Acessibilidade / Reportar erro

Dossiê Questões de gênero e políticas da terra

Este dossiê vem sendo gestado há bastante tempo. Trata-se do resultado de uma série de seminários nos quais, entre 2018 e 2020, cerca de vinte pesquisadoras de diferentes instituições, em variados momentos da trajetória acadêmica e com formações em subáreas diversas da antropologia, mobilizaram discussões em torno do cruzamento temático entre casa, corpo e terra enquanto noções etnográficas 1 1 Além das autoras desta apresentação – que coordenaram os seminários –, participaram, em diferentes arranjos: Ana Claudia Marques, Andressa Lewandowski, Arianne Lovo, Beatriz Matos, Daniela Perutti, Emília Pietrafesa de Godoi, José Miguel Nieto Olivar, Julia Otero dos Santos, Lauriene Seraguza, Luisa Elvira Belaunde, Marcela Coelho Souza, Maiara Dourado, Paula Balduíno, Renata Machado, Rodica Weitzman, Silvana Nascimento e Yara Alves. Três dos encontros foram realizados na modalidade presencial, consecutivamente na Unicamp (Campinas, maio de 2018), na UnB (Brasília-DF, dezembro de 2018) e na UFSB (Porto Seguro, setembro de 2019). O quarto e último seminário realizou-se na modalidade virtual, em outubro de 2020, e reuniu todas as pesquisadoras acima. Agradecemos a cada uma delas pelos encontros prazerosos e inspiradores. . Antes disso – seja em um SPG da Anpocs coordenado por Dainese, Carneiro e Menasche em 2017 2 2 O GT, intitulado “Casa, comida e gênero: olhares etnográficos a partir de coletivos camponeses e tradicionais”, gerou um dossiê na revista Tessituras (ver Dainese, Carneiro e Menasche, 2018 ). , seja em uma entrevista realizada com Luisa Elvira Belaunde por Dainese e Seraguza ( 2016DAINESE, Graziele e SERAGUZA, Lauriene. 2016. “Sobre gêneros, arte, sexualidade e a falibilidade destes e de outros conceitos: Entrevista com Luisa Elvira Belaunde Olschewski”. Revista Ñanduty 4(5): 286-307. ) – já circulavam entre nós certas “transversalidades, descentramentos e inquietações” (cf. Marques, neste dossiê). Havia ressonâncias a explorar entre as etnografias conduzidas por nós, no campo do campesinato, e as de colegas que, mulheres como nós, trabalhavam com indígenas ou com outros povos chamados “tradicionais” pela Constituição Federal de 1988. Em todos os casos, a situcionalidade de nossas pesquisas colocava em primeiro plano agenciamentos e dinâmicas sociocosmológicas não abordadas ou pouco exploradas por obras canônicas em cada um de nossos campos (o que evidentemente marcava o caráter situado também de tais obras).

Os artigos aqui reunidos nasceram dessa rede de conversas em perspectivas cruzadas. Com o propósito de criar escritas coletivas, no último seminário elegemos sete eixos temáticos interligados, extraídos das discussões engajadas até ali em torno da mútua implicação entre gênero e terra 3 3 Os eixos foram definidos da seguinte forma: 1. Parentesco e família; 2. Movimento e cuidado; 3. Trabalho e ajuda; 4. Casa e cozinha; 5. Violência e conflito; 6. Corpo e paisagem; 7. Sexualidades, afetividades e desejos. . Dividimo-nos em duplas ou trios e cada um desses subgrupos ficou responsável pela apresentação de um dos eixos, retomando a partir dele nossas conversas anteriores. Ana Claudia Marques acompanhou essas trocas ao longo de três dias ao cabo dos quais nos presenteou com uma reflexão generosa e inspiradora, base do texto de abertura deste dossiê, no qual ela contextualiza e amplia o debate que o gerou, sobretudo em uma zona de fricção criativa entre gênero e parentesco. Os outros quatro artigos publicados em seguida correspondem a desdobramentos de quatro dos eixos temáticos. Cada um deles focando as relações elicitadas por saberes-fazeres 4 4 Nomeados também nos termos de modos, mexidas, jeitos, técnicas poéticas, práticas de conhecimento etc., conforme as etnografias aqui reunidas. tidos como propriamente femininos em diferentes contextos etnográficos: 1. A lida com a lama entre artesãs Kichwa, no Peru, e marisqueiras baianas; 2. Os modos de cuidar entre mulheres Pankararu de São Paulo, entre quilombolas do Maranhão e entre agricultoras familiares no leste de Minas Gerais; 3. As criações da cozinha entre agricultoras familiares no cerrado norte-mineiro e entre indígenas do povo Karo-Arara em Rondônia; 4. As formas de retomar e segurar a terra diante da violência vivida por mulheres Guarani e Kaiowa, agricultoras posseiras de Trombas e Formoso, Goiás, e mulheres de faxinais no Paraná.

Duas vertentes clássicas da antropologia do parentesco, nas quais boa parte das pesquisadoras foi formada, a dos estudos de campesinato e a da etnologia ameríndia, levam-nos aos “novos estudos do parentesco” e a suas vinculações com perspectivas teóricas feministas e com os estudos da ciência e da tecnologia. Isto certamente contribuiu para um viés comum, repercutindo autoras que já nos vinham mostrando a agência das mulheres como central na criação de pessoas, corpos, parentes, grupos sociais, moralidades, memórias e narrativas (por exemplo, Belaunde, 2005BELAUNDE, Luisa Elvira. 2005. El recuerdo de luna: género, sangre y memoria entre los pueblos amazónicos. Lima, Fondo Editorial de la Facultad de Ciencias Sociales. ; Carsten, 1995 CARSTEN, Janet. 1995. “The substance of kinship and the heat of the hearth: Feeding, personhood, and relatedness among Malays in Pulau Langkawi”. American Ethnologist, 22(2): 223-241. http://www.jstor.org/stable/646700
http://www.jstor.org/stable/646700...
; McCallum, 1997MCCALLUM, Cecilia. 1997. “Comendo com Txai, comendo como Txai: A sexualização de relações étnicas na Amazônia contemporânea”. Revista de Antropologia, 40, São Paulo, Edusp: 109-147. ; Strathern; 1988STRATHERN, Marilyn. 1988. The gender of the gift: problems with women and problems with society in Melanesia. Berkley, University of California Press. ). Entretanto, mais do que uma mesma bibliografia ou corrente teórica, partilhávamos nos seminários a intuição de que nossas posicionalidades em campo abriam-nos boas pistas etnográficas em direção a novas ou pouco usuais imagens da socialidade.

Não estávamos em busca de modelos gerais ou de uma identidade genérica, mas queríamos “sublinhar as confluências entre mulheres fazedoras de mundos e resistências/existências nos interstícios do antropo/capitaloceno”, como definem Belaunde e Machado (neste dossiê). Ao aproximar as técnicas-poéticas das oleiras de Kichwa (Lamas, Peru) e das marisqueiras de Itaparica (Bahia, Brasil), essas autoras mostram como, de modos diversos, oleiras e marisqueiras entrelaçam-se a diferentes agências da lama e da lua, constituindo-se como corpos-territórios singulares – “o encontro entre seres, mundos e tempos aparentemente separados”. Pensar junto com as interlocutoras de campo é reconectar-se a esses agenciamentos interespecíficos, refletem as autoras, e assim aprender a ouvir suas histórias. No mesmo caminho, Ayoub, Seraguza e Dourado (neste dossiê) afirmam que tematizar as agências femininas, e as outras histórias que elas têm a nos contar, é uma escolha a um só tempo epistemológica e política. Citando Haraway ( 1995HARAWAY, Donna. 1995. “Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial”. Cadernos Pagu, 5: 7-41. ), notam, em suas pesquisas, que “o conhecimento é interligado ao aparato de produção de nossos corpos, dos corpos das pessoas com quem realizamos nossas pesquisas, e das relações que travamos com elas”.

