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Aclimatação de mudas de acariquara à alta irradiância

Acclimation of manwood seedlings to full sunlight

Resumos

O objetivo deste trabalho foi determinar as mudanças fisiológicas que ocorrem em acariquara (Minquartia guianensis) durante o processo de aclimatação à alta irradiância, bem como a estratégia de aclimatação dessa espécie. Plantas mantidas em baixa irradiância foram transferidas para alta irradiância por 290 dias. Durante esse período, foi medida a relação entre fluorescência variável e máxima (Fv/Fm), em folhas desenvolvidas à sombra e, após a senescência prematura por foto-oxidação, em folhas aclimatadas ao sol. Ao final do experimento, foram determinadas as características fotossintéticas e anatômicas da folha. A exposição à alta irradiância causou, logo após a transferência, forte fotoinibição e foto-oxidação parcial da folhagem, mas não provocou a morte da planta. Folhas produzidas no ambiente ensolarado apresentaram valores de Fv/Fm similares aos do controle. A fotossíntese saturada por luz e a fotossíntese saturada por CO2 foram 90 e 50% maiores em plantas aclimatadas à alta irradiância. A velocidade máxima de carboxilação da rubisco e a taxa máxima de regeneração da ribulose bisfosfato seguiram a mesma tendência. Folhas produzidas ao sol apresentaram maior densidade estomática e maior espessura foliar. A produção de folhas novas é a principal estratégia de aclimatação da acariquara à alta irradiância.

Minquartia guianensis; características da folha; características fotossintéticas; fluorescência da clorofila; fotoinibição


The aim of this work was to determine the physiological changes that occur in manwood (Minquartia guianensis) during the acclimation process to high irradiance, and also to determine the acclimation strategy of this species. Plants kept in low light were transferred to high irradiance for 290 days. During this period the ratio between variable fluorescence and maximum fluorescence (Fv/Fm) was measured in leaves developed in the shade, and after premature senescence due to photooxidation, in sun-acclimated leaves. At the end of the experimental period the anatomic and photosynthetic characteristics of leaves were determined. Exposure to high irradiance caused, just after transferring, strong photoinhibition and partial photooxidation, but did not cause plant death. Leaves produced in sunny environment showed Fv/Fm similar to that of control plants. Light-saturated photosynthesis and CO2 saturated-photosynthesis were 90 and 50% higher in plants acclimated to high irradiance. The maximum carboxylation velocity of rubisco and the maximum rate of ribulose bisphosphate regeneration followed the same trend. Leaves produced under sunlight had higher stomatal density and increased leaf thickness. The production of new leaves is the main acclimation strategy to high irradiance in manwood.

Minquartia guianensis; leaf traits; photosynthetic characteristics; chlorophyll fluorescence; photoinhibition


FISIOLOGIA VEGETAL

Aclimatação de mudas de acariquara à alta irradiância

Acclimation of manwood seedlings to full sunlight

Nilvanda dos Santos MagalhãesI; Ricardo Antonio MarencoII; Keila Rêgo MendesI

IInstituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Curso de Pós-Graduação em Botânica, Caixa Postal 478, CEP 69011-970 Manaus, AM. E-mail: nilvanda3@hotmail.com, keilastm@hotmail.com

IIInpa, Coordenação de Pesquisas em Silvicultura Tropical. E-mail: rmarenco@inpa.gov.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi determinar as mudanças fisiológicas que ocorrem em acariquara (Minquartia guianensis) durante o processo de aclimatação à alta irradiância, bem como a estratégia de aclimatação dessa espécie. Plantas mantidas em baixa irradiância foram transferidas para alta irradiância por 290 dias. Durante esse período, foi medida a relação entre fluorescência variável e máxima (Fv/Fm), em folhas desenvolvidas à sombra e, após a senescência prematura por foto-oxidação, em folhas aclimatadas ao sol. Ao final do experimento, foram determinadas as características fotossintéticas e anatômicas da folha. A exposição à alta irradiância causou, logo após a transferência, forte fotoinibição e foto-oxidação parcial da folhagem, mas não provocou a morte da planta. Folhas produzidas no ambiente ensolarado apresentaram valores de Fv/Fm similares aos do controle. A fotossíntese saturada por luz e a fotossíntese saturada por CO2 foram 90 e 50% maiores em plantas aclimatadas à alta irradiância. A velocidade máxima de carboxilação da rubisco e a taxa máxima de regeneração da ribulose bisfosfato seguiram a mesma tendência. Folhas produzidas ao sol apresentaram maior densidade estomática e maior espessura foliar. A produção de folhas novas é a principal estratégia de aclimatação da acariquara à alta irradiância.

