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Kafka e o cinema: representações do passado colonial

Kafka and the cinema: representations of the colonial past

Resumo

O colonialismo é um conceito que escapa a uma definição única, rígida. Embora seja um fenômeno histórico, sua compreensão é fluida, redefine-se ao longo do tempo e influencia nossa interpretação do período histórico em questão. Neste artigo, a partir das narrativas de Na Colônia Penal, de Kafka, e dos filmes coloniais África Oriental Alemã. Uma grande escola pública na província de Usambara e Secretário de Estado Dr. Solf visita o Togo em outubro de 1913, analisaremos representações do colonialismo que complexificam e mostram como os eventos eram percebidos contemporaneamente. Este ensaio explora a interação entre ficção, realidade e imaginação no contexto do colonialismo europeu. À medida que essas narrativas constroem representações da realidade, elas também moldam sua própria percepção da realidade, transcendendo o conceito de “real”. Desse modo, Kafka só pôde escrever sobre o colonialismo considerando o seu imaginário anterior presente em outras mídias, como nos filmes documentários. Esse imaginário se materializou nesses três textos nos dando uma dimensão de como a colonização era representada na época de sua efetivação.

Palavras-chave:
Kafka; “Na Colônia Penal”; representação histórica; colonialismo; cinema colonial

Abstract

Colonialism is a concept that defies a single or rigid definition. Although it is a historical phenomenon, its understanding is fluid, redefining itself over time and influencing our interpretation of the historical period in question. Drawing from the narratives of Kafka's In the Penal Colony and the colonial films German East Africa: A Great Public School in the Province of Usambara and Secretary of State Dr. Solf Visits Togo in October 1913 we will analyze representations of colonialism that complexify and show how events were perceived contemporaneously. This article explores thus the interaction between fiction, reality, and imagination in the context of European colonialism. As these narratives construct representations of reality, they also shape their own perception of reality, transcending the concept of the “real”. Thus, Kafka could only write about colonialism considering the pre-existing imagery present in other media, such as documentary films. This imagery materialized in these three texts, giving us a sense of how colonization was represented at the time of its enactment.

Keywords:
Kafka; “Penal Colony”; historical representation; colonialism; colonial cinema; historical reality

Zusammenfassung

Kolonialismus ist ein Begriff, der eine einzige oder starre Bedeutung prägt. Obwohl es sich um ein historisches Phänomen handelt, ist sein Verständnis fließend, das sich im Laufe der Zeit neu definiert und unsere Interpretation der betreffenden historischen Periode beeinflusst. In diesem Artikel werden Darstellungen des Kolonialismus analysiert, die aus den Erzählungen von Kafkas In der Strafkolonie und den Kolonialfilmen Deutsch-Ostafrika. Eine große öffentliche Schule in der Provinz Usambara und Staatssekretär Dr. Solf besucht im Oktober 1913 Togo stammen und die komplizieren und zeigen, wie Ereignisse zeitgenössisch wahrgenommen wurden. Dieser Aufsatz erforscht die Interaktion zwischen Fiktion, Wirklichkeit und Vorstellungskraft im Kontext des europäischen Kolonialismus. Da diese Erzählungen Repräsentationen der Wirklichkeit konstruieren, formen sie auch ihre eigene Wahrnehmung der Realität und überschreiten den Begriff des „Realen“. Daher kann Kafka nur über Kolonialismus schreiben, wenn er die bereits vorhandene Imagewelt in anderen Medien wie Dokumentarfilmen berücksichtigt. Diese Bilderwelt materialisiert sich in diesen Texten und vermittelt uns ein Gefühl dafür, wie die Kolonisierung zum Zeitpunkt ihrer Durchführung dargestellt wurde.

Stichwörter:
Kafka; „In der Strafkolonie“; historische Darstellung; Kolonialismus; kolonialer Film

1 Introdução

A partir de uma leitura do aparato de tortura [Apparat] de Na colônia penal, de Franz Kafka junto a dois filmes documentários, pretende-se neste artigo aferir possibilidades de compreender as representações do passado colonial. Ao compará-las, a própria relação entre ficção e realidade histórica é complexificada.

De modo a elucidar a estrutura deste artigo, descreveremos a sua composição. Este trabalho divide-se em seis partes. Na introdução, discute-se a relação da novela de Kafka com o cinema e o imaginário colonial. Na segunda parte, esboçamos uma breve história da criação, publicação e recepção de Na colônia penal, com base na edição original, de 1919, disponibilizada pelo Projeto Gutenberg, e na tradução de Modesto Carone de 1966, em uma edição de 2011. Na terceira parte, apresentamos nossa hipótese de leitura, apontando como a realidade histórica é representada nessa novela e nestas duas produções cinematográficas: África oriental alemã: uma grande escola pública na província de Usambara (1912) e Secretário de Estado Dr. Solf visita o Togo em outubro de 1913 (1913). Na quarta parte, nosso objetivo é debater como a colonização é representada no texto Na colônia penal. Na quinta parte, traremos reflexões sobre a língua e a escrita na novela e, por fim, na sexta parte, as considerações finais.

Antes de nos debruçarmos sobre o texto de Kafka, é necessário investigarmos o conceito de colonialismo. Este conceito designa fenômenos de longa duração, desde a chamada “expansão marítima” portuguesa no século XV até o final do imperialismo europeu, oficialmente datado de 1994 (data de independência do Macau). Embora o imaginário do colonialismo seja historicamente situado, as interpretações sobre esse processo se alteram com o tempo. Uma prova disso é a existência de diversas teorizações do significado de colonialismo, sob os pontos de vista econômico, psicológico, diplomático e territorial (BOAHEN 2010BOAHEN, Albert Adu. História geral da África, VII: África sob dominação colonial, 1880-1935. 2.ed. rev. Brasília: UNESCO, 2010.). O imaginário é entendido aqui num sentido antropológico, como as imagens que estão em processo de produção, reprodução e recepção pelo ser humano. Ou ainda, como algo composto por representações que estão em relação tanto com a realidade histórica quanto com a literatura ficcional. Essa breve explicação do conceito se dá, pois, na nossa leitura, a máquina, personagem principal da trama kafkiana em questão, é uma representação metafórica da dominação colonial. Apesar de Kafka nunca ter viajado a nenhuma colônia, seu texto apresenta, além da ficção, percepções sociais, econômicas e políticas que circulavam publicamente na Alemanha sobre as colônias. Da mesma forma, os dois filmes selecionados, tidos à época como documentários, representam o colonialismo também a partir de ficções.