São entrelaçamentos como esses que o presente dossiê apresenta, nos interstícios de empreendimentos neoextrativistas globais e racializados de exploração e expropriação de terras, os quais assumem formas particulares (mineradoras, madeireiras, monocultivos, entre outros) em cada um dos lugares onde foram realizados os trabalhos reunidos neste dossiê. Podemos neste sentido definir nossas interlocutoras e interlocutores como povos “da terra” e também povos “com a terra” (Lewandowski & Santos, 2019LEWANDOWSKI, Andressa e OTERO DOS SANTOS, Júlia. 2019. “Cosmopolíticas da terra contra os limites da territorialização”. Ilha, 21(1): 6-20.: 13; Souza et al., 2016COELHO DE SOUZA, Marcela; BARBI, Rafael Costa e Santos; FERNANDES, Janaína; LIMA, Daniela; MOLINA, Luísa; OLIVEIRA, Ester; LEWANDOWSKI, Andressa; OTERO DOS SANTOS, Julia; MIRAS, Júlia & SOARES-PINTO, Nicole. 2016. T/ terras indígenas e territórios conceituais: incursões etnográficas e controvérsias públicas. Projeto de pesquisa. Brasília-DF. ), este último termo podendo incluir as florestas, os ares e as águas em suas composições, decomposições e regenerações, junto a uma multiplicidade de formas de vida humanas e não humanas; visíveis, invisíveis ou encantadas.

Nos debates que realizamos ao longo dos seminários, observamos que, se a tematização da terra aproximava todas nós, era também porque nossas etnografias colocam em primeiro plano os agenciamentos das mulheres na tessitura, organização e governo de corpos, famílias, comunidades, povos e movimentos sociais. Daí a ideia de “políticas da terra”, que compõe o título desta edição. Muitas de nossas discussões explicitavam a já bastante problematizada inadequação da dicotomia entre o doméstico e o político (Rosaldo, 1980ROSALDO, Michelle Zimbalist. 1980. “The use and abuse of Anthropology: Reflections on feminism and cross-cultural understanding”. Signs, 5(3): 389-417. ; Yanagisako & Collier, 1987YANAGISAKO, Sylvia Junko & COLLIER, Jane Fishburne. 1987. “Toward a unified analysis of gender and kinship”. In: COLLIER, Jane Fishburne & YANAGISAKO, Sylvia Junko. Gender and kinship: Essays toward a unified analysis. Stanford, Stanford University Press, pp. 14-50. ; Moore, 1994MOORE, Henrietta. “Understanding sex and gender”. In: INGOLD, Tim (ed.). Companion Encyclopedia of Anthropology. Londres e Nova York, Routledge, pp. 813-830. ; Carsten, 2004CARSTEN, Janet. 2004. After Kinship. Cambridge, Cambridge University Press. ). Essa oposição conceitual, também ativada no que Lugones ( 2014LUGONES, María. 2014. “Rumo a um feminismo descolonial”. Revista Estudos Feministas, 22(3): 935-952. ) chamou de “colonialidade do gênero”, evoca o aparato de poder vinculado aos processos de domínio e apropriação de territórios, os quais são concomitantes à formação do Estado em nosso continente, e implicam o gênero como forma de subjetivação e opressão dos corpos. Os conflitos por terras são, portanto, uma faceta importante das “políticas” que as autoras deste dossiê abordam. Como mostram Ayoub, Seraguza e Dourado (neste dossiê), as mulheres que permanecem nas casas, enquanto os homens estão guerreando nos matos, problematizam a violência desde a intimidade dos seus lares. A experiência no cotidiano dos conflitos não as suprime dos momentos mais dramáticos e ritualísticos dessas lutas. Entre as Guarani e Kaiowa, por exemplo, há diversas mulheres que, como Kuña Kuarahy , atuam como lideranças nas retomadas de terras. Situações como a dela nos colocam diante de uma divisão sexual do conflito que parece se repetir em quase todos os lugares, segundo a qual o trabalho da violência é uma prerrogativa masculina. São os homens que portam armas, que ameaçam, que matam. Mas não são apenas eles os ameaçados e os mortos nessas lutas. Mulheres e crianças também perdem suas vidas pelas mãos de homens.

No caso dos conflitos por terra, especificamente, essa dimensão de gênero da violência é acompanhada por uma racialização bem marcada, já que os agentes do agroextrativismo que nossas amigas enfrentam são, na maioria esmagadora das vezes, homens brancos, os quais pagam outros homens para fazerem serviços de morte. Se suas interlocutoras ressaltam essa dimensão do gênero nas lutas por terras, elas não deixam de problematizar as disputas que travam com os homens de suas famílias, comunidades e aldeias. Muitas delas enfrentam agressões dentro de suas casas, ou subalternizações no âmbito dos movimentos sociais dos quais participam. Essas interconexões entre diferentes sistemas de opressão das mulheres remetemnos a um dos debates caros ao feminismo comunitário, que ressalta o cruzamento de diferentes “patriarcados” nas vidas de mulheres indígenas e camponesas em Abya Yala (Cabnal, 2010CABNAL, Lorena. 2010. “Acercamiento a la construcción de la propuesta de pensamiento epistémico de las mujeres indígenas feministas comunitarias de Abya Yala”. In: CABNAL, Lorena & ACSURLAS SEGOVIAS. Feminismos diversos: el feminismo comunitario. Madrid, ACSUR-Las Segovias, pp. 10-25. ). Mas, ao lançarem foco sobre saberes-fazeres femininos, são os modos de existência singulares (resistentes a tais sistemas opressivos) que os artigos deste dossiê trazem para o primeiro plano. De que maneiras as relações de gênero produzem a e são produzidas pela terra com a qual se vive? Quais formas de viver e resistir são apresentadas por essas práticas em tais contextos de opressões articuladas? O que acontece com as reflexões sobre terra e territorialidade quando reconhecemos que seus “usos, costumes e tradições” são informados em grande parte por relações de gênero? A proposta deste dossiê é explorar essas questões partindo de uma abordagem de gênero que coloque, no centro da análise, as variadas práticas e princípios de distinção e composição envolvidos na criação de corpos, pessoas e relações.

