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Reflexões sobre práticas descolonizantes em educação linguística: compartilhando experiências com a língua alemã no Brasil

Reflecting on decolonising practices in language education: sharing experiences with regard to the German language in Brasil

Resumo

Este artigo tem como propósito investigar contribuições do debate decolonial no âmbito da educação linguística, com foco na língua alemã. Para tanto, apresento um breve panorama das perspectivas decoloniais, reconhecendo saberes locais historicamente invisibilizados. Nos moldes da pesquisa-ação e fundamentando-me no paradigma metodológico qualitativo-interpretativista, compartilho e analiso experiências didáticas no curso de graduação em Letras Alemão de uma universidade no sul do Brasil, considerando os deslocamentos na prática docente e inserindo sugestões de materiais à proposta inicial. Os resultados dessas experiências indicam a necessidade de transcender as fronteiras de um país europeu central como modelo idealizado. Ademais, constato a urgência de considerar o debate antirracista em educação linguística no contexto da língua alemã, além de uma demanda por maior compartilhamento de experiências, visando alternativas para o desenvolvimento de materiais e práticas pedagógicas críticas e decoloniais.

Palavras-chave:
decolonial; educação linguística; língua alemã; práxis pedagógica

Abstract

The purpose of this article is to investigate the contributions of the decolonial debate in the field of language education, with a focus on the German language. To this end, I present a brief overview of decolonial perspectives, recognising historically invisible local knowledge. Based on action research and the qualitative-interpretivist methodological paradigm, I share and analyse experiences from two different moments in the undergraduate German language course at a university in southern Brazil, considering the shifts in teaching practice and integrating suggestions for materials into the initial proposal. The results point to the need to transcend the borders of a central country as an idealised model for the language. Furthermore, there is an urgent need to consider the anti-racist debate in language education in the context of the German language, and the demand for greater sharing of experiences, with a view to alternatives for the development of critical and decolonial teaching materials and practices.

Key-words:
decolonial; language education; German language; pedagogical praxis

1 Introdução

O debate acerca dos estudos decoloniais tem repercutido no âmbito da educação linguística, provocando deslocamentos em ambientes acadêmicos e em diferentes esferas educativas. Nessa esteira, ampliam-se os estudos sobre relações (trans-) interculturais e a busca pela construção de processos educativos críticos que promovam a emersão de vozes até então silenciadas (cf. MENEZES DE SOUZA & HASHIGUTI 2023MENEZES DE SOUZA, L. M. T. .; HASHIGUTI, S. T. Decolonialidade e(m) Linguística Aplicada: Uma entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza. Polifonia, [S. l.], v. 29, n. 53, 149-177, 2023. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/14865 (29/12/2023).
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).

A luta dos movimentos de pessoas indígenas e negras, de movimentos LGBTQIA+, de grupos linguísticos minorizados, de pessoas com deficiência e a luta pelas causas feministas - para citar alguns espaços de resistência - projetam-se nas esferas educativas, inclusive por meio de políticas públicas e ações governamentais (OLIVEIRA & CANDAU 2010OLIVEIRA, L. F. De .; CANDAU, V. M. F. Pedagogia decolonial e educação antirracista e intercultural no Brasil. Educação em Revista, v. 26, n. 1, 15-40, 2010. Disponível em: Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0102-46982010000100002 (30/12/2023).
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). Transformações como essas evidenciam a importância de resistir, mesmo em meio a tantos descasos e retrocessos na educação, decorrentes de políticas coercitivas, marcadas por investidas ultraconservadoras e ultraliberais.

Pautas como essas são abordadas nos estudos ora denominados decoloniais, cuja repercussão em meio acadêmico se dá a partir das proposições lançadas por um grupo de intelectuais (BALLESTRIN 2013BALLESTRIN, L. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, vol. 11, 89-117, maio 2013. ). Em 1992, foi formado o Grupo Latino-Americano dos Estudos Subalternos em diálogo com o grupo “Sul-Asiático dos Estudos Subalternos” (BALLESTRIN 2013BALLESTRIN, L. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, vol. 11, 89-117, maio 2013. : 94). Mais tarde, o grupo acabou se desagregando devido a divergências e dissonâncias em suas perspectivas teóricas. Alguns de seus membros passaram a integrar o denominado Grupo Modernidade/Colonialidade, o qual propunha o movimento crítico na América Latina a partir do conhecimento de grupos subalternizados, defendendo uma “‘opção decolonial’ - epistêmica, teórica e política - para compreender e atuar no mundo” (BALLESTRIN 2013BALLESTRIN, L. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, vol. 11, 89-117, maio 2013. : 89).

Nesse sentido, “a descolonialidade não consiste em um novo universal” (MIGNOLO 2017MIGNOLO, W. Desafios decoloniais hoje. Epistemologias do Sul, v. 1, n. 1, 12-32, 2017. Disponível em: Disponível em: http://revistas.unila.edu.br/epistemologiasdosul/article/view/772 (28/12/2023).
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: 15), como única alternativa disponível. Na verdade, “trata-se antes de outra opção” (MIGNOLO 2017MIGNOLO, W. Desafios decoloniais hoje. Epistemologias do Sul, v. 1, n. 1, 12-32, 2017. Disponível em: Disponível em: http://revistas.unila.edu.br/epistemologiasdosul/article/view/772 (28/12/2023).
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: 15) diante da universalidade, dos padrões e formas de viver, ser e saber pautadas na leitura eurocêntrica e colonial de mundo, de modo a romper com diferentes aspectos da colonialidade que afetam nossa existência, tais como: o racismo, o mito do nativo, a subalternidade de povos não-europeus, a visão neoliberal destrutiva e suas formas de exploração e acumulação, entre outros.

Em educação linguística, frente à crítica a antigos métodos e modelos coloniais deslocados da realidade dos aprendizes, as ações pedagógicas passam a ser questionadas e analisadas sob a perspectiva descolonizante. De fato, é preciso ir além do mero emprego de uma "expressão da moda" para efetuar mudanças significativas, permitindo que perspectivas decoloniais se fortaleçam e amplifiquem as vozes do sul, até então silenciadas e apagadas. Isso implica engajar-se nas discussões, familiarizar-se com os princípios abordados no âmbito da decolonialidade, reconhecendo suas premissas e sua relação com a colonialidade (PINHEIRO 2023PINHEIRO, Bárbara Carine Soares. Como ser um educador antirracista. São Paulo: Planeta do Brasil, 2023.: 107). Dessa maneira, estaremos informadas/os a respeito para que possamos compreender os aspectos em jogo no debate e como esses influenciam nossa práxis, antes de nos apressarmos em aplicar a decolonialidade de maneira impulsiva, conforme destacado por Lynn Mario T. Menezes de Souza em entrevista à Simone Hashiguti (2023: 161).

Com base nessas considerações preliminares, situo o presente artigo no entrelugar caracterizado por deslocamentos e questionamentos decoloniais associados à práxis pedagógica, considerando desafios e condições locais. O propósito central é examinar as contribuições do debate atual no campo da educação linguística e, mais especificamente, da língua alemã, a partir de minhas perspectiva e experiências como docente no sul do Brasil. Considero urgente uma reflexão crítica diante da subordinação a políticas linguísticas educativas homogeneizantes e excludentes (NUNES 2022NUNES, E.C.R. Entre "becos sem saídas" e o "pulo do gato": Criatividade Local e mentoria na formação inicial de professores de alemão no Brasil. Tese (Doutorado em Língua e Literatura Alemã) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2022. doi:10.11606/T.8.2021.tde-11032022-212301 (03/06/2024).
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: 46), indagando-se: Qual é a minha posição e qual direção estamos tomando neste debate decolonial? Que tipo de atitudes coloniais são reproduzidas em salas de aula? Que mitos eurocêntricos são reforçados? Com que espécie de privilégios endosso a colonialidade a partir da minha branquitude?

Neste artigo, não pretendo oferecer respostas abrangentes e conclusivas a estas perguntas. Em vez disso, proponho uma conversa sobre o tema e suas implicações na ação pedagógica, compartilhando mais indagações do que conclusões e constatações. Para contribuir nesta discussão, inicio com um breve panorama das perspectivas decoloniais como base teórica para uma análise posterior. Em um segundo momento, compartilho experiências da práxis em diálogo com essas abordagens, discorrendo sobre desafios locais, tropeços e êxitos nessa trajetória. Como pesquisadora de minha própria prática pedagógica, analiso dois momentos distintos em sala de aula, adotando uma abordagem nos moldes da pesquisa-ação, embasada no paradigma metodológico qualitativo-interpretativista. Por fim, exponho os resultados dessas práticas e sinalizo possíveis confluências futuras em pesquisa, ensino e extensão, como “opções” para a ação pedagógica em língua alemã no Brasil.

Vale ressaltar que as experiências compartilhadas não representam um manual de instruções, pois defendo o protagonismo da práxis local sob a ótica freireana. Sendo assim, as ações pedagógicas pressupõem um estudo do contexto, das pessoas envolvidas e de suas especificidades para a construção de trajetórias de aprendizagem.

Como primeiros passos nesse percurso, delineio um breve panorama teórico dos estudos decoloniais e seus desdobramentos.

2 Panorama teórico

Com a intensificação do debate decolonial, estão em circulação diferentes termos, como “colonialidade, decolonialidade, descolonialidade, anticolonialidade” (MENEZES DE SOUZA & HASHIGUTI: 2023MENEZES DE SOUZA, L. M. T. .; HASHIGUTI, S. T. Decolonialidade e(m) Linguística Aplicada: Uma entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza. Polifonia, [S. l.], v. 29, n. 53, 149-177, 2023. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/14865 (29/12/2023).
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) e ainda a contracolonialidade (SANTOS 2018SANTOS, Antonio Bispo. Somos da terra. Piseagrama, Belo Horizonte, n. 12, 44-51, 2018.: 2023).