Termos para indexação:Minquartia guianensis, características da folha, características fotossintéticas, fluorescência da clorofila, fotoinibição.

ABSTRACT

The aim of this work was to determine the physiological changes that occur in manwood (Minquartia guianensis) during the acclimation process to high irradiance, and also to determine the acclimation strategy of this species. Plants kept in low light were transferred to high irradiance for 290 days. During this period the ratio between variable fluorescence and maximum fluorescence (Fv/Fm) was measured in leaves developed in the shade, and after premature senescence due to photooxidation, in sun-acclimated leaves. At the end of the experimental period the anatomic and photosynthetic characteristics of leaves were determined. Exposure to high irradiance caused, just after transferring, strong photoinhibition and partial photooxidation, but did not cause plant death. Leaves produced in sunny environment showed Fv/Fm similar to that of control plants. Light-saturated photosynthesis and CO2 saturated-photosynthesis were 90 and 50% higher in plants acclimated to high irradiance. The maximum carboxylation velocity of rubisco and the maximum rate of ribulose bisphosphate regeneration followed the same trend. Leaves produced under sunlight had higher stomatal density and increased leaf thickness. The production of new leaves is the main acclimation strategy to high irradiance in manwood.

Index terms:Minquartia guianensis, leaf traits, photosynthetic characteristics, chlorophyll fluorescence, photoinhibition.

Introdução

A luz é o fator limitante mais importante no crescimento de árvores da floresta tropical na fase juvenil (arvoretas), o que torna as aberturas do dossel e as clareiras essenciais para o crescimento e a sobrevivência de arvoretas e, consequentemente, para a dinâmica da floresta. No entanto, o aumento súbito da irradiância durante a formação de aberturas e clareiras pode induzir a fotoinibição da fotossíntese em plantas aclimatadas ao sub-bosque (Houter & Pons, 2005) e, em casos extremos, resultar na foto-oxidação do tecido foliar.

De acordo com a forma com que respondem a alterações na irradiância, as plantas podem ser classificadas em plantas de sol e plantas de sombra (Björkman, 1981). Arvoretas de espécies tolerantes ao sol (pioneiras) e tolerantes à sombra (clímax) normalmente reagem de forma diferente às alterações no ambiente luminoso (Oguchi et al., 2005). Espécies do mesmo grupo sucessional e até ecótipos da mesma espécie não reagem de igual forma às alterações na irradiância do entorno (Lovelock et al., 1994). Plantas desenvolvidas exclusivamente à sombra têm capacidade limitada para aumentar as taxas de fotossíntese em ambientes de alta irradiância devido à incapacidade de aumentar a atividade da rubisco, enquanto em plantas desenvolvidas ao sol ocorre o contrário. Os fatores que limitam a fotossíntese variam de acordo com o regime de luz no ambiente de crescimento. Plantas desenvolvidas à sombra investem mais em complexos coletores de luz e plantas desenvolvidas ao sol, em proteínas do ciclo de Calvin e do transporte de elétrons (Laisk et al., 2005). Dessa forma, variações no regime luminoso durante o crescimento normalmente levam a diferenças nas taxas de fotossíntese (A), em razão das diferenças na velocidade máxima de carboxilação da rubisco (Vc-máx.) e na taxa máxima de regeneração da ribulose bisfosfato, RuBP, (Jmáx.), dependente do transporte de elétrons, bem como das diferenças nas taxas de difusão de CO2 para os cloroplastos (Björkman, 1981). Segundo Farquhar et al. (1980), o valor de A representa o valor mínimo de dois fatores limitantes: a atividade da rubisco (Ac) e a taxa de regeneração da RuBP (Aj). Isto é, A = min {Ac, Aj} - Rd, em que Rd indica a taxa de respiração da folha na presença de luz.

