou, pelo menos, com boa parte dos componentes curriculares.

Essa preocupação também está expressa no documento orientador do processo de implantação do Ensino Fundamental de nove anos, proposto pelo MEC, em conformidade com Corsino (2007CORSINO, P. As crianças de seis anos e as áreas do conhecimento. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pd...
, p. 67):

Cabe à educação das séries/anos iniciais valorizar as diferentes manifestações culturais, partir dos interesses e conhecimentos das crianças, ampliá-los e expandi-los em projetos de trabalho interdisciplinares. Cabe ainda pensar na educação como espaço de humanização e de luta contra a barbárie. Para Paulo Freire (1997, p. 26) “quando vivemos a autenticidade exigida pela prática de ensinar-aprender participamos de uma experiência total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de mãos dadas com a decência e com a seriedade”. A educação é simultaneamente um ato político, estético e ético. A política como ação do sujeito na coletividade se efetiva com uma forma e um conteúdo que, por sua vez, são indissociáveis. Separar ética, política e estética é desconhecer como se dá a própria ação educativa. Na prática pedagógica, a estética dos espaços, dos materiais, dos gestos e das vozes dá visibilidade ao que e como se propõe à criança e, ainda, ao que o adulto pensa sobre ela e sobre a educação dirigida a ela. O político permeia tudo isso pelas vozes que podem ser ouvidas ou caladas, pela possibilidade de os sujeitos expressarem-se, relacionarem-se, respeitarem-se, sensibilizarem-se e comprometerem-se com o outro e com o seu grupo social, apropriando-se de conhecimentos e inserindo-se nas diferentes esferas culturais. O ensino fundamental para as crianças de seis anos, como um dos primeiros espaços públicos de convivência, é onde tudo isso começa.

E é isso que se defende. Deslizando para o discurso que constitui os ambientes da escola, reafirma-se, a partir de Corsino (2007CORSINO, P. As crianças de seis anos e as áreas do conhecimento. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pd...
), o quanto se pode ousar, em termos de reorganização da proposta pedagógica no espaço escolar, na sua arquitetura, de forma a incluir a dimensão estética e lúdica. Pode-se ousar, também, em termos da reorganização dos ambientes educativos nos quais as múltiplas linguagens são impulsionadas como estratégia para a criação, o desenvolvimento do vocabulário etc., pois, são ambientes potentes que contribuiriam com o planejamento do professor e, consequentemente, o desenvolvimento dos sujeitos em sua plenitude.

Nessa dimensão,

[...] a arquitetura escolar é um elemento cultural e pedagógico não só pelos condicionamentos que suas estruturas induzem, aspecto que já salientamos anteriormente, mas também pelo papel de simbolização que desempenha na vida social. [...]. Este pensamento também é reforçado pelos autores quando assim se manifestam: [...] o edifício escolar é uma forma que comporta determinada força semântica através dos signos e símbolos que exibe, como variante que é da chamada arquitetura institucional (Viñao Frago; Escolano, 1998, p. 33-34).

É com base nessa concepção de escola como produtora de cultura que se faz referência ao espaço como constituidor de sentidos outros para as crianças. Trata-se de uma necessidade que aparece de forma expressiva, na pesquisa, o que possibilita reiterar a necessidade de o professor ter presente que a organização do espaço constitui elemento importante da prática pedagógica no ciclo alfabetizador, e que é um dos elementos a ser considerado no planejamento. As SDs abaixo mostram essa dimensão nos dizeres dos sujeitos consultados:

SD 138: Já no aspecto negativo, é que muitas escolas estão adaptando o currículo sem considerar essa demanda de crianças de seis anos. Apenas mudam siglas e continua-se realizando o mesmo trabalho pedagógico. O mobiliário é outro ponto a ser considerado (MUNICÍPIO C, ESCOLA C, PROFESSOR C, 2014).

SD 139: Precisa ser melhorado o mobiliário, o espaço, os materiais, os espaços adequados, tempo para planejamento e cursos para os professores (MUNICÍPIO D, ESCOLA D, PROFESSOR B, 2014).