O legado de Kafka, bem como a análise dos filmes África Oriental Alemã. Uma grande escola pública na província de Usambara e Secretário de Estado Dr. Solf visita o Togo em outubro de 1913, partilham do mesmo contexto histórico, definem e pertencem ao mesmo imaginário colonial. Ou seja, nos possibilita conhecer como a colonização circulava na virada do século XIX para o XX, nos territórios de língua alemã [Jahrhundertswende]. Isso porque, como aponta a estética da recepção de Iser, “há no texto ficcional muita realidade” (ISER 1993ISER, Wolfgang. Akte des Fingierens. In: Das Fiktive und das Imaginäre. Perspektiven literarischer Anthropologie. Frankfurt a.M.: Suhrkamp, 1993.: 32), sendo possível identificar nele a realidade e o imaginário. Ao mesmo tempo, as narrativas ficcionais formam sua própria realidade, ofertando uma leitura própria, uma interpretação dos acontecimentos e compõem, portanto, com o imaginário colonial.

Os estudos pós-coloniais e culturais na Germanística revelam os significados e consequências do colonialismo a partir de análises de práticas coloniais que eram cotidianas, como exposições universais, expedições e exibições de materiais, objetos e pessoas trazidas das colônias e organizadas pelas chamadas sociedades coloniais. Tais práticas naturalizavam a discriminação sociocultural de africanos, asiáticos e ibero-americanos. Não à toa, o cinema surgiu durante o período colonial. Ainda que não se tenha consenso entre pesquisadores sobre a data exata, o início do cinema está entrelaçado à história colonial, uma vez que, por meio dele, imagens de várias regiões do mundo colonizado foram capturadas com o intuito de documentá-las e exibi-las nos cinemas da Europa, reforçando para um público amplo um determinado imaginário do que seriam as colônias.

Segundo o trabalho de Fuhrmann (2009FUHRMANN, Wolfgang. Propaganda und Unterhaltung: Kolonialismus im frühen Film. In: WARNKE, Ingo H. (org.). Deutsche Sprache und Kolonialismus: Aspekte der nationalen Kommunikation 1884 und 1919. Berlim: de Gruyter, 2009, 349-364. ), as colônias eram retratadas em filmagens feitas, entre 1906 e 1916, por alemães nos territórios colonizados, a partir da ideologia colonial, ajudando ativamente a moldá-la. Assim, de acordo com o que o autor argumenta, trata-se de filmes coloniais [kolonialer Film]. Ao analisar o contexto de exibição e as condições de recepção dos filmes, o pesquisador mostra como raramente esses filmes permaneceram ou foram exibidos em África, tendo sido produzidos exclusivamente para serem exibidos nos países de língua alemã.

Segundo o historiador Marc Ferro, o estatuto da colonização francesa, por exemplo, não permitia aos autóctones produzirem nem mesmo assistir a filmes (FERRO 2009FERRO, Marc. História das colonizações: das conquistas às independências: séculos XIII a XX. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.: 23), porém, as imagens de seus territórios foram amplamente exploradas e divulgadas nas metrópoles sem sua permissão prévia. Outro aspecto relacionado ao início do cinema colonial alemão, identificado por Oksiloff (2001OKSILOFF, Assenka. Picturing the Primitive. Nova York: Palgrave Macmillan US, 2001.), é a sua intersecção com a Antropologia, a partir do momento em que tal disciplina serviu como orientação internacional e multicultural fetichista, fascinada pelas assim chamadas “culturas primitivas”. Isso que moldou, por diversas vezes, a forma como os nativos eram retratados nos filmes.

Esses primeiros filmes do cinema colonial eram, vale lembrar, mudos, em preto e branco, de curta duração, e exibidos em conjunto com outras películas. Por retratarem um espaço real e, como seus títulos evocam, representarem pessoas e locais existentes, tais filmes documentários eram recepcionados pelo público como não-ficção. Nessa lógica, é fundamental que coloquemos em xeque a distinção entre ficção e não-ficção, já que ela se assenta em características temporalmente marcadas. A não-ficção, assim como a ficção, pode exprimir um ponto de vista parcial. Além do falso caráter “imparcial” associado aos documentários, os filmes coloniais são problemáticos. Tematizavam, dentre outros assuntos, os supostos “progressos” promovidos na colônia, como, por exemplo, a construção das ferrovias na África pelos alemães, documentada na película Bahnbau in Afrika (Construção Ferroviária na África), que Kafka recomenda à sua amiga Elsa Taussig (ZISCHLER 2005ZISCHLER, Hanns. Kafka vai ao cinema. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.: 25). Esse filme documental foi exibido no Cinematógrafo Orient, no “grande programa festivo de Natal” (Ibidem: 25, tradução própria) em 1907, em Praga, e traz uma visão do colonialismo enquanto progresso, ligada também à concepção linear e positivista da história. A partir desses filmes evidencia-se como o imaginário colonial circulava nos territórios de língua alemã, no caso, o Império Austro-Húngaro.

Embora a narrativa literária Na colônia penal não seja sobre a construção de ferrovias tal como aparece em Bahnbau in Afrika, nela também há alusões do emprego de mão de obra forçada, em condições análogas à escravidão, além da ideia do cumprimento de pena em caso de delito, assim como de fato ocorria nas implantações ferroviárias nos territórios coloniais. É importante mencionar que, na Namíbia, sob o governo colonial alemão, havia mão de obra migrante remunerada, entretanto, forçada, que sofreu impactos e precarizações com a guerra colonial (1904-1907) e com a primeira guerra (1914-1918). Durante a dominação colonial alemã, foram construídos cerca de 5500 quilômetros de ferrovias (WOLF 1992: 73).

