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Avaliação da saúde financeira das empresas

NOTAS E COMENTÁRIOS

Avaliação da saúde financeira das empresas

José Pereira da Silva

Mestre em finanças pela Fundação Getúlio Vargas; administrador de empresas e contabilista; e autor do livro Administração de créditos e previsão de insolvência (São Paulo, Atlas, 1983)

1. APRESENTAÇÃO

O uso da tradicional "análise de balanço" é algo que tem-se cristalizado no decorrer do tempo, sendo uma ferramenta utilizada por investidores e emprestadores de dinheiro, bem como por outras pessoas que objetivam uma medida de avaliação da "saúde" financeira das empresas. Paralelamente, diversos estudiosos nas área de contabilidade e finanças dedicaram-se a pesquisa, observando sistematicamente o comportamento dos índices financeiros, tendo com finalidade descobrir se efetivamente esse instrumental é eficiente na predição de insolvências de empresas. Já em 1932, nos EUA, Fitz Patrick selecionou 19 empresas que haviam falido no período de 1920 a 1929 e as comparou corri 19 outras empresas bem-sucedidas, tendo confirmado a capacidade de previsão dos índices financeiros e concluído (para sua amostra) que os melhores indicadores foram patrimônio líquido sobre o passivo total e lucro líquido sobre patrimônio líquido. Posteriormente, vieram outras pesquisas, como as de Winakor e Smith, de Merwin, Tamari e Beaver, por exemplo.

Em que pese à tentativa pioneira de Tamari, de usar um "composto ponderado" de vários índices, foi o trabalho de Edward Altman1 1 Altaian, Edward I. Financial ratios, discriminant analysis and the prediction of corporation bankruptcy. Journal of Finance. 23, (4): 589-609, Sept. 1968. em 1968 que serviu como uma espécie de "marco". Altman utilizou, em sua pesquisa, o instrumental estatístico denominado análise discriminante, o que lhe possibilitou a determinação do peso relativo de cada um dos índices utilizados, sem que para isso prevalecesse seu subjetivismo. Na Argentina, Letícia Topa2 2 Topa, Letícia E. La Gestion de créditos (bancaria y mercantil). Buenos Aires, Depalma, 1979. desenvolveu seu estudo baseado no conceito de probabilidade subjetiva, defendendo a idéia de que o peso de cada fator a ser considerado na análise de crédito é responsabilidade direta e indelegável dos dirigentes máximos das áreas de crédito. Dessa forma, a experiência, a sensibilidade do homem de crédito devem determinar o peso de cada fator, que com o auxilio da estatística (análise bayesiana) permite as quantificações devidas.

No Brasil, em 1974, Stephen Charles Kanitz3 3 Kanitz, Stephen Charles. Como prever falências. São Paulo, McGraw-Hill, 1972. desenvolveu o modelo que chamou de "termômetro de insolvência". Apesar de Kanitz não ter explicitado se usou análise discriminante, em face das características de seu trabalho, tem-se a impressão de que esse instrumental foi a base de sua metodologia. Em 1979, Revista de Administração de Empresas (RAE) de janeiro/março publicou um estudo desenvolvido por Altman e alguns professores da PUC (do Rio), usando empresas brasileiras. Em 1976, Roberto Elizabetsky desenvolveu "Um modelo matemático para decisão de crédito no banco comercial", que foi seu trabalho de formatura para o curso de engenharia de produção da Escola Politécnica da USP. Em 1976, Alberto Borges Matias, ao desenvolver seu trabalho de formatura para o curso de Administração de Empresas da USP, também usou análise discriminante. Cada um desses autores, segundo consta nas respectivas pesquisas, chegou a bons resultados, o que caracteriza a eficiência do uso dos dados dos demonstrativos financeiros como instrumento de previsão de insolvência.

