RESUMO
Este artigo é fruto de pesquisa quanti-qualitativa, que avaliou a qualidade motivacional de 600 estudantes, de 9 escolas de Ensino Médio da rede pública Estadual do Rio de Janeiro, no ensino remoto emergencial (ERE), durante a pandemia de Covid-19. Foram tomados como referência os preceitos da Teoria da Autodeterminação e as análises evidenciaram diferenças estatisticamente significativas na qualidade motivacional dos alunos de uma das escolas, com indicadores mais elevados de motivação autônoma em relação aos alunos das demais. Esses resultados exigiram a adoção de procedimentos de estudo de caso, ouvindo diferentes integrantes da comunidade escolar, o que permitiu identificar fatores intraescolares associados à maior qualidade motivacional dos alunos. Constatou-se que as ações empreendidas para promover engajamento e motivação para aprender foram bem-sucedidas e os bons resultados se deveram, principalmente, à colaboração entre gestores, professores e alunos, cujas condições de possibilidade haviam sido criadas previamente.
Palavras-chaves: motivação; autodeterminação; ensino médio
RESUMEN
Este artículo es resultado de investigación cuanti-cualitativa, que evaluó la calidad motivacional de 600 estudiantes, de 9 escuelas de enseñanza secundaria de la red pública Estadual de Rio de Janeiro, en la enseñanza remota de emergencia (ERE), durante la pandemia de Covid-19. Se utilizó como referencia los preceptos de la Teoría de la Autodeterminación y los análisis evidenciaron diferencias estadísticamente significativas en la calidad motivacional de los alumnos de una de las escuelas, con indicadores más elevados de motivación autónoma con relación a los alumnos de las demás. Esos resultados exigieron la adopción de procedimientos de estudio de caso, oyendo distintos integrantes de la comunidad escolar, lo que permitió identificar factores intraescolares asociados a la mayor calidad motivacional de los alumnos. Se constató que las acciones emprendidas para promover participación y motivación para aprender fueron exitosas y los resultados positivos resultaron principalmente, a la colaboración entre gestores, profesores y alumnos, cuyas condiciones de posibilidad se habían sido creadas previamente.
Palabras clave: motivación; autodeterminación; enseñanza secundaria
ABSTRACT
This article is the result of quantitative-qualitative research, which evaluated the 600 students’ motivational quality, from 9 high schools in the Rio de Janeiro state public system, in emergency remote teaching (ERE), during the Covid-19 pandemic. The precepts of the Self-Determination Theory were taken as a reference and the analyzes showed statistically significant differences in the students’ motivational quality from one of the schools, with higher indicators of autonomous motivation in relation to students from the others. These results required the case study procedures adoption, listening to different members of the school community, which made it possible to identify intra-school factors associated with students’ greater motivational quality. It was found that the actions undertaken to promote engagement and motivation to learn were successful and the good results were mainly due to the collaboration among managers, teachers and students, whose conditions of possibility had been previously created.
Keywords: motivation; self-determination; high school
INTRODUÇÃO
Em 13 de março, poucos dias após o início do ano letivo, as escolas do Rio de Janeiro fecharam as portas por conta da pandemia de Covid-19, doença causada pelo vírus SARS-COV-2. Era preciso reinventar maneiras de seguir com o trabalho pedagógico, mesmo em um contexto adverso inédito na história do país. Valendo-se de material impresso e das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), gestores estaduais e municipais implantaram plataformas educacionais e outros ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) para continuar com as aulas de forma remota.
Estados e municípios personalizaram soluções dentro do que era possível. A Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC) utilizou a plataforma Google Classroom (https://classroom.google.com) como meio oficial de interação entre os docentes e os alunos. Os aprendizados, as dificuldades, insucessos e ganhos dessa experiência demandam ainda muitos estudos.
Este artigo é fruto de uma pesquisa realizada através de dois estudos de cunho quantitativo e um de cunho qualitativo, que investigou a motivação para aprender de alunos do Ensino Médio da Rede Pública Estadual do Rio de Janeiro durante a pandemia de Covid-19. Os quantitativos se debruçaram sobre a motivação para aprender dos estudantes frente à adoção de TIC e de material impresso pelas escolas para dar continuidade, de forma remota, às atividades escolares. Já o qualitativo teve como principal objetivo identificar a percepção dos estudantes acerca do atendimento, pela escola, das necessidades psicológicas básicas associadas à motivação para aprender (relacionamento, competência e autonomia) e do engajamento deles na aprendizagem escolar durante o ensino remoto.