De acordo com Nagl (2009NAGL, Tobias. Die unheimliche Maschine Rasse und Repräsentation im Weimarer Kino. Munique: Edition text + kritik, 2009.), as representações de raça e do mundo colonial no cinema têm um caráter propagandista, sendo ao mesmo tempo colonialista e nacionalista. Os documentários etnográficos que fazem parte do cinema colonial, retratavam pessoas negras como primitivas, sexualizadas e/ou demonizadas. Nos filmes selecionados para esta pesquisa, encontramos imagens positivas da vida cotidiana colonial, mostrando adultos e crianças negras felizes, sorrindo, brincando, dançando e, ao mesmo tempo, servindo e obedecendo. No entanto, as revoltas dos nativos contra a presença colonial alemã nos “protetorados” vão na contramão de imagens pacíficas como as que eram mostradas nos filmes. Um claro exemplo disso é a revolta Maji-Maji, que ocorreu entre 1905 e 1907 na África Oriental Alemã (SPEITPKAMP 2008SPEITPKAMP, Winfried. Deutsche Kolonialgeschichte. Stuttgart: Reclam, 2008.: 128), território onde vários filmes coloniais escolhidos foram rodados alguns anos mais tarde (1913 e 1914).

Essas representações cinematográficas, que, concomitantemente, constituem e são constituídas pelo imaginário colonial, revelam muito mais sobre as expectativas, experiências e valores de quem produzia esses filmes do que sobre as de quem aparecia na tela. Já de partida temos uma diferença, não trivial apesar de óbvia, entre o que de fato ocorreu, a realidade, e o ponto de vista a partir do qual essa realidade é representada. O ponto de vista colonial se materializou nessas películas, dando forma ao imaginário colonial. Ao mesmo tempo, aspectos já presentes no imaginário puderam ser usados de forma subversiva, como a presença do expedicionário na novela kafkiana em questão. Os viajantes eram figuras recorrentemente representadas na literatura de viagem em língua alemã e nos documentários etnográficos. Como veremos mais adiante e apontam vários críticos (Gagnebin 2006GAGNEBIN, Jeanne-Marie. Escrituras do corpo. In: Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006, 119-134.: 133), a representação dessa figura kafikiana quebra as expectativas do leitor.

2 Circulação do texto

Na colônia penal foi escrito em 1914, durante suas férias (BROD 1966BROD, Max. Über Franz Kafka. Frankfurt am Main: Fischer Verlag, 1966.: 134). Sobre essa data é relevante mencionar que muitos intérpretes consideram o imperialismo europeu como um dos principais motivos para o início da Primeira Guerra (1914-1918) (HOBSBAWM 2003; WALLERSTEIN 1970WALLERSTEIN, Immanuel. The colonial era in Africa: changes in the social structure. In: L. H. GANN e P. DUIGNAN (orgs.). Colonialism in Africa 1870-1960. v. II. Cambridge: Cambridge University Press, 1970, p. 399-421.). Kafka queria ter publicado essa novela junto com outras duas, A Metamorfose e O Veredicto, em um único volume sob o título de Strafen [punições]. Apesar de não ter saído como desejado, o fato desses três textos terem sido concebidos juntos aponta para um projeto do autor em escrever sobre estruturas de poder.

A publicação de Na colônia penal ocorreu isolada em formato de livro2 3 (1873 - 1927) é considerado pioneiro da arte moderna. em Leipzig no ano de 1919, pela editora de Kurt Wolff, famoso editor da época. A primeira edição teve mil exemplares impressos na gráfica W. Drugulin. Criada em 1746 sob outro nome, essa gráfica imprimia, em 1840, escritos em 300 idiomas. Isso porque muitos dos livros escritos e vendidos nas colônias não eram impressos nos seus territórios, mas sim nas metrópoles. Há aqui uma relação entre a história da imprensa e a história colonial que evidencia como os países europeus organizaram formas de manutenção do poder: isto é, o monopólio de conhecimento também se deu através dos meios de produção artísticos, como a imprensa, o cinema e a literatura. O conceito de colonialidad del saber do autor Aníbal Quijano (2000QUIJANO, A. Colonialidad del poder, eurocentrismo y América Latina. In: LANDER, E. (org.). La Colonialidad del Saber: Eurocentrismo y Ciencias Sociales. Perspectivas Latinoamericanas. Buenos Aires: Clacso, 2000, 201-245.) nos ajuda a entender como as formas de conhecimento desenvolvidas pela sociedade europeia tornaram-se as formas objetivas e universais de conhecimento e, portanto, as únicas válidas a serem divulgadas em detrimento das formas de conhecimento desenvolvidas em outras partes do mundo. Assim, há uma colonização cultural e epistemológica que se concretiza na colonialidade do conhecimento, que objetivava uma hegemonização do sistema de representação e conhecimento produzido na Europa e exportado para as colônias. Esse movimento subordinou outras representações e conhecimentos, relegando-os a meros objetos de conhecimento, silenciados e sem o poder de enunciação.

Além da gráfica nos conduzir à relação entre a história da imprensa e o colonialismo, a data de publicação do texto também nos revela muito: 1919 é o ano do Tratado de Versailles, em que a Alemanha perdeu suas colônias. Essa circunstância nos instigou a perguntar não só como a realidade histórica aparece na novela kafkiana, mas se os leitores da época teriam questionado sobre a violência colonial representada por Kafka.