O nosso propósito neste artigo é a apresentação de nossa pesquisa,4 4 Essa pesquisa recebeu o nome de "Modelos para classificação de empresas com vistas à concessão de crédito" e foi nossa monografia para o curso de mestrado em administração contábil financeira pela Fundação Getúlio Vargas. Em que pese ao seu propósito inicial, de desenvolva modelos para fins de concessão de crédito, o seu resultado é uma "ferramenta" que nos permite a "avaliação da saúde financeira das empresas". de cujos modelos obtidos podemos ter uma medida da "avaliação da saúde financeira das empresas".

Nossa amostra foi composta de 419 empresas, sendo 160 insolventes e 259 boas. Direcionamos os testes considerando o setor de atividades (comércio ou indústria), bem como o Estado da Federação. Analisamos os índices significativos para os demonstrativos que antecederam as insolvências (último ano) e para o ano anterior (penúltimo). Associados a esses fatores, nosso direcionamento teórico esteve voltado para indicadores que, na medida do possível, refletissem a capacidade de crescimento das empresas e a eficiência da administração dos itens do capital de giro, numa economia com elevado índice de inflação. No item 2, apresentaremos a metodologia de nossa pesquisa; no item 3, comentaremos os aspectos relativos ao setor de atividade e à região geográfica, no 4, os modelos; e no 5, algumas considerações gerais.

2. METODOLOGIA

A análise discriminante foi a nossa principal "ferramenta" estatística. Nesse tópico abordaremos basicamente os aspectos metodológicos relativos ao instrumental estatístico e à escolha da amostra. Vejamos.

2.1 Análise discriminante

A análise discriminante é um conjunto de processos estatísticos que utilizamos para classificar um determinado elemento (E) num dos (i) grupos existentes. Daí é necessário que o elemento a ser classificado realmente pertença a um dos grupos e que sejam conhecidas as características dos elementos dos grupos existentes, de modo a possibilitar que comparemos as características do elemento a ser classificado com as dos elementos dos grupos existentes. Tais características são especificadas a partir de um conjunto de n variáveis aleatórias (x1 . . . xn). Vamos supor a existência de uma determinada empresa (Ep), a qual queremos classificar como boa ou insolvente, admitindo-se que desconheçamos a condição de solvência dessa empresa. Admitamos, para o exemplo, que os únicos parâmetros existentes sejam os índices de endividamento (exigível total dividido pelo patrimônio líquido) e rentabilidade (lucro líquido dividido pelo patrimônio líquido). Os dois grupos existentes e que servirão de referencial para classificarmos a empresa (Ep) são mostrados nas tabela 1 e 2.

Pela análise das tabelas 1 e 2, observamos que a nossa amostra de empresas boas apresenta os índices de endividamento com valores inferiores aos da amostra de empresas insolventes. Ao mesmo tempo, o índice de rentabilidade assume posição inversa, isto é, é maior nas empresas boas. Daí a nossa observação visual já permite um tipo de discriminação, isto é, de identificação das características das empresas de cada um dos grupos de nosso exemplo. Suponhamos que a empresa (Ep), que queremos classificar, apresente endividamento de 1,80 e rentabilidade de 0,30; em qual dos grupos ela será classificada? Antes e independente de qualquer cálculo, vamos representar as duas amostras das populações de empresas (boas e insolventes) numa figura do tipo cartesiano. No eixo das abscissas representamos o endividamento (x1), e no das ordenadas a rentabilidade (x2) (ver figura 1).


Pela figura 1, notamos que as empresas boas ocupam um espaço geométrico, cuja característica é de baixo endividamento e elevada rentabilidade, enquanto que as insolventes têm uma situação contrária, isto é, alto endividamento e baixa rentabilidade. A empresa (Ep) se situou na região das boas; daí seria classificada como boa, uma Vez que apresentou índices de 1,80 e 0,30 para endividamento e rentabilidade respectivamente.