Para compreender esses desdobramentos, vale diferenciar primeiramente as noções de colonialismo e colonialidade. Nas palavras de Maldonado-Torres (2007MALDONADO-TORRES, Nelson. Sobre la colonialidad del ser: contribuciones al desarrollo de un concepto. In: CASTRO-GOMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramon (eds.). El giro decolonial: reflexiones para una diversidade epistemica mas alla del capitalismo global. Bogota: Siglo del Hombre Editores, 2007 127-168. Disponivel em: Disponivel em: https://ram-wan.net/restrepo/decolonial/17-maldonado-colonialidad%20del%20ser.pdf (29/12/2023).
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: 131), o colonialismo é a relação de poder política e econômica de um povo soberano a outro povo, constituindo um império. Assim, o colonialismo precede à colonialidade, mas essa última se mantém, já que antigas colônias seguem marcadas por essas relações de exploração e dominação, não somente por externos, mas também internamente. A manutenção do colonialismo se perpetua no Estado-Nação, no qual frentes locais seguem reproduzindo as estruturas colonialistas, em um tipo de “colonialismo interno”, como descrito por Pablo González Casanova (2007CASANOVA, Pablo González. Colonialismo Interno - Uma redefinição. In: BORON, Atílio A.; AMADEO, Javier; GONZALEZ, Sabrina. A teoria Marxista hoje. Problemas e perspectivas. Buenos Aires: CLACSO, 2007, p. 431-458. ). Trata-se de um “empreendimento colonial maciço”, no qual o padrão de poder não se limita a uma relação formal, mas se expande para “a forma como o trabalho, o conhecimento, a autoridade e as relações intersubjetivas se articulam entre si, através do mercado capitalista mundial e da ideia de raça” (MALDONADO-TORRES 2007MALDONADO-TORRES, Nelson. Sobre la colonialidad del ser: contribuciones al desarrollo de un concepto. In: CASTRO-GOMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramon (eds.). El giro decolonial: reflexiones para una diversidade epistemica mas alla del capitalismo global. Bogota: Siglo del Hombre Editores, 2007 127-168. Disponivel em: Disponivel em: https://ram-wan.net/restrepo/decolonial/17-maldonado-colonialidad%20del%20ser.pdf (29/12/2023).
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: 131)2 2 Do original: “a colonialidad se refiere a un patrón de poder que emergió como resultado del colonialismo moderno, pero que en vez de estar limitado a una relación formal de poder entre dos pueblos o naciones, más bien se refiere a la forma como el trabajo, el conocimiento, la autoridad y las relaciones intersubjetivas se articulan entre sí, a través del mercado capitalista mundial y de la idea de raza” (MALDONADO-TORRES 2007: 131). Todas as traduções do artigo foram realizadas pela autora. .

A invenção moderna de raça determinou esse padrão de poder, uma vez que classifica a população (QUIJANO 2007QUIJANO, A. Colonialidad del poder y clasificación social. In: CASTROGÓMEZ, S.; GROSFOGUEL, R. (Orgs.). El giro decolonial. Reflexiones para una diversidad epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá: Universidad Javeriana-Instituto Pensar, Universidad Central-IESCO, Siglo del Hombre Editores, 2007. 93-126. : 93) para legitimar sistemas de dominação e exploração (MUNANGA 2004MUNANGA, Kabengele. Uma Abordagem Conceitual das Noções de Raça, Racismo, Identidade e Etnia In: BRANDÃO, André Augusto P. Programa de Educação Sobre o Negro na Sociedade Brasileira. Rio de Janeiro: EDUFF, 15-34, 2004.). Assim, povos africanos e indígenas sofreram e sofrem processos de desumanização para atender aos objetivos da modernidade e promover um ideal superior universal de branquitude, transmitido de geração a geração, “fortalecendo seu grupo no lugar de privilégio” (BENTO 2022BENTO, Cida. Pacto da Branquitude. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.: 25). Munanga (2004MUNANGA, Kabengele. Uma Abordagem Conceitual das Noções de Raça, Racismo, Identidade e Etnia In: BRANDÃO, André Augusto P. Programa de Educação Sobre o Negro na Sociedade Brasileira. Rio de Janeiro: EDUFF, 15-34, 2004.) descreve as consequências desse feito que repercutem nos dias de hoje:

Se na cabeça de um geneticista contemporâneo ou de um biólogo molecular a raça não existe, no imaginário e na representação coletivos de diversas populações contemporâneas existem ainda raças fictícias e outras construídas a partir das diferenças fenotípicas como a cor da pele e outros critérios morfológicos. É a partir dessas raças fictícias ou “raças sociais” que se reproduzem e se mantêm os racismos populares. (MUNANGA 2004MUNANGA, Kabengele. Uma Abordagem Conceitual das Noções de Raça, Racismo, Identidade e Etnia In: BRANDÃO, André Augusto P. Programa de Educação Sobre o Negro na Sociedade Brasileira. Rio de Janeiro: EDUFF, 15-34, 2004.: 22)

Durante muito tempo, a discussão sobre o racismo foi apagada devido ao mito da democracia racial brasileira (MUNANGA 2004MUNANGA, Kabengele. Uma Abordagem Conceitual das Noções de Raça, Racismo, Identidade e Etnia In: BRANDÃO, André Augusto P. Programa de Educação Sobre o Negro na Sociedade Brasileira. Rio de Janeiro: EDUFF, 15-34, 2004.: 28), fato que bloqueou políticas de ação afirmativa, negando a diversidade cultural em nosso território e o racismo enraizado em nossas instituições e em nossa sociedade, pautado em privilégios da branquitude, “um lugar de vantagens simbólicas, subjetivas e materiais disponíveis para as pessoas identificadas como brancas em uma sociedade onde o racismo é estrutural” (PINHEIRO 2023PINHEIRO, Bárbara Carine Soares. Como ser um educador antirracista. São Paulo: Planeta do Brasil, 2023.: 41).

Esse esquema de poder é manifestado em diferentes facetas da colonialidade, as quais, em conexão, perpetuam com o jogo colonial. Assim, a colonialidade do poder “relaciona as formas modernas de exploração e dominação” (MALDONADO-TORRES 2007MALDONADO-TORRES, Nelson. Sobre la colonialidad del ser: contribuciones al desarrollo de un concepto. In: CASTRO-GOMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramon (eds.). El giro decolonial: reflexiones para una diversidade epistemica mas alla del capitalismo global. Bogota: Siglo del Hombre Editores, 2007 127-168. Disponivel em: Disponivel em: https://ram-wan.net/restrepo/decolonial/17-maldonado-colonialidad%20del%20ser.pdf (29/12/2023).
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: 130). Em relação direta com esse tipo de dominação, encontra-se a colonialidade do saber, que abarca a produção de conhecimento e a reprodução dos pensamentos coloniais, apagando outros saberes e trajetórias. Já a colonialidade do ser refere-se à experiência vivida e seu impacto para o sujeito colonizado, negando a humanidade para povos subalternizados e não-europeus (MALDONADO-TORRES 2007MALDONADO-TORRES, Nelson. Sobre la colonialidad del ser: contribuciones al desarrollo de un concepto. In: CASTRO-GOMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramon (eds.). El giro decolonial: reflexiones para una diversidade epistemica mas alla del capitalismo global. Bogota: Siglo del Hombre Editores, 2007 127-168. Disponivel em: Disponivel em: https://ram-wan.net/restrepo/decolonial/17-maldonado-colonialidad%20del%20ser.pdf (29/12/2023).
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: 130).

A partir dessa discussão, há outros desdobramentos e outras percepções de colonialidade, como a “colonialidade cosmogônica ou da mãe natureza”, a qual caracteriza a força vital de comunidades afrodescendentes e indígenas como “primitivas” e “pagãs” (WALSH 2009WALSH, Caterine. Interculturalidade Crítica e Pedagogia Decolonial: in-surgir, re-existir e re-viver. In: CANDAU, V. M. (Org.) Educação Intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2009.: 15), e a colonialidade de gênero, trazendo à tona discussões feministas, o patriarcado colonial moderno e o sistema colonial de gêneros (SEGATO 2012SEGATO, Rita L. Gênero e colonialidade: em busca de chaves de leitura e de um vocabulário estratégico descolonial. e-cadernos CES, n. 18, 106-131, 2012. Disponível em: Disponível em: http://journals.openedition.org/eces/1533 (30/12/2023).
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; LUGONES 2020LUGONES, Maria. Colonialidade e gênero. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (org.). Pensamento feminista hoje: perspectivas decoloniais. Rio de Janeiro: Bazar: 2020, 52-83.). A colonialidade da linguagem (VERONELLI & DAITCH 2021VERONELLI, Gabriela Alejandra; DAITCH, Silvana Leticia. Sobre a colonialidade da linguagem. Revista X , [S.l.], v. 16, n. 1, 80-100, 2021. Disponível em: Disponível em: https://revistas.ufpr.br/revistax/article/view/78169 (30/12/2023).
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; SILVA 2023SILVA, Marina Grilli Lucas. Submissão, questionamento e subversão da colonialidade linguística nas práticas de ensino de alemão para o público brasileiro. Tese (Doutorado em Educação, Linguagem e Psicologia) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2023. doi:10.11606/T.48.2023.tde-11052023-102121 (30/12/2023).
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), por sua vez, evidencia o desprezo pelas linguagens de povos escravizados e subalternizados, prezando pelo monolinguismo, pelo domínio de línguas de prestígio e por uma opressão colonial discursiva.

Constata-se, portanto, que a colonialidade não é apenas uma questão de poder político, mas também de poder epistêmico e ontológico, ou seja, refere-se à forma de produção de conhecimento e de identidades, reproduzidos em um mundo marcado pela colonialidade global (GROSFOGUEL 2010GROSFOGUEL, R. Para descolonizar os estudos de economia política e os estudos póscoloniais: transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade global. In: SANTOS, Boaventura de Sousa e MENESES, Maria Paula (Orgs.). Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010, p. 115-147.). Nesse espaço, “o diferente” é criado a partir da referência universal (BENTO 2022BENTO, Cida. Pacto da Branquitude. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.: 106), o modelo de homem branco, heterossexual, de origem europeia.