A resposta da fotossíntese à irradiância é comumente descrita por uma hipérbole não retangular que inclui os parâmetros teta (Θ) e fi (Φ), em que Θ representa a convexidade da curva e Φ, o rendimento quântico máximo (Ogren, 1993). Em condições naturais, a taxa de fotossíntese é geralmente limitada pela luz, por isso Φ e Θ são parâmetros importantes. Em plantas C3 em concentração de CO2 ambiente, Φ é uma função dessa concentração nos espaços intercelulares (Ci) e pode ser diminuído pela alta irradiância devido à fotoinibição. Em alta irradiância, as folhas absorvem mais energia radiante que a capacidade de processamento do aparato fotossintético, e o excesso de energia radiante pode levar à fotoinibição da fotossíntese, ou seja, à redução nos valores de Φ (Choudhury & Behera, 2001; Demmig-Adams & Adams, 2006). Como há uma relação linear entre Φ e Fv/Fm, em que Fv indica a fluorescência variável e Fm a fluorecência máxima (a diferença entre Fm e a F inicial, Fo) (Genty et al., 1989), essa relação é comumente utilizada como estimativa da fotoinibição. Além da irradiância excessiva, o estresse hídrico e aumentos na temperatura (aumento na fotorrespiração) também podem levar a decréscimos em Φ. No grupo de plantas tolerantes à sombra, como a acariquara (Minquartia guianensis Aubl.), as estratégias de aclimatação à alta irradiância variam entre espécies e até entre ecótipos de uma mesma espécie (Björkman, 1981).

A acariquara é uma árvore de dossel (cresce cerca de 30 m de altura), possui madeira com coloração marrom-escura, dura, pesada e muito durável. Seu tronco é bastante irregular e sua madeira, muito resistente ao apodrecimento e a ataques de cupins, é muito usada na indústria, na fabricação de pisos e forros. A acariquara cresce bem em florestas de várzea com precipitação anual de 2.000 a 4.000 mm, e suas sementes não regeneram em campos abertos, o que a torna uma espécie tolerante à sombra e que pode ser classificada como espécie do estádio tardio de sucessão.

No presente trabalho, partiu-se da premissa de que folhas de mudas de acariquara desenvolvidas à sombra apresentam alta plasticidade fisiológica, de modo que continuam a manter taxas similares de fotossíntese após a transferência para alta irradiância sem mostrar perda significativa de folhas.

O objetivo deste trabalho foi determinar as mudanças fisiológicas que ocorrem em acariquara (M. guianensis) durante o processo de aclimatação à alta irradiância, bem como a estratégia de aclimatação dessa espécie.

Material e Métodos

O presente estudo foi realizado no campus V-8 do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) em Manaus, AM, (03º05'30"S, 59º59'35"W, altitude de 51 m) entre setembro de 2007 e julho de 2008. Foram utilizadas mudas de acariquara (M. guianensis) de aproximadamente um ano de idade e 12 cm de altura, produzidas a partir de sementes e cultivadas em vasos de plástico (4 L) em substrato formado por uma mistura de terra compostada (90%), areia (7%) e vermiculita (3%). O substrato foi adubado (5 g kg-1) com um fertilizante de liberação lenta (Basacote). As mudas foram mantidas em baixa irradiância (0,30 mol m-2 dia-1 ) até o início do experimento.

Os tratamentos foram constituídos por um grupo de dez plantas expostas durante 290 dias à alta irradiância (céu aberto). O controle foi constituído por outro grupo de plantas (dez mudas) mantidas sob a sombra de árvores adultas e debaixo de um telado, para aumentar o sombreamento para níveis de irradiância comparáveis aos encontrados no ambiente natural (Marenco & Vieira, 2005). A irradiância (Q) recebida pelas plantas em aclimatação durante o experimento foi de 21,45 mol m-2 dia-1 , com amplitude de 8,0 a 35,1 mol m-2 dia-1 e picos de irradiância de 1.000 a 1.200 µmol m-2 s-1. No controle, a irradiância foi de 0,30 mol m-2 dia-1 , com amplitude de 0,10 a 0,5 mol m-2 dia-1 . Durante o dia, a temperatura e a umidade do ar foram de 26 a 30°C e de 72 a 96%, respectivamente, no controle e de 26 a 32°C e de 50 a 91% no tratamento em alta irradiância.

