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A contabilidade decisorial em seu segundo estágio: - 1.ª parte: considerações gerais e elaboração do plano geral de atividades

ARTIGOS

A contabilidade decisorial em seu segundo estágio - 1.ª parte: considerações gerais e elaboração do plano geral de atividades

José Luiz Bicudo Paranhos

Engenheiro, Consultor em Administração de Empresas, Assistente da Diretoria, Encarregado dos Programas de Desenvolvimento Técnico da OECI - Organizadores, Economistas e Consultores Industriais, Ltda

Em artigo precedente, publicado na RAE de março de 1969, Vol. 9, n.º 1, sob o título: Contabilidade Decisorial - Um sistema integrado de informações para diretores e gerentes, procuramos dar uma idéia dos conceitos básicos utilizados pela Contabilidade Decisorial (CD), suas principais características e das vantagens que se pode obter com a adoção do sistema. Detivemo-nos, no que chamamos um primeiro estágio da CD, que aborda seu aspecto de controle, entendido como sendo a coleta, registro e apresentação das formações econômico-financeiras dos períodos passados.

Pretendemos, agora, mostrar como o sistema é enriquecido e cresce em utilidade para o administrador, quando aplicado no estudo dos períodos futuros, ou seja, quando se acrescentam àqueles conceitos e características do primeiro estágio, os princípios e técnicas do planejamento geral das atividades da empresa.

A separação da Contabilidade Decisorial (CD) em dois estágios não é uma imposição do sistema. Pode-se muito bem implantar a CD numa empresa já no seu segundo estágio, como, aliás, prevê o sistema na sua forma original (Profitability Accouting). O grau de desenvolvimento de nossas sociedades foi o que nos levou a fazer esta separação. Assim procedendo: a) mesmo as empresas que não têm condições (de estrutura, de organização e mesmo humanas) para prever o seu desenvolvimento, já poderão se beneficiar de grande parte das vantagens do sistema: b) criam-se condições para que os dirigentes da empresa se familiarizem bem com os conceitos do sistema antes de usá-los para planejar suas atividades; c) pode a empresa acumular dados que irão servir para a elaboração dos planos futuros.

Neste ponto é preciso deixar claro que o primeiro estágio deve ser encarado como uma transição, como uma plataforma de apoio, para o planejamento do desenvolvimento da empresa, que caracteriza o seu segundo estágio.

1. Plano geral de atividades (PGA)1 1 Podem ser usadas outras designações como Plano de Operações, Plano Econômico-Financeiro, etc.

A função de planejar é inerente à atividade do administrador. Ela é exercida sempre, qualquer que seja a ação a executar. Acontece que grande parte das vezes o planejamento ou é feito mentalmente, o que é justificável para pequenas tarefas, ou acaba numa simples lista de providências a tomar a curto prazo. E isto ocorre em grande número de nossas empresas, originando uma cadeia de medidas improvisadas, de regra transmitidas verbalmente, que com freqüência, por serem tomadas por pessoas diferentes, não estão sempre no mesmo sentido e não consideram o problema sob todos os aspectos. Em resultado, tornam-se freqüentes os pontos de conflito, a dispersão de esforços, os atritos internos, as quebras de eficiência, etc.

A fixação de objetivos bem definidos para a empresa em seu todo e a explosão destes objetivos em metas e tarefas para cada pequeno núcleo de atividade dentro da empresa constituem o fator de polarização dos esforços disponíveis no sentido do progresso desejado. E para que esta tarefa - que nada mais é do que planejar, mas num sentido bem mais profundo e consciente - possa atingir o resultado esperado, ela deve ser materializada, num Plano Geral de Atividades, elaborado com certo grau de formalismo, de modo a constituir a base de referência a ser utilizada na aferição das metas atingidas e do nível de desempenho alcançado pelos diversos setores de empresa.

O Plano Geral de Atividades compreende basicamente:

- Plano de Lucro

- Previsão Financeira

- Plano de Investimentos

O Plano de Lucro mostra o resultado esperado da empresa, em função dos dados projetados de receita e despesas, e ainda fornece informações sobre o custo e rentabilidade das linhas de produtos e das filiais (ou divisões). São empregadas, na sua elaboração, as técnicas de Orçamento Flexível (Variable Budget) para o que os conceitos de Custo Direto, Contribuição Marginal, e padrões introduzidos no primeiro estágio da CD, são de grande utilidade.

A Previsão Financeira apresenta o fluxo de fundos decorrentes das operações necessárias ao cumprimento do Plano de Lucro, das demais operações financeiras da empresa, e do programa de investimentos aprovados. Apresenta ainda a projeção mensal de balanços, mostrando sua provável evolução.