Como reação a essa conjuntura, a decolonialidade representa, em sua essência, a luta anticolonial em um processo de superação do colonialismo e de hierarquias naturalizadas. Quanto à terminologia em uso, tanto o conceito de decolonial quanto descolonial são empregados na literatura sobre o tema. Walsh (2013WALSH, Catherine (Ed.). Pedagogías decoloniales: prácticas insurgentes de resistir, (re)existir y (re)vivir. Tomo I. Quito, Ecuador: Ediciones Abya-Yala, 2013.: 24) argumenta que o termo decolonial enfatiza uma “luta contínua”, pois não seria possível apenas “desfazer” ou passar de um momento para o outro, como se existisse um “estado nulo de colonialidade”. Em vez disso, a abordagem decolonial propõe assumir posturas e engajar-se em projetos de resistência que permitam "transgredir, intervir, insurgir, criar e influenciar" (WALSH 2013WALSH, Catherine (Ed.). Pedagogías decoloniales: prácticas insurgentes de resistir, (re)existir y (re)vivir. Tomo I. Quito, Ecuador: Ediciones Abya-Yala, 2013.: 25). Dado que somos “programados” pela colonialidade, é vital ter consciência desse esquema colonial para resistir a ele.

Nesse sentido, as contribuições do grupo de intelectuais foram decisivas para incitar o debate em meio acadêmico. Alguns de seus integrantes são: Enrique Dussel, Aníbal Quijano, Walter Mignolo, Ramón Grosfoguel, Catherine Walsh e Nelson Maldonado Torres, entre outros. No entanto, há ainda uma série de estudos nessa direção sem a denominação específica de estudos decoloniais, que já abordavam temas e acenavam para aporte teórico e premissas semelhantes (ELIZALDE, FIGUEIRA & QUINTERO 2019ELIZALDE, Paz Concha; FIGUEIRA, Patricia; QUINTERO, Pablo. Uma breve história dos estudos decoloniais. São Paulo: Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, 2019.). Vale mencionar figuras brasileiras relevantes nesse cenário das pautas do debate colonial, como: Milton Santos, Lélia Gonzalez, Vera Candau, Davi Kopenawa, Ailton Krenak, Nego Bispo, Cida Bento para citar apenas algumas. Com efeito, pode-se afirmar que debates nessa direção em solo brasileiro já eram motivados pelo trabalho de Paulo Freire, com quem Catherine Walsh (2009WALSH, Caterine. Interculturalidade Crítica e Pedagogia Decolonial: in-surgir, re-existir e re-viver. In: CANDAU, V. M. (Org.) Educação Intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2009.) também dialoga. Em sua obra, Freire denunciava o apagamento de subalternos e pleiteava por uma práxis libertadora a partir do contexto de quem aprende (BARBOSA 2016BARBOSA, V. L. E. Modernidade, descolonialidade e educação popular: perspectivas da pedagogia da esperança de Paulo Freire. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 11, n. 1, 81-94, 2016. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/iberoamericana/article/view/8090 (30/11/2023).
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; FREIRE 1967FREIRE, P. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.; SILVA & NOLASCO 2022SILVA, Luã A. de O.; NOLASCO, E. C. Na fronteira da Desobediência Epistêmica: Paulo Freire e a Pedagogia do Oprimido. Cadernos de estudos culturais, v. 1, n. 27, 67-76, 2022), pautas comuns aos estudos decoloniais.

Na verdade, os próprios saberes indígenas e movimentos da população negra no Brasil já invocaram rupturas com a colonialidade no passado, porém suas vozes não foram ouvidas, nem legitimadas. Como bem aponta Antônio Bispo dos Santos ( 2018SANTOS, Antonio Bispo. Somos da terra. Piseagrama, Belo Horizonte, n. 12, 44-51, 2018.: 9), mais conhecido como Nego Bispo, a luta e a resistência contra a colonização são anteriores à contemporaneidade e remontam aos primeiros quilombos.

Saiu o primeiro navio negreiro, eis o primeiro quilombo. O primeiro aquilombamento foi ali dentro, com as pessoas reagindo, jogando-se dentro do mar, batendo e morrendo. Aí começou o quilombo. E Marx nem existia naquele tempo! (SANTOS 2018SANTOS, Antonio Bispo. Somos da terra. Piseagrama, Belo Horizonte, n. 12, 44-51, 2018.: 9)

Essa resistência dos povos indígenas e da comunidade negra impediu o apagamento da memória ancestral. Porém, na sociedade da escrita, o processo de denominação e de determinação de conceitos parece imperar. Por isso, Nego Bispo propõe o “jogo de contrariar palavras coloniais” (SANTOS 2023SANTOS, Antônio Bispo dos. A terra dá, a terra quer. São Paulo: Ubu Editora, 2023.: 3). Na disputa de denominação, o pensador quilombola (SANTOS 2023SANTOS, Antônio Bispo dos. A terra dá, a terra quer. São Paulo: Ubu Editora, 2023.) usa o termo "contracolonialidade" para se referir a um modo de vida e a uma experiência pessoal, mais do que a uma estrutura conceitual. Nego Bispo destaca como o processo privilegiado dos quilombos é um exemplo de contracolonialidade, já que eles nunca foram colonizados e não permitem que o colonialismo avance em seus espaços (SANTOS 2018SANTOS, Antonio Bispo. Somos da terra. Piseagrama, Belo Horizonte, n. 12, 44-51, 2018.). O processo de contracolonização empodera as pessoas. Nas palavras de Bispo, contracolonizar é “reeditar as nossas trajetórias a partir das nossas matrizes. E quem é capaz de fazer isso? Nós mesmos!” (SANTOS 2018SANTOS, Antonio Bispo. Somos da terra. Piseagrama, Belo Horizonte, n. 12, 44-51, 2018.: 9). Sendo assim, as nossas atitudes e posturas podem contribuir para essa “reedição”, desde que estejamos dispostos a nos deslocar na práxis diária.

Todavia, mesmo no âmbito do debate decolonial, será necessário se deslocar sempre, pois nada está pronto e dado. Silvia Rivera Cusicanqui (2021CUSICANQUI, Silvia R. Ch’ixinakax utxiwa: uma reflexão sobre práticas e discursos descolonizadores. São Paulo: n-1edições, 2021.) critica a produção acadêmica carente de urgência política (CUSICANQUI 2021CUSICANQUI, Silvia R. Ch’ixinakax utxiwa: uma reflexão sobre práticas e discursos descolonizadores. São Paulo: n-1edições, 2021.: 95), a manutenção de privilégios políticos e culturais tácitos (CUSICANQUI 2021CUSICANQUI, Silvia R. Ch’ixinakax utxiwa: uma reflexão sobre práticas e discursos descolonizadores. São Paulo: n-1edições, 2021.: 94) e a reprodução de padrões hegemônicos e estruturas coloniais também em discursos decoloniais, que acabam por criar “um novo cânone acadêmico, [...] que estabelece novas hierarquias e adota novos gurus” (CUSICANQUI 2021CUSICANQUI, Silvia R. Ch’ixinakax utxiwa: uma reflexão sobre práticas e discursos descolonizadores. São Paulo: n-1edições, 2021.: 105). Nesse sentido, é preciso estar vigilante para não permanecer no discurso teórico abstrato, distante da realidade. Nas palavras da autora, “Não pode haver um discurso da descolonização, uma teoria da descolonização, sem uma prática descolonizadora” (CUSICANQUI 2021CUSICANQUI, Silvia R. Ch’ixinakax utxiwa: uma reflexão sobre práticas e discursos descolonizadores. São Paulo: n-1edições, 2021.: 101).

Cientes de que a colonialidade sobrevive (OLIVEIRA & CANDAU 2010OLIVEIRA, L. F. De .; CANDAU, V. M. F. Pedagogia decolonial e educação antirracista e intercultural no Brasil. Educação em Revista, v. 26, n. 1, 15-40, 2010. Disponível em: Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0102-46982010000100002 (30/12/2023).
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:18) e de que “nossa reedição” será necessária se fizermos a “opção” decolonial, vale observar a práxis e verificar se reproduzimos um misto de “fascínio e alienação” diante do ideal eurocentrado universal, naturalizando esse imaginário e negando as próprias perspectivas. Como sujeitos subalternizados, a perspectiva eurocêntrica é comumente adotada e reverenciada, pois fomos “educados sob sua hegemonia” (OLIVEIRA & CANDAU 2010OLIVEIRA, L. F. De .; CANDAU, V. M. F. Pedagogia decolonial e educação antirracista e intercultural no Brasil. Educação em Revista, v. 26, n. 1, 15-40, 2010. Disponível em: Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0102-46982010000100002 (30/12/2023).
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: 19). Assim, exatamente por ser constituída pela colonialidade, opto por adotar o termo decolonial neste artigo, para evidenciar esse ponto de vista e marcar os deslocamentos em curso no processo de “identificar, interrogar e interromper” (MENEZES DE SOUZA, MARTINEZ & FIGUEIREDO 2019MENEZES DE SOUZA, Lynn Mario; MARTINEZ, Juliana; DINIZ DE FIGUEIREDO, Educardo. (Entrevista) "Eu só posso me responsabilizar pelas minhas leituras, não pelas teorias que eu cito": entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza (USP). Revista X, v. 14, n. 5, 5-21, 2019. Disponível em: Disponível em: https://revistas.ufpr.br/revistax/article/view/69230 (29/12/2023).
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) as amarras coloniais.

Em consonância com as perspectivas decoloniais, concebo a língua como uma força de transformação social em diálogo com diferentes realidades. Diante disso, pequenas atitudes podem ser adotadas em nossa prática para promover o diálogo auf Augenhöhe e os deslocamentos decoloniais. Assumir essa postura crítica não significa desprezar as contribuições do norte e ignorar nossos próprios processos de constituição. Como Menezes de Souza pontua, “o objetivo da decolonialidade é acabar com essa hierarquização, essa separação e não inverter os papéis [...], não é trocar uma norma por outra” (MENEZES DE SOUZA & HASHIGUTI 2023MENEZES DE SOUZA, L. M. T. .; HASHIGUTI, S. T. Decolonialidade e(m) Linguística Aplicada: Uma entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza. Polifonia, [S. l.], v. 29, n. 53, 149-177, 2023. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/14865 (29/12/2023).
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: 172). A proposta é ampliar a visão e ultrapassar os limites de “conceitos modernos e eurocentrados” (MIGNOLO 2008MIGNOLO, Walter D. Desobediência epistêmica: a opção descolonial e o significado de identidade em política. Cadernos de Letras da UFF - Dossiê: Literatura, língua e identidade, n. 34, 287-324, 2008.: 288), valorizando saberes locais e práticas linguísticas significativas para as pessoas envolvidas e percebendo a hierarquia vertical e hegemônica europeia, muitas vezes reforçada por nós, professores, em um processo de autocolonização e subjugação. Com isso, torna-se possível desestabilizar relações hierárquicas coloniais de poder, saber e ser, abrindo espaço para outras cosmologias e perspectivas.