Reconhecer que o doméstico é político implica uma atenção a como a domesticidade e a política se distinguem, se misturam e se recombinam em modos de existência que têm por fundamento a relação com a terra. E se isso nos instiga à necessidade de complexificarmos e ampliarmos os significados da domesticidade, o mesmo ocorre com a noção de política. Entendemos como práticas políticas as atividades femininas que produzem, organizam e modulam relações, seja no cultivo e criação das crianças, plantas e animais, da saúde dos corpos, do preparo da comida, da organização de suas casas, da elaboração de utensílios e instrumentos, do compartilhamento de alimentos, do benzimento de crianças e adultos, da mobilidade entre lugares com distintas qualidades. Se, por meio de tais atividades, são criados e generificados corpos, papéis sociais e terras, reiterados como femininos ou masculinos, essas ações também consolidam as reputações e o reconhecimento das mulheres em suas famílias, comunidades, aldeias, vilas e municípios. Além disso, tais atos criam pertencimentos à medida que vinculam corpos e territórios. Em muitos de nossos trabalhos, por exemplo, a ação materna de criação das crianças inscreve, sobretudo através da comida, uma memória do lugar nos corpos de futuros adultos/as, ao mesmo tempo que deixa, na terra, as marcas dessa criação (por exemplo, Alves, 2016ALVES, Yara. 2016. A casa raiz e o voo de suas folhas: Família, movimento e casa entre os moradores de Pinheiro-MG. São Paulo, Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo. ; Carneiro, 2015CARNEIRO, Ana. 2015. O povo parente dos Buracos: sistema de prosa e mexida de cozinha. Rio de Janeiro, E-papers. ; Machado, 2019MACHADO, Renata Freitas. 2019. “Entre a maré e a casa: corpo, técnica e movimento das marisqueiras (Vila de Matarandiba – BA)”. Trabalho apresentado no 3º Seminário Casa, corpo e políticas da terra (Campus Sosígenes Costa da UFSB, Porto Seguro, Bahia), pp. 1-15. ; Perutti, 2015). Como notam Ayoub, Seraguza e Dourado (neste dossiê), a própria casa é entidade viva, conecta corpos e terras reagindo à violência a que suas interlocutoras estão sujeitas. Modula, assim, as interações entre as pesquisadoras e as indígenas e posseiras de suas pesquisas; e também entre estas mulheres da terra, os jagunços e seus mandantes. Em suma, através das atividades na casa, entrelaçam-se o corpo, a terra e seus seres, cada qual com suas próprias agências e relações.

Contudo, ao invocar a casa como lugar de produção ou tensionamento de vínculos entre corpos e terras e, por conseguinte, de criação de comunidades e povos, os trabalhos aqui apresentados não o fazem da mesma maneira. Ao longo dos seminários, as noções de casa, corpo e políticas da terra reapareciam articuladas em diversas pesquisas, mas operavam conexões e sentidos específicos em cada uma delas. Partindo dos diferentes mundos que compunham nossos diálogos, avançávamos na aposta feminista em compreender os modos de co-constituição dos corpos, dos sujeitos, dos objetos, dos gêneros etc. (cf. Haraway, 2021HARAWAY, Donna. 2021. Manifesto das espécies companheiras: cachorros, pessoas e alteridade significativa. Tradução Pê Moreira. Rio de Janeiro, Bazar do Tempo. ). E avançávamos também na construção de uma perspectiva de gênero (e não apenas sobre o gênero), na medida em que nossos pontos de vista analíticos se forjavam em espaços e circuitos de ação feminina, recompondo, de forma deliberadamente situada e singular, as descrições mais correntes dos mundos sob análise. Por isso mesmo, entretanto, aqueles termos homônimos, postos em diálogo através de nossas etnografias, mantiveram-se dísres e equívocos, como singularidades recalcitrantes a tentativas de aproximação apressada. A própria terra é uma equivocação 5 5 A autora toma o conceito de equivocação emprestado de Eduardo Viveiros de Castro (2004). , afirmou Marisol de la Cadena ( 2010CADENA, Marisol de la. 2010. “Indigenous Cosmopolitics in the Andes: Conceptual Reflections beyond ‘Politics’”. Cultural Anthropology, 25(2).: 355 apud Coelho de Souza et al. , 2016COELHO DE SOUZA, Marcela; BARBI, Rafael Costa e Santos; FERNANDES, Janaína; LIMA, Daniela; MOLINA, Luísa; OLIVEIRA, Ester; LEWANDOWSKI, Andressa; OTERO DOS SANTOS, Julia; MIRAS, Júlia & SOARES-PINTO, Nicole. 2016. T/ terras indígenas e territórios conceituais: incursões etnográficas e controvérsias públicas. Projeto de pesquisa. Brasília-DF.: 18) ao descrever a aliança entre políticos de esquerda peruanos e lideranças campesinas/indígenas andinas em prol de uma recuperação de “suas terras”, com sentidos desafortunados. Conforme questionaram Carneiro e Otero dos Santos (neste dossiê), “que tipo de sistematização ou ficção persuasiva poderíamos construir sem supor (ou dar a entender) um fundo comum, uma identidade humana transcendental ou uma essência de gênero feminino? […] Como aproximar nossos campos etnográficos sem anular a multiplicidade de nossas experiências em campo e dos sujeitos que nos recebem?”.

Dedicadas a lidar com esse estado de incerteza no qual nossas tentativas de comparação nos deixavam durante as discussões nos seminários, hesitávamos entre o que seriam as categorias de base a informar nossos materiais etnográficos e o que víamos como possibilidade de reconfigurar esses materiais, forçando os limites de nossas abordagens. Os trabalhos aqui publicados não fugiram a esse desafio. Buscaram criar ferramentas narrativas capazes de operar contrastes, aproximações, cruzamentos e descentramentos sem apagar as especificidades postas em cada relação. Tratamos de encarar “os vãos em que operam essas traduções” (Coelho de Souza et al ., 2016COELHO DE SOUZA, Marcela; BARBI, Rafael Costa e Santos; FERNANDES, Janaína; LIMA, Daniela; MOLINA, Luísa; OLIVEIRA, Ester; LEWANDOWSKI, Andressa; OTERO DOS SANTOS, Julia; MIRAS, Júlia & SOARES-PINTO, Nicole. 2016. T/ terras indígenas e territórios conceituais: incursões etnográficas e controvérsias públicas. Projeto de pesquisa. Brasília-DF.: 19) entre diferentes modelos interpretativos – os da antropologia, os dos povos com os quais trabalhamos e aqueles do ordenamento político-jurídico com que tais povos precisam lidar. “Não são contextos comparáveis”, como notam Weitzman, Godoi e Lovo (neste dossiê). “Ao contrário, pretendemos estabelecer as conexões parciais a partir das correlações dos nossos campos empíricos num exercício de compatibilidade e não de comparabilidade.” (Strathern, 1991STRATHERN, Marilyn. 1991. Partial connections. Lanham, AltaMira Press. ).

À exceção do texto de abertura, os demais artigos deste dossiê criaram suas narrativas como mosaicos etnográficos nos quais cada parte aparece “em toda a sua força particular” (Stengers, 2002STENGERS, Isabelle. “Beyond conversation: the risks of peace”. 2002. In: KELLER, Catherine & DANIELL, Anne (eds.). Process and difference: between cosmological and poststructuralist post-modernisms. Albany, University of New York Press, pp. 235-55.: 245) 6 6 Podemos nos inspirar no texto de autoapresentação da Teia dos Povos: “ninguém precisa baixar a bandeira de sua luta para constituir uma Aliança. Nosso objetivo não é, portanto, ser um movimento social que englobe os demais. Queremos caminhar juntos, não produzir uma unidade monolítica” ( https://teiadospovos.org/sobre/ . Acessado em 09/02/2024). . No conjunto, entretanto, mostram-se como arranjos conceituais precários, composições contingentes à medida que os contrastes em relação a uma tradição teórica trazem para o primeiro plano dimensões pouco enfatizadas pela outra. Alertam-nos assim para a contínua possibilidade de reconfiguração do material etnográfico e de suas fronteiras definidoras. Observando que a indagação sobre as fronteiras está no cerne do “problema de gênero” enfrentado por autoras que, a partir de abordagens e pautas variadas, buscaram escapar dos binarismos e de seus efeitos hierarquizantes 7 7 Guardadas as devidas distâncias, mencionem-se, por exemplo, Anzaldua, 1987 ; Gonzalez, 1988 ; Haraway, 1991; Preciado, 2003 ; Strathern, 1988 . , encaramos tal problema a exemplo dessas obras: não apenas quando estamos diante de corpos, sexualidades e papéis sociais, mas também, e concomitantemente, quando pensamos em (sub) disciplinas, terras, territórios, povos, raças, parentes, conceitos ou quaisquer outras unidades com as quais trabalhamos 8 8 Forçoso lembrar que as divisões entre subáreas estabilizadas na antropologia brasileira não correspondem a fronteiras dadas e nunca estiveram alheias a disputas e variações no tempo e no espaço. .