O Plano de Investimentos apresenta, de acordo com os objetivos gerais da empresa, as diversas alternativas de investimento possíveis, dados de lucratividade e do retorno do capital referente a cada uma, e o estudo dos recursos necessários e utilizáveis para cada caso. É evidente a sua íntima ligação com o Plano de Lucro e a Previsão Financeira.

Como elementos de apoio do PGA, e fazendo parte mesmo do plano, são considerados: a Previsão de Venda, a Previsão da Produção, Previsão de Compras, os processos de determinação dos níveis de estoque, os programas de modificações na estrutura do capital, os estudos sobre as leis e mecânica que regem o mercado de capitais, as taxas de retorno sobre o investimento, etc. Sobre alguns destes pontos teceremos breves comentários mais adiante.

São incluídos ainda, como elementos complementares, entre outros, os planos de assistência social, programas de treinamento do pessoal e planos de reorganização.

2. Período abrangido pelo PGA

Comumente um PGA é estabelecido primeiro para o prazo de um ano, sendo, em seguida, pormenorizado mensalmente. Em alguns casos esta pormenorização é feita por trimestre e, no fim de cada trimestre, faz-se a análise, por mês, para o trimestre seguinte.

Algumas empresas fazem planos para períodos mais longos, até cinco anos, mas, evidentemente, somente para o primeiro ano dão ao problema um tratamento mais pormenorizado.

Outras empresas, ainda, preferem fazer planos anuais contínuos, ou seja, após encerrar um mês, ou trimestre, é ajustado o plano para o período subseqüente e acrescenta-se a este o plano para um período igual (mês ou trimestre) na frente, de sorte a haver sempre um plano para os 12 meses seguintes.

Para ilustrar o presente trabalho, vamos imaginar uma empresa que faça, anualmente, um plano para um ano, pormenorizando mensalmente . Neste caso, o PGA começa a ser preparado cerca de três meses antes de findar um exercício, devendo estar pronto, aprovado e divulgado antes do início do período planejado.

3. Organização necessária

A elaboração de um Plano Geral de Atividades segue sempre um processo evolutivo, por aproximações sucessivas. Partindo-se dos objetivos gerais da empresa, estabelecem-se as metas a serem atingidas pelos diversos setores da empresa e avaliam-se os efeitos das diversas alternativas possíveis para que elas sejam alcançadas. São escolhidas as alternativas mais convenientes, ou então, caso necessário, modificamse as metas, e assim sucessivamente, até que se tenha um plano perfeitamente exeqüível. Com a aprovação formal da diretoria, o plano final é divulgado internamente, passando a ser o ponto de referência para a atividade de todos os órgãos da empresa.

Toda a empresa participa dos trabalhos de montagem de um PGA, desde a alta administração, na fixação dos objetivos, até os encarregados de serviço, que fazem as previsões do nível de trabalho do seu setor e das suas necessidades, face às metas definidas por seus superiores. Os setores contábil e de custos procedem à compilação dos dados, aos cálculos e preparação dos demonstrativos correspondentes às diversas alternativas. A coordenação geral é normalmente exercida pelo controller ou elemento de alto nível ligado às funções de planejamento.

Percebe-se que uma boa organização geral é necessária, não só para elaborar um PGA justo e exeqüível, como para analisar, juntamente com os respectivos responsáveis, as causas dos desvios que ocorreram na prática.

O próprio trabalho de fornecimento de dados, referentes aos objetivos iniciais fixados, aos diversos setores da empresa, a coleta das informações de previsão decorrentes e a compilação destas para a montagem de PGA exigem uma certa organização para que não se desperdicem esforços. Assim, a empresa deve ter sua estrutura orgânica e a respectiva distribuição de funções bem definidas. Também a Contabilidade, os setores de custos, controles de produção, controle de estoque, tesouraria, cobrança, vendas, etc, devem estar em condições de fornecer as informações corretas para que as alternativas possam ser estudadas com segurança.

Os conceitos introduzidos pela CD, no seu primeiro estágio, tais como a separação dos gastos em proporcionais, regulares e programados, a Contabilidade por Responsabilidade, o custo direto e a contribuição marginal, os processos de demonstração da situação patrimonial e de fluxo de fundos forçam e auxiliam a empresa a criar aquele mínimo de organização geral necessário à elaboração do PGA.