Foram adotados como referência os preceitos da Teoria da Autodeterminação - TAD (Ryan & Deci, 2000; Ryan & Deci, 2017), que desde os anos 1980 se configurou como principal ancoramento teórico dos estudos sobre motivação no Brasil, com fortes implicações para a educação (Ryan & Deci, 2000) e modificou o modo de olhar para o problema. A teoria propõe uma ruptura epistemológica com a concepção dicotômica de motivação x desmotivação que lhe antecedeu, valorizando mais a sua qualidade motivacional. Essa perspectiva volta-se, principalmente, para análise dos fatores e ambientes sociais favoráveis e antagônicos à motivação e ao bem-estar (Ryan & Deci, 2000). A partir de um conjunto consistente de evidências empíricas, a teoria pressupõe como base para a qualidade motivacional o atendimento pelo ambiente social de três necessidades psicológicas inatas e básicas: competência, relacionamento (ou vínculo) e autonomia (Deci & Ryan, 2000; Ryan & Deci, 2017). A frustração ou negação dessas necessidades pode levar inclusive, ao desenvolvimento de psicopatologias.
Segundo Ryan e Deci (2000), a TAD enfatiza as motivações inerentes às pessoas, levando em consideração as propensões naturais do ser humano para crescer e se desenvolver, além de lançar luz sobre os ambientes, as relações e como eles podem apoiar ou frustrar a satisfação das necessidades psicológicas básicas. Vislumbra a motivação humana em um continuum de autorregulação, que vai da desmotivação à motivação intrínseca, condição na qual as ações e comportamentos são realizados por vontade própria, pelo prazer ou satisfação, prevalecendo a regulação autônoma. Entre esses dois níveis de qualidade motivacional, identifica-se: a motivação extrínseca, ações e comportamentos regidos por pressões externas, podendo os motivos externos serem assimilados (regulação externa), introjetados (regulação introjetada) e/ou internalizados (regulação identificada); chegando à motivação intrínseca, quando ações e comportamentos são regidos pelo prazer e satisfação pessoal.
A teoria define autorregulação como a forma que as pessoas incorporam valores sociais e contingências extrínsecas e os transformam, progressivamente, em valores pessoais e automotivações (Ryan & Deci, 2000). Autorregulando seu comportamento, a pessoa tende a agir de forma autônoma, realizando determinada tarefa por vontade própria, reconhecendo nela seu valor e importância e, ainda que isso seja uma razão externa à pessoa, pois não parte de um desejo genuíno seu, ela se sente impelida a fazer pelo bem-estar que o resultado lhe trará.
METODOLOGIA, INSTRUMENTOS E PARTICIPANTES
A pesquisa foi realizada em duas etapas: uma quantitativa, da qual participaram 600 estudantes do Ensino Médio de 09 escolas da rede pública estadual do Rio de Janeiro, escolhidas por adesão. Os dados foram coletados através de questionário online, em outubro de 2020. Para avaliar a qualidade motivacional dos alunos na relação com o ensino remoto emergencial, foram construídos e utilizados dois instrumentos de autorrelato em escala tipo Likert, onde os entrevistados especificam seu nível de concordância com uma afirmação, sendo a mais usada em pesquisas de opinião. As questões foram embaralhadas em um único questionário, denominado Escala de Motivação para Aprender no Ensino Médio com uso de TIC (EMA-EM-TIC) e Escala de Percepção de Atendimento das necessidades psicológicas básicas.
Inspirada em estudos anteriores (Clement, Custódio, Rufini, & Alves Filho, 2014; Neves & Boruchovitch, 2006), a Escala (EMA-EM-TIC), com 20 itens, visava avaliar a motivação para aprender de acordo com o continuum de autorregulação proposto pela Teoria da Autodeterminação (Ryan & Deci, 2000, 2017). Levando-se em consideração as classificações mais comumente usadas em pesquisas (Guimarães & Bzuneck, 2008; Peters, Calvo, & Ryan, 2018), os itens desse continuum correspondiam às categorias de: motivação intrínseca, motivação por regulação identificada, motivação por regulação introjetada e motivação por regulação externa, seguidos de desmotivação. Foram observadas na construção da escala as redações de itens de instrumentos já existentes, com boas qualidades psicométricas, como os de Bzuneck, Megliato e Rufini (2013), Guimarães e Bzuneck (2008), Peters et al., (2018); Ratelle, Guay, Vallerand, Larose e Senécal (2007) e Vallerand et al., (1993). O formato de resposta em escala Likert incluía em cada item possibilidades desde 1 (nada verdadeiro) até 5 (totalmente verdadeiro).
O segundo instrumento, também em escala tipo Likert, denominado Escala de Percepção de Atendimento das necessidades psicológicas básicas, visava mensurar o quanto o modo como os professores usavam a plataforma Classroom e os materiais impressos contribuiu para a satisfação das necessidades psicológicas básicas preconizadas pela TAD: competência, autonomia e relacionamento.
Os dados foram submetidos a análises estatísticas, começando pela Análise Fatorial, pelo método de Análises Paralelas1 (Damásio, 2012). Foi realizada também a estatística descritiva dos itens relacionados ao continuum de motivação, seguida de análise de correlação entre variáveis, com uso de regressão linear. Foram comparados os escores dos alunos das diferentes escolas nas medidas de motivação e de percepção do atendimento das necessidades psicológicas básicas, levando em conta variáveis intrapessoais (como sexo, raça, idade) e de contexto, como tipos de escolas (ensino médio regular e ensino médio técnico) e formato do ensino remoto emergencial (plataforma digital ou material impresso). Em todos os casos, as diferenças encontradas foram submetidas à análise de variância (ANOVA). Por último, foi utilizada a metodologia de agrupamento dos respondentes, mediante a análise centrada em pessoas (person-centered approach).