A recepção da obra de Kafka tende a ser considerada pelos pesquisadores somente após a publicação de sua obra pelo seu amigo Max Brod (SOUSA; BRITO; SANTOS 2005SOUSA, Celeste Ribeiro; BRITO, Eduardo. SANTOS, Maria Célia. “A recepção da obra de Franz Kafka no Brasil”. Pandaemonium Germanicum, São Paulo, n. 9, p. 227-253, 2005.). Entre a crítica que valorizava o trabalho de Kafka, podemos mencionar os textos de Tucholsky (1979 [1920]TUCHOLSKY, Kurt. In der Strafkolonie. In: MUHFEIT, Herbert; SPICKER, Friedmann (org.). Franz Kafka - Kritik un Rezeption zu seinen Lebzeiten 1912-1924. Frankfurt am Main: S. Fischer, 1979, p. 94.), Brecht (1993 [1934]BRECHT, Bertolt. Über die moderne tschechoslowakische Literatur. Werke - Große kommentierte Berliner und Frankfurter Ausgabe (Herausgegeben von Werner Hecht, Jan Knopt, Werner Mittenzwei und Klaus-Detlef Müller) - Band 22. Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag, 1993.) e Benjamin (1980 [1934]ANDERS, Günter. Kafka: pró e contra: Os autos do Processo. Tradução, posfácio e notas: Modesto Carone. São Paulo: Cosac Naify, 2007.), que procuraram nas obras do autor pontes que permitissem “uma reflexão sobre os acontecimentos do III Reich, uma explicação [...] para o ocorrido” (BRITO 20BRITO, Eduardo Manoel de. Quando a ficção se confunde com a realidade: as obras In der Strafkolonie/ Na Colônia Penal e Der Process/O Processo de Kafka como filtros perceptivos da ditadura civil-militar brasileira. São Paulo: Tese (Doutorado) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, FFLCH/USP, 2006.08: 51). Podemos dizer que há um modo predominante de ler os textos de Kafka como chaves para entender os regimes totalitários (BROD 1966BROD, Max. Über Franz Kafka. Frankfurt am Main: Fischer Verlag, 1966.: 382), derivado da interpretação de autores célebres como Max Brod, Hannah Arendt e Günter Anders, que pensaram nas relações entre a obra kafkiana e o nazismo. No entanto, recentemente, têm surgido pesquisas acadêmicas em língua alemã e inglesa que tematizam a relação entre Kafka e o colonialismo (ZILCOSKY 2004ZILCOSKY, John. „Wildes Reisen: kolonialer Sadismus und Masochismus in Kafkas ‚Strafkolonie‘“. In: Weimarer Beiträge, v. 50, 2004.; GOEBEL 2002GOEBEL, Rolf. Kafka and Postcolonial Critique: Der Verschollene, “In der Strafkolonie,” “Beim Bau der chinesischen Mauer”, in: A Companion to the Works of Franz Kafka, ed. James Rolleston Rochester, NY, 2002.). Os trabalhos de Suchoff e Sela trazem novas abordagens sobre Na colônia penal que a “libertam dos protocolos de interpretação do cânone” (GOETSCHEL 2015GOETSCHEL, Willi. Franz Kafka's “In der Strafkolonie”. The Germanic Review: Literature, Culture, Theory, v. 90, n. 2, 81-86, 2015.: 86, tradução própria). No caso da novela em questão, o título é bastante sugestivo, pois entrevê a colônia como local de punição e isolamento. O termo é associado normalmente às colônias britânicas, Austrália e Estados Unidos.

No caso da recepção no Brasil, a tese de Brito (2008BRITO, Eduardo Manoel de. Quando a ficção se confunde com a realidade: as obras In der Strafkolonie/ Na Colônia Penal e Der Process/O Processo de Kafka como filtros perceptivos da ditadura civil-militar brasileira. São Paulo: Tese (Doutorado) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, FFLCH/USP, 2006.) defende que as traduções, edições e reedições das obras de Kafka “traduziram de forma ficcional o que estava sendo silenciado na linguagem cotidiana” (BRITO 2008BRITO, Eduardo Manoel de. Quando a ficção se confunde com a realidade: as obras In der Strafkolonie/ Na Colônia Penal e Der Process/O Processo de Kafka como filtros perceptivos da ditadura civil-militar brasileira. São Paulo: Tese (Doutorado) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, FFLCH/USP, 2006.: 7) durante a ditadura militar brasileira. Apesar de haver diversas alusões à colonização nos escritos de Kafka, a questão colonial foi marginalizada pela fortuna crítica de Kafka no Brasil. Para contribuir com a crítica e observar os desdobramentos da recepção desse texto, é importante questionarmos: quais eram os sentidos de “colônia” e “colonização” para o público de língua alemã no início do século XX? E em que medi da essa novela de Kafka consegue intervir com uma nova representação do processo colonial?

Entretanto, veremos aqui um exemplo de uma das reações à novela Na colônia penal expressa em 10 de novembro de 1916, na Galerie Hans Goltz3 4 Cf. link: <https://www.franzkafka.de/fundstuecke/kafka-lesung-als-koerperverletzung> (16.02.22). , em Munique, durante a leitura pública do texto4 5 https://digitaler-lesesaal.bundesarchiv.de/video/22729/666346 . Por conta da guerra e da censura bávara, o escritor precisou de permissão das autoridades para realizar a leitura. Diante dessa conjuntura, o evento, adiado várias vezes, foi anunciado sob o título de Tropische Münchhausiade, para disfarçar o verdadeiro tema do evento: a crítica à política colonial e ao governo. Apesar de ter recebido o Prêmio Theodor Fontane um ano antes, Kafka ainda era pouco conhecido. O público era pequeno, com cerca de 50 pessoas, entre elas alguns escritores como Rainer Maria Rilke.

Assim como outros modernistas recebidos com controvérsia pelo público na Galeria, Kafka também não foi bem recepcionado. O salão estava mal iluminado e sem aquecimento. Segundo o relato do escritor Max Pulver:

Uma queda abafada, confusão no salão, uma senhora foi levada desmaiada. Enquanto isso, a descrição continuou. Mais duas vezes, suas palavras derrubaram o inconsciente. As filas de ouvintes começaram a se esvaziar. Alguns fugiram no último momento antes que a visão do poeta os esmagasse. Eu nunca observei um efeito semelhante das palavras faladas (PULVER: 1954PULVER, Max. Erinnerungen an eine europäische Zeit: Begegnungen mit Rilke, Kafka, Klee, Meyrink und anderes. Zürich: Orell Fuessl, 1954., tradução própria IN BORN 1979BORN, Jürgen. Franz Kafka: Kritik und Rezeption zu seinen Lebzeiten 1912-1924. Frankfurt am Main: Fischer, 1979.: 119).

Kafka fazia, periodicamente, leituras públicas de seus textos em pequenos grupos e Na colônia penal foi a única leitura feita fora de Praga (HEIN 2012HEIN, Franziska. Ein Ort der Geschichten, Süddeutsche Zeitung, 2012.). No dia seguinte ao evento, os jornais publicaram críticas negativas ao texto, inclusive o jornal de Munique [Münchner Zeitung], que descreveu a novela como lascivo do horror [Lüstling des Entsetzens] (SCHULER 2010SCHULER, Thomas. Kälter als ein leeres Ofenloch. Jornal Vienense, 2010. <https://www.wienerzeitung.at/nachrichten/kultur/mehr-kultur/226573-Kälter-als-ein-leeres-Ofenloch.html> (16.11.22).
https://www.wienerzeitung.at/nachrichten...
).