SD 140: A preparação dos professores da educação para trabalhar com os alunos nos anos iniciais, a importância de compreender e trabalhar com as particularidades, características e concepções com essa faixa etária (MUNICÍPIO B, ESCOLA B, COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA, 2014).

SD 141: O espaço físico da escola precisa ser adaptado para essas crianças (MUNICÍPIO D, ESCOLA D, COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA, 2014).

SD 142: Falta de espaço físico; falta de adequação do imobiliário; comprometimento político; superlotação das escolas e salas de aulas. (MUNICÍPIO B, ESCOLA B, DIREÇÃO, 2014).

SD 143: Processo de avaliação e registro destes; o lúdico, como proposta de aprendizagem significativa; interações entre as turmas visando trocas de experiências (MUNICÍPIO C, ESCOLA C, PROFESSOR C, 2014).

Pelas sequências discursivas, vê-se a necessidade de ouvir a voz dos educadores/professores/equipe pedagógica, que clamam por um trabalho que crie condições para repensar a organização espacial, ouvindo e envolvendo as crianças e, conseguintemente, possibilitando condições para transformar o espaço educativo num locus de produção de sentidos para a infância.

Isso leva a vislumbrar uma escola que cumpra “[...] não só com a sua função pedagógica, mas também com um objetivo cultural de primeira magnitude, ao criar um dos símbolos que melhor aglutinam a consciência coletiva das populações e sua própria identidade” (Viñao Frago; Escolano, 1998, p. 34).

Essa concepção também está em sintonia com Freire (1987FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.), ao afirmar que a Educação não só é produtora de cultura, como deve proporcionar a emancipação dos sujeitos. Para ele, somente quando a camada popular tiver acesso à cultura da elite é que haverá mais justiça social e se poderá falar de um mundo mais humanizado, com mais integridade e igualdade de condições, em razão de que é o conhecimento e o acesso à cultura que contribuirão para ampliar as possibilidades de libertação e de emancipação dos sujeitos (Freire, 1996), possibilitando que deixem, gradualmente, a condição de submissão, e isso não se faz sem a escola.

Na pesquisa, essa concepção apareceu com estas palavras:

SD 144: A escola é uma instituição social com objetivo de desenvolver as potencialidades físicas, cognitivas e afetivas dos alunos através da aprendizagem dos conteúdos que acontece de maneira contextualizada desenvolvendo nos educandos capacidades de se tornarem cidadãos críticos e participativos na sociedade em que estão inseridos, deixando de ser um local para deixar a criança, mas que serve a ser o encontro dos saberes e descobertas, onde a aprendizagem passe a acontecer de forma prazerosa e funcional (MUNICÍPIO B, ESCOLA B, DIREÇÃO, 2014).

Como se pode perceber, os sujeitos necessitam ter na escola a oportunidade de conviver em espaços que sejam agentes de sua cultura, de (e de sua) história; esse pode ser o caminho para sua humanização, e a escola é um dos espaços onde isso pode ser provocado. Logo, é importante que se organize como, “[...] o lugar mais alegre e hospitaleiro, e, ao mesmo tempo, o modelo de uma existência superior [pois] a influência dos primeiros anos na vida de uma criança tem força bastante para fazê-la, mais tarde, renovar o povo” (Viñao Frago; Escolano, 1998, p. 36).

Já referenciado anteriormente, a formação inicial é basilar na vida do ser humano e precisa estar fundamentada em valores que favoreçam o desenvolvimento da independência, a formação de sujeitos autônomos e produtores de cultura (Perrotti, 1986PERROTTI, E. A criança e a produção cultural. In: ZILBERMAN, R. (org.). A produção cultural para a criança. Porto Alegre: Mercado de Letras, 1986.).

