Acessibilidade / Reportar erro

Escala de Proteção e Risco de Superendividamento: Construção e Evidências de Validade

Resumo

O objetivo deste estudo é apresentar as evidências de validade da Escala de Proteção e Risco de Superendividamento (EPRIS). O instrumento foi construído para avaliar aspectos atitudinais (comportamentais, cognitivos e afetivos) que previnem ou estimulam o superendividamento, considerado um grave problema social. Participaram 444 adultos na modalidade online. A análise Fatorial Exploratória revelou a presença de dois fatores: proteção ao superendividamento (13 itens) e risco de superendividamento (21 itens), com bons níveis de ajuste. A validade de critério mostrou que ambos os fatores diferenciaram grupos quanto ao estresse autopercebido, preocupação financeira, presença/ausência de dívidas e perfil de consumo. Considera-se que a EPRIS tem o potencial de contribuir na formulação de políticas públicas voltadas à abordagem do fenômeno do superendividamento.

Palavras-chave:
consumo; superendividamento; análise fatorial; evidências de validade

Abstract

This study aims to present evidence for the validity of the Over-indebtedness Protection and Risk Scale (OPRIS). The instrument was constructed to assess attitudinal aspects (behavioral, cognitive, and affective) that prevent or encourage over-indebtedness, considered a serious social problem. Four hundred and forty-four adults participated in the online version. Exploratory Factor Analysis revealed the presence of two factors: protection against over-indebtedness (13 items) and risk of over-indebtedness (21 items), with good levels of adjustment. Criterion validity showed that both factors differentiated groups in terms of self-perceived stress, financial concern, presence/absence of debt, and consumption profile. OPRIS is considered to have the potential to help formulate public policies aimed at addressing the phenomenon of over-indebtedness.

Keywords:
consumption; over-indebtedness; factor analysis; evidence of validity.

Estudos apontam para o grande número de pessoas endividadas no Brasil (Borges, 2018Borges, J. P. R. (2018). Overindebtness in Brazil: A study based on Law and Economics. Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central, 12(2), 95-109. https://revistapgbc.bcb.gov.br/index.php/revista/issue/view/29/A6%20V.12%20-%20N.2
https://revistapgbc.bcb.gov.br/index.php...
; Hennigen, 2019Hennigen, I. (2019). Indebted, I have to: Government of life by finance. Forum Linguistic, 16(3), 3953-3965. https://doi.org/10.5007/1984-8412.2019v16n3p3953
https://doi.org/10.5007/1984-8412.2019v1...
; Leandro & Botelho, 2022Leandro, J. C., & Botelho, D. (2022). Consumer over-indebtedness: A review and future agenda. Journal of Business Research, 145, 535-551. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2022.03.023
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2022.0...
). Em novembro de 2022, três em cada quatro famílias brasileiras (75,6%) possuíam dívidas oriundas de cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, empréstimo pessoal e/ou prestação de carro e casa. Uma em cada quatro (26,1%) possuía dívidas em atraso e 10,1% afirmaram que não tinham condições de pagá-las em um futuro próximo. Nesse mês, o número de famílias pobres com dívidas atrasadas alcança a máxima histórica (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo [CNC], 2022Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. (2022). Pesquisa de endividamento e inadimplência do consumidor [Consumer debt and default survey] (Nov.). CNC, SESC, Senac. https://portal-bucket.azureedge.net/wp-content/2022/12/aa61da37abe25436bf3ff86c7541f38d.pdf
https://portal-bucket.azureedge.net/wp-c...
).

A inflação corrente elevada, disseminada e persistente tem deteriorado os orçamentos domésticos e reduzido o poder de compra das famílias, em especial as de menor renda. Como nem mesmo as constantes altas na taxa básica de juros têm surtido efeito para conter a inflação, tampouco arrefecido a dinâmica do endividamento, a saída do brasileiro para recompor a renda corroída pela desvalorização monetária tem sido o crédito (CNC, 2021Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. (2021, Aug. 25). Relatório especial Peic agosto 2021 [Peic special report August 2021]. https://portal-bucket.azureedge.net/wp-content/2021/08/Analise-Peic-Agosto-de-2021_especial.pdf
https://portal-bucket.azureedge.net/wp-c...
). As perspectivas para melhorar o problema estão longe de serem animadoras. O Brasil passa por uma grave crise econômica, marcada pelo elevado índice de desemprego e a crescente precarização e informalização do trabalho.

Apesar de não haver consenso sobre uma definição de superendividamento na atualidade (Leandro & Botelho, 2022Leandro, J. C., & Botelho, D. (2022). Consumer over-indebtedness: A review and future agenda. Journal of Business Research, 145, 535-551. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2022.03.023
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2022.0...
), o termo refere-se à impossibilidade do consumidor cumprir com o pagamento de compromissos financeiros previamente assumidos (Bodea & Deceanu, 2022Bodea, G., & Deceanu, L. (2022). Private over-indebtedness, a concept that has become too common? Review of Economic Studies and Research Virgil Madgearu, 15(1), 5-33. https://doi.org/10.24193/RVM.2022.15.83
https://doi.org/10.24193/RVM.2022.15.83...
). As consequências do superendividamento para os consumidores podem ser perturbadoras, desestabilizadoras e desestruturantes (Leandro & Botelho, 2022Leandro, J. C., & Botelho, D. (2022). Consumer over-indebtedness: A review and future agenda. Journal of Business Research, 145, 535-551. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2022.03.023
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2022.0...
) e a dimensão moralizante que recai sobre o problema é fonte de sofrimento psíquico para esses indivíduos (Hennigen & Borges, 2014Hennigen, I., & Borges, J. P. (2014). Moral stigma and psychological suffering: Problematizing the individualization of consumer overindebtness. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 14(1), 214-238. https://doi.org/10.12957/epp.2014.10465
https://doi.org/10.12957/epp.2014.10465...
).

Os efeitos do superendividamento sobre a saúde incluem perda do sono (Warth et al, 2019Warth, J., Puth, M., Tillman, J., Porz, U., Weckbecker, K., & Münter, E. (2019). Over-indebtedness and its association with sleep and sleep medication use. BMC Public Health, 19(957), 1-15. https://doi.org/10.1186/s12889-019-7231-1
https://doi.org/10.1186/s12889-019-7231-...
), desesperança (Hudges, 2021Hudges, C. (2021). The impact of creditworthiness on financial well-being, anxiety, depression, hopelessness, and suicide. Journal of Accounting and Finance, 21(3), 143-160. http://www.m.www.na-businesspress.com/JAF/JAF21-3/10_HughesFinal.pdf
http://www.m.www.na-businesspress.com/JA...
), depressão, angústia, suicídio e ansiedade (Turunen & Hiilamo, 2014Turunen, E., & Hiilamo, H. (2014). Health effects of indebtedness: A systematic review. BMC Public Health, 14(489), 1-8. https://doi.org/10.1186/1471-2458-14-489
https://doi.org/10.1186/1471-2458-14-489...
). Além das consequências sobre o bem-estar individual, o superendividamento afeta a esfera da saúde pública (Gaglietti & Dorst, 2016Gaglietti, M. J., & Dorst, D. Z. (2016). The social conflicts in the context of over-indebtedness and mediation as a way to deal with them. Revista de Direito do Consumidor, 107, 1-12. http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_boletim/bibli_bol_2006/RDCons_n.107.17.PDF
http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal...
) e traz consequências nos domínios social e familiar (Almeida & Andrade, 2022Almeida, I. J. O., & Andrade, V. L. P. (2022). The psychological factors involved in the debt process from the perspective of Economic Psychology. Cadernos de Psicologia, 4(7), 490-507. https://seer.uniacademia.edu.br/index.php/cadernospsicologia/article/view/3287
https://seer.uniacademia.edu.br/index.ph...
). Ademais, o estresse financeiro induz a um baixo comprometimento organizacional e a efeitos deletérios no âmbito do trabalho, com níveis elevados de absenteísmo (Kim et al., 2003Kim, J., Garman, E.T., & Sorhaindo, B. (2003). Relationships among credit counseling clients’ financial well-being, financial behaviors, financial stressor events, and health. Financial Counseling and Planning, 14(1), 75-87. https://ssrn.com/abstract=2265623
https://ssrn.com/abstract=2265623...
), estimulando a ocorrência de faltas injustificadas (Souza et al., 2017Souza, F. T. G., Eid Júnior, W., & Rochman, R. R. (2017). Os efeitos do estresse financeiro no trabalho [The effects of financial stress at work]. PWC, FGV, Quartier Latin.). Em que pesem as graves consequências do superendividamento, há de se destacar a invisibilidade que paira sobre os consumidores superendividados devido à ausência de políticas públicas voltadas para abordar o problema no Brasil (Pérez-Nebra et al, 2020Pérez-Nebra, A. R., Siqueira, A. O., Couto, C., & Oliveira, L. F. (2020). Overindebtedness Program: “A light at the end of the tunnel for who is lost”. Psicologia: Ciência e Profissão, 40(e194281), 1-16. https://doi.org/10.1590/1982-3703003194281
https://doi.org/10.1590/1982-37030031942...
).