Ampliar a questão de gênero para além da noção de identidade atrelada a corpos e papéis sociais, em última análise, amplia o alcance de nossa indagação sobre o poder. Ao mesmo tempo, nos possibilita conceder multiplicidade e movimento às descrições etnográficas presentes neste dossiê. Se oleiras e marisqueiras diferem no que se refere aos ritmos e modos de criação de suas corporalidades femininas, por exemplo, é preciso notar também “a temporalidade e transformabilidade da paisagem, alimentos e artefatos” com os quais esses corpos interagem (Belaunde e Machado, neste dossiê). A corporalidade dessas mulheres se faz na relação cotidiana com os movimentos transitórios da vida do barro, mas este possui qualidades e fluxos variados em cada lugar, só existindo na transição entre os estados sólido e líquido, em diferentes gradações de mistura e compostagem. Por sua vez, o fogo lançado por jagunços para queimar casas ameaçadas de esbulho torna-se noutro momento o fogo que, no chão dentro de casa, as donas do fogo Guarani Kaiowa, “mães em potencial”, manejam para, entre outras coisas, agregar parentes e gerar alegria na vida em retomada. O fogo está também nos fogões à lenha de mulheres quilombolas no Vale do Jequitinhonha, emitindo uma fumaça preta que cobre as madeiras da casa com uma resina protetora. Por isso, dizem: fogão, esteio da casa.

No artigo de Weitzman, Godoi e Lovo, é o próprio movimento que ganha primeiro plano na atenção ao “cuidado”. Para mulheres Pankararu, quilombolas e agricultoras familiares com as quais as pesquisadoras trabalham, os modos de se movimentar estão intimamente associados aos modos de cuidar, envolvendo relações de cura, afeto e controle entre humanos, encantados, plantas e venenos que circulam. Assim, o cuidado constitui “um conjunto de gestos e práticas que estão imersos em uma teia de relacionalidade extensiva e elástica”, uma elasticidade mobilizada por vinculações afetivas e disruptivas, harmoniosas e perigosas. Também Carneiro e Otero dos Santos descrevem como as práticas da cozinha karo-arara e sertaneja criam e fortalecem pessoas e relações, ao mesmo tempo que podem enfraquecê-las ou destruí-las. Nem as mães estão isentas de raiva, na verdade muito menos elas. Entre as karo-arara, há um modo de cuidado ritual para controlar esse sentimento. Assim, diante dessas modulações relacionais, corpos, pessoas e coletividades agenciados nas cozinhas karo-arara ou sertaneja constituem sistemas em variação constante, tão lábeis quanto os valores que lá se atribuem à categoria “mulher”. É o que ainda emerge da etnografia com posseiras de Trombas e Formoso (GO), que se transformam em “nova mulher” para poder “dar conta” de retomar e manter a terra em reação à violência a que estão sujeitas. Articulando-se a essa observação, a escrita de Ayoub, Seraguza e Dourado mistura-se à generificação de seus próprios corpos em campo como pesquisadoras, “mulheres, jovens, solteiras, sem filhos, que vão sozinhas às aldeias e comunidades com que trabalham”. Incorporam assim outros códigos de gênero “para os quais certamente não estávamos preparadas”, e assim se abre todo um campo inesperado de “interlocuções caseiras”.

Em todos os casos acima, as práticas femininas – cotidianas, repetidas, nunca inteiramente findas – agenciam conjuntos de entidades da “terra” e criam configurações relacionais amplas e heterogêneas, extensíveis para além do que se costuma definir como “domesticidade”. Em suma, a lama, a terra, o cuidado, o corpo, a comida, a palavra, a casa, o fogo, o conflito, a mulher e a mãe fazem parte de um léxico mais amplo, que se rearticula a cada um dos encontros etnográficos aqui descritos, movendo-se em tempos-espaços específicos, desdobrando-se em sentidos singulares. Se sua análise será portanto sempre parcial, atenta a um porvir, a escrita deste dossiê foi inevitavelmente atravessada pelo tempo.

Desde o momento em que começamos a ativar a rede de pesquisadoras ora apresentada, até os dias atuais, fomos arrebatadas por uma série de acontecimentos pessoais e coletivos, tais como a pandemia da Covid-19, o avanço da extrema direita brasileira (representando o agronegócio e com ataques explícitos a coletivos e comunidades tradicionais em agenciamentos com a terra e/ou a pautas ligadas à questão de gênero) e o assassinato, na Terra Indígena do Vale do Javari, do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira – este último, marido de Beatriz Matos, integrante de nossa rede. Por outro lado, testemunhamos povos minorizados conquistarem recentemente importantes espaços de representação na política partidária nacional, fato auspicioso ainda que incipiente.

Já há alguns anos, vemos se fortalecerem múltiplos movimentos sociais de mulheres, formados no contexto de alianças cosmopolíticas entre distintos povos ameaçados por empreendimentos modernizantes neoagroextrativistas. Em sua 23a edição, a Marcha das Margaridas, organizada sobretudo por entidades sindicais das trabalhadoras rurais, vem mobilizando nacionalmente “mulheres do campo, da floresta e das águas”. Em 2019, a 1a Marcha das Mulheres Indígenas em Brasília, com o tema “Território: nosso corpo, nosso espírito”, reuniu 130 diferentes povos indígenas. Já em 2024, com o tema “Mulheres em defesa da vida, por terra e território”, realizou-se o IV Encontro de Mulheres da Teia dos Povos – rede que desde 2014 reúne extrativistas, ribeirinhos, sem-terra, sem-teto, pequenos agricultores, povos de terreiros, pescadores e marisqueiras, quebradeiras de coco e mesmo comunidades de periferias urbanas. Se exemplos como esses dão força e pertinência ao nosso propósito de aproximar pesquisas desenvolvidas em contextos culturais heterogêneos, a tarefa de criar enquadramentos teórico-etnográficos para essas junções, como vimos, não é trivial, sobretudo quando partimos do princípio de que o conhecimento é inevitavelmente situado.