4. Modificação de mentalidade

A elaboração conscienciosa de um PGA implica numa modificação da mentalidade geral da empresa. E essa mentalidade é de grande importância para o êxito do PGA. É indispensável que se crie um clima de cooperação mútua e confiança nos propósitos do PGA. Ele deve ser entendido como um instrumento orientador das atividades dos diversos setores da empresa, fazendo com que se somem os esforços para a obtenção dos objetivos comuns colimados. E como tal, sua utilidade deve ser sentida até aos escalões hierárquicos inferiores, que terão então o máximo interesse em fazer previsões justas, não viciadas por otimismos ou pessimismos extremos. A participação de cada encarregado na elaboração do plano deve torná-lo, cada vez mais, responsável pelo seu trabalho. É de suma importância, portanto, que o PGA não seja imposto aos escalões inferiores, mas, sim, resulte de sua própria participação. Assim como jamais deve ser dada a idéia de que o PGA será utilizado para punir os responsáveis pelo não cumprimento do plano. O que realmente existe é a prestação de contas, compreendendo a análise das causas dos desvios, que é feita em profundidade, mas com o espírito de auxiliar os setores necessitados e não de puni-los. A tendência de se fazerem previsões pessimistas decorre freqüentemente deste receio de punições futuras.

Não queremos nos estender demais neste ponto. Queremos apenas deixar claro que a preparação psicológica do pessoal e todo o cuidado neste sentido durante sua introdução e elaboração é de suma importância para o êxito do PGA.

5. Esquema para a elaboração do PGA

O esquema abaixo, Fig. 1, representa o fluxo dos principais elementos utilizados na elaboração do PGA, considerando-se suas partes componentes:


- Plano de Lucro

- Previsão Financeira

- Plano de Investimentos

A seguir teceremos alguns comentários sobre cada uma destas partes e sobre as fases de sua elaboração.

6. O plano de lucro

6.1 . PREVISÃO DE VENDAS

A Previsão de Vendas é o ponto de partida para a elaboração do Plano de Lucro e para a Previsão Financeira. É o elemento mais importante e também o mais difícil do PGA. Diversos métodos têm sido correntemente utilizados nesta tarefa, podendo-se citar, segundo JOEL DEAN2 2 DEAN, Joel. Economia de Empresas, Ed. Fundo de Cultura, R. J., Brasil, traduzido do original em inglês. Managerial Economics, Prentice-Hall, Inc., Englewood Cliffs, N. J., EUA. :

- pesquisa das intenções dos compradores;

- pesquisa de opiniões de pessoas informadas;

- projeção de padrões de períodos anteriores;

- análise da correlação das vendas com outros fatores da economia nacional.

Estes e outros métodos são freqüentemente combinados para se ter a confirmação de uma previsão e/ou para atender melhor às características diferentes das diversas linhas de produto da empresa.

A Previsão de Vendas deve ser:

- anual, depois pormenorizada mensalmente ou por trimestre;

- feita em quantidades de produto;

- valorizada aos respectivos preços padrão de venda estabelecidos para o período em questão.

Conforme as necessidades de controle posterior, são calculadas as vendas por linha de produto, por zona de venda, por filial, etc.

O valor padrão previsto para as vendas é complementado com a porcentagem de desconto que a diretoria decidiu conceder aos clientes, a fim de estimular suas vendas.

É também definida, neste ponto, a porcentagem padrão para as Despesas Proporcionais de Venda (ICM, comissões, royalties, etc.) a vigorar no período, levando-se em conta as diferenças entre produtos, linhas de produto, filiais ou mesmo a localização dos clientes (no país, ou no exterior).

6.2. O CUSTO INCREMENTAL PADRÃO DE FABRICAÇÃO

Concomitantemente é feita a revisão do Custo Incremental Padrão de Fabricação para cada produto.

O Custo Incremental Padrão de Fabricação compõe-se dos gastos proporcionais ao volume de produção, ou seja, Matéria-Prima, Mão-de-Obra Direta e Despesas Proporcionais de Fabricação. Para cada um destes elementos são considerados os fatores de quantidade (quantidade de matéria-prima, horas x homem, horas máquinas necessárias, etc.) e os fatores de preço (de cada matéria-prima, das horas homem de cada seção, etc).

A quantidade de matéria-prima é obtida através das listas de materiais e listas de componentes de cada produto, tendo-se o cuidado de incluir, caso ainda não o esteja, correções para cobrir as perdas normais de fabricação. Os preços considerados são aqueles estimados pelo setor de compras como a média dos preços que deverão vigorar no período envolvido pelo PGA. Esta forma de fixação de preço, numa economia onde há certa inflação de custos, vai acarretar uma variação do preço de compra favorável no início do período a ser compensada com as variações desfavoráveis no final. Estas variações podem mesmo ser previstas dentro do próprio FGA.