Nesse exemplo, com apenas duas variáveis (endividamento e rentabilidade), fica fácil a representação gráfica e sua visualização, o que não ocorre quando trabalhamos com uma grande quantidade de variáveis. Da mesma forma, nas situações reais, num simples olhar de tabelas não nos é possível identificar as características dos grupos, sendo, portanto, necessário que sejam desenvolvidos os cálculos para obtenção de uma função linear5 5 A abordagem matemática para obtenção dos coeficientes das variáveis pode ser procurada na literatura especializada, como é o caso da dissertação apresentada ao Instituto de Matemática e Estatística da USP, pelo Prof. Abraham Laredo Sicsú, cujo título (da dissertação) recebeu o nome de "Análise discriminante". do tipo: Z = aX1 + bX2, em que a é o peso de X1 e b o peso de X2. Z é uma espécie de "nota " a ser obtida para uma determinada empresa, visando sua classificação.

O que foi apresentado são as noções elementares sobre análise discriminante, necessárias a uma melhor compreensão deste artigo. No item 4, estaremos apresentando nossos modelos, e o leitor poderá observar como os mesmos são operacionalizados.

2.2 A amostra

Fatores como porte (tamanho) da empresa, região geográfica e ramo de atividade, por exemplo, poderão interferir no desenvolvimento e na eficiência do modelo que se busca. A nossa amostra foi composta de 419 empresas, conforme a tabela 3.

Chamamos de empresas ótimas, basicamente, as 10 melhores de cada ramo de atividade, segundo a classificação da revista Exame, em sua edição de "Maiores e melhores", publicada em setembro/80. Excluímos desse grupo as empresas de prestação de serviços e as agrícolas, por terem características muito peculiares. Empresas que, mesmo estando entre as 10 melhores de seu ramo, apresentaram prejuízo também foram excluídas.

Empresas insolventes, para nossa amostra, foram aquelas envolvidas em processos de concordata (requerida e/ou deferida) e/ou de falência (requerida e/ou decretada).

Classificamos como regulares diversas empresas que não tenham processos de concordata e/ou de falência, ao mesmo tempo em que não eram tão saudáveis quanto as ótimas.

Nas três condições (ótimas, regulares e insolventes), trabalhamos apenas com as empresas para as quais dispúnhamos dos demonstrativos contábeis de pelo menos três exercícios sociais.

Posteriormente, nossos, testes mostraram melhores resultados a partir da união das "ótimas" com as "regulares" num único grupo, que recebeu o nome de "boas". A partir daí, trabalhamos com "boas" e "insolventes".

Procuramos evitar empresas muito pequenas, cujos demonstrativos contábeis não nos inspirasse confiança.

Escolhida a amostra e definido que utilizaríamos o ferramental estatístico de análise discriminante, optamos pelo uso do "pacote" estatístico SAS.6 6 Statistical Analysis Sistem" (SAS) é tido atualmente como um dos "pacotes" estatísticos mais evoluídos. Esse sistema foi desenvolvido pelo Instituto da Carolina do Norte, EUA. Em nossa pesquisa, processamos o SAS em computador IBM 4341 MG1, de 4 Mega Bytes de memória.

3. REGIÃO GEOGRÁFICA E O SETOR DE ATIVIDADE

Durante todos os testes que desenvolvemos, à medida que separamos a amostra pelo setor de atividade das empresas (comércio ou indústria), bem como pela região geográfica (São Paulo ou outros estados), os resultados foram melhores.

3.1 Testes entre indústria e comércio

Observa-se, na tabela 4, que o teste IC (modelo desenvolvido com um conjunto de empresas industriais e aplicado em caráter de teste para 58 empresas comerciais) foi eficiente para as empresas boas, enquanto que para as insolventes o percentual de acerto foi de apenas 55,56%; daí o maior risco de classificarmos uma empresa insolvente como boa.