Para evitar a identificação das escolas e dos respondentes, as escolas foram nomeadas com letras de A a I. Após as primeiras análises, verificaram-se diferenças estatisticamente significativas na qualidade motivacional dos alunos da escola C, que apresentavam indicadores mais elevados de motivação autônoma em relação aos alunos das demais escolas, sendo significativa a diferença na variável motivação autônoma. Na variável percepção do atendimento das necessidades, a Escola C teve média superior a todas as demais e significativamente superior à da escola de menor média.
Esses resultados chamaram a atenção e exigiram a adoção de procedimentos de estudo de caso que nos permitissem olhar a escola C mais de perto, conhecer melhor sua gestão e sua estrutura pedagógica, ouvindo diferentes integrantes de sua comunidade em relação a como estava sendo implementado o ensino remoto emergencial para contextualizar os dados produzidos. Assim, foram enviados convites à direção, coordenação pedagógica, professores e alunos da escola C solicitando a concessão de entrevistas sobre a atuação docente e o engajamento dos alunos no ensino remoto emergencial (ERE). Atenderam ao convite 02 docentes e 02 alunos, além da Diretora Adjunta e da Coordenadora Pedagógica. Foram, então, realizadas seis entrevistas estruturadas de curta duração, com tempo médio de 30 minutos, por via digital (plataforma de videoconferência), no período de 15 dias. As entrevistas com as gestoras e professores abordavam, fundamentalmente, as ações adotadas no ensino remoto emergencial (ERE) para assegurar o vínculo dos estudantes com a escola e o engajamento deles nas tarefas escolares, tendo como foco o atendimento das necessidades psicológicas básicas associadas à motivação (relacionamento, competência e autonomia).
As entrevistas com os estudantes enfocavam indiretamente a percepção que eles tinham do atendimento de suas necessidades motivacionais, ou seja, se as ações adotadas pela escola e pelos professores asseguravam, de algum modo, a autonomia deles em relação às tarefas escolares no ERE, a competência na aquisição dos conteúdos e principalmente, o pertencimento à escola e ao grupo de pares (relacionamento). Elas foram submetidas à análise de conteúdo (Franco, 2018) a partir de três categorias de análise: a) perspectiva dos alunos em relação ao ERE; b) perspectiva dos professores em relação ao ERE; c) perspectiva da gestão escolar em relação ao ERE. Além disso, foram buscadas informações adicionais sobre a escola nos dados do Censo Escolar (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2021) e fotografias do espaço físico enviadas pelos entrevistados.
Interações humanas e clima escolar: fatores que influenciam a motivação para aprender
As análises das ações pedagógicas promovidas pela escola C no contexto de ensino remoto emergencial podem subsidiar reflexões a respeito do fazer pedagógico promotor de motivação em momentos regulares e em momentos adversos. Cremos que os relatos obtidos nas entrevistas com integrantes dessa escola possibilitam ampliar o conhecimento sobre os fatores que contribuíram para a manutenção do engajamento (Bzuneck Et Al, 2013; Reeve, 2012) e do bem-estar dos alunos em um contexto bastante complexo de isolamento social, fechamento das escolas e adoção do ERE.
Cabe a ressalva de que, nas entrevistas, a palavra “engajamento” foi utilizada para instigar o diálogo com os entrevistados sobre as ações pedagógicas implementadas pela escola C para promover os processos motivacionais dos alunos, sabendo que motivação e engajamento são conceitos distintos, embora relacionados, como esclarece Reeve (2012, p.151):
A motivação é um processo psicológico, neural e biológico privado e inobservável que serve como uma causa antecedente para o comportamento publicamente observável que é o engajamento. Enquanto a motivação e o engajamento estão inerentemente ligados (cada um influencia o outro), aqueles que estudam a motivação estão interessados no engajamento principalmente como resultado de processos motivacionais, enquanto aqueles que estudam o engajamento estão interessados principalmente na motivação como uma fonte de engajamento. Assim, a motivação é a causa relativamente mais privada, experimentada subjetivamente, enquanto o engajamento é o efeito relativamente mais público, objetivamente observado (Reeve, 2012, p. 151).
Temos ciência de que fatores econômicos, sociais e psicológicos, associados ao isolamento social, não contemplados na pesquisa, podem ter influenciado a qualidade da motivação dos alunos. O relato da Coordenadora Pedagógica da escola C oferece elementos que corroboram essa hipótese:
Teve aluno que, realmente, desistiu, largou pra lá. Porque depois a gente ficou sabendo que eles tiveram depressão. (Coordenadora Pedagógica)
No entanto, o objetivo da pesquisa era investigar possíveis impactos de fatores intraescolares na qualidade da motivação para estudar de alunos do Ensino Médio público do Rio de Janeiro e acreditamos que os dados produzidos junto à escola C oferecem subsídios importantes para pensar nesse problema.