O acesso ao crédito no Brasil foi massificado entre os anos 2001 e 2006 devido ao ingresso de 50 milhões de novos correntistas pouco acostumados com as regras de mercado no sistema financeiro, devido à bancarização das políticas de transferência de renda à população. Segundo Souza (2013Souza, M. A. P. (2013). O uso do crédito pelo consumidor: Percepções multifacetadas de um fenômeno intertemporal [Consumer use of credit: Multifaceted perceptions of an intertemporal phenomenon] Master’s Dissertation, Universidade de Brasília. Repositório Institucional da UnB. https://repositorio.unb.br/bitstream/10482/13255/1/2013_MarcosAguerriPimentadeSouza.pdf
https://repositorio.unb.br/bitstream/104...
), esses consumidores são mal preparados para contratar operações de crédito na intenção de adquirir bens e serviços pela primeira vez. Junto a isso, surge a publicidade agressiva e o abuso nas práticas para liberação facilitada de crédito por parte dos bancos (Marques & Cavallazzi, 2006Marques, C. L., & Cavallazzi, R. L. (2006). Direitos do consumidor endividado: Superendividamento e crédito [Consumer rights in debt: Over-indebtedness and credit]. Revista dos Tribunais. https://bdjur.stj.jus.br/jspui/bitstream/2011/8655/Direitos_do_Consumidor_Endividado.pdf
https://bdjur.stj.jus.br/jspui/bitstream...
). Visando aproveitar a expansão do consumo por parte das famílias de baixa renda ocorrido no segundo semestre de 2004 (primeiro governo Lula), conglomerados financeiros e redes varejistas se associaram e geraram um significativo crescimento no número de operações de crédito no país. Isso facilitou a aquisição de bens e serviços por meio do parcelamento de compras no varejo e de um aumento da disponibilidade de crédito por parte instituições financeiras, devido à redução da taxa básica de juros (Banco Central do Brasil, 2005Banco Central do Brasil. (2005). Relatório de estabilidade financeira: Maio 2005 [Financial stability report: May 2005] (Vol. 4, N. 1). BC. https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/ref/200505/RELESTABM2005-ref2005v4n1completop.pdf
https://www.bcb.gov.br/content/publicaco...
).

A ausência de programas de educação financeira associada ao estímulo ao consumo e ao excesso de crediários trouxe consequências negativas uma década após esse período de massiva expansão do crédito e consumo, quando o país sentiu os efeitos de uma crise econômica mundial, o que tornou milhões de brasileiros inadimplentes. Apesar da contração de dívidas ser comum em sociedades capitalistas, quando ela afeta as classes sociais menos favorecidas, famílias deixam de ser atendidas em suas necessidades básicas, o que agrava sua situação de exclusão social (Pereira & Almeida, 2020Pereira, L. M., & Almeida, R. S. (2020). O superendividamento na vida das trabalhadoras e dos trabalhadores: Por um olhar para além do aparente [Over-indebtedness in the lives of workers: Looking beyond the apparent]. Appris.).

Há dois tipos de medidas para auxiliar os consumidores em relação ao superendividamento. A primeira inclui formas de prevenir o fenômeno, como ações em educação financeira, aconselhamento da dívida e esclarecimento sobre as consequências da tomada de crédito. A segunda aborda o problema de forma propositiva, e inclui medidas que dizem respeito à sua regulação e ao seu tratamento (Sampaio, 2018Sampaio, M. A. S. (2018). Superendividamento e consumo responsável de crédito [Over-indebtedness and responsible credit consumption]. TJDFT. https://www.tjdft.jus.br/institucional/escola-de-administracao-judiciaria/documentos_e-books/e-books-pdf/Superendividamentoeconsumoresponsveldecrdito.pdf
https://www.tjdft.jus.br/institucional/e...
). A formulação de políticas públicas sobre o tema deve tanto incentivar os consumidores a reduzir seus níveis de endividamento, quanto abordar aspectos subjetivos sobre o ato de consumir, como, por exemplo, a crença de que as posses trazem felicidade (Nepomuceno & Laroche, 2015Nepomuceno, M. V., & Laroche, M. (2015). The impact of materialism and anti-consumption lifestyles on personal debt and account balances. Journal of Business Research , 68(3), 654-664. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2014.08.006
https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2014.0...
).

Apesar da relevância da temática do superendividamento, uma revisão de literatura em bases de dados nacionais e internacionais para buscar medidas do superendividamento revelou a indisponibilidade de instrumentos sobre a temática (Machado, 2021Machado, A. C. A. (2021). Proteção e risco de superendividamento, variáveis psicológicas e financeiras: Estudo de preditores de qualidade de vida [Protection and risk of over-indebtedness, psychological and financial variables: A study of predictors of quality of life ] Doctorate Thesis, Universidade de Brasília. Repositório Institucional da UnB. https://repositorio.unb.br/handle/10482/42997
https://repositorio.unb.br/handle/10482/...
), o que alertou para a importância de se elaborar uma escala para investigar o fenômeno. Escalas que mensuram outros aspectos sobre o uso do dinheiro foram encontradas, como no estudo nacional de Moreira e Tamayo (1999Moreira, A., & Tamayo, A. (1999). The meaning of money scale: Development and validation. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 15(2), 93-105. https://doi.org/10.1590/S0102-37721999000200002
https://doi.org/10.1590/S0102-3772199900...
), mas nenhuma que aborde diretamente o superendividamento. A relevância desse instrumental justifica-se tanto pelas graves consequências individuais e sociais ocasionadas pelo excesso de dívidas, quanto por seu potencial de mensurar aspectos relacionados a um problema social que vem afetando cada vez mais a população brasileira. Acredita-se que a medida tem o potencial de contribuir para o planejamento de ações preventivas e posventivas voltadas à mitigação do excesso de dívidas que recai sobre milhões de cidadãos brasileiros.

Dimensões Teóricas

Mediante a realização de diferentes procedimentos de identificação e análise de informações de natureza teórica, com revisões de literatura em diferentes áreas do conhecimento, e de natureza prática (entrevistas com especialistas, além de experiências profissionais em decorrência do atendimento ao público de pessoas endividadas), as dimensões teóricas do endividamento foram definidas. Foram indicadas sete dimensões: compra impulsiva, compra compulsiva, materialismo, bem-estar financeiro, influências sociais sobre o consumo, crenças sobre o dinheiro e comportamento financeiro.

Compra Impulsiva

Ocorre quando um consumidor tem um desejo repentino, intenso e persistente de adquirir algo imediatamente, de forma complexa, o que pode estimular um conflito emocional (Rook, 1987Rook, D. W. (1987). The buying impulse. Journal of Consumer Research, 14(2), 189-199. https://doi.org/10.1086/209105.
https://doi.org/10.1086/209105...
). Fatores internos e externos influenciam esse tipo de compra. Dentre os fatores externos estão promoções, facilidades para o pagamento e possibilidade de testar ou degustar o produto nos pontos de venda. Os fatores internos relacionam-se a características demográficas e ao estado de espírito do consumidor no momento da compra, quando prevalecem sentimentos positivos, tais como euforia, calma, felicidade, alegria e disposição, em detrimento de sentimentos negativos, como depressão, ansiedade, tristeza, irritação e cansaço (Serviço de Proteção ao Crédito, 2015Serviço de Proteção ao Crédito. (2015). Os influenciadores da compra por impulso [The influencers of impulse buying]. https://www.spcbrasil.org.br/uploads/st_imprensa/analise_os_influenciadores_das_compras_por_impulso.pdf
https://www.spcbrasil.org.br/uploads/st_...
). Compra impulsiva é um fator de risco para a saúde financeira. No presente estudo, compra impulsiva foi definida como a conduta de comprar realizada de ímpeto, sem uma prévia reflexão sobre sua real necessidade.

