Resumos
Os morcegos frugívoros são componentes fundamentais na manutenção e regeneração de florestas tropicais, pois ao se alimentarem, promovem a mobilidade das sementes dos frutos em que se alimentaram. Muito se discute sobre os efeitos da passagem das sementes no trato digestivo dos morcegos sobre a taxa e velocidade de germinação. O objetivo deste trabalho foi examinar a dieta das espécies de morcegos frugívoros na Estação Experimental de Itirapina para descobrir quais utilizam significativamente os frutos de Cecropia pachystachya. Foi testada a importância dos quirópteros na dispersão e germinação desta espécie de planta. Para isso, os morcegos foram capturados no período de agosto de 2005 a julho de 2006, suas fezes foram recolhidas e as sementes de C. pachystachya separadas. Os testes de germinação foram feitos para duas espécies de morcegos, Artibeus liuratus e Platyrrhinus lineatus, e suas taxas de germinação comparadas com amostras de sementes coletadas da planta (controle). Foram feitos cinco repetições com 30 sementes em cada gerbox para cada teste. Os testes foram realizados em câmaras germinadoras " Mangelsdorf" , com temperatura de 25°C, luminosidade e umidade constante por 40 dias. Houve uma alta porcentagem de germinação das sementes encontradas em A. lituratus (79,3%) e não diferiu estatisticamente das sementes controle (76%). Esses resultados foram superiores a P. lineatus (52%). Em relação ao Índice de Velocidade de Germinação (IVG), esse resultado foi semelhante, sendo 2,73 para A. lituratus, 2,66 para o controle e 1,80 para P. lineatus. Com esse resultado, tem-se que a passagem das sementes de C. pachystachya pelos morcegos não aumentou a porcentagem, nem a velocidade de germinação delas, quando comparado com o controle, sendo até menor para P. lineatus. Com os resultados obtidos, conclui-se que, o efeito da passagem do trato digestivo dos morcegos na germinação pode sofrer influências que ainda precisam ser estudadas, mas não há como negar o beneficio da dispersão das sementes de C. pachystachya promovida por quatro espécies de morcegos no local estudado.
Chiroptera; frugivoria; Phyllostomidae; Cecropia pachystachya; Brasil
Frugivorous bats are fundamental components in the maintenance and regeneration of tropical forests since they promote the mobility of the fruit seeds. There are controversies about the effects of the seed passage through the bat gut in the germination tax and speed. The goal of this work was to investigate the diet of frugivorous bat species at Estação Experimental de Itirapina to find out which species significantly use the fruits of the pioneer plants species Cecropia pachystachya. It was tested the importance of bats on the spread and germination of seeds from this plant species. For that, the bats were captured in the period from August 2005 to July 2006, their feces were collected and the seeds of C. pachystachya separated. The germination tests were made for two bat species, Artibeus liuratus and Platyrrhinus lineatus, and were compared with seeds collected directly from the plant (control). Five repetitions were made with 30 seeds in each gerbox for each test. The tests were conducted in " Mangelsdorf" germinators chambers, with temperature of 25°C, luminosity and constant humidity for 40 days. There was a high germination percentage of the seeds found in A. lituratus (79,3%), and it did not differ statistically from the seeds control (76%). These results were superior from P. lineatus (52%). Regarding the Germination Speed Index (IVG), the results were similar, being 2,73 for A. lituratus, 2,66 for the control seeds and 1,80 for P. lineatus. It was concluded that the passage of the seeds of C. pachystachya through the bats gut did not increase the percentage or the speed of germination, when compared with the control seeds, being smaller for P. lineatus. With the results obtained, it was concluded that the effects of the bats’ gut passage in the germination still needs further studies but the benefits of seed dispersion of C. pachystachya promoted by four bat species in the studied place cannot be refused.