Para nos auxiliar nesse sentido, testemunhamos não apenas a criação e multiplicação de movimentos sociais de mulheres indígenas, camponesas, quilombolas, pescadoras etc., mas também a emergência de uma literatura informada por estes eventos. De um lado, há um conjunto de trabalhos recentes produzidos por pesquisadoras que teceram suas reflexões em diálogo com mães, professoras, rezadeiras, curandeiras, agentes de saúde, lideranças de movimentos sociais (mistos ou de mulheres) e detentoras de cargos na política 9 9 Podemos citar, entre outras autoras, Maria Ignez Paulilo ( 2009 ), Fernanda Figurelli ( 2011 ), Rodica Weitzman ( 2016 ), Taísa Lewitzki ( 2019 ), Marcela Centelhas ( 2019 ), Michela Calaça ( 2021 ), bem como as coletâneas organizadas por Furtado, Carneiro e Ayoub ( 2023 ), Martínez e Hellebrandt ( 2019 ), Medeiros & Neves ( 2013 ) e Woortmann, Heredia e Menashe ( 2006 ). . De outro, somos tributárias também das leituras de acadêmicas/os indígenas que vêm recentemente criando um campo de debate teórico e político original e importante para as reflexões aqui presentes, sobretudo a respeito dos imbricamentos entre corpo, território e conhecimento 10 10 Ver, entre outras, Aurora Baniwa, Braulina, 2018 ; Benites, 2018; Barreto Tukano, 2021 ; Correa Xakriabá, 2018 . . Esses dois conjuntos de trabalhos incitam-nos a discutir como o gênero organiza e é organizado junto à atuação política dos movimentos sociais. Em vários dos artigos aqui reunidos, nossas interlocutoras ressaltam experiências e modos de socialidade próprios, os quais não se limitam a um modelo heteronormativo da vida social. Ao contrário, elas muitas vezes enfatizam saberes e fazeres políticos que passam pelos laços de umas com as outras, e através dos quais podem ser produzidas e reiteradas algumas diferenças e assimetrias entre as próprias mulheres.

Apresentação dos artigos

Como dito inicialmente, o comentário que abre esta coletânea, de autoria de Ana Claudia Marques, corresponde ao debate realizado pela colega ao final de nosso último seminário. Ao assinalar o exercício que mobilizou nossos encontros – “liberar, focalizar e discutir dimensões das relações de gênero em suas etnografias” –, a autora mapeia algumas das temáticas abordadas por nós, com especial ênfase à relação entre gênero e parentesco. A generificação criada pelo parentesco, vista desde as experiências dos povos da terra, indica que as mulheres encontram uma posição fundamental quando se tornam mães – de modo que práticas da casa, cozinha, quintais, retomadas, ocupações (atos femininos valorados nesses coletivos) não são de qualquer mulher, mas da mulher-mãe. Também deixa ver que parte desta agência envolve saberes que as mães detêm sobre seus próprios corpos e sobre os corpos mais chegados, aspecto que remete nosso debate da corporalidade aos acontecimentos sociológicos da procriação .

Como bem destaca a autora, esta é uma imagem importante às perspectivas que trabalham na intersecção entre pensamentos feministas e estudos de parentesco, e pode nos ajudar a complexificar nossas problemáticas sobre “processos de transformação contínuos” agenciados pelas mães. Participam de tais processos as vivências nas casas e os modos de habitar; a relação tempo, memória, movimento; os acontecimentos conflitivos e violentos que envolvem mulheres em contexto de luta pela terra, mas não apenas.

Seguindo esta abordagem, podemos entender a procriação (e aqui acrescentemos a cocriação) como modalidades de saberes corporificados (Haraway, 1995HARAWAY, Donna. 1995. “Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial”. Cadernos Pagu, 5: 7-41. ) que, expressos na posição de mulher-mãe, revelam dimensões importantes das políticas da terra protagonizadas por elas. Mencionamos anteriormente que esta é uma “política” tecida em variados atos extraordinários e cotidianos orientados para a produção de pessoas e terras. Por sua vez, temos consciência de que descrevê-la em sua multiplicidade supõe não nos limitarmos ao modelo da conjugalidade cis-hetererossexual, à medida que este encerra equivocadamente a vida das mulheres à relação com o pai de família . O argumento reforça o que já afirmamos anteriormente. Afinal, entender o lugar dessa mulher-mãe demanda uma atenção à convivência entre mulheres, mas também às relações entre mulheres e filhos (e às especificidades relacionais entre mãe e filha, mãe e filho e demais vínculos que participam do criar/cuidar); à notável ausência dos pais (seja porque abandonaram os seus, seja pela violência que acometem seus corpos de modo particular ou até mesmo pelos trânsitos associados ao mundo do trabalho); assim como às relações entre mulheres e os outros, desde a convivência com irmãos, vizinhos, agentes do Estado, políticos, jagunços, senhores da terra.

Em “Nos caminhos da lama: diálogos entre oleiras e marisqueiras através das fronteiras etnográficas sul-americanas”, Luisa Elvira Belaunde e Renata Machado nos convidam a olhar para os saberes-fazeres de mulheres, e a refletir sobre as composições entre corpos e territórios em um trançado multiespécies. A aproximação e o contraste de suas etnografias com mulheres Kichwa-lamas no sopé andino da Amazônia peruana, e com marisqueiras na Ilha de Itaparica, Bahia, levaram as antropólogas a elegerem as conexões entre mulheres, lamas e luas como vetores para a compreensão da corporalidade e das técnicas e poéticas do habitar. Os entrelaçamentos entre os corpos, os barros e as fases da lua iluminam ainda transformações na paisagem, na alimentação e nos artefatos, mudanças que também dizem respeito aos processos de usurpação de terras e águas vividos pelas kichwa-lamas, mulheres indígenas, e pelas marisqueiras de Itaparica, mulheres pretas. Além de ressaltarem o racismo ambiental como estruturante dos avanços das frentes desenvolvimentistas e de privatização das terras, as autoras revelam os modos como as mulheres experimentam a lama como substância, artefato e lugar de luta por direitos aos seus corpos-territórios. Isso implica necessariamente o exercício etnográfico de descrever o que chamam de “cinética corporal” – instrumentos, gestos, olhares, passos, cortes – da interação das mulheres com a lama. Destacam-se nesse sentido o diálogo com o conceito de “compostagem” (Haraway, 2016HARAWAY, Donna J. 2016. Staying with the trouble: making kin in the chthulucene. Durham, Duke University Press. ) e a ideia de “devir com a terra”, um devir que se realiza com o gênero e através da olaria e da mariscagem, as quais não se resumem a modos de produção de vasos ou de alimentos, mas são formas de gerar casas, afetos, corpos e territórios de mulheres em movimento.

Ao tangenciarem as contribuições de diferentes campos teóricos feministas para um debate marcado por inúmeros desdobramentos e firme na proposta de visibilizar as atividades realizadas pelas mulheres (com destaque para a questão da sobrecarga e do trabalho não pago), as reflexões elaboradas por Weitzman, Lovo e Pietrafesa associam o vocabulário político-analítico do cuidado à temática do movimento. A partir dessa intersecção, no artigo intitulado “Modos de cuidar e se movimentar: experiências etnográficas entre indígenas, quilombolas e agricultoras familiares”, as autoras aproximam campos etnográficos distintos (povo Pankararu em Pernambuco e São Paulo, quilombolas de Alcântara – MA e agricultoras agroecológicas do Leste de Minas Gerais), a fim de descrever variações entre os “modos de cuidar”, isto é, saberes-fazeres que expressam princípios organizadores da vida coletiva e reveladores de uma ética do relacionamento atualizada em práticas de cura, experimentações agroextrativistas e no cultivo dos afetos. Nesse sentido, a aproximação desses contextos etnográficos evidencia práticas do cuidado experimentadas em um cotidiano baseado na atenção às conexões existentes entre os corpos das pessoas e o corpo da terra, bem como aos vínculos que as constituem, a exemplo da relação entre humanos e mais que humanos. Vivências que atuam nas constantes costuras entre mundos moventes, cujas estabilizações, ainda que provisórias e precárias, não prescindem de atividades fundamentadas em conhecimentos que nos falam de dádivas e de venenos, ou seja, dos afetos em sua complexidade. Cuidado é também dissidência, reforçam as autoras em diálogo com interlocutoras sensíveis aos movimentos necessários à constituição da vida.