Ao direcionar a atenção para o lócus de enunciação daquelas/es que estão aprendendo a língua, outros conhecimentos serão considerados e construídos, sem a rigidez de abstrações universais (cf. MENEZES DE SOUZA & HASHIGUTI 2023MENEZES DE SOUZA, L. M. T. .; HASHIGUTI, S. T. Decolonialidade e(m) Linguística Aplicada: Uma entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza. Polifonia, [S. l.], v. 29, n. 53, 149-177, 2023. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/14865 (29/12/2023).
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: 159). Com vistas a aproximar a discussão da prática pedagógica, evitando o isolamento no âmbito teórico acadêmico, exploro a necessidade de considerar esse lócus, “constituído por discursos e também por história” (MENEZES DE SOUZA & HASHIGUTI 2023MENEZES DE SOUZA, L. M. T. .; HASHIGUTI, S. T. Decolonialidade e(m) Linguística Aplicada: Uma entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza. Polifonia, [S. l.], v. 29, n. 53, 149-177, 2023. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/14865 (29/12/2023).
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: 169). Isso implica não apenas mudanças nas temáticas, nas formas de estudo e na partilha de saberes, mas também indica que o foco não está mais limitado a uma realidade idealizada em um país central considerado como modelo perfeito a ser replicado.

De fato, não se trata de um processo trivial para o contexto de educação linguística, pois a colonialidade pode representar uma zona de conforto e de manutenção de privilégios, na qual apenas serão reproduzidos conteúdos linguísticos sem reflexão, garantindo o espaço e o poder de línguas de prestígio. Ao se deslocar, busca-se o processo dialógico e sem hierarquias, no qual todos podem aprender a reaprender (MIGNOLO 2008MIGNOLO, Walter D. Desobediência epistêmica: a opção descolonial e o significado de identidade em política. Cadernos de Letras da UFF - Dossiê: Literatura, língua e identidade, n. 34, 287-324, 2008.: 290), sem a valorização de uma única forma de conhecimento e ponto de vista.

No âmbito da educação linguística em alemão no Brasil, percebe-se o desafio de lidar com currículos engessados, diretrizes e documentos padrões vinculados a centros de poder. Sob uma perspectiva decolonial, os padrões únicos devem dar espaço às variedades de línguas e contextos outros, trazendo à tona a vida e a história de subalternizadas/os, racializadas/os e invisibilizadas/os. Para a educação básica, essa é uma abordagem definida por lei pois, em março de 2008, o ensino da “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena” torna-se obrigatório (Lei Nº 11.645, de 10 de março de 2008). Entretanto,

Não existem leis no mundo que sejam capazes de erradicar as atitudes preconceituosas existentes nas cabeças das pessoas, atitudes essas provenientes dos sistemas culturais de todas as sociedades humanas. No entanto, cremos que a educação é capaz de oferecer tanto aos jovens como aos adultos a possibilidade de questionar e desconstruir os mitos de superioridade e inferioridade entre grupos humanos que foram introjetados neles pela cultura racista na qual foram socializados (MUNANGA 2005MUNANGA, Kabengele. Superando o racismo na Escola. 2ª ed. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. ).

Com efeito, a educação pode “girar a chave” e provocar deslocamentos necessários, pode desconstruir mitos e levar a repensar atitudes, conscientizando-nos de nossa história e dos efeitos de nossas ações. E a educação linguística tem seu papel ao abordar a língua em sua pluralidade, revelando diferentes modos de ser, pensar e significar, “nos distanciando de movimentos em direção à homogeneização” (MENEZES DE SOUZA & HASHIGUTI, 2023MENEZES DE SOUZA, L. M. T. .; HASHIGUTI, S. T. Decolonialidade e(m) Linguística Aplicada: Uma entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza. Polifonia, [S. l.], v. 29, n. 53, 149-177, 2023. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/14865 (29/12/2023).
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: 163).

Para desconstruir a lógica da colonialidade em educação linguística, é preciso também desconstruir a hierarquia entre línguas e sujeitos na direção a uma interculturalidade crítica e não meramente funcional (WALSH 2009WALSH, Caterine. Interculturalidade Crítica e Pedagogia Decolonial: in-surgir, re-existir e re-viver. In: CANDAU, V. M. (Org.) Educação Intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2009.), sendo essa última a mais difundida em diferentes espaços de ensino de línguas e materiais didáticos. Enquanto a interculturalidade funcional parece assumir um caráter integracionista, como ferramenta para controle de conflitos para manter a estabilidade e o status quo, a interculturalidade crítica problematiza “dispositivos e padrões de poder institucional-estrutural” (WALSH 2009WALSH, Caterine. Interculturalidade Crítica e Pedagogia Decolonial: in-surgir, re-existir e re-viver. In: CANDAU, V. M. (Org.) Educação Intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2009.: 21), geradores da desigualdade e da “diferença (colonial, não simplesmente cultural)” (WALSH 2009WALSH, Caterine. Interculturalidade Crítica e Pedagogia Decolonial: in-surgir, re-existir e re-viver. In: CANDAU, V. M. (Org.) Educação Intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2009.: 21). Não se trata apenas de abordar a “relação entre culturas” ou a “incorporação de excluídos” dentro das estruturas educativas, mas de enfrentar as estruturas de poder e a “lógica racial, moderno-ocidental e colonial”, que oculta as desigualdades e mantém a negação e a subalternização de povos racializados (WALSH 2009WALSH, Caterine. Interculturalidade Crítica e Pedagogia Decolonial: in-surgir, re-existir e re-viver. In: CANDAU, V. M. (Org.) Educação Intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2009.: 23-24).

Ao ensinarmos uma língua europeia, somos confrontados com uma história de colonização, permeada por relações de poder, explícitas ou não, e por relações de dependência irrefletida, que podem refletir na adoção de materiais didáticos, na formação inicial e continuada de professores, bem como nas metodologias e estratégias da prática pedagógica. Isso inclui, por exemplo, a crença de que pesquisas realizadas por especialistas com alcance global possuem maior respaldo e legitimidade na busca por soluções locais (NUNES 2022NUNES, E.C.R. Entre "becos sem saídas" e o "pulo do gato": Criatividade Local e mentoria na formação inicial de professores de alemão no Brasil. Tese (Doutorado em Língua e Literatura Alemã) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2022. doi:10.11606/T.8.2021.tde-11032022-212301 (03/06/2024).
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: 60).

No que diz respeito aos materiais didáticos, identifica-se uma lacuna local. Embora novos projetos ensejem a mudança de direção para o contexto brasileiro, buscando diversidade de temas e a reflexão crítica de aprendizes, há uma demanda latente nesse âmbito, corroborada em diferentes estudos (AQUINO & FERREIRA 2023AQUINO, M.; FERREIRA, M. Ensino de alemão com foco decolonial: uma discussão sobre propostas didáticas para o projeto Zeitgeist. Domínios de Lingu@gem, vol. 17, e1709, 2023. DOI: 10.14393/DLv17a2023-9. Disponível em: Disponível em: https://seer.ufu.br/index.php/dominiosdelinguagem/article/view/66610 (30/12/2023).
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; FREITAS & BUHUNOVSKY 2023FREITAS, A. De; BOHUNOVSKY, R. Conchita Wurst: gênero e diversidade no ensino de alemão no Brasil. Pandaemonium Germanicum , São Paulo, v. 27, n. 51, 1-26, 2023. Disponível em: Disponível em: https://www.revistas.usp.br/pg/article/view/217978 (30/12/2023).
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). De modo geral, os livros didáticos em língua alemã são produzidos para atender um público também “universal” e, para a aceitabilidade ser possível em diferentes contextos, temas “polêmicos” parecem ser apagados e evitados.3 3 São os conteúdos representados pela sigla PARSNIPS: política, alcoolismo, religião, sexo, narcóticos, -ismos e carne de porco, como hábitos culturais alimentares (NUNES 2022: 190). Além disso, as imagens de aprendizes criam um sujeito distante de seu lócus de enunciação, alinhado ao perfil desejável para o contexto europeu, como: o “aprendiz-consumidor-turista”, os “trabalhadores temporários” ou um “mero espectador, que se ocupará de repetir sentenças e estruturas determinadas por uma simulação artificial de situações comunicativas” (ARANTES 2018ARANTES, P. C. C. Imagens de aprendizes de ALE em livros didáticos e o disciplinamento dos saberes. Pandaemonium Germanicum, v. 21, n. 34, 1-30, 2018. Disponível em: Disponível em: http://www.revistas.usp.br/pg/article/view/143789 (29/11/2023).
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: 1).

Certamente, produzir materiais locais e construir uma base transdisciplinar, direcionada para a educação linguística crítica e decolonial, em um currículo muitas vezes engessado, é tarefa desafiadora4 4 Diferentes projetos estão em andamento com o objetivo de desenvolver material didático para língua alemã do e no Brasil. O grupo de pesquisa Zeitgeist empenha-se na discussão e na elaboração de um livro didático de alemão específico para o ambiente acadêmico brasileiro (AQUINO; FERREIRA 2023). Outra iniciativa na produção de materiais didáticos está sendo conduzida pelo Centro Austríaco, situado na Universidade Federal do Paraná (FREITAS; BUHUNOVSKY 2023). Além disso, experiências de outros contextos e línguas podem servir de inspiração para projetos na área de alemão, a exemplo da criação do livro "Black Matters Matter" (SANTOS, 2023), que propõe abordagens didático-pedagógicas alinhadas às bases legais da educação no Brasil. Esse material enfoca o ensino da língua inglesa considerando as questões étnico-raciais, a história e a cultura afro-brasileira e africana, em conformidade com a Lei nº 10.639/03. . Afinal, o padrão colonial, ao estabelecer relações de poder, molda a subjetividade, impõe hierarquias, privilegiando perspectivas eurocêntricas e marginalizando outros saberes vistos como subalternos. Daí a importância de reconhecer como essa colonialidade impacta a prática pedagógica, buscando interações com diversos interlocutores, fortalecendo iniciativas e compartilhando ações pedagógicas na experiência situada5 5 O GEPELAB, Grupo de Estudos e Pesquisa de Ensino de Língua Alemã no e do Brasil, tem como foco discussões teóricas e práticas em torno das perspectivas decoloniais no Brasil. Recentemente, foi publicado um dossier sobre algumas contribuições: Ensino de alemão e de línguas teuto-brasileiras no Brasil: decolonialidades em curso. Disponível em: https://revista.uemg.br/index.php/sulear/issue/view/482 (30/12/2023). .