Chiroptera; frugivory; Phyllostomidae; Cecropia pachystachya; Brazil
Frugivoria de morcegos (Mammalia, Chiroptera) em Cecropia pachystachya (Urticaceae) e seus efeitos na germinação das sementes
Therys Midori SatoI; Fernando de Camargo PassosII; Antonio Carlos NogueiraIII
IPós-graduação em Zoologia, Universidade Federal do Paraná. E-mail: therysbio@yahoo.com.br
IIDepartamento de Zoologia, Universidade Federal do Paraná. E-mail: fpassos@ufpr.br
IIIDepartamento de Ciências Florestais e da Madeira, Universidade Federal do Paraná. E-mail: nogueira@ufpr.br
RESUMO
Os morcegos frugívoros são componentes fundamentais na manutenção e regeneração de florestas tropicais, pois ao se alimentarem, promovem a mobilidade das sementes dos frutos em que se alimentaram. Muito se discute sobre os efeitos da passagem das sementes no trato digestivo dos morcegos sobre a taxa e velocidade de germinação. O objetivo deste trabalho foi examinar a dieta das espécies de morcegos frugívoros na Estação Experimental de Itirapina para descobrir quais utilizam significativamente os frutos de Cecropia pachystachya. Foi testada a importância dos quirópteros na dispersão e germinação desta espécie de planta. Para isso, os morcegos foram capturados no período de agosto de 2005 a julho de 2006, suas fezes foram recolhidas e as sementes de C. pachystachya separadas. Os testes de germinação foram feitos para duas espécies de morcegos, Artibeus liuratus e Platyrrhinus lineatus, e suas taxas de germinação comparadas com amostras de sementes coletadas da planta (controle). Foram feitos cinco repetições com 30 sementes em cada gerbox para cada teste. Os testes foram realizados em câmaras germinadoras " Mangelsdorf" , com temperatura de 25°C, luminosidade e umidade constante por 40 dias. Houve uma alta porcentagem de germinação das sementes encontradas em A. lituratus (79,3%) e não diferiu estatisticamente das sementes controle (76%). Esses resultados foram superiores a P. lineatus (52%). Em relação ao Índice de Velocidade de Germinação (IVG), esse resultado foi semelhante, sendo 2,73 para A. lituratus, 2,66 para o controle e 1,80 para P. lineatus. Com esse resultado, tem-se que a passagem das sementes de C. pachystachya pelos morcegos não aumentou a porcentagem, nem a velocidade de germinação delas, quando comparado com o controle, sendo até menor para P. lineatus. Com os resultados obtidos, conclui-se que, o efeito da passagem do trato digestivo dos morcegos na germinação pode sofrer influências que ainda precisam ser estudadas, mas não há como negar o beneficio da dispersão das sementes de C. pachystachya promovida por quatro espécies de morcegos no local estudado.
Palavras-chave: Chiroptera, frugivoria, Phyllostomidae, Cecropia pachystachya, Brasil.
ABSTRACT
Frugivorous bats are fundamental components in the maintenance and regeneration of tropical forests since they promote the mobility of the fruit seeds. There are controversies about the effects of the seed passage through the bat gut in the germination tax and speed. The goal of this work was to investigate the diet of frugivorous bat species at Estação Experimental de Itirapina to find out which species significantly use the fruits of the pioneer plants species Cecropia pachystachya. It was tested the importance of bats on the spread and germination of seeds from this plant species. For that, the bats were captured in the period from August 2005 to July 2006, their feces were collected and the seeds of C. pachystachya separated. The germination tests were made for two bat species, Artibeus liuratus and Platyrrhinus lineatus, and were compared with seeds collected directly from the plant (control). Five repetitions were made with 30 seeds in each gerbox for each test. The tests were conducted in " Mangelsdorf" germinators chambers, with temperature of 25°C, luminosity and constant humidity for 40 days. There was a high germination percentage of the seeds found in A. lituratus (79,3%), and it did not differ statistically from the seeds control (76%). These results were superior from P. lineatus (52%). Regarding the Germination Speed Index (IVG), the results were similar, being 2,73 for A. lituratus, 2,66 for the control seeds and 1,80 for P. lineatus. It was concluded that the passage of the seeds of C. pachystachya through the bats gut did not increase the percentage or the speed of germination, when compared with the control seeds, being smaller for P. lineatus. With the results obtained, it was concluded that the effects of the bats gut passage in the germination still needs further studies but the benefits of seed dispersion of C. pachystachya promoted by four bat species in the studied place cannot be refused.
Keywords: Chiroptera, frugivory, Phyllostomidae, Cecropia pachystachya, Brazil.
INTRODUÇÃO
A frugivoria é muito difundida entre mamíferos e aves, pois consomem mais de 75% das espécies de frutos de árvores tropicais (Howe & Smallwood, 1982). Ao se alimentarem, esses animais podem dispersar as sementes dos frutos consumidos. Entre os mamíferos, os morcegos se destacam por serem os dispersores mais importantes (Fleming & Heithaus, 1981; Gorchov et al. 1993; Fleming & Sosa, 1994), podendo carregar sementes até 10 km (Phyllostomidae) ou até 50 km (Pteropodidae) (Morrison, 1978; Fleming, 1993).
Segundo Gardner (1977), os morcegos podem dispersar sementes de pelo menos 96 gêneros e 49 famílias de plantas na região Neotropical. Eles podem dispersar centenas de sementes por noite (Fleming & Sosa, 1994) e milhares em um período de frutificação. Diversos estudos demonstram a importância de morcegos frugívoros na regeneração de ecossistemas florestais (Charles-Dominique, 1986; Whittaker & Jones, 1994; Medellín & Gaona, 1999), por incluírem em sua dieta, frutos de espécies de plantas pioneiras. Galindo-González (1998) comenta que morcegos da subfamília Stenodermatinae são essenciais para uma rápida sucessão secundária em áreas abertas desmatadas.