A densidade de fluxo de fótons (Q) foi medida utilizando um sensor quântico (LI-191SA, Li-Cor, Lincoln, Nebraska, EUA) conectado a um coletor de dados (LI-1000, Li-Cor). Os valores de Q foram coletados em intervalos de 15 minutos durante o período experimental. A umidade e a temperatura do ar foram medidas com um termo-higrômetro digital (Incoterm, Brasil) em dias selecionados ao acaso, em intervalos de 30 min.

A fluorescência da clorofila foi mensurada em intervalos de dois a três dias desde o início até o final do experimento (totalizando 119 dias amostrados) para determinar o efeito da alta irradiância na fotoinibição da fotossíntese (inferida pela relação Fv/Fm). Durante o período de aclimatação, as folhas que sofreram foto-oxidação (morte do tecido) ou experimentaram senescência foram substituídas por folhas expandidas produzidas no novo regime de luz (após duas a três semanas do início do experimento, dependendo do grau de desenvolvimento da folha por ocasião da transferência ao ambiente aberto).

A fluorescência da clorofila foi mensurada logo ao amanhecer com um fluorômetro (PEA, MK2, 9600, Hansatech, UK) após 15 min de adaptação ao escuro. Foram mensuradas a fluorescência inicial (Fo) e máxima (Fm) e a eficiência quântica máxima do fotossistema (relação Fv/Fm).

Ao final do período de aclimatação, foram medidas as trocas gasosas, o teor de clorofila, a espessura da folha, a densidade estomática, o comprimento das células-guarda e a área foliar específica (AFE, relação entre área e massa foliar). Também foram determinados a altura da planta e o diâmetro do caule a 5 cm do coleto das plantas. As trocas gasosas foram determinadas em quatro plantas com duas folhas completamente expandidas e bom estado fitossanitário, por tratamento. Foi utilizado um medidor de fotossíntese (LI-6400, Li-Cor) com controle independente de luz (Li-6400-02B) e de CO2 (6400-01). A resposta da fotossíntese à irradiância [curva A(Q)] e à concentração intracelular de CO2(Ci)i [curva A(Ci)] foi gerada conforme descrito previamente (Marenco et al., 2001). Os dados de trocas gasosas foram obtidos quando o coeficiente de variação total foi menor que 0,7% (Long & Bernacchi, 2003). A partir da curva A(Q), foram determinados a fotossíntese saturada por luz (Amáx.), Φ, Θ e a irradiância de compensação (Ic). Dados da curva A(Ci) foram utilizados para determinar fotossíntese saturada por luz e por CO2 (Apot.), Vc-máx., Jmáx. e o ponto de compensação de CO2 (Γ). Os valores de Amáx. e Apot. foram determinados em luz saturante - 1.000 µmol m-2 s-1 e concentração CO2 de 380 (Amáx.) ou 2.000 µmol mol-1 (Apot.). Durante as medições, a umidade relativa do ar, o deficit de pressão de vapor (DPV) e a temperatura oscilaram conforme as condições do ambiente; a temperatura do ar oscilou entre 29 e 30°C e o DPV, entre 1,10 e 2,17 kPa.

Os dados de A(Q) foram ajustados com o modelo da hipérbole não retangular [ΘAg2 - (ΦQ + Agmáx.)Ag + ΦQAgmáx. = 0] (equação 1). Nesta equação, Ag representa a fotossíntese bruta (Ag = A + Rd). A equação 1 é uma quadrática de segunda ordem da forma y = ax2 + bx + c = 0, que pode ser resolvida para x = [-b ± (b2 - 4ac)0,5]/2a (equação 2). Os coeficientes a, b e c da equação 2 representam: teta (Θ), (ΦQ + Agmáx.) e ΦQAgmáx., respectivamente. Substituindo-os na equação 2, tem-se:

A = {[(ΦQ + Amáx. + Rd) - ((ΦQ + Amáx. + Rd)2 - 4ΦQΘ(Amáx. + Rd))0,5]/2Θ} - Rd (equação 3).