Localizada fora do município do Rio de Janeiro, na região metropolitana do Estado, com prédio próprio, a escola C atende a 241 alunos do segundo segmento do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, dos quais 39 responderam ao questionário. Ela é a menor das escolas participantes da pesquisa e, apesar de constar no censo escolar como escola urbana, fica localizada em área rural. Não possui laboratório de informática nem de Ciências. Segundo dados do censo escolar (INEP, 2021), 31% dos alunos fizeram o ENEM, tendo nota média de 494,17 pontos. Segundo a Diretora Adjunta, “muitos alunos de outras escolas queriam ir lá para o colégio (...) houve uma espécie de “fama da escola”, que atraía essas outras pessoas, por conta de resultados”, o que ocorreu também durante a pandemia da Covid 19.
Os dois professores entrevistados informaram trabalhar na escola há mais de dez anos e ressaltaram um forte vínculo afetivo e profissional com ela, com os colegas, com a gestão e com os estudantes. Eles tiveram acesso à plataforma Classroom do Google, e receberam da SEEDUC alguns cursos e oficinas específicos para utilização da plataforma. A direção e os professores informaram que o uso anterior à pandemia da comunicação por aplicativos de voz e texto (WhatsApp) entre escola e pais, gestão e professores, escola e alunos e alunos e professores favoreceu a manutenção do vínculo da comunidade escolar durante o ERE.
Em 2020, o foco de gestores e professores da maioria das escolas públicas do país esteve mais voltado para a manutenção do vínculo dos alunos com os estudos do que para avaliação do desempenho, como indica pesquisa realizada nesse período (GESTRADO/CNTE/CONTEE, 2020). No entanto, a pesquisa identificou também um considerável esforço para que os alunos seguissem aprendendo, o que foi evidenciado nas falas dos integrantes da escola C, entrevistados para esta pesquisa:
A gente teve uma preocupação maior em ter esse aluno sempre em contato com a gente. Que se ele não aprendesse agora, pra ele não ficar desesperado. Que depois ele ia poder perguntar ao professor. (Coordenadora Pedagógica)
Olha eu vou te dizer que eu acho que [o trabalho] ... se não puder [ser] “meio a meio” [eu acho que é] mais pela manutenção do vínculo. (Docente 1)
[...] não tínhamos essa intimidade pra usar as aulas neste formato, e isso pegou todo mundo de surpresa e o que mais me atingiu foi essa questão de como elaborar uma aula a fim de que nossos alunos não percam a motivação, possam compreender o conteúdo que está sendo dado. Foi um aprendizado para nós. (Docente 2)
O controle dos resultados dos alunos baseado exclusivamente em notas acaba levando à redução da qualidade do engajamento e da motivação (Ryan & Deci, 2000). Em relação ao trabalho com os conteúdos, no desenvolvimento de habilidades e na avaliação do rendimento, a escola acaba por priorizar fatores motivacionais externos, sendo que na maioria das vezes é promotora de motivação extrínseca/controlada, de pior qualidade. A escola C seguiu o caminho inverso ao priorizar a manutenção do vínculo deles com a escola, para que não evadissem ou abandonassem e como forma de buscar seu engajamento nos estudos, aprendendo o que fosse possível do conteúdo mesmo em condições muito adversas. Assim, adotou uma avaliação mais focada na participação do que na avaliação do conteúdo apreendido. Diante da incerteza dos critérios que poderiam vir a ser adotados pela SEEDUC para possível promoção dos alunos, as gestoras da escola e os docentes valorizaram o número de tarefas realizadas e enviadas para compor a nota final, se e quando fossem solicitados a emiti-la:
Tivemos um bom resultado! Só que a nossa preocupação, realmente, não era se o aluno aprendeu ou não aquele conteúdo. Sabe por quê? Não tem como você dimensionar isso. Então, o nosso objetivo era ver pela participação do aluno, pelo interesse dele. (Coordenadora Pedagógica)
Porque se logo nessa fase inicial a gente não der essa atenção ou mostrar, pelo menos, pro aluno que a gente tá aqui, que isso tá difícil pra todo mundo, mas que a gente tá junto, que a gente vai fazer isso dar certo, a gente vai se perder, a gente não vai ter uma participação dessa galera na plataforma. (Docente 1)
O importante era termos a participação dos alunos. (Coordenadora Pedagógica)
Reeve (2012) ressalta que o contexto social e o professor são fundamentais para apoiar a motivação e o engajamento dos alunos. Para isso, ele sugere que a interação professor-aluno seja baseada no reconhecimento de que aquele possui recursos motivacionais internos para se engajar na aprendizagem, que por sua vez, pode apoiar ou frustrar esses recursos, em uma relação de mútua afetação.