3 Colonialismo nos filmes e na literatura kafkiana

Kafka escreveu extensamente sobre cinema em seus diários até 1913. A partir de então os comentários sobre a sétima arte “curiosamente cessam quase por completo” (ZISCHLER 2005ZISCHLER, Hanns. Kafka vai ao cinema. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.: 17). Essa informação nos levou a consultar, no Arquivo Nacional Alemão [Bundesarchiv], filmes sobre o colonialismo produzidos no período. Foram encontrados 53 títulos produzidos entre 1911 e 1938; número expressivo se considerarmos os gastos, mão-de-obra e equipamentos necessários para a produção fílmica na época. Além disso, como aponta Sadoul (1963SADOUL, Georges. História do Cinema Mundial: Das Origens a Nossos Dias - vol. I. Tradução: Sônia Salles Gomes. Editora Martins Livreiro: Porto Alegre, 1963.), a indústria cinematográfica alemã teve seu desenvolvimento mais tardio quando comparada com a francesa. Diferente dessa, os filmes alemães receberam patrocínio de seu governo para serem produzidos. Dentre esses filmes, cinco deles nos chamaram atenção, uma vez que foram produzidos até 1914, data da finalização da escrita da novela. São eles:

Tabela 1:
Filmes Coloniais até 1914.

Dentre os cinco, conseguimos ter acesso a dois filmes: África Oriental Alemã. Uma grande escola pública na província de Usambara e Secretário de Estado Dr. Solf visita o Togo em outubro de 1913. Embora não possamos afirmar que Kafka assistiu aos dois filmes coloniais aqui comentados, de toda forma, esses filmes estavam presentes na esfera pública e contribuíram para a construção do imaginário sobre as colônias.

Cabe aqui uma breve descrição de ambos os filmes. África Oriental Alemã (4’17’’) trata da colonização alemã no território da atual da Tanzânia e foi produzido em parceria com Pathé Frères. Naquele período inicial do cinema, era comum que os filmes fossem produzidos em conjunto com as companhias francesas, como a Pathé ou Gaumont.

O filme tem início em uma sala de aula “tradicional”, com os alunos sentados em fileiras. O professor está em pé, na frente, segurando uma vara; do seu lado direito há uma lousa e do lado esquerdo, um mapa. O professor veste uma túnica e uma calça, ao passo que os estudantes vestem calças e têm o peito desnudo. Um frame exibe um letreiro explicativo: “Na aula de Geografia”. O professor aponta com a vara para o mapa, e, ao que nos parece, ele faz uma pergunta. Os alunos levantam a mão e o professor escolhe um, apontando para ele com a vara. O aluno se levanta, corre para o mapa e aponta para ele com uma vara, respondendo à pergunta do professor. A mesma situação ocorre algumas vezes e depois todos pegam um livro. Ao fim dessa primeira cena, todos saem da sala e uma segunda legenda anuncia: “Na hora do recreio”.

Imagem 1:
Cena do filme África Oriental Alemã. Uma grande escola pública na província de Usambara.

Nesta cena, quase todos os alunos aparecem vestidos e enfileirados, seguindo as instruções de homens de túnica com chapéus brancos. A maioria das crianças, aparentemente todos meninos, seguem andando, alguns correm. A cena seguinte apresenta as crianças brincando do que talvez pudéssemos nomear de “salto em altura”. Elas correm em direção à câmera e saltam por cima de um pedaço de pau sustentado por dois homens. No momento seguinte, uma fanfarra de músicos marchando aparece na diagonal da tela e crianças correm e dançam atrás deles. A terceira legenda surge em tom claramente propagandístico: “Para o entretenimento, o Fonógrafo Pathé”. Nessa última sequência de cenas do filme, crianças estão sentadas ao redor de três homens brancos e uma mulher branca que, por sua vez, estão sentados à mesa. Eles tomam uma bebida, fumam e preparam o fonógrafo. Enquanto o aparelho é ligado, a câmera se aproxima bem das crianças que se amontoam e se empurram para ver/admirar o som que sai do objeto.

O outro filme, Secretário de Estado Dr. Solf (12’13’’) acompanha a visita de Wilhelm Heinrich Solf ao Togo. Solf estudou Indologia e foi governador “Deutsch-Samoa”, hoje o território das ilhas de Upolu, Savaiʻi, Apolima, Manono e o Estado Independente de Samoa, situadas na Oceania. A partir de 1910, Solf é nomeado Secretário de Estado do Escritório Colonial Imperial [Reichskolonialamt], cargo no qual permanece até 1913.

No início do filme, Solf chega em um porto, cercado pelo mar, com bandeiras hasteadas, uma grande casa branca e bandeirinhas decorativas. Oficiais negros em trajes alemães marcham em desfile com baionetas, enquanto Solf presta continência. Logo depois, ele é conduzido em uma liteira por dois homens negros. Ao descer, Solf cumprimenta as pessoas com continências. Uma mulher branca, possivelmente sua esposa, desce de outra carruagem e recebe flores de uma mulher negra antes de seguir com o passeio.

Imagem 2:
Cena do filme Secretário de Estado Dr. Solf visita o Togo em outubro de 1913.

A seguir, Solf segura uma espécie de arrimo. A cena muda e ele sobe em uma carruagem puxada por cavalos. Em um segundo plano, um barracão abriga muitas pessoas. A carruagem começa a andar, seguida por homens montados a cavalo. A cena seguinte mostra três homens negros que parecem dançar e cantar. Na sequência, um soldado toca trompete. A câmera filma os homens conversando e fumando, ao fundo vê-se uma mata, e depois, um vagão aberto andando sobre um trilho de trem e diversos homens de branco ao lado de Solf. Mais um desfile, dessa vez de uma cavalaria guiada por Solf, surge na película. Vê-se novamente Solf cumprimentar outros homens brancos que, em fila, levantam seus chapéus conforme ele passa. Em contraste, a próxima cena, no minuto 07:57 do filme, mostra diversos homens negros dançando, próximos uns aos outros. A maioria aparece desnuda na parte superior e alguns trajados com roupas ocidentais. Na sequência, aparecem outros homens encurvados, com trajes típicos e portando baionetas, fazendo uma espécie de desfile em círculo e depois novamente, em fila, erguem suas armas. A seguir, falaremos de três aspectos do retrato do colonialismo, presentes também nas descrições feitas dos filmes: o uso da violência, o local e o uso da linguagem.