Nessa linha de pensamento, compartilho nas próximas seções o desenvolvimento das práticas didáticas no curso de graduação em Letras Alemão, com o propósito de socializar e discutir sobre formas possíveis de integrar perspectivas descolonizantes nesse contexto.

3 Procedimentos metodológicos

Nesta seção, delineio brevemente o percurso metodológico para a condução das práticas pedagógicas propostas no curso de graduação em Letras Alemão no sul do Brasil, assim como os instrumentos para registro e análise dos resultados. Considerando as interações humanas construídas no contexto social específico, situo este trabalho no âmbito de uma pesquisa exploratória e interpretativista.

Nessa perspectiva, adoto a posição de professora pesquisadora, conforme proposto por Kumaravadivelu (2012KUMARAVADIVELU, B. Language teacher education for a global society: A modular model for knowing, analyzing, recognizing, doing, and seeing. New York: Taylor & Francis, 2012.: 10). Ao levantar questões intrigantes, registrar e observar como as ações reverberam a práxis pedagógica, não tenho a pretensão de sugerir práticas “melhores” (KUMARAVADIVELU 2012KUMARAVADIVELU, B. Language teacher education for a global society: A modular model for knowing, analyzing, recognizing, doing, and seeing. New York: Taylor & Francis, 2012.: 86), mas de poder compreender, teorizar e compartilhar experiências da prática, nos moldes da pesquisa-ação.

Pela dimensão do artigo e a natureza da proposta, não apresentarei as sequências didáticas na íntegra. Ofereço apenas um recorte de cada uma delas, abordando dois momentos distintos em sala de aula. Os dados foram gerados por meio de diferentes instrumentos com base em observações participantes, registros em diário de bordo, conversas informais, além de apontamentos e reflexões sobre a produção e aplicação de material didático próprio, ativando informações introspectivas e retrospectivas sobre a experiência pedagógica.

Atendendo a princípios éticos, não será possível identificar as/os participantes. Portanto, restrinjo-me a compartilhar as atividades e a síntese de comentários espontâneos das/dos estudantes como base para a discussão. As atividades propostas foram elaboradas para a disciplina de língua alemã para a terceira fase, com ênfase na prática de conversação para o nível A2 do Quadro Comum Europeu de Referência. Os objetivos dessas práticas não se restringiam apenas a uma abordagem linguística, mas buscavam acessar a experiência de cada participante com relação ao tema e em interação com as/os demais, promovendo o debate e a reflexão conjunta.

Durante as experiências no primeiro semestre de 2023, observei momentos de estranhamento, conscientização, deslocamentos e envolvimento em sala de aula, para além de aquisições linguísticas. A expressão de opiniões, a percepção de apagamentos na história e a relevância social dos temas contribuíram para o envolvimento e a participação ativa das/dos estudantes. Ao incorporar saberes locais no processo de aprendizagem do alemão ou quebrar paradigmas relacionados a um imaginário tipicamente germânico (especialmente da Alemanha), foi possível promover reflexões sobre o encontro com outras perspectivas e histórias.

A concepção e aplicação das duas atividades, bem como os impactos e efeitos observados no contexto universitário serão detalhados a seguir.

4 Discussão dos dados e compartilhamento de práticas pedagógicas

Para a análise dos dados, as práticas pedagógicas são relatadas em dois momentos (Umweltschutz e Afrodeutsch), divididos em três etapas. Primeiro, em cada um desses momentos, apresento um breve relato da experiência de sala de aula com base na atividade aplicada. A partir dessa vivência, indico sugestões para ampliar a proposta inicial, considerando deslocamentos na prática docente e a inclusão de materiais complementares. Por fim, discuto os efeitos das escolhas pedagógicas e as consequências para a práxis e para as pessoas em interação.

Contrariamente a um modelo de artigo tradicional, este trabalho aborda temas intrincados, expondo indagações e reflexões em desenvolvimento. Ao revisitar esses momentos, faço o “mea culpa”, reconhecendo as limitações do “alto de minha branquitude” (MENEZES DE SOUZA & HASHIGUTI 2023MENEZES DE SOUZA, L. M. T. .; HASHIGUTI, S. T. Decolonialidade e(m) Linguística Aplicada: Uma entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza. Polifonia, [S. l.], v. 29, n. 53, 149-177, 2023. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/14865 (29/12/2023).
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: 168), encarando desconfortos e admitindo desconhecimentos.

4.1 Momento 1: Umweltschutz

A primeira proposta foi elaborada com base no tema escolhido em conjunto: Umweltschutz (preservação do meio ambiente). Este assunto é recorrente nos livros didáticos alinhados às diretrizes europeias, já que está contemplado no Quadro Comum Europeu de Referências (2001: 58), junto com outros temas, como: moradia, cotidiano, lazer, viagens, saúde e higiene, formação, compras, comida e bebida, etc.

Em linhas gerais, os materiais convencionais exploram diversos aspectos do contexto europeu relacionados à separação de resíduos, às energias renováveis, à preservação de florestas, à despoluição de rios e à crise climática, apresentando temas pertinentes e indispensáveis para educação linguística, se abordados sob o viés da interculturalidade crítica. Em geral, nota-se a preocupação com a temática ambiental relacionada a práticas de produção e ao consumo sustentáveis, muitas vezes, associadas à adoção de medidas individuais6 6 Alguns livros consultados: Menschen B1 (Hueber), Weltblick B2 (Cornelsen), Das Leben A2 (Cornelsen) e Vielfalt B1+ (Hueber). . Basta consultar os sumários de alguns livros didáticos para verificar a forma de abordagem. As discussões giram em torno de temáticas como: Bewusst konsumieren, nachhaltiger Konsum, Klimawandel, umweltfreundlich handeln, Fahrrad fahren ist in, usw.

Para a discussão, destaco uma fase específica das sequências didáticas propostas para o grupo de estudantes, retomando momentos deste trabalho. De início, o debate foi instigado por meio de ilustrações que evidenciavam a influência humana no mundo, como o excesso de plástico nos rios e mares, juntamente com manchetes de jornais e revistas. Posteriormente, conduziu-se um trabalho de levantamento de vocabulário e sensibilização para o tema, seguindo uma abordagem nos moldes das palavras geradoras de Freire (1967FREIRE, P. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.). Essa abordagem inicia-se com o levantamento de palavras e estruturas significativas e pertinentes ao grupo naquele momento, evoluindo para tópicos e argumentos destinados à discussão. Algumas questões provocadoras também foram lançadas de antemão, tais como: Was ist Umweltbildung? Welche Rolle spielen wir in diesem Prozess? Welche lokalen Projekte sind für den Naturschutz relevant? Outras questões foram formuladas pelas/os próprios estudantes, como: Wer ist am stärksten von Umweltbelastungen betroffen? Warum produzieren wir so viel Müll?

Após o levantamento de vocabulário específico e de recursos para argumentação e expressão de opiniões, as/os estudantes se organizaram em duplas para discussão. Em uma etapa subsequente, participaram de uma roda de conversa, conduzindo a discussão com base nas perguntas previamente elaboradas. É importante ressaltar que todas as interações ocorreram em alemão, utilizando vocabulário adquirido durante as atividades, por meio de diálogos com colegas e pesquisas na internet. O interesse em se expressar em alemão sobre o tema, buscando as palavras adequadas e meios para expressar opiniões, foi notável. Certamente, tanto o ambiente do grupo quanto a temática em questão contribuíram para esse engajamento, mantendo o foco na comunicação e na reflexão conjunta.

Para além de ações individuais, as discussões e críticas destacaram aspectos como a devastação causada por grandes cartéis, o impacto do agronegócio e o consumo excessivo, trazendo à tona questões negligenciadas em espaços que privilegiam a manutenção de um status quo, em uma conjuntura neoliberal focada no lucro a qualquer preço. Nas palavras de um estudante do grupo: "Não se trata apenas de fechar a torneira ao escovar os dentes; é necessário intimar as grandes empresas e aqueles que lucram com a exploração do meio ambiente".

Evidenciando a importância de observar nosso entorno, buscamos ainda projetos locais alinhados com a preservação ambiental. Foram apresentadas iniciativas ambientais escolares no bairro, ações de coleta de lixo e de preservação da flora local, além de projetos de maior abrangência, como o Projeto Tamar em Florianópolis, voltado para a proteção de tartarugas marinhas (https://www.tamar.org.br/).

Embora tenham sido exploradas perspectivas e projetos locais, considero necessário expandir a proposta original para abranger saberes e ações que denunciem formas de dominação e exploração. Projetos locais geralmente não são contemplados, uma vez que os materiais convencionais são direcionados a um público mais amplo e “universal”. Da mesma maneira, parece não haver espaço para a perspectiva valiosa de especialistas de destaque na área de preservação: os povos indígenas. É preciso reconhecer a importância de incorporar nessa discussão os conhecimentos indígenas, os quais há tempos nos alertam para a necessidade de transformar o estilo de vida da humanidade. Apesar de haver iniciativas locais nesse sentido, observa-se que essas ações ainda se apresentam de forma limitada7 7 Para mencionar um exemplo: O coletivo “Gestos rumo a futuros decoloniais” (https://decolonialfutures.net/) tem reunido pesquisadores, professores, indígenas, artistas e outros. Dentre as propostas do grupo, são exploradas possibilidades educativas na perspectiva de estudos decoloniais. .