A mão-de-obra direta pode ser determinada por vários processos mais ou menos precisos. Um estudo apurado dos métodos de trabalho, incluindo cronometragens ou técnicas do MTM por exemplo, seria o mais aconselhável para empresas já com um bom nível de racionalização do trabalho. Na impossibilidade destes estudos, recorre-se freqüentemente a dados históricos compilados através dos anos e que, devidamente manuseados, poderão servir perfeitamente como os padrões procurados. Em casos onde nem isto é possível, as estimativas de tempo feitas pelos responsáveis pelas diversas operações constituirão um ponto de partida para os nossos padrões que deverão, aos poucos, serem ajustados de acordo com os erros detectados posteriormente. É evidente que os processos mais grosseiros acarretarão variações maiores em relação aos dados efetivos, mas, mesmo assim, estando a sistemática de trabalho introduzida, é mais fácil o reajuste progressivo destes padrões até se chegar a precisão ideal. Os preços para a mão-de-obra direta são fixados para cada centro produtivo e deverão vigorar para o período abrangido pelo PGA; estas taxas já deverão incluir os encargos sociais correspondentes, calculados através de uma porcentagem padrão pré-estabelecida aplicada ao valor da hora.

De maneira análoga à da mão-de-obra direta, são calculados os padrões de custo das despesas proporcionais de fabricação. De um modo geral, a empresa é dividida em centros de custo homo-De um modo geral, a empresa é dividida em centros de custo homogêneos (u'a máquina, um grupo de máquinas, uma linha de montagem, uma seção de pintura, etc), de modo que, para cada um deles, se possa definir uma unidade (designada Unidade de Trabalho, ou simplesmente UT), capaz de medir todo o trabalho aí executado, qualquer que seja o produto beneficiado. Fixam-se as quantidades de UTs que cada produto deve absorver de cada centro de custo e, para cada centro de custo, é estabelecido o preço padrão para a sua UT; com base nesses dados, calcula-se o padrão de custo correspondente às despesas proporcionáis de fabricação para cada produto. Em alguns casos, dependendo das características destas despesas e de sua importancia, pode-se adotar procedimentos mais simples, como, por exemplo, associar estes gastos à mão-de-obra direta considerada nos custos. Partindo-se, então, das quantidades vendidas e valorizando-as aos respectivos custos-padrão, agora atualizados, chega-se ao custo incremental padrão de fabricação dos produtos vendidos, que irá figurar no Plano de Lucro.

6.3. AS DESPESAS REGULARES E AS PROGRAMADAS

As despesas regulares são determinadas seção por seção, incluindo os centros produtivos (que também têm sua parte de despesas regulares), os setores auxiliares de produção, os administrativos, os de vendas, e outros semelhantes. Com dados acumulados do passado - já compilados dentro dos conceitos da CD, num primeiro estágio de utilização - são feitas as projeções para o novo período, levando em conta as alterações previstas decorrentes da inflação, dos reajustes salariais, das modificações programadas para os serviços (racionalização, mecanização, desmembramento ou fusão de setores, etc.) e ainda o nível de atividade previsto para a empresa, em decorrência da previsão de vendas. Embora estas despesas sejam, a curto prazo, independentes do volume de negócios, pode ocorrer que um aumento mais significativo destes, ou a inclusão de uma nova linha de produtos, ou uma filial, por exemplo, acarretem um salto naquelas despesas, que é então estudado nesta fase do PGA.

Uma vez determinadas as despesas regulares por setor, e conseqüentemente por responsabilidade, passa-se a estudar a associação destas despesas com as linhas de produto (definição das despesas específicas), para o que lança-se mão das vantagens oferecidas pela técnica de preparação dos dados em building blocks. É dentro desta classificação, despesas específicas de cada linha e de conjunto, que as Despesas Regulares aparecem na montagem sintética final do Plano de Lucro.

As Despesas Programadas, estipuladas pela alta administração com base nos objetivos e política gerais da empresa, são também classificadas em específicas (por linha) e de conjunto, e assim figuram no Plano de Lucro final. O seu tratamento analítico não oferece dificuldades especiais.

6.4. O PLANO DE LUCRO

Até esse ponto já temos calculados:

- a Venda a preço padrão esperada;

- as Despesas Proporcionais de Venda decorrentes;

- o Custo Incremental (direto) dos Produtos Vendidos;

- a Contribuição Marginal Padrão esperada, em decorrência dos itens anteriores; e

- as Despesas Regulares e as Programadas.