4 Violência e inespecificidade

A novela narra a punição de um nativo executado por uma máquina, denominada Apparat, uma “estrutura bem grande” formada por três partes: cama, desenhador e rastelo, instalada em um campo aberto, que grafa a lei infringida no corpo do condenado durante 12 horas até sua execução. Por mais que, em boa parte do texto, o oficial explique exaustivamente as funções e partes do Apparat, com o intuito de legitimar seu funcionamento e seu trabalho, a apreensão dos sentidos da máquina permanece ainda em aberto.

O narrador descreve um espaço vazio em um pequeno vale arenoso, onde a máquina está instalada. Há também a referência de que a roupa seria muito pesada para os trópicos. Essas descrições evocam territórios ocupados pela colonização alemã, como a Namíbia e Samoa Colonial. Mas poderia ser também uma colônia na Ásia, já que há, no texto, a referência a uma casa de chá e a língua falada pelo oficial é o francês. A inespecificidade do local sugere que a novela poderia se passar em qualquer colônia, e o narrador brinca com isso, dando pistas que nos confundem sobre a localização exata.

A colonização representada em Na colônia penal se contrapõe à representação positiva apresentada pelo cinema colonial, vista anteriormente. Essa novela constrói uma representação do colonialismo diversa do senso comum, ao mesmo tempo em que utiliza ideias e representações já existentes para se contrapor a elas. Como Iser aponta, em vez de se opor à realidade, a ficção se relaciona com ela. Mesmo para quem não associa a máquina à colonização, a metáfora kafkiana do Apparat gera efeitos no leitor ao apontar para os objetivos dela: escrever, punir e matar, imagem extremamente poderosa do que é o uso do poder, despertando desconfortos no leitor.

O texto apresenta, na sua maior parte, a conversa entre um expedicionário e um oficial da colônia, que também tem a função de imprimir ao texto uma fluidez no ritmo da leitura. Nesse contexto, a violência não é apenas física, mas institucional, pois o condenado desconhece sua pena, não tendo direito à fala e, portanto, à defesa, permanecendo no plano de fundo na narrativa. Observa-se que Kafka utiliza um recurso literário que se assemelha ao da câmera em plano fechado (close up) ao focar em objetos específicos e deixar outros de fora, suscitando perguntas para as quais o leitor não encontra respostas.

Quando o oficial é questionado pelo expedicionário sobre o motivo pelo qual o condenado desconhece sua pena, responde que seria inútil anunciá-la, pois ele vai experimentá-la na própria carne. Somos levados a questionar a “justiça” reivindicada pelo oficial em sua fala, bem como a infração “insignificante” do condenado: dormir, quando seu dever era “bater continência diante da porta do capitão” (KAFKA 2011KAFKA, Franz. Na Colônia Penal. In: Essencial. Tradução Modesto Carone. São Paulo: Companhia das Letras em associação a Penguin Group, 2011. Livro Eletrônico.: 841). O corpo do nativo se torna então não só um suporte para a lei, como também o meio pelo qual ele passa a conhecê-la, ou seja, não tem acesso anterior, não está diante da Lei (Vor dem Gesetz), como anuncia o título de outro conto de Kafka. Sendo assim, não se trata dos colonizados explorados compreenderem a lei, seu sentido hermenêutico, mas sim de tê-la inscrita pela violência no próprio corpo.

O poder da lei não está focado apenas na figura do oficial, mas no Apparat, o que podemos observar na submissão do oficial à máquina, sinalizada na narrativa pelo uso da voz passiva: eu fui nomeado juiz - “ich bin hier in der Strafkolonie zum Richter bestellt” (KAFKA 1919KAFKA, Franz. In der Strafkolonie. Leipzig: Kurt Wolff Verlag, 1919. Livro Eletrônico, Adobe Digital Editions.: 7). Ele se mostra convicto da função social da máquina até o final da narrativa, quando submete seu próprio corpo a ela. A máquina cria uma relação impessoal no processo de punição, sua repetibilidade naturaliza a violência e desumaniza o condenado/colonizado, assim como ocorreu nos processos coloniais que repetiram diversas atrocidades, representando o funcionamento dessa instituição.

Muitas vezes a fala do narrador destoa da fala do oficial, denotando ironia (como aponta também RIEGER 2012RIEGER, Jeanette. Komische Strafen, strafende Komik: Kafkas ‘Tropische Münchhausiade’ in der Strafkolonie. Oxford German Studies, v. 41, n. 2, 236-252, 2012.); uma delas surge da discrepância entre a grandiosidade da descrição do regime feita pelo oficial e o espaço vazio, sem espectadores, descrito pelo narrador. O espetáculo da tortura, que é assistida por um público amplo, nos remete a outros exemplos históricos. A punição pública do condenado alude às exibições etnográficas públicas de pessoas negras, vindas de territórios coloniais, como as que ocorriam no zoológico de Hagenbeck, em Berlim. Mas são várias as situações no mundo colonial em que os nativos têm seus corpos subjugados e exibidos publicamente pelas autoridades em situação de violência. Violência que se dá explicitamente sobre determinados corpos, como nas exibições dos corpos negros nus ou dissecados, assistidas exclusivamente por antropólogos e membros da Sociedade de Antropologia (BGAEU), no início do século XX, no hospital Charité em Berlim, na Alemanha (CALÇA 2019CALÇA, Elaine. Os Expedicionários e suas Relações com o Imperialismo a partir de Adolf Bastian (1870-1890). Dissertação (Mestrado Acadêmico em História). Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras, Assis, 2019.).

Na colônia penal, o corpo condenado não tem nome, em uma clara referência à objetificação dos corpos no mundo colonial, em ambos os filmes coloniais que apresentamos, vemos uma imagem contrastante com as situações de violência apresentadas na narrativa: são cenas de corpos negros também desnudos e dançantes, mas há uma narrativa dessas pessoas como alegres. Já na novela, considerada ficção, possui elementos que fazem referência à história, enquanto os filmes, interpretados como documentais, apresentam elementos ficcionalizados. Tendo em vista a história colonial, podemos afirmar que os aspectos dessas produções cinematográficas que apontam positivamente à felicidade da população negra na colônia foram fabricados. Ambas as representações do colonialismo colocadas lado a lado causam estranhamento em relação aos limites tradicionalmente postos entre ficção e realidade.