Para o teste Cl (modelo desenvolvido com um conjunto de empresas comerciais e aplicado em caráter de teste para 255 empresas industriais) observa-se que nos grupos das empresas "boas" a margem de acerto foi de apenas 69,59%, enquanto que para as insolventes foi de 81,97%; neste caso, o risco maior seria de classificarmos uma empresa boa como insolvente.

Por outro lado, o teste II (modelo desenvolvido com um conjunto de empresas industriais aplicado para outro grupo também de empresas industriais) apresentou resultados superiores aos obtidos em IC e CI. Essa separação das amostras de empresas industriais, em dois grupos, permite um teste mais severo para o modelo, pois a constatação de sua validade não embute eventuais vícios da amostra. Observa-se que o teste II superou IC e CI.

Cabe acrescentar que nos três testes (IC, CI e II) foram utilizadas empresas do estado de São Paulo e dados dos demonstrativos contábeis que antecederam à insolvência, para as empresas "insolventes"; para as empresas "boas", utilizamos os demonstrativos contábeis do último exercício disponível, que em sua grande maioria coincide com o exercício dos insolventes.

3.2 Testes entre São Paulo e outros estados

Pela análise da tabela 5, observamos que a aplicação do modelo desenvolvido com empresas industriais de São Paulo, para um grupo de empresas industriais de outros estados, apresentou um índice de 80,49% de acerto,quando o teste II, comentado no subitem 3.1, chegou a 89,61%. Diversos outros testes foram efetuados, e em todos eles a separação por setor e por estado comprovou maior índice de acertos.

4. OS MODELOS

Conforme expusemos no item 3, a separação por região (estado) e por setor (indústria e comércio) fez parte de nossa metodologia de trabalho. Daí apresentarmos modelos para empresas industriais e pára empresas comerciais, separadamente. Em ambos os casos, são modelos desenvolvidos com empresas do estado de São Paulo. Em que pese aos modelos desenvolvidos com empresas do estado de São Paulo serem aplicáveis para outros estados, em ocorrendo tal uso, eleva-se o risco de erro conforme abordamos no item 3.

4.1 Apresentação dos modelos

Vejamos, a seguir, dois de nossos modelos, isto é, os modelos de seis variáveis aplicáveis para empresas industriais, que são Z1i, que foi desenvolvido com dados do último exercício e que será aplicado com o propósito de nos fornecer uma classificação para p exercício subseqüente à data do último balanço; e Z2i, que foi desenvolvido com dados do penúltimo e que será utilizado para classificar empresas para até os dois próximos exercícios subseqüentes à data do último balanço.

No item 4.3, abordaremos como utilizar conjunta mente Z1i e Z2i.

Para empresas comerciais, os modelos Z1c e Z2c aplicáveis para classificar empresas para o "próximo exercício" e para os "dois próximos exercícios", em relação à data do último balanço, também são constituído por índices diferentes entre si. Por uma questão de limitação de espaço não os apresentamos.

A nossa experiência com a aplicação desses modelos no atual contexto, tem sido altamente satisfatória.

4.2 Ponto de separação

Para os quatro modelos, o ponto de separação é zero isto é, calculando os índices de uma determinada empresa e substituindo-os na respectiva função (modelo), se o resultado obtido for maior que zero a empresa será classificada como "boa"; se for menor, será classificada como "insolvente". Existem processos para transformação da nota, obtida pela aplicação do modelo, em probabilidade de a empresa ser classificada como "boa" ou como "insolvente". Em todos os nossos testes, em que trabalhamos com o ponto de separação em zero, os resultados obtidos foram altamente satisfatórios. Usar apenas o ponto de separação em zero, sem uma região de dúvida, é como se definíssemos que para uma probabilidade maior que 50% para uma empresa ser classificada como sendo de um determinado grupo, assume-se a classificação nesse grupo. A região de dúvida consiste numa faixa em que a empresa não seria classificada nem como boa nem como insolvente, isto é, seria uma faixa próxima de zero; e que equivale a dizer, por exemplo, que uma empresa que tenha apresentado uma baixa probabilidade (por exemplo, 52%) dè ser boa poderia ser insolvente. Seria uma área de superposição, onde poderíamos encontrar tanto empresas boas quanto empresas insolventes, que no caso de nossos modelos se situa entre -1,3 e 1,3.