Cecropia Miq. (Urticaceae) é um dos gêneros característicos da região Neotropical (Berg, 1978) e inclui árvores de crescimento rápido muito comuns em vegetações secundárias. Numa localidade onde a vegetação está passando por um processo de sucessão, as espécies de Cecropia podem ser as mais comuns (Charles-Dominique, 1986, Medellín & Gaona, 1999). Uma de suas características é a necessidade de taxa elevada de luminosidade para germinar (Godoi & Takaki, 2005). Em muitas florestas tropicais primárias ou secundárias, as suas sementes costumam ser a maioria no solo entre as sementes encontradas (Whitmore, 1983; Lobova et al., 2003).
Um total de 93% das espécies de Cecropia são zoocóricas (Prevost, 1983). Doze gêneros e 32 espécies de morcegos utilizam quinze espécies de Cecropia como alimento (Lobova et al., 2003), sendo que nove pertencem ao gênero Artibeus.
Na região Sudeste do Brasil, existem três espécies de Cecropia: C. pachystachya Trec., C. hololeuca Miq. e C. glaziovii Snethl. (Berg, 1996). A primeira possui a maior distribuição geográfica e Artibeus lituratus, Glossophaga soricina, Carollia perspicillata, Platyrrhinus lineatus e Sturnira lilium já foram listadas como consumidoras de suas infrutescências (Fleming & Williams, 1990). Vários estudos têm demonstrado que a luz é o fator determinante de quebra de dormência de sementes de C. pachystachya (Souza & Válio, 2001).
Galindo-González (1998) aponta alguns fatores a serem analisados para identificar os morcegos como efetivos dispersores e recolonizadores de vegetação das florestas. Entre esses fatores estão os tempos de trânsito intestinal das sementes e efeito da digestão sobre a germinação das sementes.
Na literatura, há controvérsias sobre a conseqüência da passagem da semente pelo trato digestivo de alguns animais. Os resultados com morcegos se dividem em efeitos positivos, ou seja, incremento na taxa e/ou porcentagem de germinação das sementes (Estrada et al., 1984, Fleming, 1988; Figueiredo & Perin, 1995; Lopez & Vaughan, 2004), negativos (Lieberman & Lieberman, 1986), com diminuição na taxa de germinação, e efeito neutro (Izhaki et al., 1995), quando as sementes retiradas diretamente da planta apresentam a mesma taxa e/ou porcentagem de germinação do que as defecadas pelos morcegos (Lopez & Vaughan, 2004).
O objetivo deste trabalho foi examinar a dieta das espécies de morcegos frugívoros na Estação Experimental de Itirapina para descobrir quais utilizam significativamente os frutos de Cecropia pachystachya. Foi testada a importância dos quirópteros na germinação de sementes desta espécie de planta.
MATERIAL E MÉTODOS
A Estação Experimental de Itirapina pertence ao Instituto Florestal do Estado de São Paulo e está localizada no município de Itirapina, Sudeste do Brasil (22°15S 47°49W). Trata-se de uma área originalmente de Cerrado, na qual apresenta plantio de Pinus spp., Eucalyptus spp., além de outras espécies exóticas e nativas. No local existem algumas plantas frutíferas que fornecem alimento para os morcegos e outros animais, como Cecropia pachystachya.
Os morcegos foram capturados com redes-de-neblina instaladas em rotas de vôo para algumas espécies ou próximas de plantas frutíferas. O detalhamento desta metodologia encontra-se em Sato (2007). As sessões de captura ocorreram entre agosto de 2005 e julho de 2006, mensalmente, exceto em abril de 2006. As fases de campo tiveram duração de uma a cinco noites por mês, e as redes ficaram dispostas de cinco a seis horas por noite. No solo, abaixo da rede, foram dispostas folhas de plásticos transparentes (3 x 1 m) para coletar as amostras fecais dos morcegos que defecassem enquanto estivessem na rede ou sendo manuseados, e frutos ou pedaços destes que viessem carregados por eles.
Os morcegos capturados e identificados foram acondicionados em sacos de algodão por algumas horas, até o momento em que já houvesse ocorrido sua digestão e eliminação das fezes. Em seguida, as amostras fecais foram individualizadas em tubos de plástico ou envelopes de papel vegetal para serem examinadas posteriormente. A dieta dos morcegos frugívoros foi examinada com base nas sementes encontradas nas amostras.