Conforme mencionado anteriormente, a colonialidade do saber apaga a sabedoria e a vivência de especialistas locais do Sul global, assim como a luta de povos indígenas e quilombolas pela preservação de seus territórios e florestas. Nesse sentido, para enriquecer a proposta em uma abordagem decolonial e crítica, proponho a inclusão de discussões sobre os modos de vida dessas comunidades que podem representar alternativas e soluções valiosas no atual período histórico do planeta, definido por algumas/alguns estudiosas/os como a era do Antropoceno8 8 O termo Antropoceno, proposto pelos cientistas Paul Crutzen e Eugene Stoermer (2015), representa a era em que as ações humanas na civilização industrial e capitalista causam enormes impactos e transformações na Terra, conduzindo à crise ecológica com suas drásticas consequências. Recomendo o material “Habitar o Antropoceno” para se inteirar sobre o assunto a partir de diferentes perspectivas (MOULIN et al. 2022). . Este período é caracterizado pela degradação ambiental resultante da ação humana, alcançando níveis catastróficos e desencadeando consequências desastrosas nos dias atuais.

As cosmologias indígenas, ao se oporem e resistirem às práticas antropocêntricas e capitalistas, emergem como importantes contrapontos nesta discussão. De fato, a sociedade moderna estabeleceu uma separação entre a humanidade e a natureza. É crucial reconhecer-nos como parte desse mundo e aprender com aqueles que ainda mantêm uma integração profunda com seres, plantas, animais, minerais e toda a energia cósmica. Esses grupos, por sua vez, encontram-se entre os mais vulneráveis, seja devido à contaminação das águas, dos solos ou do ar em ataques químicos.

O impulso para desenvolver a atividade descrita a seguir surgiu dessas reflexões e também a partir de conversas com Prof. Milan Puh na ocasião de meu estágio de docência na Universidade de São Paulo9 9 O relato de experiência de estágio docente foi publicado no artigo em parceria com Prof. Milan Puh (PUH & NUNES 2022): https://www.seer.ufal.br/index.php/debateseducacao/article/view/14201. (03/06/2024). . Em uma atividade com as/os estudantes, foi produzida uma sequência didática sobre mercados alternativos e projetos sustentáveis. Na época, o professor lamentou o fato de abordamos tão pouco as formas de ser e viver de povos indígenas e quilombolas. Com base nessas reflexões, foi realizada a pesquisa por material adequado à proposta. A partir dessa experiência de diálogos com colegas, constato a relevância de desviar nossos olhares e perceber o nosso contexto local, valorizando compartilhamentos de ideias e saberes.

O material sugerido10 10 O referido material faz parte de uma oficina ministrada em 2023 no congresso de professores de alemão da ABRAPA (Probieren geht über Studieren: Impulse für einen kritisch-reflexiven Deutschunterricht). A oficina foi concebida em parceria com a Profª Louise Ibrügger, com quem aprendo em muitos compartilhamentos. é referente a uma entrevista com Davi Kopenawa, xamã e líder espiritual do povo indígena Yanomami do Brasil para o podcast da SWR Kultur (VON LÜPKE 2020VON LÜPKE, G. Im Gespräch mit Davi Kopenawa. 2020, Podcast SWR2 Wissen. Disponível em: Disponível em: https://www.swr.de/swr2/wissen/davi-kopenawas-kampf-fuer-die-indigenen-im-amazonasgebiet-100.html (31/12/2023).
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). Durante a entrevista, Kopenawa discorre sobre a magia de sua terra natal, as florestas brasileiras, e sua incansável defesa pelos povos indígenas, que o levou a viajar pelo mundo. A incorporação desse podcast pode proporcionar aos estudantes informações sobre a cultura Yanomami no Brasil, contribuindo para a ampliação da consciência em relação à vida das comunidades indígenas brasileiras e seus modos de vida. Na página, é possível acessar o áudio e a transcrição da entrevista em alemão.

O trabalho com esse material pode assumir diversas formas, incluindo a elaboração de perguntas prévias à audição e a análise de trechos e temas para discussão em grupo. Em uma etapa posterior, os alunos podem realizar pesquisas independentes sobre outras comunidades indígenas, inclusive em suas localidades, buscando compreender a importância de suas ações para o Umweltschutz e a condição atual desses povos diante de tantos ataques e ameaças.

Figura 1:
Davi Kopenawa

Outra fonte rica e inesgotável de material reside no patrimônio cultural indígena11 11 Recomendo explorar o canal https://tepi.digital/. A terceira edição do TePI - Teatro e os Povos Indígenas ressalta a importância do protagonismo artístico indígena em diversas formas de expressão e representação. Durante o período de 2021 a 2022, foi desenvolvida a plataforma que disponibiliza uma ampla gama de produções, como espetáculos, conversas, palestras, textos, vídeo-pílulas, e-books e dramaturgias inéditas. . A título de exemplo, destaco a obra "Natureza Morta" do artista indígena Denilson Baniwa. A partir dessa obra, podemos indagar: Welche Geschichten können sich aus diesem Bild ergeben? Was symbolisiert es?

Figura 2:
Denilson Baniwa

A expressão artística pode servir como fonte inspiradora para o desenvolvimento de atividades, para propostas de projetos e discussões, além de dar visibilidade à produção cultural dessas comunidades. Da mesma forma, é crucial reconhecer os projetos locais liderados por povos indígenas no palco desta discussão. Um exemplo nesse sentido é o trabalho de mulheres indígenas, como Jerá Guarani (pedagoga pela USP, agricultora e líder na Terra Indígena Tenondé Porã), que promove práticas agrícolas junto à sua comunidade na cidade de São Paulo. Ao invés de abordar histórias fictícias e personagens desconhecidos presentes nos livros didáticos, considero relevante apresentar vidas e projetos reais e locais. Esses elementos podem integrar o repertório de recursos linguísticos, contribuindo para uma consciência mais ampla, para além das fronteiras da sala de aula. O trecho seguinte foi selecionado e traduzido para um trabalho futuro sobre Steckbrief (informações pessoais).

Ich möchte mehr Menschen dazu aufrufen, wild zu sein. Unser Planet, so wie er ist, leidet sehr, er weint, er schreit, und weil wir mit ihm verbunden sind, müssen wir anfangen zu leben, zu sehen, zu wissen und uns auch mit vielen negativen Dingen auseinanderzusetzen. Ich rauche eine Pfeife, mache Feuer auf dem Boden, koche, schlafe und wache mit dem Gesang der Vögel auf. Und alles ist so einfach, aber es ist so schön, so wunderschön, so wichtig... (GUARANI, 2022GUARANI, Jerá. Para nós, o futuro é indígena. In: MOULIN, G. et al. Habitar o Antropoceno. Belo Horizonte: BDMG Cultural/ Cosmopolis, 2022, p. 9-21.)12 12 Do original: Gosto de chamar mais pessoas para serem selvagens. O nosso planeta, do jeito que está, está sofrendo muito, está chorando, está gritando, e, por estarmos integrados com ele, vamos ter que começar a viver, a ver, a saber e a ter que enfrentar muitas coisas negativas também. Fumo cachimbo, faço fogo no chão, cozinho, durmo e acordo com a cantoria dos passarinhos, e tudo isto é tão simples, mas é tão bonito, tão lindo, tão importante (Tradução minha). .

De fato, textos em alemão com essa perspectiva podem não estar disponíveis para o uso em sala de aula. Contudo, essa eventual limitação não deve impedir a seleção e elaboração de materiais, desde que seja possível e haja disposição para traduzi-los, caso se adequem na proposta.

Vale mencionar que, ao longo das atividades, discutimos sobre uma possível subestimação de estudantes em relação ao trabalho com textos nos níveis iniciais. Embora os textos selecionados fossem complexos, com vocabulário específico, o tema despertou interesse e a língua não se apresentou como um obstáculo à comunicação. Para tanto, as/os estudantes utilizaram estratégias de leitura, recursos digitais, troca de experiências pessoais e conversas no grupo para aprofundar a compreensão sobre o assunto.

A partir dessas constatações, reconhecemos movimentos a serem feitos. É preciso reconhecer o papel do racismo e da exploração de terras indígenas na colonialidade, que segue fundamentada na destruição do meio ambiente. Além disso, é preciso buscar fontes de materiais não convencionais que ampliem a visão restrita de fontes desatualizadas. Esse trabalho pode envolver estudantes e comunidade numa versão mais ampla, inclusive em projetos de extensão e ações conjuntas. São temas que necessitam ser incorporados à discussão sobre Umweltschutz em diversas esferas educacionais, abrindo espaço para outros conhecimentos e desestabilizando os centros de poder, ser e saber.

4.2 Momento 2: Afrodeutsch

A segunda proposta desenvolvida com o grupo de estudantes tinha como objetivo estudar o gênero reportagem e o movimento Afrodeutsch na Alemanha13 13 Termo empregado pela primeira vez no livro: Farbe bekennen: afro-deutsche Frauen auf den Spuren ihrer Geschichte, publicado pela primeira vez em 1986 por May Ayim, Katharina Oguntoye e Dagmar Schultz, uma obra de referência do movimento de mulheres afro-alemãs. . Nesse contexto, o debate foi conduzido com base em uma série de reportagens sobre temas antirracistas e sobre vivências da comunidade negra na Alemanha, disponíveis em documentários e textos da Deutsche Welle - DW (https://www.dw.com/de/themen/s-9077)14 14 Abro aqui um parêntese para algumas observações. Para abordar essa questão, busquei estabelecer diálogo com especialistas, fundamentando-me nas obras de Cida Bento (2022) e Bárbara Carine S. Pinheiro (2023). Apesar de a legislação garantir a inclusão desse tema no contexto brasileiro, percebo uma lacuna em debates e espaços de formação sobre educação antirracista no âmbito da língua alemã. Neste momento, faço minha segunda autocrítica a partir do espaço privilegiado que ocupo: quantos autores e autoras da população negra foram incorporadas/os em minhas bibliografias? Em que momentos reproduzi discursos fundamentados na meritocracia e na perspectiva dos privilégios da branquitude? Até que ponto limitei minha visão ao cânone branco, europeu e masculino, sem explorar outras produções e fontes diversas? Termino esse adendo com algumas reticências. .