Pode-se afirmar, então, a partir da pesquisa, que as manifestações discursivas presentes, na arquitetura da escola, também podem compor um programa educador, como um dos elementos do currículo invisível ou silencioso, o que pressupõe dar visibilidade para a infância, para as crianças. De acordo com o que se identificou, nos sujeitos da pesquisa, é preciso também ter paciência, pois se está diante de um processo complexo, que exige de todos formação e o constante repensar de suas práticas.

Sobre a questão, vide este dizer:

SD 145: É um processo gradativo. Em todo trabalho precisamos ter como ponto de referência as peculiaridades infantis, as características de desenvolvimento e aprendizagem e a realidade do contexto socioeconômico e cultural no qual os educandos encontram-se inseridos, pois estamos diante de uma nova realidade onde cada um tem seu tempo e aprende de acordo com sua capacidade de interação. Nada se construiu e se modificou num piscar de olhos, é com persistência a mudança e muito precisa ser feito sobre a nova organização escolar (MUNICÍPIO C, ESCOLA C, COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA, 2014).

Mediante essa fala, percebe-se que cabe aos educadores, no processo de planejamento, ter em conta essas peculiaridades, considerar também os espaços como constitutivos do currículo, uma vez que eles são essenciais para que as crianças vivam sua infância e, ao mesmo tempo, interajam com o processo de construção do conhecimento, no ciclo alfabetizador.

Isso pode ressignificar o ambiente escolar, tornando-o um espaço de criação cultural e histórica que pode ser transformado pelos adultos e crianças, isto é, por quem convive nele, cotidianamente.

Vê-se que a linguagem oral, a escrita e a leitura ainda são priorizadas na escola. E, como espaço de criação, as demais linguagens não são consideradas com a mesma atenção, por vezes ficando até silenciadas. Na SD 147 pode-se constatar uma situação de maior valorização da linguagem escrita, dado que os outros espaços são organizados para as crianças usarem sozinhas e, por vezes, pouco olhados pelo professor, em seu planejamento. Vide:

SD 147: Na sala organizei espaços para as crianças explorarem sozinhas, caixa de revistas, jornais, mesa de jogos, livros de histórias e gibis; conforme vão terminando as atividades exploram esses espaços. Em alguns momentos planejo situações de aprendizagem para as turmas nesses espaços (MUNICÍPIO C, ESCOLA C, PROFESSOR C, 2014).

Conforme esse docente, os espaços ainda são organizados para as crianças terem o que fazer, ao finalizar as atividades, que possam explorar esses ambientes, experienciar outras linguagens. Isso leva a compreender que eles ainda não constituem elemento especial de aprendizagem, no planejamento, mas são lugares que as crianças podem explorar, quando terminam as atividades apontadas por esse professor como mais importantes.

Daí a relevância de romper com a lógica de organização da cultura escolar vigente. Esse lugar poderia contribuir para o desenvolvimento do potencial infantil, ser um espaço motivador da transgressão, da audácia, potente em efeitos de sentidos. Ser um lugar onde todas as linguagens têm o mesmo valor, no processo pedagógico, de modo a possibilitar o desenvolvimento integral e integrado dos sujeitos.

Na verdade, não se pode esquecer de que, quando os ambientes escolares aparecem sempre com a mesma configuração, trazem, implicitamente, marcas do discurso pedagógico autoritário, consolidado historicamente: um espaço sedimentado na memória discursiva dos sujeitos.

Como Orlandi (2009ORLANDI, E. P. Espaço da violência: o sentido da delinquência. Cadernos de Estudos Linguísticos, Campinas, v. 51, n. 2, p. 219-234, jul./dez. 2009.) assevera, o ambiente é uma construção social que se significa e significa o tempo inteiro, daí a contribuição da dimensão estética. Segundo Jimenez (1999JIMENEZ, M. O que é estética. São Leopoldo: Ed. Unisinos, 1999., p. 370), “[...] a estética é antes de tudo o universo da sensibilidade, das emoções, da intuição, da sensualidade, das paixões, domínio em que reina uma ambivalência irredutível a símbolos e a um sistema de notação”.