As taxas de fotossíntese em função da atividade da rubisco (Ac) e da taxa de transporte de elétrons (Aj) foram estimadas de acordo com as equações a seguir (Farquhar et al., 1980): Ac = [Vc-máx. (Ci - Γ*)]/[Ci + Kc(1 + O/Ko )] (equação 4) e Aj = [Jmáx. (Ci - Γ*)]/([4C i + 8Γ*)] (equação/ 5), em que Γ* é o ponto de compensação de CO2 na ausência de respiração e na presença de luz; Kc/ e/ Ko representam as constantes de Michaelis-Mentem da rubisco para CO2 e O2, respectivamente, e O representa a concentração de oxigênio nos espaços intercelulares. Γ* = 36,9 + 1,88(T - 25) + 0,036(T - 25) 2 (equação 6), em que T é a temperatura em graus Celsius. Os valores de Vc-máx. e Jmáx. foram normalizados a 25°C com uso das equações descritas por Medlyn et al. (1999).

O teor de clorofila foi determinado após a extração dos pigmentos cloroplastídicos em acetona 80%, conforme descrito anteriormente (Jesus & Marenco, 2008). A espessura foliar foi medida, evitando-se as nervuras principais, com um paquímetro digital em folhas frescas e após secagem a 72ºC em estufa, até atingirem massa constante. A densidade estomática foi determinada em quatro folhas por planta e dez plantas por tratamento (aclimatadas e controle), com uso de impressões da superfície foliar obtidas com esmalte incolor. A contagem de estômatos foi feita com microscópio em magnificação de 400x e o comprimento das células-guarda (CG) foi mensurado a 1.000x. Os dados dos parâmetros estudados foram submetidos à análise de variância (ANOVA). O programa SAEG 9.0 da Universidade Federal de Viçosa foi utilizado para ajustar os parâmetros (Θ e Amáx.) da curva A(Q). O valor de Φ foi determinado pela análise de regressão com as irradiâncias inferiores a 60 µmol m-2 s-1 . O efeito do período de aclimatação na fluorescência foi analisado por meio do teste t para observações pareadas (controle e alta irradiância com 118 gl).

Resultados e Discussão

A partir do primeiro dia de exposição ao sol, as folhas apresentaram forte fotoinibição, que evoluiu para foto-oxidação nas folhas superiores da planta. A foto-oxidação manifestou-se como manchas cloróticas que evoluíram para manchas necróticas em cinco a seis dias após o início do tratamento (Figura 1), seguida de abscisão das folhas que apresentaram áreas necróticas muito extensas, superiores a 50% da área foliar. Assim, cerca de 30% das folhas presentes antes do tratamento colapsaram até o final da segunda semana no tratamento com alta luminosidade (Figura 1 E). Contudo, algumas folhas do terço inferior permaneceram na planta durante a maior parte do experimento. Embora a irradiância intensa tenha causado foto-oxidação em boa parte da folhagem desenvolvida à sombra, a mortalidade em plantas aclimatadas à luz solar plena foi nula.



No grupo de plantas tolerantes à sombra, as estratégias de aclimatação à alta irradiância variam entre espécies. Após a transferência à alta irradiância, Hybanthus prunifolius sofre fotoinibição severa e perda quase total das folhas desenvolvidas à sombra. Já em Ouratea lucens, a transferência à alta irradiância causa apenas fotoinibição moderada e retém a maioria das folhas produzidas em baixa irradiância (Kursar & Coley, 1999). Em algumas espécies, a aclimatação à alta irradiância pode ocorrer na própria folha (Oguchi et al., 2005). Porém, em outras espécies, a produção de novas folhas com morfologia e fisiologia adequadas ao novo ambiente é a principal estratégia do processo de aclimatação (Kursar & Coley, 1999), o que parece ser o caso de acariquara.

A transferência das mudas desenvolvidas à sombra para a alta irradiância causou efeito significativo nos valores da fluorescência (p<0,01, Figura 2). A flurescência inicial (Fo) aumentou nas primeiras semanas à proporção que folhas presentes na planta experimentavam fotoinibição (baixa relação Fv/Fm). Posteriormente, a Fo declinou de forma gradual até o final do quarto mês do início do experimento, aproximando-se dos valores do controle (Figura 2/ A). Nas plantas expostas à alta irradiância houve rápido decréscimo nos valores de fluorescência máxima (Fm), seguido de aumento gradativo até atingir, aos 30 dias, os mesmos valores observados ao final do período de aclimatação; porém, sem atingir os valores do controle (Figura 2 B). Os valores de Fv/Fm apresentaram variação similar aos observados para Fm. Isto é, houve uma redução brusca nos primeiros três dias de exposição à alta irradiância (Figura 2 C), seguida de recuperação gradual até atingir valores máximos após quatro meses do início do processo de aclimatação. Em alta irradiância, os valores Fv/Fm atingiram 93% dos valores observados no controle.