Estamos, portanto, em condições de montar o Plano de Lucro, ficando apenas faltando os dados das despesas financeiras, a serem determinados por ocasião da elaboração da Previsão do Fluxo de Caixa, em função das necessidades de descontos de títulos.

Os dois modelos abaixo são exemplos de apresentação do Plano de Lucro.

O primeiro, Fig. 2, corresponde ao Plano anual e deve ser montado de modo a fornecer informações sobre as linhas de produto.


O segundo, Fig. 3, é a pormenorização dos dados globais e mensais do primeiro. Da mesma forma são preparados os demonstrativos mensais para cada linha isoladamente.


Estes modelos sintéticos têm, evidentemente, suas análises, cujos graus de pormenorização estão na dependência dos valores em jogo, das características da empresa e/ou das linhas, do interesse da própria administração, etc. Não pretendemos nos deter mais nestes pormenores, uma vez que nosso objetivo é dar uma visão de conjunto do sistema.

7. Previsão financeira

A Previsão Financeira inicia-se com o estudo do Fluxo de Caixa, cujo elemento de entrada é o valor das vendas previstas, acrescido da par cela correspondente ao IPI.

Os elementos de saída são provenientes de:

- Previsão das Despesas Proporcionais de Venda;

- Previsão de Produção, cuja elaboração parte da própria Previsão de Vendas, considerando os estoques: inicial existente e final desejado, para o período; e fornecendo os gastos a serem feitos com Mão-de-Obra Direta e Despesas Proporcionais de Fabricação;

- Previsão de Compras, que tem sua origem na Previsão de Produção e nos estoques inicial e final, de matéria-prima;

- Orçamento de Despesas Regulares e Programadas, devidamente ajustado para não incluir gastos que não representam desembolso de dinheiro, como depreciação, por exemplo;

- Encargos Diversos, considerando aquelas saídas que não são incluídas como despesas, tais como Imposto de Renda a pagar no período, dividendos a distribuir, amortização de empréstimos, IPI a recolher, etc;

- Necessidade do desconto de títulos (dando origem às despesas financeiras), conhecida através da comparação dos elementos de entrada e saída acima mencionados;

- Plano de Investimentos e recursos especiais para este fim conseguidos (empréstimos no BNDE, por exemplo).

Do fluxo de caixa decorre a Previsão Financeira, entendida num sentido mais amplo, envolvendo a projeção de balanço, análise dos índices econômico-financeiros, estudos da conveniência de aumentar o capital ou contrair empréstimos, etc.

Alguns dos elementos acima requerem comentários mais pormenorizados.

7.1. PREVISÃO DE PRODUÇÃO

Partindo-se da Previsão de Vendas considerada mensal ou trimestralmente, e dos estoques de produtos, inicial existente e final, estabelecido como meta a ser atingida, é feita a Previsão de Produção, também em quantidades.

Uma primeira questão que se impõe é a verificação, pelo menos aproximada, se esta previsão é exeqüível, face à capacidade da empresa, o que deve ser feito antes mesmo de ter sido elaborado o Plano de Lucro. A dificuldade desta verificação, em grande parte, está ligada à própria dificuldade de se ter um critério objetivo e homogêneo para a medida da produção e da capacidade produtiva da empresa. Em alguns casos, esta medida global tem uma unidade simples como por exemplo, o número de veículos de uma fábrica de automóveis, ou a quantidade, em toneladas, de aço produzido por uma siderúrgica. Entretanto, na maior parte dos casos, esta medida direta é praticamente inexpressível, e mesmo impossível, dada a diversidade dos produtos.

Lançando mão dos recursos que a Contabilidade Decisorial nos coloca à disposição, podemos chegar a uma solução bastante satisfatória para o problema. Ao examinarmos os elementos que compõem o Custo Incremental de Fabricação, verificamos que a matéria-prima representa a mercadoria ou substância que entra e sai da empresa, sofrendo, nesta passagem, uma transformação. A mão-de-obra direta e as despesas proporcionais de fabricação representam o esforço da empresa para efetuar essa transformação. Por esta razão, estas duas parcelas juntas constituem o que chamaremos de Custo de Transformação do produto e os gastos que a empresa têm para efetuar essa transformação, designaremos como Despesas de Transformação, que nada mais são do que a soma da Mão-de-Obra Direta com as Despesas Proporcionais de Fabricação.