Para realizar os testes de germinação foram utilizadas as sementes de C. pachystachya coletadas nas amostras fecais dos morcegos e diretamente das infrutescências. As sementes foram conservadas em local seco e escuro à temperatura ambiente. As espécies de morcegos com amostras fecais selecionadas para o teste de germinação foram A. lituratus e P. lineatus, que apresentaram a maior quantidade de amostras e capturas. Portanto, as sementes foram divididas nos tratamentos: as consumidas por A. lituratus, por P. lineatus e controle (não consumidas).
Em laboratório, as sementes foram inicialmente lavadas com água destilada. Foram escolhidas ao acaso 150 sementes de cada tratamento e divididas em cinco caixas de germinação " gerbox" com 30 sementes cada, totalizando 30 " gerbox" . Os " gerbox" foram esterelizados e forrados com três folhas de papel filtro umedecidas com água destilada. Para desinfestação, as sementes foram imersas em hipoclorito de sódio a 1% por um minuto e posteriormente lavadas em água destilada. O uso da água sanitária foi empregado para eliminar a ação de fungos que costumam ocorrer no ambiente em que as sementes ficam expostas. Contudo, alguns elementos benéficos para a germinação podem também ser eliminados com essa prática. Como a quantidade de material (número de sementes) era restrito por se tratar de amostras fecais, adotou-se o uso do água sanitária para garantir que não fossem perdidas muitas sementes devido ao ataque de fungos.
O experimento foi conduzido em germinadores do tipo Mangelsdorf no Laboratório de Sementes Florestais do Departamento de Ciências Florestais da Universidade Federal do Paraná. A luz foi contínua e a temperatura do germinador mantida a 25°C. O número de sementes germinadas foi registrado diariamente até o fim do experimento. O encerramento do experimento foi estabelecido quando passado uma semana sem nenhuma semente germinada. As sementes foram consideradas germinadas quando apresentaram a emissão de no mínimo 2 mm de radícula (Lima e Borges & Rena, 1993).
As porcentagens finais de germinação e o Índice de Velocidade de Germinação (IVG) foram submetidos à análise de variância. Foi utilizado o teste de Tukey, com nível de significância 5% para comparar as médias quando " F" foi significante.
No cálculo do índice de velocidade de germinação (IVG) foi empregada a seguinte fórmula de Maguire (1962):
onde:
RESULTADOS
Foram capturados 403 indivíduos de 12 espécies de morcegos durante o período de estudo na Estação Experimental de Itirapina (Sato, 2007). Sete destas espécies são consideradas principalmente frugívoras, que são: Artibeus lituratus, Platyrrhinus lineatus, Carollia perspicillata, Sturnira lilium, Vampyressa pusilla, Chiroderma villosum e Pygoderma bilabiatum, embora Glossophaga soricina, Phyllostomus discolor e Anoura caudifer também possam incluir frutos em sua dieta. As duas outras espécies são as insetívoras Myotis nigricans e Eptesicus brasiliensis.
As espécies A. lituratus, P. lineatus, C. perspicillata e G. soricina se alimentaram de infrutescências de C. pachystachya. As duas primeiras foram escolhidas para realizar o teste de germinação por apresentarem um maior número de amostras fecais com sementes. Em observações noturnas das plantas, A. lituratus e P. lineatus foram as que mais visitaram frutos de C. pachystachya (Sato, 2007).
As espécies que se alimentaram de infrutescências de C. pachystachya incluíram outros frutos em suas dietas (Figura 1). Cecropia pachystachya foi consumida intensamente por A. lituratus, contribuindo com 84% de sua dieta, porém também incluiu em menor proporção Piperaceae (10%), Solanaceae (4%) e Myrtaceae (2%). Muitas vezes havia fezes pastosas de A. lituratus, indicando o consumo de frutos de sementes grandes, mas esses dados não foram contabilizados. Esse tipo de fruto estava representado na Estação Experimental de Itirapina por Terminalia catappa (Combretaceae) e Mangifera indica (Anacardiaceae). Platyrrhinus lineatus também consumiu frutos de Piperaceae (20%) e Moraceae (Ficus guaranitica) (6,7%) em menor quantidade quando comparado a Urticaceae. Em relação à C. perspicillata, Urticaceae foi a família de frutos menos consumido (3,1%), e os mais consumidos foram Piperaceae (87,5%) e Solanaceae (9,3%). Mesmo considerada como nectarívora, G. soricina incluiu em sua dieta frutos de Urticaceae (66,7%) e Moraceae (33,3%).
As sementes de C. pachystachya germinaram a partir do 6º dia e encerraram a germinação no 33º dia (Figura 2). O experimento se prolongou por mais sete dias sem nenhuma germinação.