Para o docente 1, entrevistado nesta pesquisa, essa afetação relacional entre professor e aluno, esse vínculo, capaz de interferir no engajamento e no rendimento dos alunos, é construído na convivência:
Esses alunos, nós já os pegamos também em anos anteriores. Isso também já cria um vínculo. Esse ano, eu peguei uma turma de ensino médio numa outra escola. Eu não vou ter o mesmo resultado lá que eu tenho [aqui]... A gente precisa, primeiro, preparar esse terreno para depois ganhar a confiança e ter esse nível de engajamento. (Docente 1)
O que corrobora com a posição de Guimarães (2010, p. 183) de que
Embora grande parte das investigações sobre o vínculo tenham focalizado os relacionamentos entre pais e filhos, trabalhos relativos à interação professor-aluno confirmam a relevância de se promover em sala de aula um ambiente favorável ao estabelecimento de vínculos seguros, mediante o interesse e a disponibilidade do professor no que se refere à satisfação das necessidades e perspectivas dos estudantes (Guimarães, 2010, p. 183).
Os alunos entrevistados relataram perceber também a importância da relação professor/ aluno no interesse pelas aulas remotas:
Aulas interessantes eram quando o professor estava junto com a gente, através do Meet, ao vivo. A maioria da turma preferia a aula ao vivo, com contato direto com o professor para poder tirar dúvida na hora. (Aluno 2)
A maioria [dos professores] se disponibilizou para tirar dúvidas da gente, principalmente no início. Ficaram muito preocupados, perguntando como a gente preferia, se por vídeos do Youtube ou pra fazer uma aula mesmo (Aluna 1).
A aluna reconhece que a escola, como um todo, está preocupada com o bem-estar dos alunos e percebe que isso foi benéfico para eles também durante as atividades remotas. Identificamos nas falas de outros/as entrevistados/as indícios de satisfação e bem-estar na convivência dentro da escola, que podem indicar a existência de um bom clima escolar2, definido nas pesquisas nesse campo (Collie, Shapka, & Perry, 2012; Vinha, Et Al., 2016) como coesão em torno da aprendizagem escolar, convivência harmoniosa e respeitosa da comunidade escolar, segurança física e socioemocional, estrutura, entre outras dimensões. Os extratos a seguir são representativos da percepção de um clima positivo pelos integrantes da escola:
A gente tem uma equipe muito unida. [...] acolhimento é uma coisa importante. (Diretora Adjunta)
A gente se relaciona muito com a parte da direção. E esse apoio sempre foi muito importante porque, às vezes, a gente não tem esse apoio em casa. (Aluna 1)
Ali tem esse clima familiar. (Docente 1)
A gente já tem os projetos da escola. Todo ano tem. Mas as ideias de como fazer o que vai acontecer, isso é decidido em grupo. Não é uma coisa, assim, que a escola e a coordenação impõem. (Diretora Adjunta)
Gosto muito da minha escola. A relação com os funcionários é ótima, com o pessoal da direção é excelente, com os colegas também, não tinha briga. Tudo muito bom. (Aluno 2)
Acreditamos que isso pode ter favorecido o atendimento das necessidades psicológicas básicas de autonomia, pertencimento e competência (Ryan & Deci, 2017) na escola C, que teve a mais alta média na percepção de atendimento dessas necessidades, 3,63), o que por sua vez, pode estar associado às altas médias em motivação autônomas e baixas médias em desmotivação.
Collie, Shapka e Perry (2012) investigaram o clima da escola à luz de diversas teorias, inclusive a Teoria da Autodeterminação, e concluíram que esse fator intraescolar influencia as experiências dos indivíduos nesse sistema, pois nas interações com os outros e nas vivências diárias a cultura e as regras do espaço escolar vão sendo assimiladas e integradas aos modos de ser e de agir das pessoas. Assim, um clima escolar positivo tende a estar associado à percepção do atendimento das necessidades de competência, autonomia e pertencimento e, consequentemente, a favorecer recursos motivacionais internos dos alunos, o que se traduz em maior envolvimento com os estudos e com a aprendizagem (Guimarães, 2010).
Segundo as gestoras, durante o ensino remoto, a segurança física e socioemocional dos alunos foi reforçada com a distribuição de alimentos feita pela escola, o que garantiu auxílio às famílias em risco de insegurança alimentar, quando muitas pessoas perderam suas fontes de renda em razão do fechamento dos locais de trabalho, necessário à contenção da propagação do vírus. Essa dimensão também pode ter sido assegurada pelo acompanhamento constante dos alunos, que se sentiram “cuidados”, tanto pela equipe gestora quanto pelos docentes.