É nesse sentido que se propõe reterritorializar os ambientes escolares, de forma a que eles possam propiciar a criação, a fantasia e a imaginação, possibilitando a ampliação do repertório infantil.

Essa não é, certamente, uma reflexão que se esgota aqui. Para romper um paradigma é preciso que seja construído um outro gradativamente.

Trata-se de um processo desafiador para o ciclo alfabetizador/para os anos iniciais, mas acredita-se, a partir da pesquisa realizada, que é um processo que, se trabalhado com base em estudos teóricos consistentes, possibilitaria a reterritorialização/ressignificação da escola. A escola deve ser um lugar onde as crianças gostam de ficar e possam ser felizes, questionar, problematizar, criar; lugar em que sejam desafiadas e motivadas a aprender e desenvolver-se (Snyders, 1996SNYDERS, G. Alunos felizes: reflexão sobre a alegria na escola a partir de textos literários. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.).

Por esse ângulo, as dimensões mais relacionadas à organização do espaço, do ressignificar a estrutura da escola, é ratificado, por um discurso que coloca como um dos centros da dimensão pedagógica o eixo da ludicidade, da interação e das brincadeiras. Pode-se afirmar, então, pelos dizeres dos professores, que eles têm consciência de que é preciso organizar o trabalho a partir da lógica da criança, visto que a dimensão lúdica constitui a criança (Vigotski, 2009VIGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. Tradução de Paulo Bezerra. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.). Não fosse dessa forma, não apareceria com tanta ênfase, em seus depoimentos, a dimensão lúdica e a necessidade de repensar o espaço incluindo o brincar.

Na sequência, uma fala em que essa dimensão é marcante:

SD 148: Ela deve ser trabalhada através de jogos, brincadeiras, é através do lúdico que ela deverá receber as orientações. Se não for assim, ela não se motivará e seu processo de aprendizagem ficará prejudicado (MUNICÍPIO B, ESCOLA B, PROFESSOR B, 2014).

Entende-se, portanto, que transformar os ambientes escolares em espaços de aprendizagem e de produção de efeitos de sentido, como dito, é uma meta a ser alcançada pelos educadores, o que envolve um planejamento conjunto na instituição. E isso é valoroso para pensar o currículo, o lugar da escola e para as crianças, nos primeiros cinco anos do Ensino Fundamental (Lei 11.274/2006), pois, nessa fase, como tão bem expõe Mallaguzzi12 12 Para consultar o poema “As cem linguagens da criança” de Loris Malaguzzi, vide: EDWARDS, Carolyn; GANDINI, Lella; FORMAN, George. As cem linguagens da criança: vol. 2: a Experiência de Reggio Emilia em Transformação. 3. ed. Porto Alegre: Editora Penso, 2015. em seu poema: “[...] a criança é feita de cem... cem modos de fazer mundos [...]”. A escola e a cultura carecem aprender a explorar esse mundo infantil, transformando os ambientes educativos em laboratórios de aprendizagem, já que “[...] a convivência das crianças pequenas com as formas mais elaboradas da cultura é condição necessária - ainda que não seja suficiente - para a formação das máximas possibilidades humanas das crianças” (Mello; Farias, 2010MELLO, S. A.; FARIAS, M. A. A escola como lugar da cultura mais elaborada. Educação, Santa Maria, v. 35, n. 1, p. 53-68, jan./abr. 2010. Disponível em: http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2.2/index.php/reveducacao/article/view/1603/898. Acesso em: 16 maio 2015.
http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2...
, p. 57).

Nesse sentido, é preciso compreender a relação aprendizagem/desenvolvimento como um processo intencional, complexo, em que “[...] a aprendizagem passa a ser entendida como aprendizagem que impulsiona o desenvolvimento. O desenvolvimento deixa de ser entendido como natural e passa a ser entendido como cultural, social e historicamente” (Mello; Farias, 2010MELLO, S. A.; FARIAS, M. A. A escola como lugar da cultura mais elaborada. Educação, Santa Maria, v. 35, n. 1, p. 53-68, jan./abr. 2010. Disponível em: http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2.2/index.php/reveducacao/article/view/1603/898. Acesso em: 16 maio 2015.
http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2...
, p. 55).