A questão de gênero aparece mais timidamente na novela de Kafka com a rejeição do oficial ao feminino. Segundo ele, o comandante novo é uma figura importante, mas que dá atenção às “suas damas”, que seriam críticas ao funcionamento da máquina e das execuções. A presença das mulheres em um ambiente de poder tipicamente masculino erige-se como uma ameaça ao poder do oficial e, como influenciadoras do novo comandante, que fica “rodeado por elas”. O oficial aconselha o expedicionário a ficar atento a conversa com o novo comandante, senão as damas agarrarão seus dedos e brincarão com eles - “sonst fassen sie die Damen und spielen mit den Fingern” (KAFKA 2011KAFKA, Franz. Na Colônia Penal. In: Essencial. Tradução Modesto Carone. São Paulo: Companhia das Letras em associação a Penguin Group, 2011. Livro Eletrônico.: 19). Essas figuras femininas chamam nossa atenção, pois, apesar de não terem papel de destaque na novela, aparecem como representantes de um certo humanismo. Nos filmes coloniais abordados neste artigo também se observa a predominância masculina nas cenas. Em cada um deles há a presença de apenas uma figura do gênero feminino: a esposa do secretário no filme Secretário de Estado Dr. Solf, e uma mulher no filme África Oriental Alemã, que aparece no início da película e no final, à mesa junto ao fonógrafo.

Outro elemento factual comum aos regimes coloniais, que podemos rastrear no texto kafkiano, é a existência de resistência e crítica ao sistema colonial, observado na falta de adesão dos habitantes na narrativa, que não vão mais assistir às execuções públicas do Apparat. Observa-se também esse caráter crítico ao poder colonial a partir das mulheres e dos questionamentos do expedicionário estrangeiro; entretanto, essas discordâncias não abalam o Apparat, ou melhor, o Sistema Colonial. Podemos ler a novela como uma contraposição à representação favorável do suposto “progresso” resultado do colonialismo.

De fato, houve muitas críticas ao império colonial feitas pelos social-democratas, anarquistas e comunistas na Alemanha durante o período colonial tinham apoio da classe trabalhadora e eram expressas em manifestações e passeatas públicas. Podemos, portanto, ler tal novela como uma sátira à ineficiência dessas críticas diante das políticas coloniais e como uma denúncia para as consequências em longa duração. Na narrativa, o oficial afirma que a ordem colonial estaria imune a tais críticas: o sucessor de seu governo não conseguirá mudar nada do antigo por pelo menos muitos anos - “sein Nachfolger wenigstens während vieler Jahre nichts von dem Alten wird ändern können” (KAFKA 1919KAFKA, Franz. In der Strafkolonie. Leipzig: Kurt Wolff Verlag, 1919. Livro Eletrônico, Adobe Digital Editions.: 2). A máquina prossegue trabalhando e perpetuando a barbárie, mesmo contra a vontade dos habitantes da colônia.

Na novela, os discursos contrários não interferem na atuação da máquina, resultando em um final surpreendente. É o oficial que se coloca no lugar do soldado nativo na execução para provar a validade da máquina. Aqui há uma virada na narrativa. Se, por um lado, a máquina quebra, fazendo alusão à crítica europeia da colonização, por outro lado, numa metáfora potente, o oficial, ao deitar-se na máquina, se insere na estrutura de poder como submisso a ela e não apenas como algoz.

No fim da narrativa, o expedicionário precisa decidir se intervirá ou não na operação da máquina. Esperávamos que, por criticar o sistema de julgamento, fizesse algo contra a execução. No entanto, ele opta por não intervir e vai embora. Mas, então, por que, ao retornar, faz a visita ao túmulo do antigo comandante? Na perspectiva do oficial, o expedicionário iria expor sua opinião para o novo comandante a respeito da manutenção ou destruição da máquina, o que não ocorre. Em certa medida, o expedicionário não só não faz nada como aceita e respeita as práticas coloniais. Qual outro motivo o levaria a visitar o túmulo do criador da máquina?

A máquina teve seu fim por si mesma, sem a intervenção dos críticos a ela. Considerando o contexto sociocultural de escrita do texto, seria a fuga do expedicionário e o fim desta novela uma metáfora para o fim da colonização, que teve seu fim por si mesma, sem a intervenção de seus críticos europeus?

O fim da colonização parece tão complexo quanto seu começo, pois são processos recentes e que têm efeito de longa duração. Por isso, os estudos pós-coloniais e decoloniais reivindicam demonstrar a existência das continuidades após o fim oficial do colonialismo alemão em 1919, ao mesmo tempo que buscam quais são as origens anteriores ao marco oficial da exploração colonial, datadas da Conferência de Berlim, em 1884.

5 Língua e escrita

Além das referências coloniais já citadas que aparecem no texto kafkiano, gostaríamos de apontar para o aspecto colonial que a linguagem deste texto representa. O narrador afirma que o expedicionário não se surpreende de falar em francês com o soldado, e com o fato do condenado não o compreender, sugerindo a normalidade de certas convenções, regras e modus operandi. Os agentes coloniais falavam intencionalmente outro idioma, mesmo que soubessem a língua nativa, para que as populações autóctones não pudessem compreendê-los, exercendo poder de segregação.

Essa situação parece se repetir na película Secretário de Estado Dr. Solf, na qual o secretário só se dirige aos homens brancos, que vestem trajes ocidentais ou fardas, sem estabelecer nenhum diálogo com os homens negros de trajes nativos. Encontramos algumas traduções feitas por Solf, dentre elas a “Gramática da Língua Sânscrita” e outras referências a seus estudos dos idiomas dos povos colonizados. Podemos então supor que, como o oficial na novela de Kafka, Solf falaria a língua nativa. O traje está ligado ao ocidental, como um dado semiótico da colonização, juntamente ao idioma, e ao registro escrito. Em uma cena, alguns homens dançam, enquanto Solf está de costas conversando, sem olhar para a apresentação.

Imagem 3:
Secretário de Estado Dr. Solf.

Como vimos, Solf pode optar por não falar o idioma nativo, a língua dos colonizados, assim como o oficial no texto de Kafka que, em vez de se comunicar com o condenado na língua nativa, prefere escrever no corpo dele com a máquina. A substituição da comunicação pela escrita, um recurso que não era utilizado pelos povos de cultura oral, significa, pois, um ato de violência dos colonizadores sobre a população colonizada. Estaria aí a ideia da colonização como algo que escreve e marca nos corpos colonizados os ideais ocidentais?