Psicologicamente, alguns sentem a necessidade de estar sempre conversando com a gente. (Diretora Adjunta)
Teve um aluno nosso que perdeu a mãe por causa da covid. A gente teve que dar assistência, cesta básica. (Coordenadora Pedagógica)
A gente estava sempre se colocando à disposição [dos alunos]. Aí, eles se sentiam um pouco seguros. E eles não largavam a gente. (Coordenadora Pedagógica)
Nós estamos ali como orientadores na visão deles, como colegas, como amigos, pessoas que se preocupam com eles. (Docente 1)
[...]ele [o aluno]se sente à vontade sabendo que vai falar com alguém que vai ouvir e não está ali para julgá-lo . (Docente 2)
A colaboração entre pares pode ter sido outro fator importante para o bom funcionamento dessa escola. Os depoimentos colhidos nas entrevistas permitem supor que há uma atuação coletiva organizada em torno das diversas tarefas administrativas e acadêmicas. Essa atitude provavelmente influencia também as ações dos alunos. A diretora adjunta relatou, na entrevista, o acolhimento dos alunos da escola a um aluno novo, que havia sofrido bullying na escola anterior. Em relação à implementação do ERE, ela ressaltou a parceria da gestão com os professores e com os alunos para agregar todos aos grupos de WhatsApp e “não deixar ninguém de fora”:
A gente entrava em contato com o representante que fazia essa ponte com o aluno, que entrava em contato. E aí, a gente conseguiu resgatar muita gente. Isso aí foi uma integração muito legal!! (Diretora Adjunta)
Diante de tantas incertezas e da possibilidade de aulas mediadas por TIC, foi necessário criar um pacto coletivo para que houvesse engajamento de professores e alunos. Nesse momento, o bom relacionamento já instituído entre os membros da comunidade escolar foi determinante para alcançar os objetivos pretendidos:
Um professor ajudando o outro. Os alunos mesmos, com esse grupo que eles têm, foram se ajudando. (Diretora Adjunta)
Então, essas trocas foram muito importantes, pois todos os professores se uniram, estavam com as mesmas dificuldades, então quando um professor aprendia algo, ele compartilhava com outros, criando uma rede de informação. (Docente 2)
Esse bom relacionamento da comunidade escolar, presenciado e relatado pelos alunos, se mostra como fator de estímulo ao engajamento na vida escolar e este é uma base vital da motivação, do envolvimento e da autorrealização dos alunos. Quando as práticas docentes são estruturadas em termos relacionais, tem-se maior probabilidade de promover a motivação de melhor qualidade e de se obter melhores resultados nas aprendizagens. A conexão com o professor e com os colegas e a sensação de pertencimento fornecem a segurança emocional necessária que os indivíduos precisam para autodeterminar seus comportamentos. O atendimento da necessidade de relacionamento é fator motivacional para a pessoa internalizar as regulamentações sociais e se adaptar aos ambientes.
Características do professor e do ambiente da sala de aula afetam decisivamente o rendimento dos alunos (Paul & Barbosa, 2008), além de gerar maiores níveis de confiança, emoções positivas e habilidades para o enfrentamento de conflitos de forma mais adaptativa (Guimarães, 2010). O significativo engajamento dos alunos da escola C nas atividades propostas no ambiente virtual de aprendizagem - dos 241 alunos regularmente matriculados, apenas 8 não acessaram a plataforma - indicia uma atuação planejada dessa comunidade escolar com vistas à manutenção do vínculo com a escola e à redução dos riscos de evasão.
Eu criei um outro grupo para poder conversar sobre carreira, sobre desenvolvimento pessoal. Porque eu percebo isso como uma carência, às vezes familiar. Falta um pouco de orientação. (Docente 1)
Estavam bem engajados, muito interessados nas avaliações, queriam sempre o retorno das atividades, tiravam dúvidas. Mesmo em um lugar muito longe, com pouco sinal de internet, os alunos ainda tinham muita garra para aprender. (Docente 2)
O feedback constante dos docentes certamente foi o diferencial nessas interações.
Eu gostava de fazer individualmente para cada aluno, colocando comentários sobre a atividade, eles adoram receber os elogios e percebiam que eu estava atenta aos detalhes. (Docente 2)
Estudos atestam a importância do feedback para o envolvimento do aluno com as atividades de aprendizagem (Bzuneck, 2020; Hattie & Timperley, 2016). Ele pode ser de observação, para que o aluno se atente para os erros, mas sem desencorajar novas tentativas e pode ser positivo, apontando os acertos e estimulando a enfrentar novos desafios, com autonomia e competência. O aluno que recebe feedback constante dos professores tende a se engajar mais e engajamento é condição para a motivação autônoma, pois diz respeito a um esforço feito pelo aluno para aprender (Bzuneck et al, 2013). Ele também está intimamente relacionado à percepção por parte do aluno do vínculo com seus professores. Assim, é possível afirmar que o feedback positivo retroalimenta a satisfação das necessidades psicológicas básicas, porém há que se ter cuidado na forma de praticá-lo, para que não se torne “burocrático” e deixe de fazer sentido. Deve ser adotado com parcimônia, sempre dado diretamente ao aluno, de forma individualizada e havendo necessidade de “reparos” por parte do aluno, deve se configurar mais como conselho do que como uma crítica (Bzuneck, 2020).
Segundo Bressoux (1994), ofeedbacké parte essencial da comunicação humana, em que um remetente transmite uma mensagem para um receptor e este último responde, devolvendo outra mensagem ao remetente. Sem ele não há comunicação, apenas transmissão, portanto, é elemento imprescindível na relação professor-aluno.
A coordenadora pedagógica da escola pesquisada relatou, em entrevista, ter percebido uma relação entre o feedback dado pelos docentes aos alunos durante o ERE e o engajamento de melhor qualidade deles nas atividades escolares.