Utilizando estes conceitos, verificamos que a capacidade de produção pode ser medida pelo total das despesas de transformação, que se teria, se aproveitássemos a totalidade da mão-de-obra direta disponível e a totalidade das UTs das seções produtivas. Para esta totalização, basta determinar o número de horas homem e das UTs de cada seção utilizáveis para produção e multiplicá-los pelos respectivos preços unitários padrão.

Por outro lado, quando se estabelece a Previsão de Produção, sempre em quantidade de produtos, pode-se calcular o custo de transformação total envolvido, que é então comparado com a capacidade produtiva anteriormente calculada.

Matematicamente teríamos:

- Capacidade produtiva útil:

- Capacidade produtiva absorvida:

onde:

número de horas X homem úteis do centro produtivo i; hi custo padrão da hora X homem do centro i; número de UTs úteis do centro produtivo i; ui custo padrão (despesas proporcionais de fabricação) da UT do centro i; Qj quantidade a ser produzida do produto j; Hij quantidade padrão de horas X homem que o produto j absorve do centro produtivo i; UTij quantidade padrão de UT que o produto j absorve do centro produtivo i.

Para que toda a produção prevista seja exeqüível é preciso que CPA < CPU.

Há casos em que esta verificação pode ser feita considerando-se apenas a mão-de-obra direta, o que torna o processo mais simples. A verificação acima, feita de um modo global para toda a empresa, dá uma primeira idéia da exequibilidade da produção prevista. Entretanto, mesmo que a capacidade absorvida seja menor que a útil, pode ser que ocorram estrangulamentos em alguns centros produtivos. Assim sendo, para maior segurança, principalmente quando se pormenoriza o PGA, devem ser feitas verificações semelhantes para cada centro produtivo, isoladamente.

Estando resolvida a questão da exequibilidade e, portanto, definida a Previsão de Produção, é estabelecido, para cada centro produtivo, o montante de horas x homem e de UT que será preciso para a execução da produção prevista. E assim, como base nas taxas-padrão de mão-de-obra e das UTs, é feito o orçamento de despesas proporcionais para cada centro de custo, em associação direta com os níveis de atividade previstos. Posteriormente, ao serem feitos os confrontos entre as despesas orçadas e efetivamente reaüzadas, é levado em conta a influência do nível de atividade realmente atingido decorrente dos desvios na previsão da produção - determinando-se a variação de responsabilidade direta do encarregado do setor.

7.2. PREVISÃO DE COMPRA

Com base ainda na Previsão de Produção fixada, estabelece-se a Previsão de Compras, levando em conta os estoques de matéria-prima inicial existente e final desejado. Esta previsão, feita também mensal ou trimestralmente e em quantidades, é analisada por tipo de material tendo em vista a questão de preços e prazos para pagamentos. Uma classificação tipo ABC pode simplificar bastante o trabalho, porquanto permitirá que se dê mais atenção aos materiais mais onerosos, simplificando-se o tratamento a ser dado a inúmeros outros que não têm muita significação econômica.

Os dados acima calculados, matéria-prima, proveniente da Previsão de Compras e Despesas de Transformação, provenientes da Previsão de Produção, vão integrar a Previsão Financeira, próximo passo na elaboração do PGA.

7.3 . PREVISÃO DO FLUXO DE CAIXA

Para a elaboração da Previsão Financeira a CD considera, inicialmente, a previsão do Fluxo de Caixa. O quadro a seguir, Fig. 4, mostra uma das formas que pode ter o formulário a ser empregado.


A parte superior traz as indicações sobre o Movimento de Títulos esperado, onde são anotadas, para cada mês: a) o saldo restante do mês anterior (saldo ainda em carteira) e o faturamento do período, correspondendo às entradas de títulos, e b) as saídas, decorrentes das vendas à vista, dos recebimentos de títulos que venceram e foram liquidados, e dos descontos de títulos junto aos bancos e entidades de crédito. A diferença entre as entradas e as saídas representam o saldo de títulos, que permanece à disposição da empresa (em carteira, passando para o mês seguinte como saldo anterior).

Éste movimento de títulos pode ser analisado por linha de produto, o que é interessante principalmente quando se tem uma diferenciação nos prazos concedidos para pagamentos ou nas características dos clientes que influenciam as possibilidades de desconto, por exemplo.

A parte inferior do formulario mostra o Movimento de Caixa esperado. Em primeiro lugar vêm os recebimentos previstos, onde são incluídos, para cada mês, o saldo de caixa proveniente do mês anterior, os recebimentos decorrentes das vendas à vista, cobrança e desconto de títulos (relativos à saída do Movimento de Títulos), empréstimos recebidos e outros recebimentos, tais como: juros recebidos, reembolso de despesas, dividendos de outras companhias, vendas do imobilizado, etc.