Compra Compulsiva

Para que seja considerada compra compulsiva, é necessário que o comportamento de comprar possua duas características: ser repetitivo e causar problemas para o indivíduo. Em um estágio inicial, o comportamento de comprar compulsivamente gera um sentimento de alívio, o qual em seguida é substituído pela culpa por ter comprado. Em um estágio mais avançado, a pessoa percebe que perdeu o controle da situação, o que pode provocar ansiedade e frustração. Itens adquiridos por meio de compras compulsivas geralmente são escondidos de terceiros pelo receio de receberem críticas e o que se adquire é menos importante que o ato de comprar em si. As consequências adversas da compra compulsiva podem adquirir contornos legais e financeiros, além de sentimentos aversivos, como angústia, depressão, culpa e conflitos interpessoais e conjugais relevantes (Lejoyeux & Weinstein, 2010Lejoyeux, M., & Weinstein, A. (2010). Compulsive buying. The American Journal of Drug and Alcohol Abuse, 35(5), 248-253. https://doi.org/10.3109/00952990.2010.493590
https://doi.org/10.3109/00952990.2010.49...
). Compra compulsiva é um fator de risco para a saúde financeira. Nessa pesquisa, compra compulsiva refere-se ao comportamento de comprar visando satisfazer a uma necessidade incontrolável e diminuir sintomas psicológicos desconfortáveis, provocando culpa e arrependimento.

Materialismo

Materialismo refere-se ao valor conferido à aquisição de bens materiais (Borroughs & Rindfleisch, 2002Borroughs, J. E., & Rindfleisch, A. (2002). Materialism and well-being: A conflicting values perspective. Journal of Consumers Research, 29, 348-370. https://doi.org/10.1086/344429
https://doi.org/10.1086/344429...
). Em um grau extremo, as posses assumem lugar central na vida da pessoa e proporcionam suas maiores fontes de satisfação e insatisfação pessoal (Belk, 1985Belk, R. W. (1985). Materialism: Aspects of living in the material world. Journal of Consumer Research, 12(3), 265-280. https://doi.org/10.1086/208515
https://doi.org/10.1086/208515...
). Pessoas materialistas possuem mais preocupações financeiras, piores habilidades para gerenciar dinheiro e maior tendência a realizar gastos desnecessários se comparadas com indivíduos não-materialistas (Garðarsdóttir & Dittmar, 2012Garðarsdóttir, R. B., & Dittmar, R. B. (2012). The relationship of materialism to debt and financial well-being: The case of Iceland’s perceived prosperity. Journal of Economic Psychology, 33(3), 471-481. https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.12.008
https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.12.0...
). O maior objetivo de pessoas materialistas é acumular o máximo que podem para si mesmas (Kasser, 2002Kasser, T. (2002). The high price of materialism. The MIT Press.). Materialismo é um fator de risco para a saúde financeira. No presente estudo, materialismo foi definido como a valorização excessiva das posses e dos bens materiais.

Bem-Estar Financeiro

Bem-estar financeiro define-se por um estado presente em pessoas que conquistam os seguintes pilares em relação à vida financeira: capacidade de honrar as suas obrigações financeiras; segurança em relação ao futuro financeiro; ser capaz de lidar com imprevistos financeiros; e possibilidade de fazer escolhas que permitam aproveitar a vida (Consumer Financial Protection Bureau, 2015Consumer Financial Protection Bureau. (2015). Finnancial well-being: The goal of financial education. CFPB. https://files.consumerfinance.gov/f/201501_cfpb_report_financial-well-being.pdf
https://files.consumerfinance.gov/f/2015...
). O bem-estar financeiro associa-se à saúde física e mental e é considerado um importante determinante de intercorrências em saúde (Clayton et al., 2016Clayton, M., Liñares-Zegarra, J., & Wilson, J. O. (2016). Does debt affect health? Cross country evidence on the debt-health nexus. Social Science and Medicine, 130, 51-58. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2015.02.002
https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2015...
). Pessoas com alto nível de bem-estar financeiro e que vivenciam menos estressores ligados às finanças ficam menos doentes que as demais (Kim et al., 2003Kim, J., Garman, E.T., & Sorhaindo, B. (2003). Relationships among credit counseling clients’ financial well-being, financial behaviors, financial stressor events, and health. Financial Counseling and Planning, 14(1), 75-87. https://ssrn.com/abstract=2265623
https://ssrn.com/abstract=2265623...
), enquanto pessoas endividadas são mais passíveis de sofrerem estresse e outras consequências dele oriundas, já que este afeta a emissão de comportamentos protetivos à saúde (Jacoby, 2002Jacoby, M. (2002). Does indebtedness influence health? A preliminary inquiry. The Journal of Law, Medicine & Ethics, 30(4), 560-571. https://doi.org/10.1111/j.1748-720X.2002.tb00426.x
https://doi.org/10.1111/j.1748-720X.2002...
). Bem-estar financeiro é um fator de proteção da saúde financeira. Neste estudo, bem-estar financeiro define-se como a capacidade de honrar obrigações financeiras sem dificuldade, ao lado de segurança e tranquilidade em relação ao futuro financeiro.

Influências Sociais sobre o Consumo

Existem diversas fontes de influências sociais sobre o consumo, sendo a familiar uma delas (Rindfleisch et al.,1997Rindfleisch, A., Burroughs, J. E., & Denton, F. (1997). Family structure, materialism, and compulsive consumption. Journal of Consumer Research, 23(4), 312-325. https://doi.org/10.1086/209486.
https://doi.org/10.1086/209486...
). As instituições financeiras, inclusive pelo fato de sofrerem pressões competitivas, também influenciam o consumo, já que estimulam o endividamento e podem conceder empréstimos de forma irresponsável, provocando superendividamento (Garðardóttir & Dittmar, 2012Garðarsdóttir, R. B., & Dittmar, R. B. (2012). The relationship of materialism to debt and financial well-being: The case of Iceland’s perceived prosperity. Journal of Economic Psychology, 33(3), 471-481. https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.12.008
https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.12.0...
). Variáveis econômicas, educacionais e psicológicas também foram associadas à má gestão do dinheiro, assim como a tendência em imitar os outros e uma busca intensa por um alto padrão de vida material (Kahneman & Tversky, 1979Kahneman, D., & Tversky, A. (1979). Prospect theory: An analysis of decision under risk. Econometrica, 47(2), 263-292. http://hassler-j.iies.su.se/COURSES/NewPrefs/Papers/KahnemanTversky%20Ec%2079.pdf
http://hassler-j.iies.su.se/COURSES/NewP...
). Influências sociais sobre o consumo pode ser um fator de risco ou de proteção para a saúde financeira. No presente estudo, influências sociais sobre o consumo definem-se como aspectos externos, de ordem social, que influenciam positiva ou negativamente o comportamento financeiro.

Crenças sobre Dinheiro

Essa dimensão foi formada a partir da análise das entrevistas com os especialistas e da experiência profissional da primeira autora. Muito embora não tenha sido encontrada na literatura menção a essa temática em específico, decidiu-se por sua inclusão como uma das dimensões do estudo, tendo em vista dois aspectos. O primeiro é que a literatura aponta haver uma correlação entre o que uma pessoa pensa e o que ela faz em termos de prevenção de agravos à saúde, sugerindo uma relação entre aspectos cognitivos e comportamentais no desenvolvimento de doenças. Muito embora crenças funcionais (desejáveis) não garantam, por si sós, a emissão de comportamentos adaptativos, a alteração de processos cognitivos pode levar à modificação do comportamento (Dobson & Dozois, 2006Dobson, K. S., & Dozois, D. J. (2006) Fundamentos históricos e filosóficos das terapias cognitivo-comportamentais [Historical and philosophical foundations of cognitive-behavioral therapies]. In K. Dobson (Ed.), Manual de Terapias Cognitivo-Comportamentais [Handbook of Cognitive-Behavioral Therapies] (pp. 17-43). Artmed.). O outro aspecto considerado foi que o desenvolvimento de programas voltados ao atendimento do público superendividado requer o prévio conhecimento das crenças disfuncionais que, porventura, são compartilhadas por um grupo. Isso permitiria aos planejadores da intervenção direcionar o treinamento de forma mais específica, de modo a preencher possíveis lacunas informacionais por parte dessa população, refletindo, assim, em resultados mais efetivos da intervenção. Crenças sobre o dinheiro podem ser tanto um fator de proteção quanto de risco para a saúde financeira. Para fins desta pesquisa, crenças sobre dinheiro dizem respeito às crenças de uma pessoa em relação ao dinheiro que podem influenciar seu comportamento financeiro.