As porcentagens de germinação das sementes das fezes de A. lituratus não diferiram significativamente das sementes do tratamento controle, que por sua vez, foram maiores que as taxas de germinação das sementes das fezes de P. lineatus (Tabela 1). Os IVG também não diferiram entre A. lituratus e as sementes do tratamento controle e foram significativamente superiores as de P. lineatus.
DISCUSSÃO
Há uma abundância e regularidade na oferta de frutos ao longo do ano para os morcegos e esse fato se confirmou com o predomínio de espécies frugívoras nas capturas na Estação Experimental de Itirapina. Quatro destas espécies de morcegos utilizaram C. pachystachya em sua dieta. As espécies de morcegos relatadas se alimentando de infrutescência de C. pachystachya, como A. lituratus, P. lineatus, C. perspicillata e G. soricina, já haviam sido relatadas por outros autores em outras localidades no Brasil, como nos Estados de Santa Catarina (Sipinski & Reis, 1995), Minas Gerais (Pedro & Taddei, 1997) e no próprio Estado de São Paulo, em Campinas (Sazima, 1976) e no Parque Estadual de Intervales (Passos et al., 2003).
A presença de Cecropia spp. na maior parte da dieta de A. lituratus já foi verificada na Costa Rica (Howell & Burch, 1974; Fleming & Williams, 1990) e em outras localidades do Brasil (Galetti & Morellato,1994; Zortéa & Chiarello, 1994; Garcia et al., 2000; Passos & Graciolli, 2004). Outras espécies de Artibeus (A. fimbriatus e A. jamaicensis) também são conhecidas por consumirem Cecropia spp. em maior quantidade como no México (Orozco-Segovia & Vázquez-Yanes, 1982), Costa Rica (Fleming & Williams, 1990) e na Parque Estadual de Intervales (Passos et al., 2003).
Artibeus é uma espécie que se adapta às condições locais, à disponibilidade de recursos, e migrando quando há escassez de alimento, ou trocando seu principal item alimentar (Passos et al., 2003). Isto foi observado no presente estudo, já que A. lituratus foi mais comum na Estação Experimental de Itirapina no período em que C. pachystachya apresentou frutos. Situação semelhante foi relatada para P. lineatus (Pedro & Taddei, 2002). Orozco-Segovia & Vásquez-Yanes (1982) relataram a troca de consumo de Ficus sp. para C. obtusifolia por A. jamaicensis quando a área de mata foi transformada em pastagens. Essas mudanças podem ser definitivas ou temporárias.
A segunda espécie de morcego que mais consumiu infrutescências de C. pachystachya em sua dieta foi P. lineatus. Outros autores também encontraram essa espécie de morcego incluindo C. pachystachya como item principal de sua dieta na Costa Rica (Howell & Burch, 1974), e no Brasil, nos Estados do Paraná (Muller & Reis, 1992) e Minas Gerais (Pedro & Taddei, 1997).
Estenodermatíneos são considerados exclusivamente frugívoros, embora Willig et al., (1993) tenha relatado a inclusão de insetos ou outro tipo de alimento em sua dieta. Há relatos de nectarivoria para P. lineatus (Sazima, 1976) e A. lituratus (Heithaus et al., 1975; Sazima et al., 1994) e de P. lineatus se alimentando de insetos (Fleming, 1982).
Quando analisada a dieta de C. perspicillata, as infrutescências de Piper spp. são os itens alimentares mais consumidos por essa espécie e isso também foi relatado por Fleming (1988) e Passos et al. (2003). Há relatos dessa espécie se alimentando de C. pachystachya em outras localidades, como na Costa Rica (Fleming & Williams, 1990) e no Estado de Minas Gerais (Pedro & Taddei, 1997).
O morcego G. soricina é considerado um animal com hábitos generalistas, pois, além do néctar, inclui insetos e frutos em sua dieta (Gardner, 1977), como C. pachystachya (Pedro & Taddei, 1997). Na Estação Experimental de Itirapina essa espécie foi pouco observada visitando a planta e apenas três indivíduos foram capturados com sementes de C. pachystachya em suas fezes.
Outros autores também não encontraram diferenças na porcentagem de germinação das sementes quando passadas pelo trato digestivo de morcegos e outros animais (Vázquez-Yanes & Orozco-Segovia, 1986; Godínez-Alvarez & Valiente-Baunet, 1998). Segundo Traveset (1998), nem a porcentagem de germinação e velocidade aumentaram na maioria dos trabalhos com morcegos. Por outro lado, Lopez & Vaughan (2004) observaram um incremento na germinação das sementes em 10 de 13 espécies de plantas passadas pelo trato digestivo de morcegos. Figueiredo & Perin (1995) realizaram testes de germinação com sementes defecadas por morcegos e aves observaram que houve aumento na porcentagem de germinação apenas nos testes realizados no laboratório em relação às sementes de frutos não ingeridas. Esse aumento não aconteceu com os testes realizados diretamente no solo em ambiente natural.