Na ocasião da atividade, os participantes escolheram reportagens da DW para apresentação em um formato de grupo dinâmico, conhecido como Wirbelgruppe. A habilidade de sintetizar e destacar as informações principais são requisitos essenciais para a proposta. O grupo principal é subdividido em grupos menores para debaterem o tópico internamente. Ao concluir a atividade nos grupos menores, novas equipes são formadas, sendo que pelo menos um representante de cada grupo inicial se junta a cada novo grupo. As pessoas alternam suas posições ao longo do tempo.

Ao final, reunidos em círculo para uma discussão, as/os estudantes compartilharam as informações-chave, sintetizadas em um mapa mental coletivo. Apesar de o levantamento ter sido realizado em alemão, não havia restrição para que as pessoas fizessem questionamentos ou comentários em português.

Uma das reportagens selecionadas pelos estudantes da DW abordou o tema “exposições humanas”15 15 Reportagem disponível em: https://www.dw.com/de/v%C3%B6lkerschauen-menschen-zur-schau-gestellt-wie-im-zoo/a-17187997 (01/03/2024) , uma realidade até meados do século XX em muitos países europeus. Ao depararem-se com a informação, as/os estudantes expressaram choque diante do horror da exposição de corpos, uma prática que legitimava a invasão, o exotismo, a exploração de corpos e a racialização de povos africanos. O impacto dessa reportagem se manifestou no silêncio e nos olhares horrorizados, revelando retratos de uma história pouco conhecida entre os aprendizes da língua alemã. Esse enfrentamento doloroso diante desses fatos traz à tona os privilégios usufruídos, causando inquietação e incertezas sobre como tratar do assunto do alto da branquitude, que “reprime, esconde tudo que é intolerável para ser suportado e recordado pelo coletivo” (BENTO 2022BENTO, Cida. Pacto da Branquitude. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.: 25).

Diante do impacto contínuo da exploração e discriminação racial na vida das pessoas ontem e hoje, é preciso denunciá-la, embora essa não seja nossa única tarefa. Seguindo a perspectiva de Bárbara Carine S. Pinheiro, é essencial expor os processos de apagamento, discriminação, violência e silenciamento. No entanto, é crucial não nos limitarmos a essa abordagem. Devemos nos afastar da representação negra presente no currículo tradicional, que muitas vezes destaca a vitimização e submissão. Urgem outras representações na luta antirracista. É preciso falar de potência, do pioneirismo no mundo, “dos conhecimentos antepassados que fundaram as ciências em África” (PINHEIRO 2023PINHEIRO, Bárbara Carine Soares. Como ser um educador antirracista. São Paulo: Planeta do Brasil, 2023.: 45)16 16 Bárbara Carine Soares Pinheiro escreveu livros sobre a abordagem decolonial e antirracista. No “História preta das coisas”, a autora discorre sobre produções científico-tecnológicas sob a afroperspectiva e problematiza as bases intelectuais ocidentais. . A força e da luta desses povos racialmente marginalizados precisam constar em materiais e discussões.

Para uma educação linguística antirracista, é crucial reconhecer a língua como um instrumento de reflexão e resistência para criar um ambiente educacional que promova justiça social. As práticas localizadas podem se sintonizar com a língua, com as histórias locais e com as pessoas situadas neste espaço. Nessa esteira, podem ser exploradas figuras proeminentes mais próximas do nosso contexto que representem essa luta. Em nosso contexto sulino, há uma série de histórias invisibilizadas. A título de exemplificação, embora nos últimos anos tenham ocorrido homenagens a personalidades negras de destaque na história em murais de edifícios na capital catarinense, é válido questionar quem, de fato, está familiarizado com essas trajetórias e o legado de figuras como Antonieta de Barros e Cruz e Souza.

Considerando que a sala de aula não é isolada da realidade do mundo e que, frequentemente, contribuímos para a perpetuação de diferenças, padrões prescritos e discursos estereotipados, torna-se evidente a necessidade de adotar práticas de descolonização. Essas práticas visam fomentar ações e transformações nos nossos ambientes educacionais, englobando, assim, abordagens antirracistas. Para uma compreensão mais aprofundada sobre como as estruturas coloniais foram historicamente construídas e ainda persistem, é crucial revisitar nossa história, reconhecendo diferentes saberes e culturas com um olhar crítico em relação aos problemas sociais.

Com efeito, esses movimentos não são “confortáveis” e vozes contrárias a essa abordagem podem surgir em diferentes contextos. No entanto, se pretendemos incitar o pensamento crítico e a transformação social, não podemos reduzir nosso trabalho a conteúdos linguísticos descontextualizados e sem reflexão.

Dentre os reconhecimentos dessa experiência, percebo o quanto necessito aprender com pessoas negras e indígenas, reconhecendo o potencial mobilizador que isso pode proporcionar em nossas aulas de língua. Considerando estratégias e ações conjuntas com minhas/meus estudantes negras/os e colegas negras, percebo a importância da conscientização e da desconstrução dos privilégios. Reconheço o esgotamento e a justa indignação ao ter que educar a branquitude sobre essas questões. De fato, a necessidade de aprofundar nossos estudos é evidente.

Não se trata apenas de prezar pela representatividade. Certamente, esta é imprescindível, uma vez que, como destaca Pinheiro (2023PINHEIRO, Bárbara Carine Soares. Como ser um educador antirracista. São Paulo: Planeta do Brasil, 2023.: 20): "onde a gente não se vê, a gente não se pensa, não se projeta". Contudo, é fundamental que essa representação não seja apenas uma presença superficial, como frequentemente ocorre em propagandas, websites e materiais didáticos. Novamente, torna-se necessário questionar esses espaços e conceber práticas pedagógicas que abordem criticamente o privilégio branco (PINHEIRO 2023PINHEIRO, Bárbara Carine Soares. Como ser um educador antirracista. São Paulo: Planeta do Brasil, 2023.: 35-36).

Nessa esteira, pequenas atitudes podem contribuir, como: reconhecer a presença da língua alemã em diferentes espaços, inclusive em antigos territórios colonizados; procurar maneiras de não marginalizar narrativas históricas e, principalmente, se reconhecer nessa história. Encontro-me nesse processo de aprendizado, situando-me neste contexto e reconhecendo uma narrativa que me influencia, uma vez que, além de ser descendente de imigrantes alemães, possuo uma herança afroindígena proveniente da família paterna, sobre a qual pouco foi revelado.

De modo geral, as conversas baseadas na atividade incitaram a reflexão sobre problemas enfrentados diariamente por pessoas negras e desvelaram a falácia da democratização racial no Brasil. Outro aspecto observado nesta atividade foi o interesse em conhecer os diversos espaços falantes da língua alemã, fora da Europa, destacaram-se as narrativas sobre comunidades alemãs na Papua-Nova-Guiné ou em nações do continente africano, bem como em nossos espaços brasileiros, incentivando a reflexão sobre essas interconexões.

Nos moldes dessas atividades, outros encontros foram programados com o grupo de estudantes. A promoção da autoconfiança e a disposição para se expressar em alemão contribuíram para a participação ativa dos aprendizes. O foco principal era assegurar que a mensagem fosse compreendida pelos interlocutores, permitindo o debate e o fluxo comunicativo.

Dentro do escopo desta disciplina, também foram produzidos podcasts para incentivar a expressão oral e o diálogo entre os diversos estudantes da língua. A partir desse trabalho, surge como um projeto de extensão a proposta de reunir e divulgar produções de estudantes nos diferentes contextos e disciplinas. Publicações digitais podem desempenhar um papel significativo nesse percurso, especialmente quando organizadas pelos próprios estudantes17 17 No último ano, um trabalho em parceria com as universidades de Augsburg e de Yaoundé I em Camarões reunindo estudantes das três universidades em diálogo. O resultado desse primeiro encontro está em nosso canal do YouTube: https://www.youtube.com/channel/UCyf6QtCAc2TTbb4ChGzufVw (01/03/2024) .

Com base nas atividades aqui descritas, evidenciou-se a necessidade de perceber outras facetas históricas de países falantes da língua alemã, uma língua que transcende as fronteiras de um país central. Por certo, pode ser desafiador abrir esse espaço para discussão, já que nem todos estão dispostos a realizar esses deslocamentos. Por outro lado, é um processo enriquecedor observar quando a língua deixa de ser uma barreira e torna-se uma ponte que conecta pessoas e comunidades.

5 Algumas considerações

Neste momento de insurgências, busquei respaldo no debate teórico decolonial para orientar a discussão no âmbito da educação linguística, com ênfase na língua alemã. Com o intuito de compreender as direções e escolhas pedagógicas, revisitei momentos da práxis que sinalizaram mudanças de rumo e deslocamentos em sala de aula.

Como mencionado inicialmente, não são oferecidas respostas e afirmações conclusivas neste artigo. Em sintonia com a abordagem proposta, adoto um tom de conversa, optando por uma escrita mais próxima das pessoas com as quais dialogo, com o intuito de estimular a reflexão conjunta e promover o engajamento na discussão.

Caso a “opção” seja caminhar para uma abordagem crítica e decolonial em educação linguística, é imprescindível reconhecer as dinâmicas que nos levam a reproduzir e perpetuar estruturas coloniais estáveis, homogêneas e hegemônicas em nossos espaços. A partir da análise de ações pedagógicas e dos materiais didáticos empregados, pode-se compreender de que maneira esses têm impactado (ou impedido) o debate, atentas/os a eventuais descompassos entre o discurso e a prática.

Para que a decolonialidade não se torne apenas uma “roupa da moda” (MENEZES DE SOUZA & HASHIGUTI 2023MENEZES DE SOUZA, L. M. T. .; HASHIGUTI, S. T. Decolonialidade e(m) Linguística Aplicada: Uma entrevista com Lynn Mario Trindade Menezes de Souza. Polifonia, [S. l.], v. 29, n. 53, 149-177, 2023. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/14865 (29/12/2023).
https://periodicoscientificos.ufmt.br/oj...
: 168), o discurso teórico deve se traduzir em ações práticas concretas e transformações sociais. Nesse sentido, pequenas atitudes diárias podem abrir caminhos ao considerar nosso espaço local e as questões que nele surgem, pleitear por justiça social, além de visibilizar diferentes saberes em práticas plurais. Nesse cenário, será preciso construir mecanismos para compreender e engajar-se na luta antirracista e decolonial. O combate ao racismo e a reflexão sobre o lócus de enunciação são elementos essenciais nessa dinâmica.