Comportamento Financeiro

A dimensão crenças sobre o dinheiro relaciona-se ao comportamento financeiro, nesta pesquisa tida como uma dimensão constitutiva. O Modelo de Crenças em Saúde (MCS), proposto por Rosenstock (1990Rosenstock, I. M. (1990). The health belief model: Explaining health behavior through expectancies. In K. Glanz, F. M. Lewis & B. K. Rimer (Eds.), Health behavior and health education: Theory, research and practice (pp. 39-62). Jossey-Bass.), é especialmente utilizado em estudos sobre doenças crônicas (HIV/aids, doenças cardiovasculares etc.). Ao se tentar transpô-lo para abordar a temática da saúde financeira, vislumbram-se contribuições relevantes sobre a área, que podem agregar conhecimento sobre a temática em estudo, tendo em vista que as consequências do superendividamento sobre a saúde também são graves e merecem ser abordadas tanto em termos de prevenção quanto de tratamento. Além das crenças sobre dinheiro, esta pesquisa também investigou aspectos relacionados à forma como as pessoas se comportam em relação ao seu uso. O comportamento financeiro pode ser tanto um fator de proteção quanto de risco para a saúde financeira. Para fins de definição do construto teórico, no presente estudo, comportamento financeiro diz respeito à conduta das pessoas em relação ao dinheiro.

Apesar da relevância do tema e dos impactos que provoca sobre a saúde mental, ainda há certa invisibilidade do superendividamento no campo da ciência psicológica. De forma a impedir o avanço do problema sobre a população, é preciso estabelecer um rol de políticas públicas voltadas a auxiliar as pessoas superendividadas, preferencialmente com a participação de profissionais da psicologia, tendo em vista os impactos que o superendividamento provoca sobre a saúde mental (Gathergood, 2012Gathergood, J. (2012). Self-control, financial literacy and consumer over-indebtedness. Journal of Economic Psychology, 33, 590-602. https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.11.006
https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.11.0...
). Dessa forma, o presente estudo objetivou construir e estimar as propriedades psicométricas de uma medida de superendividamento, para avaliar aspectos atitudinais (cognitivos, afetivos e comportamentais) que previnem ou estimulam essa condição.

Método

A versão preliminar do instrumento foi composta por 56 itens distribuídos em sete dimensões constitutivas, sendo elas: compra impulsiva, compra compulsiva, materialismo, bem-estar financeiro, influências sociais sobre o consumo, crenças sobre o dinheiro, e, por fim, comportamento financeiro, apresentadas na introdução do presente artigo.

Tal como assinalado, essas dimensões foram definidas após a realização de procedimentos de coleta e análise de informações, cujo desenvolvimento se deu em três etapas. A primeira etapa incluiu procedimentos de natureza teórica, como revisões de literatura em diferentes áreas do conhecimento - como psicologia, direito e economia - e em propostas legislativas que tratam do assunto e, também, de natureza prática (entrevistas com especialistas, além de experiências profissionais acumuladas por meio do atendimento a esse público). A segunda etapa incluiu dois procedimentos empíricos: a realização de análise semântica junto a nove voluntários com diversas características sociodemográficas, e a análise de juízes, realizadas com três professores universitários com experiência acadêmica e/ou profissional na temática do superendividamento. A terceira etapa, quando a escala estava com 45 itens, consistiu na análise fatorial exploratória (AFE), cuja coleta de dados ocorreu no ano 2021, a qual foi realizada na modalidade online, em virtude das dificuldades trazidas pela pandemia da doença do coronavírus (Covid-19).

Participantes

Participaram 444 respondentes, em amostra de conveniência, com idades variando de 18 a 86 anos (M = 46; DP = 14,89). A maior parte (62,6%; n = 278) era do sexo feminino, declarou-se branca (62,4%; n = 277); possuía pós-graduação (59,9%, n = 266) e residia no Distrito Federal (36,5%; n = 162), seguida dos estados de São Paulo (23%, n = 102), Goiás (6,8%, n = 30) e Rio de Janeiro (5,6%, n = 25). Aproximadamente três quartos (73,9%, n = 328) declararam exercer algum tipo de atividade remunerada. Cento e cinco participantes (23,6%) declararam possuir dívidas em atraso e 280 (63,1%) disseram estar ou extremamente preocupados ou preocupados com sua situação financeira.

Instrumentos

Foram utilizados dois instrumentos de pesquisa. O primeiro foi a medida em teste (posteriormente denominada Escala de Proteção e Risco de Superendividamento - EPRIS), contendo 45 itens quando da realização da análise semântica, contendo opções de resposta distribuídas em uma escala Likert de 1 a 5. O segundo foi um questionário sociodemográfico e financeiro construído para fins do estudo, composto por 30 perguntas-chave.

Procedimentos de Coleta de Dados

A coleta de dados ocorreu por meio das funcionalidades oferecidas pela plataforma eletrônica Lime Survey. Ao acessarem o link no qual o questionário estava hospedado, os participantes deveriam assinar eletronicamente o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) antes de acessar o questionário propriamente dito. O estudo recebeu aprovação por meio do Parecer n. 4.264.782 do Comitê de Ética em Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais da Universidade de Brasília.

Análise de Dados

Análises fatoriais exploratórias (AFEs) foram realizadas no software FACTOR versão 10.10.02 para avaliar a estrutura interna do instrumento. Diante da falta de normalidade multivariada dos dados foi utilizado o método de extração Robust Diagonally Weighted Least Squares (RDWLS; Muthén & Kaplan, 1985Muthén, B., & Kaplan, D. (1985). A comparison of some methodologies for the factor analysis of non-normal Likert variables. British Journal of Mathematical and Statistical Psychology, 38, 171-189. http://doi.org/10.1111/j.2044-8317.1985.tb00832.x
http://doi.org/10.1111/j.2044-8317.1985....
). Também foram considerada matrizes de correlação policóricas (Asparouhov & Muthén, 2010Asparouhov, T., & Muthén, B. (2010). Simple second order chi-square correction. Unpublished manuscript. https://www.statmodel.com/download/WLSMV_new_chi21.pdf.
https://www.statmodel.com/download/WLSMV...
) e rotação Robust Promin. O software Statistical Package for Social Sciences- SPSS versão 26.0 foi utilizado para análises estatísticas descritivas e inferenciais do estudo, bem como para estimação do índice de consistência interna alfa de Cronbach. A fidedignidade composta (FC) dos subfatores e fatores também foi estimada. O nível de significância de 5% foi adotado no estudo.

Para investigar as evidências de validade baseadas na relação com outras variáveis (relacionamento com o critério), estatísticas inferenciais não paramétricas (Mann-Whitney e Kruskal-Wallis) foram efetuadas para comparação de médias entre os fatores da medida em construção com as seguintes variáveis: (i) presença de dívidas em atraso, (ii) estresse financeiro percebido, (iii) preocupação com a situação financeira atual e, por fim, (iv) perfil quanto a consumo, dívidas e poupança. Destaca-se que tais variáveis descrevem aspectos importantes da vida financeira dos participantes.

Resultados

Análise Fatorial Exploratória

Foram efetuadas análises para sete, quatro e três fatores, preliminarmente, porém, chegou-se à melhor solução do instrumento com dois fatores, segundo resultados da AFE. Essa tentativa fixou dois fatores tendo em vista a indicação da análise paralela (AP). Nessa análise, optou-se por excluir previamente quatro itens/variáveis, tendo em vista que na solução de três fatores os mesmos apresentaram cargas fatoriais abaixo de 0,30, indicando sua fragilidade. Assim, 41 variáveis/itens foram analisadas. A solução fatorial apresentou índices adequados de ajuste: Testes de Esfericidade de Bartlett = 4944,8; gl = 820; p < 0,001; KMO = 0,90; RMSEA (95% IC) = 0,03 (0,010; 0,050); CFI = 0,98; TLI = 0,98.

O Goodness of Fit Index (GFI), analisado com bootstraping, foi igual a 0,97, IC 95% (0,97; 0,98). Foi calculado o coeficiente multivariado de Mardia, cujos valores foram: assimetria = 395,75; p > 0,99; curtose = 2178,23; p < 0,001. Este último resultado indicou que o pressuposto de normalidade multivariada dos dados não foi atendido.

Os dois fatores explicaram 32,24% da variância e seus índices de fidedignidade composta foram adequados (FC > 0,70). Optou-se, então, por considerar apenas cargas-fatoriais acima de 0,30, visando um instrumento mais parcimonioso e de fácil aplicação, o que levou à exclusão de seis itens. Um sétimo item foi excluído por decisão dos pesquisadores, devido ao seu conteúdo ter-se mostrado de difícil compreensão.

Assim, a versão final da escala ficou composta por 34 itens e dois fatores. As sete dimensões inicialmente propostas se agruparam nos dois fatores descritos a seguir. O fator 1, denominado proteção ao superendividamento, agregou itens das dimensões teóricas bem-estar financeiro (BEF; 4 itens), comportamento financeiro (CF; 6 itens) e crenças sobre o dinheiro (CD; 3 itens), totalizando 13 itens. Esse fator e seus itens se referem a aspectos que previnem ou evitam que o consumidor chegue à situação de superendividamento, cuja definição se refere ao conjunto de comportamentos de consumo visando à segurança financeira em relação ao futuro, caracterizados pelo hábito de poupar e refletir antes de gastar, baseado em crenças funcionais sobre o uso do dinheiro.