No filme África oriental alemã. Uma grande escola pública na província de Usambara, mostra-se a educação baseada na escrita que os alemães supostamente “levariam” para os povos da África Oriental. Essa relação com a escrita nos remete novamente ao conto de Kafka, em que as relações entre poder, corpo e escrita são explícitas. “O mandamento que o condenado infringiu [ser] escrito no seu corpo com o rastelo” (KAFKA 2011KAFKA, Franz. Na Colônia Penal. In: Essencial. Tradução Modesto Carone. São Paulo: Companhia das Letras em associação a Penguin Group, 2011. Livro Eletrônico.: 816) leva-nos a pensar nos discursos que legitimam a colonização e são objeto da historiografia atual sobre esse tema. O discurso, isto é, a escrita da lei no condenado para que ele a incorpore até ser convencido de sua culpa, parte do pressuposto de que esse condenado não possui conhecimento - dado somente pela escrita - a respeito da lei: “o senhor viu como não é fácil decifrar a escrita com os olhos, mas o nosso homem a decifra com seus ferimentos” (Ibidem: 925). Aqui se estabelece uma relação com muitos povos colonizados que tinham/têm uma tradição oral, como no caso dos povos que ocupa(va)m a África Oriental Alemã.

O Apparat pode ser interpretado também no contexto da produção de outras máquinas relacionadas à escrita, desenvolvidas na Europa na virada do século XIX para o XX, como o Parlographen, uma máquina de escrever ditados que foi uma das invenções patenteadas por Thomas Edison. Foram muitas as ilustrações feitas do colonialismo como sendo máquina; uma delas foi publicada em 1904 na revista de circulação semanal Simplicissismus. A revista, que nessa edição veicula diversas referências ao colonialismo, era caracterizada por seu tom satírico e crítico. Em uma das imagens desta edição, vemos o corpo de um homem negro violentado sob um moinho, que, semelhantemente ao aparato kafkiano, é operado por um homem branco. Do lado esquerdo da máquina, outro homem branco despeja um líquido na boca do homem negro, que está deitado e preso pela máquina, enquanto do lado oposto da máquina, saem moedas de ouro. À direita da máquina, um padre em pé segura a Bíblia. Portanto, a imagem, reproduzida a seguir, critica as políticas colonialistas na esfera pública da virada do século.

Imagem 4:
“That’s how the Englishman colonizes”.

Essa imagem é um dos exemplos das representações sobre o mundo colonial que circulavam na época. Um ponto de virada na narrativa kafkiana é quando o expedicionário, que, pelas pistas que nos dá o narrador, parecia pouco interessado (Kafka 2011KAFKA, Franz. Na Colônia Penal. In: Essencial. Tradução Modesto Carone. São Paulo: Companhia das Letras em associação a Penguin Group, 2011. Livro Eletrônico.: 733) ou pouco convencido pelo discurso do oficial, se pronuncia: admitiu “a si mesmo que se tratava de uma colônia penal, que aqui eram necessárias medidas excepcionais” (Ibidem: 858). Aqui se encontra um aspecto cinematográfico na narrativa: nem sempre sabemos o que pensam os seus personagens. A câmera, assim como o narrador, não é neutra, não é isenta de opinião ou posicionamento político.

Na novela, o oficial mostra para o expedicionário documentos escritos pelo antigo comandante, mas o viajante não consegue entender nada, pois o texto é ininteligível. O poder, como a escrita, é ininteligível. As bases argumentativas racistas do colonialismo são ilógicas. É nesse ponto que o texto de Kafka explora as bases imaginárias do poder e, ao mesmo tempo, o seu limite: o que é o poder e a serviço de quem ele atua. Outras relações com o corpo, além da pele ferida, são apresentadas, como o sangue, o vômito e a contorção do corpo.

6 Considerações Finais

Os filmes coloniais mostram uma ficção romantizada e favorável da colonização por meio da seleção de cenas específicas. Pesquisas recentes revelam que o colonialismo estava presente na vida cotidiana no início do século XX e era divulgado como algo positivo. O cinema colonial adota o ponto de vista do colonizador, retratando a colonização como algo pacífico e harmonioso, sem revoltas ou resistências.

Entender a colonização a partir da máquina [Apparat] nos leva a observar as semelhanças entre as práticas e as políticas coloniais empreendidas pelas diferentes nações europeias. A máquina, como símbolo do poder, nos obriga a pensar na sua estrutura, nos aspectos abstratos e ficcionais que ela evoca. Esse movimento, de partir da ficção para pensar a concretude e a materialidade da máquina, aponta para o desnudamento desse poder colonial. Ao mesmo tempo, evidencia a ficção existente no nosso cotidiano. Chegar a uma conclusão sobre esse texto de Kafka é, na verdade, explorar aquilo que o texto não nos dá, e seu sentido indeterminado está intrínseco à própria metaforologia presente na narrativa. Logo, essa interpretação da máquina como uma representação da colonização é uma das possibilidades de leitura.

Ao contrastar diferentes representações desse passado presentes nos filmes e na novela kafkiana, percebemos que todas utilizam-se de ficcionalidades que compõem e são constituídas de um imaginário colonial, fornecendo-nos uma possível compreensão da realidade histórica daquele momento. Tal percepção, nos leva a criticar as primeiras narrativas coloniais, já que, através de uma estética informativa, documentarista, o cinema realizou uma propaganda da política colonial com o objetivo de ressaltar uma perspectiva favorável à prática colonial de dominação. Afinal, o que é a realidade histórica: a cena das crianças comportadas e alegres retratadas nos filmes feitos pelos colonizadores ou as revoltas e violências praticadas que não foram e nem sempre são registradas?

Portanto, o texto de Kafka é uma representação crítica e contraditória do discurso predominante no cinema colonial. As várias referências à colonização nessa novela confirmam a hipótese de que Kafka não apenas teve contato com o imaginário colonial da época, majoritariamente positivo como podemos ver através dos filmes coloniais, mas também contribuiu criticamente ao atribuir aspectos negativos a este imaginário. O texto Na colônia penal pode ser lido como uma resposta do autor ao momento histórico em que Kafka viveu.

Agradecimentos

Ao Prof. Fuhrmann, que compartilhou comigo os dois filmes utilizados para a análise desenvolvida neste artigo, muito obrigada. À Prof. Luciana Villas Bôas e ao Prof. Helmut Galle pela escuta, comentários e incentivo à publicação.

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Editora: Érica Schlude Wels

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    22 Mar 2024
  • Aceito
    11 Abr 2024
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