4.3 "Próximo" e "dois próximos" exercícios

Tanto para empresas industriais quanto para empresas comerciais, apresentamos modelos para o "próximo" e para os "dois próximos" exercícios. Qual deles devemos usar? Os testes demonstraram que os modelos para o "próximo" exercício foram mais eficientes. De qualquer forma, o que se pretende é que detectemos a possibilidade de insolvência antes de sua ocorrência, e, nesse caso não se sabe se determinada empresa vai ter problemas de liquidez no prazo de um, dois ou três anos.

Se se pretende, por exemplo, usar tais modelos para fins de concessão de crédito, uma sugestão que fazemos é que sejam aplicados simultaneamente os dois modelos. Nesse caso, se uma determinada empresa for classificada como "boa" tanto para o "próximo" quanto para os "dois próximos" exercícios, assumimos que seja "boa"; se em ambos os casos, for Classificada como "insolvente", assumimos a possibilidade de insolvência; quando num dqs modelos for "boa" e no outro for "insolvente", podemos classificá-la como duvidosa e, em havendo interesse, desenvolve-se análise complementar.

Os testes, com os modelos apresentados no subirem 4.1, para empresas industriais, bem como os modelos (não apresentados neste artigo) para empresas comerciais, com uso simultâneo dos dois modelos, apresentaram os resultados mostrados na tabela 8.

Pela análise das tabelas 8 e 9, observa-se que o uso conjunto dos dois modelos tende a minimizar os erros de de classificação. A conveniência do uso conjunto dos dois modelos requer uma adequada análise, pois é preciso que se tenha parâmetros para medir a relação risco/retorno; em determinadas situações, pode ser conveniente a uma empresa assumir um risco maior, em face de um maior retomo esperado. Outros fatores - por exemplo, o lançamento de um novo produto poderá fazer com que a empresa para penetrar no mercado assuma maior risco de crédito; linhas de produtos que apresentem margens de lucro elevadas - podem permitir também maior nível de risco. Daí, os modelos estão sendo apresentados, porém a forma de uso requer as análises necessárias.

4.4 Validade dos modelos

De um total de 85 índices financeiros, classificados em três categorias (liquidez, estrutura e rentabilidade), o conjunto dos 31 índices de rentabilidade foi o que apresentou maior eficiência, mostrando que, ao contrário do que pensam alguns autores, a liquidez não é o parâmetro mais significativo. Evidentemente, estamos assumindo a liquidez como decorrência do desempenho da empresa e/ou de outras decisões financeiras, ao invés de encará-la como causa.

Na tabela 10 apresentamos um resumo dos principais testes que desenvolvemos. Observa-se que os modelos Z1i, Z2i, Z1c e Z2c são os mais singelos (seis variáveis), porém seus níveis de acertos se mantêm elevados.

Diversos outros testes foram realizados, inclusive a comparação dos modelos Z1i, Z2i, Z1c e Z2c com trabalhos de outros autores brasileiros. Para uma amostra de 194 empresas "boas" e 61 empresas "insolventes", todas industriais no estado de São Paulo, procedemos à divisão apresentada na tabela 11.

Com os dados e a metodologia da tabela 11, procedemos ao teste do nosso modelo Z1i e obtivemos acerto de 89,61%. Dos outros quatro modelos (de outros autores) que testamos com a mesma amostra e com a mesma metodologia, os percentuais de acerto foram 81,82%, 76,62%, 72,73% e 71,43%. Considerando que passe s modelos (dos outros autores) recalculamos os coeficientes dos respectivos índices,.como uma tentativa de atualizá-los, a maior eficiência apresentada pelos nossos modelos está nos índices financeiros (que diferem daqueles tradicionalmente utilizados) e na adequação desses índices para a atual realidade econômica.