Eu percebi que as turmas em que os professores cobravam mais, eram mais rigorosas, tanto nas atividades, nas explicações e nas datas... Quando o professor estava ali, toda semana, constantemente, os alunos eram mais frequentes. E os alunos tiveram melhores notas. O aluno sabia que tinha alguém corrigindo a atividade dele. (Coordenadora Pedagógica)
A diretora adjunta salientou o esforço de alguns docentes que, mesmo sem muitas habilidades com as TIC, se empenharam em dar retorno aos alunos em relação às tarefas realizadas. Além disso, houve feedback também da equipe da escola em relação às angústias, receios e expectativas dos alunos com relação à aprendizagem do conteúdo.
A partir de dados de pesquisa, Neubauer, Davis, Tartuce, & Nunes (2011) elencaram oito práticas recorrentes em 35 escolas brasileiras e a relação delas com o sucesso escolar dos alunos. Entre elas o clima da escola como um lugar agradável para ensinar e aprender, além do trabalho em equipe. Os relatos de integrantes da escola C indicam que ela apresenta essas características. Percebe-se nas falas dos docentes o explícito compromisso com a aprendizagem e o bem-estar dos alunos:
Ali somos todos profissionais, e excelentes profissionais e há uma preocupação em ensinar, uma boa participação e intenção em entregar, realmente, um bom conteúdo pros alunos. (Docente 1)
Isso certamente foi determinante para o engajamento dos alunos nas atividades escolares remotas e ajuda a explicar o perfil motivacional majoritariamente autônomo identificado entre os participantes da pesquisa aqui relatada.
O tamanho da escola é visto também como fator importante para a permanência ou abandono dos alunos do Ensino Médio (Cohen et al., 2009; Machado, Alavarse, & Arcas, 2016). O fato de a escola C ser pequena, com apenas 241 alunos, distribuídos em 09 turmas, pode ter favorecido a aproximação entre a equipe gestora, os docentes, os alunos, os familiares e demais membros da comunidade escolar, inclusive, permitindo uma comunicação mais direta, através das redes sociais, conforme relatos:
Eu conheço a mãe, eu conheço a avó de sicrano, e beltrano, e tal... Então, isso eu acho que é uma coisa assim também que a gente consegue ali porque é uma escola pequena. (Docente 1)
A escola já tinha essa prática de comunicação antes da pandemia, o que reforçava a dimensão do relacionamento. Dados das pesquisas TIC Educação (CETIC.br, 2019) indicaram que entre 2016 e 2019 a porcentagem de instituições públicas urbanas cujos pais ou responsáveis utilizaram perfis ou páginas em redes sociais para interagir com a escola passou de 32% para 54% (CETIC.br, 2019). Resultados desta pesquisa indicam que o uso de aplicativos de mensagem instantânea e de redes sociais e a busca de informações na internet são as atividades com mídias mais citadas pelos alunos do Ensino Médio.
A popularidade das mídias de mensagens em tempo real levou à adoção destas pelas escolas para o contato com os alunos e seus familiares e esse recurso se tornou fundamental no ERE. O fato de a escola C já ter essa forma de acesso às famílias incorporada às suas práticas administrativas regulares - “tem mais ou menos 4 ou 5 anos que nós decidimos fazer grupos de Whatsapp dos pais”, relatou a diretora adjunta - pode ter favorecido a interação permanente com os alunos durante o ERE. Essa interação, além de fortalecer os vínculos entre os alunos e a escola, dá significado ao espaço escolar, ajuda a construir um ambiente de relações sociais saudáveis, onde é bom estar, e isso interfere no nível e na qualidade da motivação para aprender.
(...) sentem a necessidade de estar sempre conversando com a gente. Na pandemia, então, mandam mensagem pelo WhatsApp [regularmente]. (...) Os alunos têm os nossos telefones. (Diretora Adjunta)
O professor de Arte fez um projeto que interessou muito, sobre a busca de colocação profissional, de buscar crescimento pessoal. Isso me motivou muito a estudar. Foi um grupo à parte, para quem queria, não tinha a ver com o conteúdo (Aluno 2)
Quando o aluno manda mensagem para a escola, seja lá qual for o conteúdo, ele está buscando por ela, interagindo com uma instituição que tem alguma importância para ele. Isso se acentuou durante o isolamento social, quando, mais importante que nunca, estar conectado aos outros era fator de manutenção do equilíbrio da saúde mental, uma vez que muitas pessoas sentiam tristeza ou desenvolviam depressão por conta da solidão e do afastamento dos amigos e familiares.