O trânsito intestinal em A. lituratus e C. perspicillata ocorre entre 20 a 40 minutos (Morrison, 1980; Fleming, 1988; Charles-Dominique, 1991). Em laboratório, Charles-Dominique (1986) observou um trânsito digestivo de cinco minutos para A. lituratus, C. perspicillata e S. lilium. Por outro lado, quando esses morcegos passavam por um período de descanso, as fezes eram acumuladas no reto para serem evacuadas mais tarde. Um atraso na evacuação foi observado para as espécies A. lituratus e P. lineatus no presente estudo, em que só eram observadas fezes no saco de pano em sua manipulação no dia seguinte. Este atraso na digestão poderia modificar os resultados nos testes de germinação das sementes de C. pachystachya.
Lobova et al. (2003) discutem que as sementes que passam pelo trato digestivo de animais perdem o pericarpo que as envolvem e um pouco do tecido mucilaginoso, que no solo, servem de substrato para fungos e bactérias. Desse modo, pode-se dizer que um dos benefícios do consumo de frutos pelos animais frugívoros e a eliminação das sementes intactas, aumentam a sobrevivência dessas, e como conseqüência, a sua maior capacidade de germinação e probabilidade de estabelecimento no solo.
Os resultados obtidos aqui, ou seja, da germinação de sementes defecadas por A. lituratus e do controle estatisticamente iguais, e ambos maiores que as sementes defecadas por P. lineatus não implicam que os morcegos não sejam bons dispersores. Foram 79,3% de germinação para A. lituratus e 52% para P. lineatus. Considerando as centenas de sementes defecadas por noite pelos morcegos em locais variados, aliados à retirada da mucilagem das sementes, representa que no mínimo, metade das sementes que essas espécies ingerem, têm probabilidade de germinar. O que se conclui é que vários fatores ecológicos e fisiológicos podem estar associados nessa relação morcego-planta para C. pachystachya.
As quatro espécies de morcegos que se alimentaram de C. pachystachya exercem um papel importante na dispersão de suas sementes, seja na mobilidade associada à semente, seja pela retirada do pericarpo da semente. Vázquez-Yanes et al. (1975) observaram numa floresta do México, que os morcegos visitavam tanto vegetações primárias quanto secundárias. Isto demonstra o papel fundamental que os morcegos exercem na regeneração de florestas tropicais, na reestruturação de ecossistemas e quanto eles são imprescindíveis e necessários na conservação das florestas tropicais.
AGRADECIMENTOS
A CAPES, pela bolsa de mestrado concedida a T.M. Sato, ao CNPq pela bolsa de auxílio à pesquisa de F.C. Passos (Processo 306194/2006-6). A todas as pessoas que auxiliaram no campo e no laboratório; aos funcionários da Estação Experimental de Itirapina e ao Instituto Florestal pela permissão de trabalho. Ao Prof. Dr. Wilson Uieda, Prof. Dr. Emydgio L.A. Monteiro-Filho e Prof. Dr. James Roper pelas críticas e sugestões ao trabalho. Aos revisores anônimos pelas sugestões ao trabalho. Este estudo teve licença do IBAMA processo N° 02001.005919/2005 (048/2006-COFAN) (2005-2006).
Recebido em: 09.08.2007
Aceito em: 23.01.2008
Impresso em: 24.03.2008
- BERG, C.C. 1978. Espécies de Cecropia da Amazônia Brasileira. Acta Amazônica, 8(2):149-182.
- BERG, C.C. 1996. Cecropia (Cecropiaceae) no Brasil, ao sul da Bacia Amazônica. Albertoa, 4(16):213-221.
- CHARLES-DOMINIQUE, P. 1986. Inter-relations between frugivorous vertebrates and pioneer plants: Cecropia, birds and bats in French Guiana. In: Estrada, A. & Fleming, T.H. (Eds.), Frugivores and seed dispersal. W. Junk Publishers, Dordrecht, p.119-136.
- CHARLES-DOMINIQUE, P. 1991. Feeding strategy and activity budget of the frugivorous bat Carollia perspicillata (Chiroptera: Phyllostomidae) in French Guiana. Journal of Tropical Ecology, 7:243-256.
- ESTRADA, A.; COATES-ESTRADA, R. & VÁSQUEZ-YANES,C. 1984. Observations on fruiting and dispersers of Cecropia obtusifolia at Los Tuxtlas, Mexico. Biotropica, 16(4):315-318.