5. CONSIDERAÇÕES GERAIS

Os resultados dos testes confirmam a validade de abordagem quantitativa dos modelos apresentados. É necessário, entretanto, que ão utilizarmos um determinado instrumental tenhamos os devidos cuidados, pois sempre existem vantagens e limitações. É importante deixar claro que esses modelos, mesmo tendo apresentado elevado grau de acerto na classificação de empresas (como "boas" ou como "insolventes"), não pretendem substituir outros critérios de análises, porém devem ser utilizados como um instrumental complementar de alta validade. Vejamos a seguir.

5.1 Vantagens

As vantagens podem ser muitas, como por exemplo:

1. A constatação de margens elevadas de acerto transmite segurança ao usuário do modelo. No caso do modelo de 31 variáveis (conjunto dos índices de rentabilidade), aplicado para um conjunto de empresas comerciais do estado de São Paulo, o acerto foi de 96,55%. Mesmo o modelo mais simples Z1c, também para empresas comerciais, chegou a 91,38% (ver tabela 10).

2. A seleção dos índices, bem como a atribuição de seus pesos por processos estatísticos, elimina o subjetivismo de nós analistas e mostra quais são os índices que, em média, são os mais significativos como medida do desempenho das empresas. Isso permite que o feeling, a sensibilidade do analista seja canalizada para outras variáveis exógenas do modelo.

3. Uma vez adotado um modelo básico para classificação de empresas, o processo de concessão de crédito se torna mais ágil, podendo-se obter, por exemplo, três categorias básicas de empresas: boas para operações de crédito; não-operáveis ou operáveis apenas com base em garantias; duvidosas, para as quais há necessidade de análise complementar. Dessa forma, o tempo do analista e/ou do gestor de crédito poderá ser utilizado em outras atribuições creditícias.

4. Outras vantagens poderão ser relacionadas, como, por exemplo, a obtenção de um padrão para classificação das empresas pleiteantes de crédito, bem como o aumento da capacidade (quantidade) das análises a serem elaboradas.

5.2 Limitações

Da mesma forma como há vantagens, temos algumas limitações. Vejamos:

1. O tempo (a época) é a principal das limitações. À medida que transcorre o tempo, tanto as variáveis (índices) quanto seus coeficientes sofrem alterações. Determinados índices que são eficientes hoje poderão não ser daqui a oito anos, por exemplo. Os fatores políticos e macroeconômicos poderão interferir nos parâmetros de avaliação da saúde financeira das empresas.

2. Os modelos precisam ser entendidos e usados com o devido cuidado. Supondo que o percentual de acerto na seleção de empresas seja de 95%, os 5% de erro, dependendo do tipo de atividade da empresa que concede cré: dito, poderá lhe trazer terríveis conseqüências.

3. A adoção de apenas um modelo poderá possibilitar a alguém que o conheça a oportunidade de adulterar os dados dos demonstrativos contábeis de uma determinada empresa prestes à insolvência, com a finalidade de obter crédito. Isso enfatiza que os modelos não devem suprimir o julgamento do analista.

4. A utilização inadequada dos modelos, principalmente por pessoas não conhecedoras de análises, poderá levar a resultados não desejáveis, pois é necessário, por exemplo, uniformidade nos critérios de padronização dos demonstrativos contábeis.

5. Os aspectos de região geográfica, bem como ramos de atividade com características especiais, podem exigir modelos próprios, o que requer amostras de empresas que possibilitem o desenvolvimento de tais modelos.

6. Uma vez que os modelos são desenvolvidos ex-post, ao serem aplicados em períodos seguintes (para outros grupos de empresas) poderão perder sua eficácia; o fator tempo (época) tem o seu peso. Daí, é necessário que os modelos sejam realimentados e recalculados periodicamente para que se mantenham atualizados ao longo do tempo.