O fator 2, intitulado risco de superendividamento, agrupou itens das dimensões teóricas influências sociais sobre o consumo (IS; seis itens), compra compulsiva (CC; oito itens), materialismo (M; dois itens) e compra impulsiva (CI; cinco itens), somando 21 itens. Esse fator representa aspectos que estimulam ou induzem o consumidor a tornar-se superendividado, sendo definido como o conjunto de comportamentos de consumo caracterizado pela realização de compras por impulso, em que o valor social da aquisição é preponderante sobre sua real necessidade, baseado na crença de que posses e aquisições influenciam no valor que as pessoas têm para a sociedade, podendo estar associado a um desejo irresistível de comprar. A Tabela 1 apresenta as cargas fatoriais dos itens, o percentual de variância explicada, os alfas de Cronbach e os valores da fidedignidade composta (FC) por fator.

Tabela 1
Solução fatorial com cargas fatoriais, comunalidades, percentual de variância explicada e índices de consistência interna da Escala de Proteção e Risco ao Superendividamento

A análise da consistência interna a partir do alfa de Cronbach e da fidedignidade composta (FC) foi calculada para os sete subfatores da EPRIS, sendo que quatro deles obtiveram alfas e FCs superiores ou iguais a 0,70, a saber: compra compulsiva (α = 0,85; FC = 0,82), comportamento financeiro (α = 0,82; FC = 0,83), compra impulsiva (α = 0,75; FC = 0,77) e bem-estar financeiro (α = 0,70; FC = 0,69). Os outros três subfatores - materialismo (α = 0,46; FC = 0,20), crenças sobre o dinheiro (α = 0,53; FC = 0,33) e influências sociais (α = 0,51; FC = 0,56) - obtiveram valores baixos, indicando fidedignidade reduzida. Além disso, ao verificar os valores do Bayesian Information Criterion (BIC), o modelo bifatorial foi igual a 1.807,15 sendo que quanto menor o valor, mais ajustado é o modelo, e esse foi o menor valor identificado se comparado às análises fatoriais anteriores (Damásio & Dutra, 2017Damásio, B. F., & Dutra, D. F. (2017). Análise fatorial exploratória: Um tutorial com o software Factor [Exploratory factor analysis: A tutorial with Factor software]. In B. F. Damásio & J. C. Borsa (Eds.), Manual de Desenvolvimento de Instrumentos Psicológicos [Manual for the development of psychological instruments] (pp. 241-265). Vetor.).

As análises descritivas do fator 1 Proteção ao Superendividamento indicaram os seguintes valores: M = 3,95; DP = 0,70; Mdn = 4,08; assimetria = -0,65; curtose = -0,15; máximo = 5,0; mínimo = 1,31. Quanto ao fator 2 Risco de Superendividamento os valores observados foram: M = 1,87; DP = 0,60; Mdn = 1,76; assimetria = 1,17; curtose = 1,56; máximo = 4,05; mínimo = 1,00.

Investigando Evidências de Validade: Relação da EPRIS com outras Variáveis Financeiras

Houve infração do pressuposto da normalidade nas variáveis risco (K-S = 0,01; p ≤ 0,001; S-W = 0,92; p ≤ 0,001) e proteção ao superendividamento (K-S = 0,11; p ≤ 0,001; S-W = 0,95; p ≤ 0,001), sendo que testes não paramétricos foram aplicados nas análises subsequentes. Para investigar evidências baseadas na relação com outras variáveis (validade de critério), quatro variáveis referentes à vida financeira foram selecionadas para teste de comparação de medianas dos dois fatores da EPRIS, a saber: presença de dívidas em atraso, preocupação com a vida financeira atual, estresse financeiro percebido (as cinco alternativas de resposta foram agrupadas em três níveis: estresse baixo ou nulo; estresse médio e estresse alto ou extremamente alto) e perfil de consumo.

No teste de Mann-Whitney (Tabela 2), pessoas com dívidas em atraso tiveram medianas mais altas no fator risco de superendividamento (z = -2,89; p ≤ 0,01; r = -0,14) e essas diferenças foram significativas (U = 14476,50; df = 1; p = 0,004). No que se refere ao fator proteção, as diferenças também foram significativas (U = 5511,50; df = 1; p ≤ 0,001): as medianas das pessoas com dívidas atrasadas foram menores do que as daquelas que não tinham essas dívidas (z = -10,70; p ≤ 0,01; r = -0,51).

Tabela 2
Comparação de medianas dos fatores proteção e risco de superendividamento segundo presença de dívidas em atraso, estresse financeiro percebido e preocupação com a situação financeira atual (n = 444)

Foram avaliadas diferenças de medianas dos fatores de risco e proteção ao superendividamento entre pessoas com níveis diferentes de estresse financeiro percebido (Tabela 2). O resultado foi estatisticamente significativo para risco de superendividamento (H [2] = 21,841, p ≤ 0,001). Na comparação par a par, observou-se que pessoas com estresse nulo ou muito baixo se diferenciaram daquelas com estresse alto ou extremamente alto (z = -4,65; p < 0,001; r = -0,22), bem como entre as que tiveram estresse médio com as que indicaram estresse alto ou extremamente alto (z = -2,53; p < 0,05; r = -0,12).

O fator proteção também teve resultado significativo (H [2] = 85,551, p ≤ 0,001). Na comparação par a par, as diferenças das medianas dos três grupos foram estatisticamente significativas: níveis altos ou extremamente altos de estresse tiveram medianas mais baixas em proteção ao superendividamento em relação ao nível médio de estresse (z = 5,40; p < 0,001; r = 0,26), e em relação aos que tinham estresse baixo ou nulo (z = 9,24; p < 0,001; r = 0,44). Também foi significativa a diferença entre as medianas dos que informaram estresse médio em comparação com níveis baixos ou nulos (z = 4,07; p < 0,001; r = 0,19).

Quanto à preocupação com a situação financeira atual (Tabela 2), o teste de Kruskal-Wallis também foi significativo para a variável risco de superendividamento (H [2] = 14,072; p = 0,001), sendo que as medianas foram significativamente mais altas para os extremamente preocupados em comparação com os despreocupados (z = 3,66; p < 0,001; r = 0,17), alcançando significância estatística. Esse teste também foi significativo para a proteção ao superendividamento (H [2] = 109,51, p ≤ 0,001). Na comparação par a par (Tabela 2), as medianas dos três grupos alcançaram diferenças estatisticamente significativas: pessoas despreocupadas obtiveram medianas mais altas nessa variável em relação às preocupadas (z = -7,58; p < 0,001; r = -0,36) e às que se revelaram extremamente preocupadas (z = -9,56; p < 0,001; r = -0,45). Não obstante os resultados das análises não paramétricas terem sido significativos, os tamanhos dos efeitos variaram de pequenos a médios. Houve exceção, quanto à proteção ao superendividamento na comparação entre pessoas com dívidas em atraso com as que não tinham dívidas, cujo tamanho do efeito foi grande (r = - 0,51).

Por último, procedeu-se ao teste Kruskal-Wallis com a variável perfil de consumo e os fatores de risco e proteção (Tabela 3). Como pode ser observado, o resultado foi estatisticamente significativo para risco de superendividamento (H [4] = 32,53; p ≤ 0,001). Na comparação par a par, as medianas alcançaram significância estatística entre três pares, sendo que a condição 5 (gasto menos do que ganho e consigo guardar dinheiro mensalmente) teve mediana mais baixa se comparada às condições 3 (z = 4,07; p < 0,001; r = 0,19), 2 (z = 3,95; p < 0,001; r = 0,19) e 1 (z = 3,011; p < 0,001; r = 0,14). As diferenças entre os demais pares não foram significativas.

Tabela 3
Comparação de medianas dos fatores de proteção e risco de superendividamento segundo o perfil de consumo (n = 444)

Quanto à variável proteção ao superendividamento, o resultado também foi significativo (H [4] = 226,44, p ≤ 0,001). Comparando par a par, as medianas alcançaram diferença estatística significativa entre sete pares, sendo que a condição 5 (gasto menos do que ganho e consigo guardar dinheiro mensalmente) se comparada às condições 4 (z = -4,29; p < 0,001; r = 0,20) e 5 (z = -7,20; p < 0,001; r = -0,34) foram significativas, além de outras diferenças significativas entre os demais pares, conforme dados da Tabela 3.