O aumento observado em Fo após exposição à luz solar intensa é consistente com resultados encontrados por outros autores (Dias & Marenco, 2006). Como a proteína D1 do fotossistema II (FSII) é o principal alvo da fotoinibição (Long et al., 1994), a exposição à alta irradiância de plantas desenvolvidas à sombra pode induzir um aumento de Fo, em razão do bloqueio da transferência de elétrons da plastoquinona A para a plastoquinona B, como resultado da inativação parcial da população do FSII (Gilmore et al., 1996). O declínio de Fo depois da segunda semana nas plantas expostas ao sol indica recuperação da fotoinibição, pois nesse mesmo período observou-se também aumento nos valores de Fv/Fm. A redução de Fm pode ser atribuída à dissipação não fotoquímica, via ciclo da xantofila, no qual a violaxantina é convertida em zeaxantina (Demmig-Adams & Adams, 2006), bem como a inativação de uma fração dos fotossistemas 2 (FSII) que, quando inativos, contribuem para a dissipação de energia na forma de calor, mas não para a dissipação fotoquímica da energia radiante (Lee et al., 2001). A queda brusca nos valores de Fv/Fm logo após transferência para luz solar plena é coerente com o fato de plantas desenvolvidas à sombra serem mais sensíveis à fotoinibição que plantas adaptadas a ambientes ensolarados (Kitao et al., 2000).

A Amáx. das plantas aclimatadas aumentou em 90% em comparação ao controle (Tabela 1). De forma similar, a condutância estomática (gs) (medida em CO2 ambiente) e a Rd foram também maiores em folhas aclimatadas ao sol. Ao contrário, o Θ e o teor de clorofila foram menores em plantas aclimatadas à alta luminosidade em comparação com o controle. Porém, não houve efeito significativo (p >0,05) entre os tratamentos (sol e sombra) nos valores " e Φ. Os valores de Amáx. e Φ observados em plantas aclimatadas à luz solar plena estão dentro da faixa de valores encontrados em outras espécies da sucessão tardia, tais como Hydrophyllum virginianum, Quercus rubra e Aesculus glabra (Bazzaz & Carlson, 1982). Marenco & Vieira (2005) também encontraram valores de Amáx., Φ e Θ similares aos relatados no presente trabalho. Entretanto, os valores de Φ relatados no presente trabalho são menores que os valores máximos potenciais (em torno de 0,08) observados em plantas C3 em baixa concentração de O2 ou alto Ci (Björkman, 1981). Essa discrepância deve-se ao fato de Φ ter sido determinado em concentrações ambiente de CO2 e O2 no presente trabalho. A condutância estomática (gs) pode influenciar Φ por meio de seu efeito em Ci, (Björkman, 1981); porém, isso não foi observado, pois embora gs tenha variado de 0,03 a 0,07 mol m-2 s-1 , essa variação não influenciou Φ (Tabela 1).

Na alta irradiância, a transição da fotossíntese de limitada por Ac para limitada por Aj ocorreu em Ci de 652 µmol mol-1, valor maior que o do controle, de 543 µmol mol-1 (Figura 3). A diminuição nos valores de Θ no controle é indicação de menor investimento em proteínas da rubisco. Isso porque, quando esse investimento é reduzido, a transição de fotossíntese limitada por Ac para limitada por Aj ocorre mais rápido e o formato final da curva é mais truncado. Provavelmente, por isso os valores de Θ tendem a aumentar (transição pausada de Ac para Aj) à proporção que plantas se aclimatam à alta irradiância (Ogren, 1993). Independentemente do tratamento de aclimatação à alta irradiância, o fator limitante da fotossíntese foi a velocidade de carboxilação da rubisco, o que está de acordo com os resultados de Sage & Kubien (2007), que mostram que, exceto em temperaturas muito altas, a fotossíntese é mais comumente limitada pela atividade da rubisco.