Em seguida são considerados os pagamentos a serem feitos no período sobre os quais cabem os comentários abaixo:

- Convém manter em separado os pagamentos referentes às Despesas Proporcionais de Venda, às Proporcionais de Transformação, ao fornecimento de Matéria-Prima e outros materiais, às Despesas Regulares, às Despesas Programadas, às Despesas Financeiras, e outros encargos como Imposto de Renda, Amortização de Empréstimos, Distribuição de Dividendos, etc.

Esta separação auxilia os ajustes que eventualmente serão necessários para o estudo de novas alternativas (de venda, por exemplo).

- Estes elementos devem ser analisados por natureza e, quando possível, por Linha de produto. O quadro Fig. 4, mostra algumas das análises possíveis.

- Na parcela correspondente ao pagamento de salários e ordenados aparece somente o valor líquido a ser pago aos empregados, separado do valor dos encargos sociais correspondentes (parte do empregado e parte do empregador, que aparecem juntas na linha seguinte). Isto porque as épocas dos respectivos desembolsos não são as mesmas.

- A parcela de matéria-prima foi calculada a partir da Previsão de Compras, e, portanto, com base nos preços-padrão. Ao ser feita a previsão de desembolso deve ser levada em conta uma correção para cobrir a variação do preço de compra esperada.

- As despesas que, no Plano de Lucro, entravam por provisões, (seguros, alguns impostos, por exemplo), são consideradas, para efeito da Previsão do Fluxo de Caixa segundo os respectivos programas reais de desembolso. Assim, enquanto no Plano de Lucro aparece um doze avos do valor anual das despesas de seguros, por exemplo, a Previsão do Fluxo de Caixa considerará a parcela anual no mês em que ela deverá ser paga.

- Em Despesas Financeiras está incluída, além dos juros e demais encargos a serem pagos pela empresa referentes a empréstimos diversos, a parcela correspondente às despesas com desconto de títulos, somente agora conhecida, uma vez que somente agora é que se tem conhecimento das necessidades de desconto.

A preparação da Previsão do Fluxo de Caixa vem mostrar, de antemão, os períodos financeiramente críticos para a empresa. A forma de sua montagem e as análises propostas facilitarão os estudos de outras alternativas de operações que possam ser feitas para corrigir os gargalos financeiros inicialmente previstos.

7.4. PROJEÇÃO DA EVOLUÇÃO DA POSIÇÃO PATRIMONIAL PROJEÇÃO DO BALANÇO

Os dados obtidos da Previsão do Fluxo de Caixa são, a seguir, incorporados à Previsão Financeira, tomada em seu sentido mais amplo. Esta Previsão é apresentada no quadro Projeção da Evolução da Posição Patrimonial, Fig. 5, mostrado a seguir, onde são feitas as projeções, mensais, para o balanço da empresa, já levando em conta, além dos dados acima, aqueles decorrentes do Plano de Investimentos (ver mais adiante) e dos estudos financeiros de alto nível, que tratam da estrutura do capital da empresa, da conveniência do aumento do capital, da contratação de empréstimos, da distribuição de dividendos, etc.


Figura 5

São analisados, também, os índices econômico financeiros decorrentes e propostas novas alternativas para melhoria da situação a ser atingida no futuro.

Demonstrações do balanço projetado são preparadas - com os recursos dos building bloks - especialmente para os acionistas, visando mostrar as perspectivas para seus investimentos na companhia. Estas demonstrações, que seguem os princípios contábeis geralmente aceitos, servem, ainda, de base para comparação com empresas similares.

Parte dos elementos componentes da Previsão Financeira pode ainda ser analisada por linha de produto, o que é feito principalmente quando se pretende introduzir modificações substanciais nas linhas, por exemplo: a) quanto ao equipamento, que vai alterar o imobilizado; b) quanto aos níveis de produção, que têm influência nos estoques, contas de fornecedores e compradores; c) quanto a prazos de financiamento, que interferem nas contas de compradores (duplicatas a receber), e assim por diante.

Pode-se, portanto, estabelecer, para cada linha, o capital de giro necessário para suportar o nível de produção programado, o montante imobilizado, quando houver relação entre o equipamento e a linha de produtos, os índices de retorno e rotação do capital, e mais outros, que vêm complementar as informações de natureza econômica contidas no Plano de Lucro, e que são indispensáveis ao estudo criterioso das linhas, e das alternativas de investimento possíveis.