No artigo de Ana Carneiro e Júlia Otero dos Santos, as agências das mulheres na criação de corpos, terras e relações são discutidas a partir da cozinha, compreendida pelas autoras como um dispositivo que propicia o fazer e o desfazer de pessoas e coletivos através da produção, circulação e compartilhamento de comida e bebida. As autoras tomam por base suas etnografias com os agricultores familiares do povo dos Buracos, em Minas Gerais, e com o povo indígena Karo-Arara, na Amazônia. Em “Criações da cozinha: corpos, pessoas e relações em contextos indígenas, camponeses e quilombolas”, Carneiro e Otero dos Santos debatem as possibilidades e limites do exercício de comparação entre contextos tão diferentes, os quais, no interior de nossa disciplina, têm inspirado tradições teóricas distintas: os estudos de campesinato e a etnologia indígena. Se este desafio marca todos os artigos do dossiê, aqui vemos especificamente como essas tradições têm tratado as associações entre o parentesco, a alimentação e a terra. Ao atentarem para as aproximações e contrastes entre os Karo-Arara e o povo dos Buracos, as autoras buscam salientar as particularidades de cada etnografia, o que chamam de “procedimentos das misturas culinárias apreendidas”, e não um modelo relacional comum. Assim, enquanto no caso dos Karo-Arara os agenciamentos das mulheres atuam nos processos pacificadores de transformação da caça em alimento, entre o povo dos Buracos a “mexida de cozinha” das mulheres atua na criação do sangue e dos parentes. Ali a comensalidade é um princípio da criação de um povo e, por conseguinte, dos lugares de um povo. Em ambos os casos, como nos recordam as autoras, compartilhar alimentos e criar corpos são atos que não se reduzem à chave da sociabilidade e da vitalidade. Há dimensões agonísticas e disruptivas que se destacam em ambos os contextos, na medida em que a comida e a bebida são capazes de fazer mal, envenenar, produzir diferença, violência e morte.

As imbricações entre o gênero e os conflitos sociais são observadas também por Dibe Ayoub, Lauriene Seraguza e Maiara Dourado. Em “Lutas pela terra, mulheres e violências: aproximações e distanciamentos desde as indígenas Guarani e Kaiowa, as posseiras de Trombas e Formoso e as mulheres dos faxinais de Pinhão”, as autoras refletem sobre os engajamentos das mulheres nos movimentos para retomar ou segurar as terras de suas gentes, povos, parentes. Desvelam assim um conhecimento da violência, de seus perpetradores e das formas de enfrentá-los que é particular às mulheres. Sem deixar de reconhecer as especificidades de cada um dos conflitos e dos povos com que trabalham, as autoras encontram, na figura da casa, um ponto comum de preocupação entre suas interlocutoras. As lutas pela terra passam por diferentes maneiras de reivindicar e assumir pertencimentos entre corpos e lugares de existência, o que nos casos analisados implica diretamente o esforço de fazer e manter casas, entidades vivas que dão um caráter de lar à terra. Ao colocar seus corpos e casas na luta, essas mulheres problematizam as maneiras com que os conflitos as constituem enquanto pessoas no mundo. Apesar de haver muito sofrimento ao longo desses enfrentamentos, as interlocutoras ressaltam como, através deles, tornaram-se também mulheres fortes e lideranças. Se por um lado elas se orientam pelas moralidades de gênero particulares aos seus grupos, por outro suas falas revelam que tais valores e normas não são fixos, que há variadas formas de viver a luta enquanto mulher. Isso nos leva a refletir sobre os modos com que o conflito atua na estilização, reiteração ou contestação dos gêneros de corpos e terras. As histórias daquelas mulheres iluminam ainda a face íntima dos processos de usurpação de terras. Ao contarem sobre suas experiências, elas elaboram uma perspectiva crítica sobre as formas de poder de homens diferentes, formas que se entrelaçam às violências vividas nas lutas.