A maior irradiância de compensação (Rd/Φ) em plantas aclimatadas ao aberto é resultado de uma maior taxa de respiração (Rd), o que é esperado para plantas desenvolvidas ao sol que apresentam um maior investimento em proteínas envolvidas no ciclo de Calvin (Björkman, 1981).

A aclimatação à luz teve um efeito positivo em Apot., Vc-máx. e Jmáx.. Os valores de Vc-máx. e Jmáx. foram 37 e 50% maiores em alta irradiância que no controle (Tabela 1). Os valores de Vc-máx. e Jmáx. observados no presente trabalho estão dentro da faixa dos valores relatados por Wullschleger (1993). Aumentos em Apot., Vc-máx. e Jmáx. em resposta à aclimatação à luz solar plena indica maior investimento em proteínas associadas à rubisco (Hikosaka & Terashima, 1995) em detrimento do conteúdo proteico associado com os complexos coletores de luz, o que, por sua vez, explica a redução no teor de clorofila nas plantas aclimatadas à alta irradiância, em comparação ao controle não aclimatado.

A espessura da folha aumentou entre 50 (na base da folha fresca) e 100% (folha seca) nas plantas aclimatadas à alta irradiância, o que está de acordo com os resultados de Niinemets (1999). Porém, em Chenopodium album observou-se aumento em Amáx. sem aumento na espessura foliar (Oguchi et al., 2003). A relação clorofila a/b foi maior no ambiente com alta irradiância (Tabela 1), o que é consistente com o fato de plantas desenvolvidas ao sol investirem menos em proteínas associadas aos complexos coletores de luz (Björkman, 1981). Ao contrário, a relação entre clorofila total e carotenoides foi maior em plantas sombreadas que nas aclimatadas à alta luminosidade (Tabela 1), o que é consistente com o fato de os carotenoides terem um papel relevante na dissipação de energia na forma de calor (Demmig-Adams & Adams, 2006). Foram observados estômatos somente na superfície abaxial da folha, com densidade estomática maior em folhas aclimatadas ao ambiente ensolarado que no controle. Plantas aclimatadas à luz intensa apresentaram maior altura (160%) e diâmetro do caule (256%), porém menor AFE (60%) que as plantas do controle. Isso é uma indicação de que, embora as plantas expostas à irradiância intensa tenham sofrido estresse severo logo após a transferência para o novo ambiente, no longo prazo a aclimatação resultou em maiores ganhos de biomassa, inferidos pelo aumento em altura e diâmetro do caule.

A densidade estomática e o comprimento das CG observados no presente trabalho para acariquara estão dentro da faixa de valores relatados por Hetherington & Woodward (2003), que observaram de 50 a 900 estômatos mm-2 e comprimento de CG de 5 a 80 µm. A maior densidade estomática encontrada em folhas produzidas no ambiente ensolarado está de acordo com estudos que mostram aumento da densidade estomática proporcional ao aumento da irradiância (Voleníková & Tichá, 2001). Aparentemente, a alta densidade estomática pode aumentar o acúmulo da biomassa (Al Afas et al., 2006), provavelmente em razão do uso mais eficiente da água, uma vez que estômatos pequenos podem abrir e fechar-se mais rapidamente que estômatos maiores (Hetherington & Woodward, 2003).

Conclusões

1. As folhas de acariquara (Minquartia guianensis) desenvolvidas à sombra sofrem fotoinibição severa e, em alguns casos, até foto-oxidação. Porém, a perda prematura de folhas é compensada pela produção de folhas novas com alta capacidade fotossintética.

2. A produção de folhas novas fisiologicamente adaptadas ao novo ambiente é a principal estratégia de aclimatação à alta irradiância dessa espécie.

Agradecimentos

Ao Ministério da Ciência e Tecnologia, à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas e ao projeto CTPetro, pelo apoio financeiro; ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelas bolsas concedidas.

Recebido em 17 de fevereiro de 2009 e aprovado em 3 de julho de 2009

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Set 2009
  • Data do Fascículo
    Jul 2009

Histórico

  • Recebido
    17 Fev 2009
  • Aceito
    03 Jul 2009
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