Não obstante os resultados dos testes Kruskal-Wallis terem sido significativos, inclusive nas comparações par a par, nota-se que os tamanhos dos efeitos variaram de pequenos a médios. Houve exceção, quanto à variável proteção ao superendividamento, na comparação entre pessoas com perfil 5 (Gasto menos do que ganho e consigo guardar dinheiro mensalmente) e nível 2 (Gasto mais do que ganho e possuo dívidas em atraso que conseguirei quitar no futuro), que atingiu efeito grande (r = -0,55).

Discussão

Este estudo teve como objetivo construir e avaliar as propriedades psicométricas de uma medida de proteção e risco ao superendividamento. Diferentemente dos instrumentos de medida que avaliam aspectos ligados ao endividamento (Chiguay et al., 2016Chiguay, L. M., Coria, M. D., & Escobar, B. A. (2016). Relationship between attitudes toward indebtedness and consumer locus of control in university students. Suma Psicológica, 23, 1-9. http://doi.org/10.1016/j.sumpsi.2015.11.002
http://doi.org/10.1016/j.sumpsi.2015.11....
; Coria et al., 2012Coria, M. D., Gaete, D. C., Rojas, C. V., Gómez, Y. G., & Aravena, J. S. (2012). Scale Attitude toward Indebtedness: Factorial validity and attitudinal profiles in Chilean university students. Universitas Psychologica, 11(2), 497-509.; Trindade et al., 2012Trindade, L. L., Righi, M. B., & Vieira, K. M. (2012). Where does the women debt come from? Construction and validation of a PLS-PM model. Revista Eletrônica de Administração, 18(3), 718-746. https://doi.org/10.1590/S1413-23112012000300006
https://doi.org/10.1590/S1413-2311201200...
) encontrados na literatura, a EPRIS busca relacionar comportamentos, crenças e valores que ampliam ou reduzem a propensão de um consumidor de tornar-se superendividado.

O perfil sociodemográfico dos respondentes da EPRIS, recrutados por meio de coleta de dados on-line, difere da realidade nacional, tendo em vista ser formada, em sua maioria, por participantes brancos, de níveis elevados de escolaridade, residentes principalmente em duas capitais nacionais. Nesse sentido, é possível que os dados coletados não reflitam de forma inequívoca a realidade dos brasileiros, mas sim, apenas de uma parcela da população, aquela que é especialmente formada pelos que possuem acesso aos meios necessários para o fornecimento desse tipo de resposta (acesso à internet, por exemplo), e familiaridade com o preenchimento de formulários eletrônicos.

A inesperada impossibilidade de recrutar um contingente considerável de participantes que fazem parte da chamada amostra clínica (pessoas que estão em situação de superendividamento), também é tida como um limitador. Futuramente, para sanar a dificuldade relacionada à aplicação do instrumento em uma maior diversidade de consumidores, sugere-se a realização de estudos presenciais em locais que atendem a essa população em específico, como Procons ou programas de atendimento a superendividados, como era a ideia inicial da pesquisa. Por consequência das limitações de mobilidade social, ocasionadas pela crise sanitária da Covid-19, assim como em virtude do inesperado encerramento das atividades do programa voltado ao público superendividado onde os dados seriam coletados, essa tática tornou-se inviável.

Alguns aspectos positivos da medida podem ser destacados. O primeiro refere-se aos índices adequados de confiabilidade dos fatores proteção e risco ao superendividamento. Ressalta-se que não houve supressão de qualquer das sete dimensões teóricas após realização da AFE, o que indica sua adequação. Destaca-se que o agrupamento dos fatores ocorreu de forma lógica e consonante com a literatura. A validade de critério mostrou que os dois fatores diferenciaram grupos em relação a aspectos da vida financeira, no que diz respeito especificamente ao estresse autopercebido, à preocupação com a situação financeira atual e à presença ou ausência de dívidas. Nessa amostra, pessoas que se percebiam mais estressadas, que estavam mais preocupadas com sua situação financeira e possuíam mais dívidas em atraso pontuaram mais significativamente no fator risco que no fator proteção ao superendividamento. Por fim, os itens que permaneceram na escala fizeram com que cada subfator estivesse hospedado ou no fator risco ou no fator proteção ao superendividamento, muito embora, originalmente, certos construtos tenham sido elaborados com afirmativas que tendiam tanto para um polo, como para outro.

Tendo em vista que os subfatores com menores índices de confiabilidade interna (alfas de Cronbach inferiores a 0,70) são formados por itens relacionados a aspectos subjetivos do consumo (crenças sobre o dinheiro, influências sociais sobre o consumo e materialismo), e não a ações concretas relacionadas ao uso do dinheiro, pode-se sugestionar que o modo como as pessoas se comportam influencia mais significativamente sua propensão ao superendividamento do que suas crenças a esse respeito. Porém, considerando que a análise da confiabilidade interna dos dois fatores gerais (proteção e risco ao superendividamento) manteve válidos também itens originalmente pertencentes a essas três dimensões, considera-se igualmente a influência das crenças sobre o consumo na propensão ao superendividamento, ainda que em menor magnitude.

Ante o exposto, na prática, quando se intenciona desenvolver ações voltadas à prevenção ou tratamento do superendividamento, é recomendável abordar tanto aspectos comportamentais quanto afetivos e cognitivos relacionados ao consumo e relação com o dinheiro. Tendo em vista suas possíveis aplicações, a terapia cognitivo-comportamental é tida como ferramenta interessante para a formulação de programas dessa natureza. Outro aspecto a ser considerado é que o fato da compra compulsiva, também denominada oniomania, caracterizar-se por uma psicopatologia, e não apenas refletir um modo de agir e pensar, optar por uma abordagem clínica em caráter interdisciplinar aumenta as possibilidades de se obterem efeitos positivos na abordagem desse problema em específico.

Em relação aos subfatores compra compulsiva e compra impulsiva, ambos pertencentes ao fator risco ao superendividamento, a EPRIS mostra que os mesmos podem, eventualmente, ser considerados fatores independentes, em consonância com os resultados encontrados por Kshatriya e Shah (2021Kshatriya, K., & Shah, P. S. (2021). A study of the prevalence of impulsive and compulsive buying among consumers in the apparel and accessories market. Vilakshan - XIMB Journal of Management. https://doi.org/10.1108/XJM-12-2020-0252
https://doi.org/10.1108/XJM-12-2020-0252...
). A análise da EPRIS confirmou que, muito embora a compra compulsiva possa ser equivocadamente denominada ou confundida com a compra por impulso, tais conceitos possuem significados distintos (Veludo-de-Oliveira et al., 2004Veludo-de-Oliveira, T. M., Ikeda, A. A., Santos, R. C. (2004). Compulsive purchase and credit card influence. Revista de Administração de Empresas, 44(3), 89-99. https://doi.org/10.1590/S0034-75902004000300007
https://doi.org/10.1590/S0034-7590200400...
).

Sugestiona-se a realização de estudos multinacionais sobre a temática como uma contribuição para explicar a força de aspectos socioeconômicos sobre a tendência ao superendividamento. Para fins de comparação, uma maior incidência de furtos em supermercados quando há também um aumento na insegurança alimentar de uma população, muito provavelmente não reflete tão somente a tendência dos consumidores em praticar o ato delituoso, mas sim, uma suposta ineficiência do Estado em lidar com problemas sociais que poderiam evitar uma maior ocorrência de furtos famélicos.

Cabe, ainda, destacar que em setembro de 2021 o governo brasileiro lançou, mais uma vez, uma política econômica de disponibilização de crédito à população de baixa renda desacompanhadamente de ações voltadas à educação financeira. Por meio do aplicativo de um banco público, será disponibilizado crédito de até R$1.000,00 para pagamento mensal em até 24 vezes, a uma taxa de 3,99% ao mês (Governo Federal, 2021Governo Federal. (2021, Aug. 27). Lançado Crédito Caixa Tem que concede até R$ 1 mil em empréstimo feito pelo celular [Caixa Tem Credit launched, granting up to R$ 1,000 in loans via cell phone]. Gov.br. https://www.gov.br/pt-br/noticias/financas-impostos-e-gestao-publica/2021/09/lancado-credito-caixa-tem-que-concede-ate-r-1-mil-em-emprestimo-feito-pelo-celular
https://www.gov.br/pt-br/noticias/financ...
), enquanto em grande parte do mundo capitalista, a taxa de juros é negativa (descontada a inflação). É inexorável que novas políticas públicas de expansão de crédito, as quais se espera que sejam disponibilizadas a partir de 2023 pelo novo governo, venham acompanhadas de projetos voltados à alfabetização financeira da população. O objetivo da educação financeira é promover mudança de comportamento de pessoas e grupos em relação ao uso dos recursos financeiros finitos (Ferreira, 2015Ferreira, V. R. M. (2015). Educação financeira e psicologia econômica: Uma discussão e algumas recomendações [Financial education and economic psychology: A discussion and some recommendations]. GVcef: 2º Encontro Brasileiro de Economia e Finanças Comportamentais, FGV EASP. https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/18872
https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/...
). É fundamental colocar em prática um novo programa social de distribuição de renda, porém, considerando a vulnerabilidade dos consumidores ante as armadilhas do sistema bancário, caso não sejam implantadas políticas de educação financeira concomitantemente à medida, o socorro pode aumentar ainda mais o superendividamento dessas famílias a médio prazo.