Referências bibliográficas

  • ALVES, Yara. 2016. A casa raiz e o voo de suas folhas: Família, movimento e casa entre os moradores de Pinheiro-MG. São Paulo, Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo.
  • ANZALDUA, Gloria. 1987, La frontera: the new mestiza. São Francisco, Aunt Lute Books.
  • AURORA BANIWA, Braulina. 2018. “Mulheres e território: Reflexão sobre o que afeta a vida das Mulheres indígenas quando os direitos territoriais são ameaçados”. Vukápanavo: Revista Terena, 1(1): 165-170.
  • AYOUB, Dibe; SERAGUZA, Lauriene & DOURADO, Maiara. 2024. “Lutas pela terra, mulheres e violências: aproximações e distanciamentos desde as indígenas Guarani e Kaiowa, as posseiras de Trombas e Formoso e as mulheres dos faxinais de Pinhão”. Revista de Antropologia.
  • BARRETO TUKANO, João Paulo Lima. Kumuã na kahtiroti-ukuse: uma “teoria” sobre o corpo e o conhecimento prático dos especialistas indígenas do Alto Rio Negro. 2021. Tese de doutorado, Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Amazonas, 190 p.
  • BELAUNDE, Luisa Elvira. 2005. El recuerdo de luna: género, sangre y memoria entre los pueblos amazónicos. Lima, Fondo Editorial de la Facultad de Ciencias Sociales.
  • BELAUNDE, Luisa Elvira & MACHADO, Renata Freitas. 2024. “Nos caminhos da lama: diálogos entre oleiras e marisqueiras através das fronteiras etnográficas sul-americanas”. Revista de Antropologia (este volume).
  • BENITES, Sandra. 2016. Viver na língua Guarani Nhandewa (mulher falando). Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Museu Nacional.
  • CABNAL, Lorena. 2010. “Acercamiento a la construcción de la propuesta de pensamiento epistémico de las mujeres indígenas feministas comunitarias de Abya Yala”. In: CABNAL, Lorena & ACSURLAS SEGOVIAS. Feminismos diversos: el feminismo comunitario. Madrid, ACSUR-Las Segovias, pp. 10-25.
  • CADENA, Marisol de la. 2010. “Indigenous Cosmopolitics in the Andes: Conceptual Reflections beyond ‘Politics’”. Cultural Anthropology, 25(2).
  • CALAÇA, Michela. 2021. O feminismo camponês popular: resistência e revolução. Campina Grande, Tese de doutorado, Universidade Federal de Campina Grande.
  • CARNEIRO, Ana. 2015. O povo parente dos Buracos: sistema de prosa e mexida de cozinha. Rio de Janeiro, E-papers.
  • CARNEIRO, Ana & OTERO DOS SANTOS, Júlia. 2024. “Criações da cozinha: corpos, pessoas e relações em contextos indígenas, camponeses e quilombolas”. Revista de Antropologia (neste volume).
  • CARSTEN, Janet. 1995. “The substance of kinship and the heat of the hearth: Feeding, personhood, and relatedness among Malays in Pulau Langkawi”. American Ethnologist, 22(2): 223-241. http://www.jstor.org/stable/646700
    » http://www.jstor.org/stable/646700
  • CARSTEN, Janet. 2004. After Kinship. Cambridge, Cambridge University Press.
  • CENTELHAS, Marcela Rabello. 2019. Nas águas das políticas: as mulheres, as cisternas e o curso da vida no agreste pernambucano. Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
  • COELHO DE SOUZA, Marcela; BARBI, Rafael Costa e Santos; FERNANDES, Janaína; LIMA, Daniela; MOLINA, Luísa; OLIVEIRA, Ester; LEWANDOWSKI, Andressa; OTERO DOS SANTOS, Julia; MIRAS, Júlia & SOARES-PINTO, Nicole. 2016. T/ terras indígenas e territórios conceituais: incursões etnográficas e controvérsias públicas. Projeto de pesquisa. Brasília-DF.
  • CORREA XAKRIABÁ, Célia Nunes. 2018. O barro, o genipapo e o giz no fazer epistemológico de autoria Xakriabá: reativação da memória por uma educação territorializada. Dissertação de mestrado, Mestrado Profissional em Sustentabilidade junto a Povos e Terras Tradicionais (MESPT), Centro de Desenvolvimento Sustentável, Universidade de Brasília-DF, 218 p.
  • DAINESE, Graziele; CARNEIRO, Ana & MENASCHE, Renata. 2018. Dossiê Casa e corporalidade entre camponeses e povos tradicionais. Tessituras: Revista de Antropologia e Arqueologia, 6(2): 4-8. https://revistas.ufpel.edu.br/index.php/tessituras/issue/view/89 .
    » https://revistas.ufpel.edu.br/index.php/tessituras/issue/view/89
  • DAINESE, Graziele e SERAGUZA, Lauriene. 2016. “Sobre gêneros, arte, sexualidade e a falibilidade destes e de outros conceitos: Entrevista com Luisa Elvira Belaunde Olschewski”. Revista Ñanduty 4(5): 286-307.
  • FIGURELLI, Mónica Fernanda. 2011. Família, escravidão luta: histórias contadas de uma antiga fazenda. Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
  • FURTADO, Fabrina; CARNEIRO, Ana & AYOUB, Dibe. 2023. “Mulheres, territorialidades e epistemologias feministas – conflitos, resistências e (re)existências”. Revista Estudos Sociedade e Agricultura, jan.-jun.: 1-14. https://doi.org/10.36920/esa31-1_st01
    » https://doi.org/10.36920/esa31-1_st01
  • GONZALEZ, Lélia. 1988. “Mujeres, crisis y movimiento: America Latina y el Caribe”. ISIS Internacional – Mujeres por un desarrollo altenativo, 6, jun.: 133-141.
  • HARAWAY, Donna. 2021. Manifesto das espécies companheiras: cachorros, pessoas e alteridade significativa. Tradução Pê Moreira. Rio de Janeiro, Bazar do Tempo.
  • HARAWAY, Donna J. 2016. Staying with the trouble: making kin in the chthulucene. Durham, Duke University Press.
  • HARAWAY, Donna. 1995. “Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial”. Cadernos Pagu, 5: 7-41.
  • LEWANDOWSKI, Andressa e OTERO DOS SANTOS, Júlia. 2019. “Cosmopolíticas da terra contra os limites da territorialização”. Ilha, 21(1): 6-20.
  • LEWITZKI, Taísa. 2019. A vida das benzedeiras: caminhos e movimentos. Curitiba, Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Paraná.
  • LUGONES, María. 2014. “Rumo a um feminismo descolonial”. Revista Estudos Feministas, 22(3): 935-952.
  • MACHADO, Renata Freitas. 2019. “Entre a maré e a casa: corpo, técnica e movimento das marisqueiras (Vila de Matarandiba – BA)”. Trabalho apresentado no 3º Seminário Casa, corpo e políticas da terra (Campus Sosígenes Costa da UFSB, Porto Seguro, Bahia), pp. 1-15.
  • MCCALLUM, Cecilia. 1997. “Comendo com Txai, comendo como Txai: A sexualização de relações étnicas na Amazônia contemporânea”. Revista de Antropologia, 40, São Paulo, Edusp: 109-147.
  • MARQUES, Ana Claudia. 2024. “Transversalidades, descentramentos e inquietações: um comentário sobre o 4º Seminário Casa, Corpo e Políticas da terra”. Revista de Antropologia (neste volume).
  • MARTÍNEZ, Silvia A. & HELLEBRANDT, Luceni. 2019. Mulheres na atividade pesqueira no Brasil. Campos dos Goytacazes, Eduenf.
  • MEDEIROS, Leonilde Servolo & NEVES, Delma Pessanha. 2013. Mulheres camponesas: trabalho produtivo e engajamentos políticos. Niterói, Alternativa.
  • MOORE, Henrietta. “Understanding sex and gender”. In: INGOLD, Tim (ed.). Companion Encyclopedia of Anthropology. Londres e Nova York, Routledge, pp. 813-830.
  • PAULILO, Maria Ignez S. 2009. “Movimentos das mulheres agricultoras e os muitos sentidos da ‘igualdade de gênero’”. In: FERNANDES, Bernardo Mançano et al. Lutas camponesas contemporâneas: condições, dilemas e conquistas, vol. II. São Paulo, Editora Unesp; Brasília, Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, pp. 179-201.
  • PERUTTI, Daniela. 2018. “O monturo, as visitas, os presentes: casa e amizade entre mulheres de Família Magalhães (GO)”. Apresentação no 2o Seminário Casa, corpo e políticas da terra, realizado em Brasília-DF, na Universidade de Brasília, pp. 1-18.
  • PRECIADO, Paul. 2003. “Multitudes queer”. Revista Multitudes. Paris, Association Multitudes, n. 12, pp.17-25.
  • ROSALDO, Michelle Zimbalist. 1980. “The use and abuse of Anthropology: Reflections on feminism and cross-cultural understanding”. Signs, 5(3): 389-417.
  • STENGERS, Isabelle. “Beyond conversation: the risks of peace”. 2002. In: KELLER, Catherine & DANIELL, Anne (eds.). Process and difference: between cosmological and poststructuralist post-modernisms. Albany, University of New York Press, pp. 235-55.
  • STRATHERN, Marilyn. 1991. Partial connections. Lanham, AltaMira Press.