A escola C se mantém receptiva aos alunos também após a conclusão do ciclo escolar, pois muitos deles permanecem em contato com a escola e com os professores pelas redes sociais:
A gente também tem uma página no Facebook, onde tem ex-aluno e aluno atual. (Diretora Adjunta)
Há uma preocupação sim, da escola, em manter o vínculo com esses alunos. Tanto nos anos de estudo quanto depois de formados. (Docente 1)
Embora a escola já tivesse alguma comunicação com os alunos em ambientes digitais, a ampliação do uso de TIC durante o ensino remoto emergencial foi vista pelos docentes como oportunidade de incorporação dessas tecnologias à cultura escolar. A docente 2 viu nessa forma de comunicação possibilidades de aperfeiçoamento das práticas pedagógicas, incorporando elementos que possam torná-las mais motivadoras:
Vejo que tem vários recursos que podem ser utilizados em sala de aula, a tecnologia veio para nos ajudar, se soubermos usar isso no processo de aprendizado, isso será maravilhoso! Achei isso interessante, com a cabeça que tenho hoje, vejo que só temos a ganhar. (Docente 2)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A literatura sobre fatores associados à motivação para aprender, que subsidia este artigo, indica que o atendimento, pela escola e pelo professor, das necessidades de autonomia, pertencimento (ou relacionamento) e competência dos alunos tem relação direta com a melhor qualidade motivacional, classificada como motivação intrínseca ou autorregulada autônoma. A pesquisa que deu origem a este artigo identificou entre os alunos de uma das escolas pesquisadas uma melhor qualidade motivacional. Uma maior aproximação com a escola, realizada através de entrevistas com 6 integrantes da comunidade escolar e da busca de informações adicionais sobre a escola, permitiu compreender melhor seu funcionamento e identificar alguns dos fatores que provavelmente explicam os resultados do perfil motivacional dos alunos.
O maior engajamento nas atividades escolares online, associados a uma maior percepção de atendimento de necessidades básicas, identificada nos relatos dos alunos entrevistados indicam que essa escola congrega fatores que podem favorecer a motivação para estudar. As entrevistas com gestoras e professores indicam que a escola tem uma gestão democrática e participativa (todos relataram apoio, conversas constantes e planejamentos conjuntos para implementação do ERE), que há uma comunicação permanente com os alunos e suas famílias (a escola já utilizava regularmente a comunicação por WhatsApp antes da suspensão das atividades presenciais e adoção das tarefas remotas), forte coesão e baixa rotatividade da equipe pedagógica (os entrevistados informaram que a maioria dos docentes está na escola há mais de 5 anos e pretende permanecer) e que, durante o ERE, todos demonstraram compromisso com a aprendizagem e com o bem-estar dos alunos. As ações implementadas nesse período incentivaram a colaboração entre pares e a interação permanente entre professores e alunos, com escuta e feedback do professor nos processos de aprendizagem. Cabe ressaltar que se trata de uma escola pequena, com menos de 250 alunos, fator que possibilita conhecer a realidade de cada aluno por parte dos professores e da gestão e uma maior atenção a processos individuais de aprendizagem, o que também favorece a motivação.
Na implantação do ERE, em um contexto extremamente adverso ao engajamento em atividades escolares e à manutenção do interesse pelos estudos, essas características favoreceram a construção coletiva de práticas pedagógicas que, ao que tudo indica, atenderam às necessidades de pertencimento e de autonomia dos alunos, imprescindíveis à motivação para estudar.
Cabe registrar que a ausência do Ministério da Educação na coordenação das gestões estaduais e municipais e no provimento dos recursos necessários à implementação das atividades escolares remotas no país acarretou prejuízos elevados às gestões escolares e aos professores, que tiveram um aumento absurdo em sua carga de trabalho, incluindo o trabalho não remunerado. Os professores arcaram, muitas vezes sozinhos, com o ônus de incorporar os recursos tecnológicos digitais ao ensino para dar continuidade às aulas, rapidamente, com impactos negativos em sua saúde física e mental e na vida familiar (GESTRADO/CNTE/CONTEE, 2020).
Por outro lado, cabe também reconhecer o que foi aprendido pelos professores nesse processo. Redescobrimos o valor do cuidado; superamos a suposta contradição entre cuidar e ensinar; nos tornamos mais autônomos com relação ao currículo e ao manejo do conteúdo de nossas disciplinas, definindo prioridades em relação ao contexto; e, sobretudo, constatamos a fundamental importância da aprendizagem por pares. A colaboração entre pares foi indicada como principal legado do ERE pela maioria dos professores que participaram das pesquisas realizadas durante a pandemia pelo GESTRADO (GESTRADO/CNTE/CONTEE, 2020). As soluções construídas pela escola C para manter os alunos motivados, apesar das enormes dificuldades vivenciadas na pandemia, foram fruto dessa forma de colaboração, cujas condições de possibilidade haviam sido criadas previamente.
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1
Método de análise fatorial exploratória (AFE) que implica a geração de dados aleatórios não correlacionados e a comparação entre os autovalores da AFE e os autovalores dos dados aleatórios (Damásio, 2012).
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2
A avaliação do clima escolar não integrava os objetivos da pesquisa relatada, razão pela qual não nos detivemos na produção de dados empíricos sobre o tema. Este está sendo mencionado aqui porque os entrevistados fizeram referência às boas relações estabelecidas na escola entre os integrantes da comunidade escolar e à satisfação e bem-estar percebidos nessa convivência.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
04 Out 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
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Recebido
20 Abr 2022 -
Aceito
03 Dez 2023