Em outros termos, em concordância com Edwards, Gandini e Forman (1999, p. 66), metaforicamente: “Quando o olho salta sobre o muro; este foi o início de outros vôos que nos levariam a percorrer o mundo”.

Contudo, faz-se necessário quebrar resistências, abrir espaços para uma “nova proposta de escola”, voltada para a infância, para a criança que integra o ciclo alfabetizador/os anos iniciais. Ainda, é preciso descontruir posturas ingênuas e olhar com maior criticidade para esse processo, transformando os desejos em lutas pela garantia do direito da criança a uma escola que a respeite, nas suas especificidades, ao mesmo tempo que busca objetivar para ela os conhecimentos historicamente acumulados pela humanidade.

Nessa perspectiva, cumpre enfatizar, com as discussões realizadas, neste artigo, que a escola que se defende para todas as crianças alinha-se à ideia de Saviani (2021SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 12. ed. Campinas: Autores Associados, 2021.), quando ressalta a função social da escola como lugar de apropriação do conhecimento científico. Para esse autor, há a necessidade de se ter clareza ao pensar o currículo, é preciso garantir, também, as ações que a escola “[...] não pode deixar de desenvolver, sob pena de se descaracterizar, de perder sua especificidade” (Saviani, 2021, p. 87).

Dito de outro modo:

Uma proposta pedagógica que envolva as diferentes áreas do currículo de forma integrada se efetiva em espaços e tempos, por meio de atividades realizadas por crianças e adultos em interação. As condições do espaço, organização, recursos, diversidade de ambientes internos e ao ar livre, limpeza, segurança etc. são fundamentais, mas são as interações que qualificam o espaço. Um trabalho de qualidade para as crianças nas diferentes áreas do currículo exige ambientes aconchegantes, seguros, encorajadores, desafiadores, criativos, alegres e divertidos nos quais as atividades elevem sua auto-estima, valorizem e ampliem as suas leituras de mundo e seu universo cultural, agucem a curiosidade, a capacidade de pensar, de decidir, de atuar, de criar, de imaginar, de expressar; nos quais jogos, brincadeiras, elementos da natureza, artes, expressão corporal, histórias contadas, imaginadas, dramatizadas, lidas etc. estejam presentes. Os espaços disponíveis para as atividades precisam ser compreendidos como espaços sociais onde nós, professores(as), temos papel decisivo, não só na organização e disposição dos recursos, mas também na distribuição do tempo, na forma de mediar as relações, de se relacionar com as crianças e de instigá-las na busca de conhecimento (Corsino, 2007CORSINO, P. As crianças de seis anos e as áreas do conhecimento. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pd...
, p. 67).

Considerando esse excerto de Corsino (2007CORSINO, P. As crianças de seis anos e as áreas do conhecimento. In: BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf. Acesso em: 16 maio 2015.
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pd...
), reafirma-se que, para dar conta de uma proposta pedagógica para o sujeito integral, que leve em conta a dimensão física e de organização do espaço, considerando-as como constituidoras do planejamento, é indispensável criar, na escola, a cultura do estudo, da (auto)avaliação do processo e constante planejamento/replanejamento. Sobre ações como essa, um dizer como o deste professor provoca entusiasmo:

SD 160: O planejar faz parte do cotidiano dos educadores e da escola, pois nosso desejo é transformar sonhos em realidade; esta é uma preocupação marcante da escola. (...) Planejar é processo de busca de equilíbrio entre meios e fins, entre recursos e objetivos, pensando sempre no melhor para os educandos, o ato de planejar é processo de reflexão, tomada de decisão sobre a ação. Ações como: reuniões, planejamento de projetos e atividades de ensino, reforço escolar em contra-turno, participação do PNAIC por parte dos professores, planos de aula, prática educativa contextualizada, formação continuada, são mudanças relativas no processo de apropriação da escrita (MUNICÍPIO B, ESCOLA B, DIREÇÃO, 2014)