Considerações Finais

Considera-se que o presente estudo oferece um instrumento psicometricamente válido, relevante e de fácil aplicação para avaliar fatores de risco e proteção ao superendividamento. Espera-se que a EPRIS possa ser usada para medir aspectos específicos de pessoas, grupos ou populações, de modo que as tornem menos propensas a tornarem-se superendividadas (caráter protetivo) e mais tendentes a sair dessa situação (caráter de tratamento).

Acredita-se que a medida tem o potencial de contribuir na formulação de políticas públicas voltadas a reduzir as consequências negativas desse problema sobre a sociedade e reduzir as consequências negativas que o superendividamento impõe para as pessoas vitimadas por esse mal, que vem afetando cada vez mais pessoas, e assume contornos cada vez mais complexos. Consequências sociais relacionadas ao alijamento dessas pessoas no mercado de trabalho produzem efeitos sobre toda a sociedade, em especial sobre o setor produtivo, mola propulsora do desenvolvimento econômico de um país.

References

  • Almeida, I. J. O., & Andrade, V. L. P. (2022). The psychological factors involved in the debt process from the perspective of Economic Psychology. Cadernos de Psicologia, 4(7), 490-507. https://seer.uniacademia.edu.br/index.php/cadernospsicologia/article/view/3287
    » https://seer.uniacademia.edu.br/index.php/cadernospsicologia/article/view/3287
  • Asparouhov, T., & Muthén, B. (2010). Simple second order chi-square correction Unpublished manuscript. https://www.statmodel.com/download/WLSMV_new_chi21.pdf
    » https://www.statmodel.com/download/WLSMV_new_chi21.pdf
  • Banco Central do Brasil. (2005). Relatório de estabilidade financeira: Maio 2005 [Financial stability report: May 2005] (Vol. 4, N. 1). BC. https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/ref/200505/RELESTABM2005-ref2005v4n1completop.pdf
    » https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/ref/200505/RELESTABM2005-ref2005v4n1completop.pdf
  • Belk, R. W. (1985). Materialism: Aspects of living in the material world. Journal of Consumer Research, 12(3), 265-280. https://doi.org/10.1086/208515
    » https://doi.org/10.1086/208515
  • Bodea, G., & Deceanu, L. (2022). Private over-indebtedness, a concept that has become too common? Review of Economic Studies and Research Virgil Madgearu, 15(1), 5-33. https://doi.org/10.24193/RVM.2022.15.83
    » https://doi.org/10.24193/RVM.2022.15.83
  • Borges, J. P. R. (2018). Overindebtness in Brazil: A study based on Law and Economics. Revista da Procuradoria-Geral do Banco Central, 12(2), 95-109. https://revistapgbc.bcb.gov.br/index.php/revista/issue/view/29/A6%20V.12%20-%20N.2
    » https://revistapgbc.bcb.gov.br/index.php/revista/issue/view/29/A6%20V.12%20-%20N.2
  • Borroughs, J. E., & Rindfleisch, A. (2002). Materialism and well-being: A conflicting values perspective. Journal of Consumers Research, 29, 348-370. https://doi.org/10.1086/344429
    » https://doi.org/10.1086/344429
  • Chiguay, L. M., Coria, M. D., & Escobar, B. A. (2016). Relationship between attitudes toward indebtedness and consumer locus of control in university students. Suma Psicológica, 23, 1-9. http://doi.org/10.1016/j.sumpsi.2015.11.002
    » http://doi.org/10.1016/j.sumpsi.2015.11.002
  • Clayton, M., Liñares-Zegarra, J., & Wilson, J. O. (2016). Does debt affect health? Cross country evidence on the debt-health nexus. Social Science and Medicine, 130, 51-58. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2015.02.002
    » https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2015.02.002
  • Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. (2021, Aug. 25). Relatório especial Peic agosto 2021 [Peic special report August 2021]. https://portal-bucket.azureedge.net/wp-content/2021/08/Analise-Peic-Agosto-de-2021_especial.pdf
    » https://portal-bucket.azureedge.net/wp-content/2021/08/Analise-Peic-Agosto-de-2021_especial.pdf
  • Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. (2022). Pesquisa de endividamento e inadimplência do consumidor [Consumer debt and default survey] (Nov.). CNC, SESC, Senac. https://portal-bucket.azureedge.net/wp-content/2022/12/aa61da37abe25436bf3ff86c7541f38d.pdf
    » https://portal-bucket.azureedge.net/wp-content/2022/12/aa61da37abe25436bf3ff86c7541f38d.pdf
  • Consumer Financial Protection Bureau. (2015). Finnancial well-being: The goal of financial education CFPB. https://files.consumerfinance.gov/f/201501_cfpb_report_financial-well-being.pdf
    » https://files.consumerfinance.gov/f/201501_cfpb_report_financial-well-being.pdf
  • Coria, M. D., Gaete, D. C., Rojas, C. V., Gómez, Y. G., & Aravena, J. S. (2012). Scale Attitude toward Indebtedness: Factorial validity and attitudinal profiles in Chilean university students. Universitas Psychologica, 11(2), 497-509.
  • Damásio, B. F., & Dutra, D. F. (2017). Análise fatorial exploratória: Um tutorial com o software Factor [Exploratory factor analysis: A tutorial with Factor software]. In B. F. Damásio & J. C. Borsa (Eds.), Manual de Desenvolvimento de Instrumentos Psicológicos [Manual for the development of psychological instruments] (pp. 241-265). Vetor.
  • Dobson, K. S., & Dozois, D. J. (2006) Fundamentos históricos e filosóficos das terapias cognitivo-comportamentais [Historical and philosophical foundations of cognitive-behavioral therapies]. In K. Dobson (Ed.), Manual de Terapias Cognitivo-Comportamentais [Handbook of Cognitive-Behavioral Therapies] (pp. 17-43). Artmed.
  • Ferreira, V. R. M. (2015). Educação financeira e psicologia econômica: Uma discussão e algumas recomendações [Financial education and economic psychology: A discussion and some recommendations]. GVcef: 2º Encontro Brasileiro de Economia e Finanças Comportamentais, FGV EASP. https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/18872
    » https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/18872
  • Gaglietti, M. J., & Dorst, D. Z. (2016). The social conflicts in the context of over-indebtedness and mediation as a way to deal with them. Revista de Direito do Consumidor, 107, 1-12. http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_boletim/bibli_bol_2006/RDCons_n.107.17.PDF
    » http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_boletim/bibli_bol_2006/RDCons_n.107.17.PDF
  • Garðarsdóttir, R. B., & Dittmar, R. B. (2012). The relationship of materialism to debt and financial well-being: The case of Iceland’s perceived prosperity. Journal of Economic Psychology, 33(3), 471-481. https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.12.008
    » https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.12.008
  • Gathergood, J. (2012). Self-control, financial literacy and consumer over-indebtedness. Journal of Economic Psychology, 33, 590-602. https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.11.006
    » https://doi.org/10.1016/j.joep.2011.11.006
  • Governo Federal. (2021, Aug. 27). Lançado Crédito Caixa Tem que concede até R$ 1 mil em empréstimo feito pelo celular [Caixa Tem Credit launched, granting up to R$ 1,000 in loans via cell phone]. Gov.br. https://www.gov.br/pt-br/noticias/financas-impostos-e-gestao-publica/2021/09/lancado-credito-caixa-tem-que-concede-ate-r-1-mil-em-emprestimo-feito-pelo-celular
    » https://www.gov.br/pt-br/noticias/financas-impostos-e-gestao-publica/2021/09/lancado-credito-caixa-tem-que-concede-ate-r-1-mil-em-emprestimo-feito-pelo-celular
  • Hennigen, I. (2019). Indebted, I have to: Government of life by finance. Forum Linguistic, 16(3), 3953-3965. https://doi.org/10.5007/1984-8412.2019v16n3p3953
    » https://doi.org/10.5007/1984-8412.2019v16n3p3953
  • Hennigen, I., & Borges, J. P. (2014). Moral stigma and psychological suffering: Problematizing the individualization of consumer overindebtness. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 14(1), 214-238. https://doi.org/10.12957/epp.2014.10465
    » https://doi.org/10.12957/epp.2014.10465