8. Plano de investimentos

O Plano de Investimentos, que no final se incorpora à Previsão do Fluxo de Caixa e à Previsão da Posição Patrimonial, estuda as diversas necessidades e possibilidades de investimento, levando em conta:

- a economia esperada a curto e a longo prazo, em função da vida útil do projeto de investimento;

- o montante a ser investido;

- a rentabilidade esperada para cada alternativa, a curto e a longo prazo;

- o retorno do investimento;

- a influência de cada alternativa sobre aspectos imponderáveis; tais como: promoção da empresa, melhoria das condições de trabalho (racionalização), melhoria do bem-estar dos empregados, melhoria da segurança no trabalho e da empresa (acidentes, fogo, roubos, etc), cooperação com órgãos públicos, entre outros;

- possibilidade de obtenção de recursos especiais;

- outros aspectos próprios de cada caso.

A forma de apresentação é extremamente variável, razão pela qual deixamos de reproduzir aqui um modelo. Lembramos, entretanto, que a utilização das técnicas dos building blocks constitui um recurso inestimável para o estudo de alternativas similares e para elaboração de novas propostas.

9. Formalização do PGA

Ponderadas todas as alternativas possíveis, a Direção-da empresa faz suas opções e define o PGA a ser seguido, que é então divulgado, com certa formalidade, aos diversos interessados da empresa. São fornecidos a cada um os planos pormenorizados correspondentes ao setor e uma síntese dos demais pontos que possam interessar ao bom desempenho de suas funções.

Daqui para diante todos os esforços serão no sentido de cumprir o Plano estabelecido, e os controles passarão a ser feitos com base no PGA.

Se, entretanto, no decorrer do período, ocorrerem situações imprevistas, que modificam as bases em que o Plano está apoiado, a Direção da empresa deve promover, o quanto antes, as alterações do Plano em suas partes atingidas. Esses ajustes - que são facilitados graças, principalmente, às técnicas do orçamento flexível aproveitadas pela CD na elaboração do PGA e à utilização dos building blocks na sua montagem - devem também ser imediatamente divulgados aos interessados, com a ênfase necessária, para garantir o crédito ao PGA e o empenho em cumpri-lo, sem o que voltaríamos ao nosso ponto de partida, com todos aqueles inconvenientes e desperdícios de esforços de que falamos no começo.

10. Conclusões

A introdução do PGA vem, portanto, trazer nova dimensão aos conceitos da CD anteriormente expostos. Seus efeitos positivos são indiscutíveis. Teremos agora:

- as condições para um desenvolvimento planejado;

- antevisão de períodos críticos para a situação econômica e/ou financeira;

- conhecimentos que nos possibilitem investir em projetos mais lucrativos;

- coordenação de esforços, em todos os escalões da empresa, no sentido de se alcançar os mesmos objetivos básicos;

- eliminação de pontos de conflito, com melhoria da eficiência geral;

- possibilidade de aferição do desempenho de todos os setores da empresa, em função dos objetivos a serem atingidos e não mais através de comparações com situações passadas.

Em resumo, em lugar de conseguir somente uma integração de informações econômico-financeiras - como no primeiro estágio - a Contabilidade Decisorial passa a promover a integração da própria ação de conduzir a empresa rumo ao progresso desejado.

Mas o PGA ainda não está completo. É necessária toda uma sistemática para controlar o seu cumprimento. Em nosso próximo artigo, teceremos algumas considerações sobre este trabalho de acompanhamento. Mostraremos, ainda, algumas simplificações que, com a utilização dos conceitos da CD, podem ser feitas para adoção do PGA em empresas, cujo grau de desenvolvimento e organização interna, não estão ainda à altura da aplicação dos métodos e técnicas abordadas neste artigo.

Bibliografia

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PINTO DIAS, Ivan. Algumas observações sobre a Margem de Contribuição, in Revista de Administração de Empresas, Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, vol. 7, n.º 24, setembro de 1967.

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  • BEYER, Robert. Profitability Accouting for Planning and Control, Nova Iorque, The Ronald Press Company, 1963.
  • 1
    Podem ser usadas outras designações como Plano de Operações, Plano Econômico-Financeiro, etc.
  • 2
    DEAN, Joel.
    Economia de Empresas, Ed. Fundo de Cultura, R. J., Brasil, traduzido do original em inglês.
    Managerial Economics, Prentice-Hall, Inc., Englewood Cliffs, N. J., EUA.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Maio 2015
    • Data do Fascículo
      Mar 1970
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