Pode-se constatar pela SD 160, que os professores desejam estar envolvidos e é possível identificar que estão comprometidos e abertos para o desenvolvimento de ações formativas que contribuam para aperfeiçoar o processo. Desse modo, compreende-se que, sendo possível, junto aos profissionais e professores que atuam nos anos iniciais, avançar nesse entendimento, poder-se-á, por meio de formação continuada consistente, visualizar a possibilidade de reterritorializar o Ensino Fundamental. Todavia, sabe-se que se trata de um processo que passa por diferentes regiões discursivas, nos níveis macro, meso e micro, o que envolve, portanto, vontade política dos gestores da Educação.

Por outro lado, não basta ampliar a formação do alfabetizador. As manifestações de docentes aqui apresentadas foram reveladoras de necessidades para além da formação, com destaque para o acolhimento dos sujeitos que se inter-relacionam, no lugar social que é a escola.

Para Kramer e Leite (1998KRAMER, S.; LEITE, M. I. (org.). Infância e produção cultural. Campinas: Papirus, 1998., p. 40), esse é um processo de “[...] ouvir as experiências, falar sobre elas e interpretá-las com a ajuda daqueles que dela hoje participam - as crianças - uma forma de ressignificar as hierarquias institucionalizadas dos papéis sociais estabelecidos culturalmente”.

Diante dessas reflexões, pode-se dizer que a política do EF9A constitui-se como um acontecimento histórico que gerou um movimento discursivo diverso e repleto de contradições, especialmente nas microrregiões discursivas (instância micro) e que envolve a escola, onde o impacto da mudança afeta o ciclo alfabetizador. O processo de implementação, porém, sofreu os reflexos da ausência de sincronia entre as diferentes instâncias da gestão educacional, o que comprometeu o trabalho e gerou a invisibilidade das crianças de seis anos, na escola.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para compreender como o lugar social escola precisou se organizar para receber as crianças de seis anos, foi preciso interpretar e compreender, histórica e ideologicamente, o discurso materializado na Lei do EF9A, os desdobramentos da respectiva política e como ela impactou o cotidiano das instituições educacionais pertencentes às redes públicas de ensino de Santa Catarina, a partir de sua implementação.

Em relação à implantação, após a aprovação da lei (2006), constatou-se que, de fato, não ocorreram ações planejadas pelos órgãos de gestão, nas diferentes instâncias discursivas, para orientar o processo de implantação e implementação do EF9A. Não houve reflexões/estudos, discussão com os professores e comunidade educacional sobre a adequação da proposta pedagógica da escola para receber as crianças na escola, com garantia do respeito a suas especificidades.

O discurso político-educacional apresentou indícios de autoritarismo, ditando normas para os sistemas de ensino sem criar as condições para o diálogo com a escola. O que se tem, então, são sujeitos que, em suas diferentes posições, são interpelados por determinações “novas”, neste caso pela política do EF9A, configurando-se arbitrariamente, no seio das instituições escolares, que ficam com o compromisso de promover a acomodação da mudança e amenizar seu impacto.

No que tange ao EF9A, em sua dimensão pedagógica e no nível macro, é preciso reconhecer que, mesmo sendo insuficiente, o discurso que constitui os documentos orientadores do MEC produzidos por pesquisadores e consultores para orientação do processo de implantação do EF9A (Brasil 2007; 2009) pode inspirar posturas pedagógicas que alavanquem o despontar de um paradigma educacional que contemple a infância/a criança, em suas singularidades, incorporados como proposta pedagógica e transformado em práxis pedagógica.

Por fim, e com a certeza da incompletude que constitui o sujeito, reafirma-se que, havendo um processo formativo que contemple esses conteúdos, pode-se aproveitar a fissura causada pela Lei 11.274/06 e, de modo articulado com outros marcos teóricos que objetivem os estudos sobre a infância, romper com a cultura escolar vigente e, em um diálogo constante com as instituições públicas, como um mosaico em construção, tornar possível a reconfiguração da escola. É nesse sentido que o estudo realizado encontra na Lei 11.274/2006 potência para reterritorializar a escola.