A nossa pretensão nesse artigo foi a de mostrar o grau de validade do uso dos demonstrativos contábeis (a partir de evidências empíricas), para fins de análise. Por se tratar de um artigo, evidentemente, tivemos de resumir o assunto. O detalhamento relativo à pesquisa consta na dissertação de mestrado citada na apresentação deste artigo, ou no livro Administração de crédito e previsão de insolvência,7 7 Silva, José Pereira da. Administração de crédito e previsão de insolvência. São Paulo, Atlas, 1983. e que contém as adequações de ordem prática, como exemplos de uso dos modelos e outras orientações sobre política de crédito, risco de crédito e decisão de crédito, necessários à operacionalização dos modelos.

Finalizando, podemos ressaltar que entre as diversas constatações importantes estão:

1. Importância da região geográfica.

2. Importância do ramo de atividade.

3. O fato de que as variáveis, que são mais eficientes, para detectar a insolvência dois anos antes não são as mesmas para um ano antes de tal ocorrência.

4. Os índices financeiros desenvolvidos com um enfoque de medir os giros nos principais itens do capital circulante, bem como a forma como a empresa cresceu e como financiou seu crescimento, foram importantes para os modelos.

5. Os resultados dos testes, bem como as vantagens e limitações dos modelos, foram citados no artigo, cabendo enfatizar que, para uma empresa que apresenta tendência a ser insolvente, se forem tomadas medidas corretivas em tempo hábil, a ocorrência poderá ser evitada.

  • 1 Altaian, Edward I. Financial ratios, discriminant analysis and the prediction of corporation bankruptcy. Journal of Finance. 23, (4): 589-609, Sept. 1968.
  • 2 Topa, Letícia E. La Gestion de créditos (bancaria y mercantil). Buenos Aires, Depalma, 1979.
  • 3 Kanitz, Stephen Charles. Como prever falências. São Paulo, McGraw-Hill, 1972.
  • 7 Silva, José Pereira da. Administração de crédito e previsão de insolvência. São Paulo, Atlas, 1983.
  • 1
    Altaian, Edward I. Financial ratios, discriminant analysis and the prediction of corporation bankruptcy.
    Journal of Finance. 23, (4): 589-609, Sept. 1968.
  • 2
    Topa, Letícia E.
    La Gestion de créditos (bancaria y mercantil). Buenos Aires, Depalma, 1979.
  • 3
    Kanitz, Stephen Charles.
    Como prever falências. São Paulo, McGraw-Hill, 1972.
  • 4
    Essa pesquisa recebeu o nome de "Modelos para classificação de empresas com vistas à concessão de crédito" e foi nossa monografia para o curso de mestrado em administração contábil financeira pela Fundação Getúlio Vargas. Em que pese ao seu propósito inicial, de desenvolva modelos para fins de concessão de crédito, o seu resultado é uma "ferramenta" que nos permite a "avaliação da saúde financeira das empresas".
  • 5
    A abordagem matemática para obtenção dos coeficientes das variáveis pode ser procurada na literatura especializada, como
    é o caso da dissertação apresentada ao Instituto de Matemática e Estatística da USP, pelo Prof. Abraham Laredo Sicsú, cujo título (da dissertação) recebeu o nome de "Análise discriminante".
  • 6
    Statistical Analysis Sistem" (SAS) é tido atualmente como um dos "pacotes" estatísticos mais evoluídos. Esse sistema foi desenvolvido pelo Instituto da Carolina do Norte, EUA. Em nossa pesquisa, processamos o SAS em computador IBM 4341 MG1, de 4 Mega Bytes de memória.
  • 7
    Silva, José Pereira da.
    Administração de crédito e previsão de insolvência. São Paulo, Atlas, 1983.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 1983
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