  • Hudges, C. (2021). The impact of creditworthiness on financial well-being, anxiety, depression, hopelessness, and suicide. Journal of Accounting and Finance, 21(3), 143-160. http://www.m.www.na-businesspress.com/JAF/JAF21-3/10_HughesFinal.pdf
    » http://www.m.www.na-businesspress.com/JAF/JAF21-3/10_HughesFinal.pdf
  • Jacoby, M. (2002). Does indebtedness influence health? A preliminary inquiry. The Journal of Law, Medicine & Ethics, 30(4), 560-571. https://doi.org/10.1111/j.1748-720X.2002.tb00426.x
    » https://doi.org/10.1111/j.1748-720X.2002.tb00426.x
  • Kahneman, D., & Tversky, A. (1979). Prospect theory: An analysis of decision under risk. Econometrica, 47(2), 263-292. http://hassler-j.iies.su.se/COURSES/NewPrefs/Papers/KahnemanTversky%20Ec%2079.pdf
    » http://hassler-j.iies.su.se/COURSES/NewPrefs/Papers/KahnemanTversky%20Ec%2079.pdf
  • Kasser, T. (2002). The high price of materialism The MIT Press.
  • Kim, J., Garman, E.T., & Sorhaindo, B. (2003). Relationships among credit counseling clients’ financial well-being, financial behaviors, financial stressor events, and health. Financial Counseling and Planning, 14(1), 75-87. https://ssrn.com/abstract=2265623
    » https://ssrn.com/abstract=2265623
  • Kshatriya, K., & Shah, P. S. (2021). A study of the prevalence of impulsive and compulsive buying among consumers in the apparel and accessories market. Vilakshan - XIMB Journal of Management https://doi.org/10.1108/XJM-12-2020-0252
    » https://doi.org/10.1108/XJM-12-2020-0252
  • Leandro, J. C., & Botelho, D. (2022). Consumer over-indebtedness: A review and future agenda. Journal of Business Research, 145, 535-551. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2022.03.023
    » https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2022.03.023
  • Lejoyeux, M., & Weinstein, A. (2010). Compulsive buying. The American Journal of Drug and Alcohol Abuse, 35(5), 248-253. https://doi.org/10.3109/00952990.2010.493590
    » https://doi.org/10.3109/00952990.2010.493590
  • Machado, A. C. A. (2021). Proteção e risco de superendividamento, variáveis psicológicas e financeiras: Estudo de preditores de qualidade de vida [Protection and risk of over-indebtedness, psychological and financial variables: A study of predictors of quality of life ] Doctorate Thesis, Universidade de Brasília. Repositório Institucional da UnB. https://repositorio.unb.br/handle/10482/42997
    » https://repositorio.unb.br/handle/10482/42997
  • Marques, C. L., & Cavallazzi, R. L. (2006). Direitos do consumidor endividado: Superendividamento e crédito [Consumer rights in debt: Over-indebtedness and credit]. Revista dos Tribunais. https://bdjur.stj.jus.br/jspui/bitstream/2011/8655/Direitos_do_Consumidor_Endividado.pdf
    » https://bdjur.stj.jus.br/jspui/bitstream/2011/8655/Direitos_do_Consumidor_Endividado.pdf
  • Moreira, A., & Tamayo, A. (1999). The meaning of money scale: Development and validation. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 15(2), 93-105. https://doi.org/10.1590/S0102-37721999000200002
    » https://doi.org/10.1590/S0102-37721999000200002
  • Muthén, B., & Kaplan, D. (1985). A comparison of some methodologies for the factor analysis of non-normal Likert variables. British Journal of Mathematical and Statistical Psychology, 38, 171-189. http://doi.org/10.1111/j.2044-8317.1985.tb00832.x
    » http://doi.org/10.1111/j.2044-8317.1985.tb00832.x
  • Nepomuceno, M. V., & Laroche, M. (2015). The impact of materialism and anti-consumption lifestyles on personal debt and account balances. Journal of Business Research , 68(3), 654-664. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2014.08.006
    » https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2014.08.006
  • Pereira, L. M., & Almeida, R. S. (2020). O superendividamento na vida das trabalhadoras e dos trabalhadores: Por um olhar para além do aparente [Over-indebtedness in the lives of workers: Looking beyond the apparent]. Appris.
  • Pérez-Nebra, A. R., Siqueira, A. O., Couto, C., & Oliveira, L. F. (2020). Overindebtedness Program: “A light at the end of the tunnel for who is lost”. Psicologia: Ciência e Profissão, 40(e194281), 1-16. https://doi.org/10.1590/1982-3703003194281
    » https://doi.org/10.1590/1982-3703003194281
  • Rindfleisch, A., Burroughs, J. E., & Denton, F. (1997). Family structure, materialism, and compulsive consumption. Journal of Consumer Research, 23(4), 312-325. https://doi.org/10.1086/209486
    » https://doi.org/10.1086/209486
  • Rook, D. W. (1987). The buying impulse. Journal of Consumer Research, 14(2), 189-199. https://doi.org/10.1086/209105
    » https://doi.org/10.1086/209105
  • Rosenstock, I. M. (1990). The health belief model: Explaining health behavior through expectancies. In K. Glanz, F. M. Lewis & B. K. Rimer (Eds.), Health behavior and health education: Theory, research and practice (pp. 39-62). Jossey-Bass.
  • Sampaio, M. A. S. (2018). Superendividamento e consumo responsável de crédito [Over-indebtedness and responsible credit consumption]. TJDFT. https://www.tjdft.jus.br/institucional/escola-de-administracao-judiciaria/documentos_e-books/e-books-pdf/Superendividamentoeconsumoresponsveldecrdito.pdf
    » https://www.tjdft.jus.br/institucional/escola-de-administracao-judiciaria/documentos_e-books/e-books-pdf/Superendividamentoeconsumoresponsveldecrdito.pdf
  • Serviço de Proteção ao Crédito. (2015). Os influenciadores da compra por impulso [The influencers of impulse buying]. https://www.spcbrasil.org.br/uploads/st_imprensa/analise_os_influenciadores_das_compras_por_impulso.pdf
    » https://www.spcbrasil.org.br/uploads/st_imprensa/analise_os_influenciadores_das_compras_por_impulso.pdf
  • Souza, F. T. G., Eid Júnior, W., & Rochman, R. R. (2017). Os efeitos do estresse financeiro no trabalho [The effects of financial stress at work]. PWC, FGV, Quartier Latin.
  • Souza, M. A. P. (2013). O uso do crédito pelo consumidor: Percepções multifacetadas de um fenômeno intertemporal [Consumer use of credit: Multifaceted perceptions of an intertemporal phenomenon] Master’s Dissertation, Universidade de Brasília. Repositório Institucional da UnB. https://repositorio.unb.br/bitstream/10482/13255/1/2013_MarcosAguerriPimentadeSouza.pdf
    » https://repositorio.unb.br/bitstream/10482/13255/1/2013_MarcosAguerriPimentadeSouza.pdf
  • Trindade, L. L., Righi, M. B., & Vieira, K. M. (2012). Where does the women debt come from? Construction and validation of a PLS-PM model. Revista Eletrônica de Administração, 18(3), 718-746. https://doi.org/10.1590/S1413-23112012000300006
    » https://doi.org/10.1590/S1413-23112012000300006
  • Turunen, E., & Hiilamo, H. (2014). Health effects of indebtedness: A systematic review. BMC Public Health, 14(489), 1-8. https://doi.org/10.1186/1471-2458-14-489
    » https://doi.org/10.1186/1471-2458-14-489
  • Veludo-de-Oliveira, T. M., Ikeda, A. A., Santos, R. C. (2004). Compulsive purchase and credit card influence. Revista de Administração de Empresas, 44(3), 89-99. https://doi.org/10.1590/S0034-75902004000300007
    » https://doi.org/10.1590/S0034-75902004000300007
  • Warth, J., Puth, M., Tillman, J., Porz, U., Weckbecker, K., & Münter, E. (2019). Over-indebtedness and its association with sleep and sleep medication use. BMC Public Health, 19(957), 1-15. https://doi.org/10.1186/s12889-019-7231-1
    » https://doi.org/10.1186/s12889-019-7231-1
  • Declaração de disponibilidade de dados

    Os autores não autorizam a divulgação de dados da pesquisa.
  • 30
    Este artigo foi extraído da tese de doutorado do primeiro autor.

Editado por

Editor responsável:

Isabelle Patriciá Freitas Soares Chariglione

Disponibilidade de dados

Os autores não autorizam a divulgação de dados da pesquisa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    19 Maio 2022
  • Aceito
    19 Dez 2022
Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília, 70910-900 - Brasília - DF - Brazil, Tel./Fax: (061) 274-6455 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: revistaptp@gmail.com