- FIGUEIREDO, R.A. & PERIN, E. 1995. Germination ecology of Fícus luschnathiana druplets after bird and bat ingestion. Acta Oecologica, 16(1):71-75.
- FLEMING, T.H.. 1982. Foraging strategies of plant-visiting bats. In: Kunz, T.H. (Ed.), Ecology of bats. Plenum Press, New York, p.287-326.
- FLEMING, T.H. 1988. The short-tailed fruit bat. University of Chicago press, Chicago.
- FLEMING, T.H. 1993. Plant-visit bats. American Scientist, 81:460-467.
- FLEMING, T.H. & HEITHAUS, E.R. 1981. Frugivorous bats, seed shadows, and the structure of the tropical forest. Biotropica, 13(Suppl.):45-53.
- FLEMING, T.H. & SOSA, V. 1994. Effects of nectarivorous and frugivorous mammals on reproductive success of plants. Journal of Mammalogy, 75(4):845-851.
- FLEMING, T.H. & WILLIAMS, C.F. 1990. Phenology, seed dispersal, and recruitment in Cecropia peltata (Moracea) in Costa Rican tropical dry forest. Journal of Tropical Ecology, 6:163-178.
- GALETTI, M. & MORELLATO, L.P.C. 1994. Diet of the large fruit-eating bat Artibeus lituratus in a forest fragment in Brasil. Mammalia, 58(4):661-665.
- GALINDO-GONZÁLEZ, J. 1998. Dispersión de semillas por murciélagos: su importancia en la conservación y regeneración del bosque tropical. Acta Zoológica Mexicana, 73:57-74.
- GARCIA, Q.S.; REZENDE, J.L.P. & AGUIAR, L.M.S. 2000. Seed dispersal by bats in a disturbed area of Southeastern Brazil. Revista de Biologia Tropical, 48(1):125-128.
- GARDNER, A.L. 1977. Feeding Habits. Special Publications of Museum Texas Tech University, 13:293-350.
- GODÍNEZ-ALVAREZ, H. & VALIENTE-BAUNET, A. 1998. Germination and early seedling growth of Tehuacan Valley cacti species: the role of soils and seed ingestion by dispersers on seedling growth. Journal of Arid Environments, 39:21-31.
- GODOI, S. & TAKAKI, M. 2005. Efeito da temperatura e a participação do fitocromo no controle de germinação de sementes de embaúba. Revista Brasileira de Sementes, 27(2):87-90.
- GORCHOV, D.L.; CORNEJO, F., ASCORRA, C. & JARAMILLO, M. 1993. The role of seed dispersal in the natural regeneration of rain forest after strip-cutting in the Peruvian Amazon. Vegetatio, 107/108:339-349.
- HEITHAUS, E.R.; FLEMING, T.H. & OPLER, P.A. 1975. Foraging patterns and resource utilization in seven bats in a seasonal tropical forest. Ecology, 56:841-854.
- HOWE, H.F. & SMALLWOOD, J. 1982. Ecology of seed dispersal. Annual Review of Ecology Systematic, 13:201-228.
- HOWELL, D.J. & BURCH, D. 1974. Food habits of some Costa Rican bats. Revista de Biologia Tropical, 21(2):281-294.
- IZHAKI, I.; KORINE, C. & ARAD, Z. 1995. The effect of bat (Rousettus aegyptiacus) dispersal on seed germination in eastern Mediterranean habitats. Oecologia, 101:335-342.
- LIEBERMAN, M. & LIEBERMAN, D. 1986. An experimental study of seed ingestion and germination in a plant-animal assemblage in Ghana. Journal of Tropical Ecology, 2:113-126.
- LIMA E BORGES, E.E. & RENA, A.B. 1993. Germinação de sementes. In: Aguiar, I.B.; Pina Rodrigues, F.C.M. & Figliola, M.B. (Eds.), Sementes Florestais Tropicais. ABRATES, Brasília, p.70-81.
- LOBOVA, T.A.; MORI, S.A.; BLANCHARD, F.; PECKHAM, H. & CHARLES-DOMINIQUE, P. 2003. Cecropia as a food resource for bats in French Guiana and the significance of fruit structure in seed dispersal and longevity. American Journal of Botany, 90(3):388-403.
- LOPEZ, J.E. & VAUGHAN, C. 2004. Observations on the role of frugivorous bats as seed dispersers in Costa Rican Secondary humid forests. Acta Chiropterologica, 6(1):111-119.
- MAGUIRE, J.D. 1962. Speed of germination-aid in selection and evaluation for seedling emergence and vigor. Crop Science, 2(1):176-177.
- MEDELLIN, R. A. & GAONA, O. 1999. Seed dispersal bats and birds in forests and disturbed habitats of Chiapas, Mexico. Biotropica, 31:478-485.