REFERÊNCIAS

  • BEAUCHAMP, J.; PAGEL, S. D.; NASCIMENTO, A. R. do. (org.). Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/ensifund9anobasefinal.pdf Acesso em: 16 maio 2015.
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  • 1
    De acordo com a Lei 11.274/06, o ciclo alfabetizador no EF9A é composto pelo primeiro, segundo e terceiro anos do Ensino Fundamental.
  • 2
    Destaca-se que os conceitos teórico metodológicos que dão ancoragem para a metodologia da tese serão utilizados, neste texto, apenas no limite da necessidade para explicar este recorte.
  • 3
    Para Pêcheux (2011PÊCHEUX, M. Reflexões sobre a situação teórica das ciências sociais e, especialmente, da psicologia social (Thomas Herbert [1966]). Tradução de Mariza Vieira da Silva e Laura A. Perrella Parisi. In: PÊCHEUX, M. Análise de Discurso: Michel Pêcheux. Textos selecionados por Eni Puccinelli Orlandi. Campinas: Pontes Editores, 2011 [1990]., p. 35), “[...] o instrumento de transformação da prática política é o discurso, como sistema articulado que remete à prática social complexa - seja ela de Mito ou de sistema - compreende-se finalmente que a prática política tem por função transformar as relações sociais reformulando a demanda social por meio de um discurso. Dizendo isto, não pretendemos que a política se reduza ao discurso; mas que toda decisão, toda ‘medida’ no sentido político adquire seu lugar na prática política como uma frase em um discurso”.
  • 4
    Os conceitos utilizados na Figura 1 serão explicitados adiante quando chamados no texto.
  • 5
    De acordo com Courtine (2009COURTINE, J.-J. Análise do discurso político. O discurso comunista endereçado aos cristãos. Tradução: Vanice Sargentini (org.). São Carlos: EdUFSCar, 2009.), essa rede de memória é que baliza a escolha das sequências discursivas (SD). É a partir dessa concepção que o conceito de sequência discursiva é utilizado para apresentar o dispositivo de análise.
  • 6
    A expressão ‘discurso proclamado’ é uma apropriação a partir de Charlot (2014CHARLOT, B. A mistificação pedagógica: realidades sociais e processos ideológicos na teoria da educação. Trad. de Maria José do Amaral Ferreira. São Paulo: Cortez, 2014., p. 39), quando faz referência às abordagens que sustentam as práticas pedagógicas dos professores brasileiros.
  • 7
    Sobre a obrigatoriedade da educação, ver Cury e Ferreira (2010).
  • 8
    Grupo de estudos e pesquisas em políticas educacionais, história e alfabetização na Educação Básica, coordenado pela pesquisadora.
  • 9
    O conceito de discurso autoritário é utilizado neste texto a partir de Orlandi (2011).
  • 10
    Utiliza-se SD (sequência discursiva) para identificar os dizeres dos participantes desta pesquisa.
  • 11
    A numeração das SD aqui em análise, segue a mesma numeração da tese de Schlickmann, 2015SCHLICKMANN, M. S. P. O potencial da lei do ensino fundamental de 9 anos: entre o discurso político e o discurso pedagógico. 2015. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) - Programa de Pós-graduação em Ciências da Linguagem, Universidade do Sul de Santa Catarina, 2015..
  • 12
    Para consultar o poema “As cem linguagens da criança” de Loris Malaguzzi, vide: EDWARDS, Carolyn; GANDINI, Lella; FORMAN, George. As cem linguagens da criança: vol. 2: a Experiência de Reggio Emilia em Transformação. 3. ed. Porto Alegre: Editora Penso, 2015.

Editores de Seção:

Fábio José Rauen e Andreia da Silva Daltoé

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    30 Jun 2023
  • Aceito
    24 Maio 2024
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