  • STRATHERN, Marilyn. 1988. The gender of the gift: problems with women and problems with society in Melanesia. Berkley, University of California Press.
  • TOLA, Miriam. 2016. “Composing with Gaia: Isabelle Stengers and the feminist politics of the Earth”. PhaenEx, 11 (1):1-21.
  • WEITZMAN, Rodica. 2016. Tecendo deslocamentos: Relações de gênero, práticas produtivas e organizativas entre trabalhadoras rurais. Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
  • WEITZMAN, Rodica; GODOI, Emília Pietrafesa de & LOVO, Arianne Rayis. 2024. “Modos de cuidar e se movimentar: experiências etnográficas entre indígenas, quilombolas e agricultoras familiares”. Revista de Antropologia (neste volume).
  • WOORTMANN, Ellen; HEREDIA, Beatriz & MENASCHE, Renata. 2006. Margarida Alves: Coletânea sobre estudos rurais e de gênero. Brasília, MDA, IICA.
  • YANAGISAKO, Sylvia Junko & COLLIER, Jane Fishburne. 1987. “Toward a unified analysis of gender and kinship”. In: COLLIER, Jane Fishburne & YANAGISAKO, Sylvia Junko. Gender and kinship: Essays toward a unified analysis. Stanford, Stanford University Press, pp. 14-50.
  • 1
    Além das autoras desta apresentação – que coordenaram os seminários –, participaram, em diferentes arranjos: Ana Claudia Marques, Andressa Lewandowski, Arianne Lovo, Beatriz Matos, Daniela Perutti, Emília Pietrafesa de Godoi, José Miguel Nieto Olivar, Julia Otero dos Santos, Lauriene Seraguza, Luisa Elvira Belaunde, Marcela Coelho Souza, Maiara Dourado, Paula Balduíno, Renata Machado, Rodica Weitzman, Silvana Nascimento e Yara Alves. Três dos encontros foram realizados na modalidade presencial, consecutivamente na Unicamp (Campinas, maio de 2018), na UnB (Brasília-DF, dezembro de 2018) e na UFSB (Porto Seguro, setembro de 2019). O quarto e último seminário realizou-se na modalidade virtual, em outubro de 2020, e reuniu todas as pesquisadoras acima. Agradecemos a cada uma delas pelos encontros prazerosos e inspiradores.
  • 2
    O GT, intitulado “Casa, comida e gênero: olhares etnográficos a partir de coletivos camponeses e tradicionais”, gerou um dossiê na revista Tessituras (ver Dainese, Carneiro e Menasche, 2018 DAINESE, Graziele; CARNEIRO, Ana & MENASCHE, Renata. 2018. Dossiê Casa e corporalidade entre camponeses e povos tradicionais. Tessituras: Revista de Antropologia e Arqueologia, 6(2): 4-8. https://revistas.ufpel.edu.br/index.php/tessituras/issue/view/89 .
    https://revistas.ufpel.edu.br/index.php/...
    ).
  • 3
    Os eixos foram definidos da seguinte forma: 1. Parentesco e família; 2. Movimento e cuidado; 3. Trabalho e ajuda; 4. Casa e cozinha; 5. Violência e conflito; 6. Corpo e paisagem; 7. Sexualidades, afetividades e desejos.
  • 4
    Nomeados também nos termos de modos, mexidas, jeitos, técnicas poéticas, práticas de conhecimento etc., conforme as etnografias aqui reunidas.
  • 5
    A autora toma o conceito de equivocação emprestado de Eduardo Viveiros de Castro (2004).
  • 6
    Podemos nos inspirar no texto de autoapresentação da Teia dos Povos: “ninguém precisa baixar a bandeira de sua luta para constituir uma Aliança. Nosso objetivo não é, portanto, ser um movimento social que englobe os demais. Queremos caminhar juntos, não produzir uma unidade monolítica” ( https://teiadospovos.org/sobre/ . Acessado em 09/02/2024).
  • 7
    Guardadas as devidas distâncias, mencionem-se, por exemplo, Anzaldua, 1987ANZALDUA, Gloria. 1987, La frontera: the new mestiza. São Francisco, Aunt Lute Books. ; Gonzalez, 1988GONZALEZ, Lélia. 1988. “Mujeres, crisis y movimiento: America Latina y el Caribe”. ISIS Internacional – Mujeres por un desarrollo altenativo, 6, jun.: 133-141. ; Haraway, 1991; Preciado, 2003PRECIADO, Paul. 2003. “Multitudes queer”. Revista Multitudes. Paris, Association Multitudes, n. 12, pp.17-25. ; Strathern, 1988STRATHERN, Marilyn. 1988. The gender of the gift: problems with women and problems with society in Melanesia. Berkley, University of California Press. .
  • 8
    Forçoso lembrar que as divisões entre subáreas estabilizadas na antropologia brasileira não correspondem a fronteiras dadas e nunca estiveram alheias a disputas e variações no tempo e no espaço.
  • 9
    Podemos citar, entre outras autoras, Maria Ignez Paulilo ( 2009PAULILO, Maria Ignez S. 2009. “Movimentos das mulheres agricultoras e os muitos sentidos da ‘igualdade de gênero’”. In: FERNANDES, Bernardo Mançano et al. Lutas camponesas contemporâneas: condições, dilemas e conquistas, vol. II. São Paulo, Editora Unesp; Brasília, Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, pp. 179-201. ), Fernanda Figurelli ( 2011FIGURELLI, Mónica Fernanda. 2011. Família, escravidão luta: histórias contadas de uma antiga fazenda. Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro. ), Rodica Weitzman ( 2016WEITZMAN, Rodica. 2016. Tecendo deslocamentos: Relações de gênero, práticas produtivas e organizativas entre trabalhadoras rurais. Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro. ), Taísa Lewitzki ( 2019LEWITZKI, Taísa. 2019. A vida das benzedeiras: caminhos e movimentos. Curitiba, Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Paraná. ), Marcela Centelhas ( 2019CENTELHAS, Marcela Rabello. 2019. Nas águas das políticas: as mulheres, as cisternas e o curso da vida no agreste pernambucano. Rio de Janeiro, Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro. ), Michela Calaça ( 2021CALAÇA, Michela. 2021. O feminismo camponês popular: resistência e revolução. Campina Grande, Tese de doutorado, Universidade Federal de Campina Grande. ), bem como as coletâneas organizadas por Furtado, Carneiro e Ayoub ( 2023 FURTADO, Fabrina; CARNEIRO, Ana & AYOUB, Dibe. 2023. “Mulheres, territorialidades e epistemologias feministas – conflitos, resistências e (re)existências”. Revista Estudos Sociedade e Agricultura, jan.-jun.: 1-14. https://doi.org/10.36920/esa31-1_st01
    https://doi.org/10.36920/esa31-1_st01...
    ), Martínez e Hellebrandt ( 2019MARTÍNEZ, Silvia A. & HELLEBRANDT, Luceni. 2019. Mulheres na atividade pesqueira no Brasil. Campos dos Goytacazes, Eduenf. ), Medeiros & Neves ( 2013MEDEIROS, Leonilde Servolo & NEVES, Delma Pessanha. 2013. Mulheres camponesas: trabalho produtivo e engajamentos políticos. Niterói, Alternativa. ) e Woortmann, Heredia e Menashe ( 2006WOORTMANN, Ellen; HEREDIA, Beatriz & MENASCHE, Renata. 2006. Margarida Alves: Coletânea sobre estudos rurais e de gênero. Brasília, MDA, IICA. ).
  • 10
    Ver, entre outras, Aurora Baniwa, Braulina, 2018AURORA BANIWA, Braulina. 2018. “Mulheres e território: Reflexão sobre o que afeta a vida das Mulheres indígenas quando os direitos territoriais são ameaçados”. Vukápanavo: Revista Terena, 1(1): 165-170. ; Benites, 2018; Barreto Tukano, 2021BARRETO TUKANO, João Paulo Lima. Kumuã na kahtiroti-ukuse: uma “teoria” sobre o corpo e o conhecimento prático dos especialistas indígenas do Alto Rio Negro. 2021. Tese de doutorado, Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Amazonas, 190 p. ; Correa Xakriabá, 2018CORREA XAKRIABÁ, Célia Nunes. 2018. O barro, o genipapo e o giz no fazer epistemológico de autoria Xakriabá: reativação da memória por uma educação territorializada. Dissertação de mestrado, Mestrado Profissional em Sustentabilidade junto a Povos e Terras Tradicionais (MESPT), Centro de Desenvolvimento Sustentável, Universidade de Brasília-DF, 218 p. .
  • O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior- Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024
Universidade de São Paulo - USP Departamento de Antropologia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade de São Paulo. Prédio de Filosofia e Ciências Sociais - Sala 1062. Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, Cidade Universitária. , Cep: 05508-900, São Paulo - SP / Brasil, Tel:+ 55 (11) 3091-3718 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista.antropologia.usp@gmail.com