- MORRISON, D.W. 1978. Influence of habitat on the foraging distance of the fruit bats, Artibeus jamaicensis. Journal of Mammalogy, 59:622-624.
- MORRISON, D.W. 1980. Foraging and day-roosting dynamics of canopy fruit bats in Panama. Journal of Mammalogy, 61(1):20-29.
- MULLER, M.F. & DOS REIS, N.R. 1992. Partição de recursos alimentares entre quatro espécies de morcegos frugívoros (Chiroptera, Phyllostomidae). Revista Brasileira de Zoologia, 9(3/4):345-355.
- OROZCO-SEGOVIA, A. & VÁZQUEZ-YANES, C. 1982. Plants and fruit bat interactions in a tropical rain forest area, southeastern Mexico. Brenesia, 19/20:137-149.
- PASSOS, F. C. & GRACIOLLI, G. 2004. Observações da dieta de Artibeus lituratus (Olfers) (Chiroptera, Phyllostomidae) em duas áreas do sul do Brasil. Revista Brasileira de Zoologia, 21(3):487-489.
- PASSOS, F.C.; SILVA, W.R.; PEDRO, W.A. & BONIN, M.R. 2003. Frugivoria em morcegos (Mammalia, Chiroptera) no Parque Estadual Intervales, Sudeste do Brasil. Revista Brasileira de Zoologia, 20(3):511-517.
- PEDRO, W.A. & TADDEI, V.A. 1997. Taxonomic assemblages of bats from Panga Reserve, southeastern Brazil: abundance and trophic level relations in the Phyllostomatidae. Boletim do Museu de Biologia Prof. Mello-Leitão, Série Zoologia, 6:3-21.
- PEDRO, W.A. & TADDEI, V.A. 2002. Temporal distribution of five bat species (Chiroptera, Phyllostomidae) from Panga Reserve, southeastern Brazil. Revista Brasileira de Zoologia, 19(3):951-954.
- PREVOST, M.F. 1983. Lês fruits et lês graines dês espèces végètales pionnières de Guyane. Revue dEcologie, La Terre et la Vie), 38:121-145.
- SATO, T.M. 2007. Estrutura de comunidade, comportamento alimentar e frugivoria dos morcegos (MAMMALIA, CHIROPTERA) em Cecropia pachystachya (URTICACEAE) na Estação Experimental de Itirapina, SP. (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.
- SAZIMA, I. 1976. Observations on the feeding habits of phyllostomatid bats (Carollia, Anoura and Vampyrops) in southeastern Brazil. Journal of Mammalogy, 57:381-382.
- SAZIMA, I., FISCHER, W.A.; SAZIMA, M. & FISCHER, E.A. 1994. The fruit bat Artibeus lituratus as a forest and city dweller. Ciência e Cultura, 46(3):164-168.
- SIPINSKI, E.A.B. & DOS REIS, N.R. 1995. Dados ecológicos dos quirópteros da Reserva Volta Velha, Itapoá, Santa Catarina, Brasil. Revista Brasileira de Zoologia, 12(3):519-528.
- SOUZA, R.P. & VÁLIO, I.F.M. 2001. Seed size, seed germination, and seedling survival of brazilian tropical tree species differing in successional status. Biotropica, 33(3):447-457.
- TRAVESET, A. 1998. Effect of seed passage through vertebrate frugivoresguts on germination: a review. Perspectives in Plant ecology, evolution and systematics, 1/2:151-190.
- VÁZQUEZ-YANS C. & OROZCO-SEGOVIA, A. 1986. Dispersal of seeds by animals: effect on light controlled dormancy in Cecropia obtusifolia. In: Estrada, A. & Fleming, T.H. (Eds.), Frugivores and seed dispersal. W. Junk Publishers, Dordrecht, p.71-77.
- WHITTAKER, T.J. &. JONES, S.H. 1994. The role of frugivorous bats and birds in the rebuilding of a tropical forest ecosystem, Krakatau, Indonesia. Journal of Biogeography, 21:245-258.
- WHITMORE, T.C. 1983. Secondary succession from seeds in tropical rain forests. Forestry Abstract, 44:767-779.
- WILLIG, M.R.; CAMILO, G.R. & NOBILE, S.J. 1993. Dietary overlap in frugivorous and insectivorous bats from edaphic cerrado habitats of Brazil. Journal of Mammalogy, 74(1):117-128.
- ZORTÉA, M. & CHIARELLO, A.G. 1994. Observations on the big fruit-eating bat, Artibeus lituratus, in an urban reserve of south-east Brazil. Mammalia, 58(4):665-670.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
25 Mar 2008 -
Data do Fascículo
2008
Histórico
-
Recebido
09 Ago 2007 -
Aceito
23 Jan 2008