Ao experimentar no espaço local e construir pontes para além dos muros da universidade, abre-se espaço para a cooperação com espaços vizinhos, promovendo parcerias no Sul global, sem criar ou perpetuar centros de poder idealizados, mas cultivando relações pautadas em diálogo e respeito mútuo. A ideia é ampliar as opções para uma "confluência de saberes", conforme expresso por Nego Bispo (SANTOS 2018SANTOS, Antonio Bispo. Somos da terra. Piseagrama, Belo Horizonte, n. 12, 44-51, 2018.), fomentando uma aprendizagem coletiva e flexível. Esse movimento de resistência à lógica da modernidade/colonialidade assume diferentes dimensões: teórica, prática, política, ética, ontológica e epistemológica.

Ao revisitar as principais reflexões derivadas das experiências, constato a demanda pelo compartilhamento e fortalecimento em redes de apoio para efetivar projetos e trajetórias decoloniais nessa direção. De fato, será preciso inicialmente reconhecer a posição de privilégios ocupada e repensar ações nesse espaço para que sejam estabelecidas colaborações e projetos educacionais descolonizantes, de pesquisa, ensino e extensão, envolvendo diferentes esferas educativas.

Dessa forma, esses coletivos podem representar locais de resistência à universalidade e de conexão com outras formas de ser, saber e sentir. Isso implica buscar parcerias e caminhos que nos desafiem a sair da zona de conforto, promovendo ações em prol de uma “reedição” decolonial. No âmbito da educação linguística crítica, temos a oportunidade de desempenhar um papel ativo e de contribuir diretamente para essa transformação.

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    : 131). Todas as traduções do artigo foram realizadas pela autora.
  • 3
    São os conteúdos representados pela sigla PARSNIPS: política, alcoolismo, religião, sexo, narcóticos, -ismos e carne de porco, como hábitos culturais alimentares (NUNES 2022NUNES, E.C.R. Entre "becos sem saídas" e o "pulo do gato": Criatividade Local e mentoria na formação inicial de professores de alemão no Brasil. Tese (Doutorado em Língua e Literatura Alemã) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2022. doi:10.11606/T.8.2021.tde-11032022-212301 (03/06/2024).
    https://doi.org/10.11606/T.8.2021.tde-11...
    : 190).
  • 4
    Diferentes projetos estão em andamento com o objetivo de desenvolver material didático para língua alemã do e no Brasil. O grupo de pesquisa Zeitgeist empenha-se na discussão e na elaboração de um livro didático de alemão específico para o ambiente acadêmico brasileiro (AQUINO; FERREIRA 2023AQUINO, M.; FERREIRA, M. Ensino de alemão com foco decolonial: uma discussão sobre propostas didáticas para o projeto Zeitgeist. Domínios de Lingu@gem, vol. 17, e1709, 2023. DOI: 10.14393/DLv17a2023-9. Disponível em: Disponível em: https://seer.ufu.br/index.php/dominiosdelinguagem/article/view/66610 (30/12/2023).
    https://seer.ufu.br/index.php/dominiosde...
    ). Outra iniciativa na produção de materiais didáticos está sendo conduzida pelo Centro Austríaco, situado na Universidade Federal do Paraná (FREITAS; BUHUNOVSKY 2023FREITAS, A. De; BOHUNOVSKY, R. Conchita Wurst: gênero e diversidade no ensino de alemão no Brasil. Pandaemonium Germanicum , São Paulo, v. 27, n. 51, 1-26, 2023. Disponível em: Disponível em: https://www.revistas.usp.br/pg/article/view/217978 (30/12/2023).
    https://www.revistas.usp.br/pg/article/v...
    ). Além disso, experiências de outros contextos e línguas podem servir de inspiração para projetos na área de alemão, a exemplo da criação do livro "Black Matters Matter" (SANTOS, 2023SANTOS, Antônio Bispo dos. A terra dá, a terra quer. São Paulo: Ubu Editora, 2023.), que propõe abordagens didático-pedagógicas alinhadas às bases legais da educação no Brasil. Esse material enfoca o ensino da língua inglesa considerando as questões étnico-raciais, a história e a cultura afro-brasileira e africana, em conformidade com a Lei nº 10.639/03.
  • 5
    O GEPELAB, Grupo de Estudos e Pesquisa de Ensino de Língua Alemã no e do Brasil, tem como foco discussões teóricas e práticas em torno das perspectivas decoloniais no Brasil. Recentemente, foi publicado um dossier sobre algumas contribuições: Ensino de alemão e de línguas teuto-brasileiras no Brasil: decolonialidades em curso. Disponível em: https://revista.uemg.br/index.php/sulear/issue/view/482 (30/12/2023).
  • 6
    Alguns livros consultados: Menschen B1 (Hueber), Weltblick B2 (Cornelsen), Das Leben A2 (Cornelsen) e Vielfalt B1+ (Hueber).
  • 7
    Para mencionar um exemplo: O coletivo “Gestos rumo a futuros decoloniais” (https://decolonialfutures.net/) tem reunido pesquisadores, professores, indígenas, artistas e outros. Dentre as propostas do grupo, são exploradas possibilidades educativas na perspectiva de estudos decoloniais.
  • 8
    O termo Antropoceno, proposto pelos cientistas Paul Crutzen e Eugene Stoermer (2015CRUTZEN, Paul J; STOERMER, Eugene F. O antropoceno. Piseagrama, Belo Horizonte, seção Extra, 06 nov. 2015. Disponível em: Disponível em: https://piseagrama.org/extra/o-antropoceno/ (29/12/23).
    https://piseagrama.org/extra/o-antropoce...
    ), representa a era em que as ações humanas na civilização industrial e capitalista causam enormes impactos e transformações na Terra, conduzindo à crise ecológica com suas drásticas consequências. Recomendo o material “Habitar o Antropoceno” para se inteirar sobre o assunto a partir de diferentes perspectivas (MOULIN et al. 2022MOULIN, G. et al. Habitar o Antropoceno. Belo Horizonte: BDMG Cultural/ Cosmopolis , 2022. ).
  • 9
    O relato de experiência de estágio docente foi publicado no artigo em parceria com Prof. Milan Puh (PUH & NUNES 2022PUH, M.; NUNES, E. C. R. Os entrelugares e o futuro aberto da formação e atuação docente em língua alemã na luta contra o latifúndio linguístico. Debates em Educação, v. 15, n. 37, 1-23, 2023. DOI: 10.28998/2175-6600.2023v15n37pe14201. Disponível em: Disponível em: https://www.seer.ufal.br/index.php/debateseducacao/article/view/14201 (03/06/2024).
    https://www.seer.ufal.br/index.php/debat...
    ): https://www.seer.ufal.br/index.php/debateseducacao/article/view/14201. (03/06/2024).
  • 10
    O referido material faz parte de uma oficina ministrada em 2023 no congresso de professores de alemão da ABRAPA (Probieren geht über Studieren: Impulse für einen kritisch-reflexiven Deutschunterricht). A oficina foi concebida em parceria com a Profª Louise Ibrügger, com quem aprendo em muitos compartilhamentos.
  • 11
    Recomendo explorar o canal https://tepi.digital/. A terceira edição do TePI - Teatro e os Povos Indígenas ressalta a importância do protagonismo artístico indígena em diversas formas de expressão e representação. Durante o período de 2021 a 2022, foi desenvolvida a plataforma que disponibiliza uma ampla gama de produções, como espetáculos, conversas, palestras, textos, vídeo-pílulas, e-books e dramaturgias inéditas.
  • 12
    Do original: Gosto de chamar mais pessoas para serem selvagens. O nosso planeta, do jeito que está, está sofrendo muito, está chorando, está gritando, e, por estarmos integrados com ele, vamos ter que começar a viver, a ver, a saber e a ter que enfrentar muitas coisas negativas também. Fumo cachimbo, faço fogo no chão, cozinho, durmo e acordo com a cantoria dos passarinhos, e tudo isto é tão simples, mas é tão bonito, tão lindo, tão importante (Tradução minha).
  • 13
    Termo empregado pela primeira vez no livro: Farbe bekennen: afro-deutsche Frauen auf den Spuren ihrer Geschichte, publicado pela primeira vez em 1986 por May Ayim, Katharina Oguntoye e Dagmar Schultz, uma obra de referência do movimento de mulheres afro-alemãs.
  • 14
    Abro aqui um parêntese para algumas observações. Para abordar essa questão, busquei estabelecer diálogo com especialistas, fundamentando-me nas obras de Cida Bento (2022BENTO, Cida. Pacto da Branquitude. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.) e Bárbara Carine S. Pinheiro (2023PINHEIRO, Bárbara Carine Soares. Como ser um educador antirracista. São Paulo: Planeta do Brasil, 2023.). Apesar de a legislação garantir a inclusão desse tema no contexto brasileiro, percebo uma lacuna em debates e espaços de formação sobre educação antirracista no âmbito da língua alemã. Neste momento, faço minha segunda autocrítica a partir do espaço privilegiado que ocupo: quantos autores e autoras da população negra foram incorporadas/os em minhas bibliografias? Em que momentos reproduzi discursos fundamentados na meritocracia e na perspectiva dos privilégios da branquitude? Até que ponto limitei minha visão ao cânone branco, europeu e masculino, sem explorar outras produções e fontes diversas? Termino esse adendo com algumas reticências.
  • 15
  • 16
    Bárbara Carine Soares Pinheiro escreveu livros sobre a abordagem decolonial e antirracista. No “História preta das coisas”, a autora discorre sobre produções científico-tecnológicas sob a afroperspectiva e problematiza as bases intelectuais ocidentais.
  • 17
    No último ano, um trabalho em parceria com as universidades de Augsburg e de Yaoundé I em Camarões reunindo estudantes das três universidades em diálogo. O resultado desse primeiro encontro está em nosso canal do YouTube: https://www.youtube.com/channel/UCyf6QtCAc2TTbb4ChGzufVw (01/03/2024)
Editora: Érica Schlude Wels

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    15 Jan 2024
  • Aceito
    11 Abr 2024
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