Acessibilidade / Reportar erro

Efetividade organizacional através do sistema recursos humanos

ARTIGO

Efetividade organizacional através do sistema recursos humanos

Paulo Roberto Nogueira

Diretor da Empresa de Consultoria Organizacional (EMCO/DF); consultor de pesquisas do Banco Central do Brasil

1. INTRODUÇÃO

O conceito de administração na empresa moderna está sofrendo crescente impacto, motivado pela revolução tecnológica, pela mudança de produtos, pela institucionalização da pesquisa básica, pela explosão da informação, entre outros fatores, exigindo contínuos e desdobrados esforços da organização no processo adaptacionista.

Para garantir o acompanhamento do inegável dinamismo do processo desenvolvimentista, a empresa moderna deve estar orientada não só no sentido de dispor, mas também de aprimorar e utilizar ao máximo a potencialidade de seus recursos-humanos. Por conseguinte, a sistematização do planejamento e implementação de ações nas várias funções da área de recursos humanos (recrutamento e seleção, treinamento, avaliação de desempenho, análise funcional, etc.) é realmente elemento básico no aumento da eficácia e da efetividade organizacional, por meio do desenvolvimento de pessoas nas funções e papéis que lhes cabe desempenhar.

Desse modo, é grande a colaboração que as ciências comportamentais podem oferecer aos administradores, sobretudo a psicologia.

Com esse objetivo, desenvolveu-se o presente trabalho que teve seu ponto de partida em dados obtidos através de visitas em mais de 40 organizações sediadas em Brasília (DF), incluindo-se empresas particulares e instituições da administração federal, como ministérios, autarquias, sociedades de economia mista e empresas públicas. Além disso, incluíram-se também atividades que, embora não tenham sido observadas nesse levantamento, são atribuições para as quais o psicólogo pode colaborar, devendo, portanto, serem aqui mencionadas. De outra feita, não são mencionadas aquelas atividades próprias do estudo e entendimento do comportamento consumidor, do relacionamento intra-organizações e do relacionamento da organização com sua cÜentela, as quais deverão ser objeto de apreciação em um outro artigo.

Para ilustrar o contexto em que se inserem as atividades próprias de cada área, tecem-se breves considerações a respeito de cada uma delas.

2. ANÁLISE FUNCIONAL

A partir da crise econômica do pós-guerra, tornou-se necessário um conhecimento mais aprofundado sobre algumas funções nas áreas da indústria e do comércio. Dessa forma, foram-se desenvolvendo métodos e técnicas de análise funcional, desde aqueles que se voltam para os aspectos isolados da atividade profissional, relacionados com a análise e estudo dos tempos e movimentos, até os estudos ergonômicos, que objetivam pesquisar a interação homem-ambiente, visando melhor adaptar o trabalho às características humanas.

Com a descoberta de novos métodos e técnicas surgiram práticos e eficazes instrumentos e procedimentos de obtenção e apresentação de informações sobre as ati:vidades laboriais do homem.

Em consequência, a sistemática de determinação dos requisitos e condições do trabalho passou a receber denominações diferentes na literatura especializada. Assim é que nomes como análise ocupacional, análise do posto de trabalho, análise profissiográfica, análise de ocupações, análise de função, análise de cargos, entre outros, têm sido largamente utilizados, normalmente como sinônimos. A denominação do processo, pois, denota não somente uma preferência de cada autor em função da metodologia proposta, mas também decorre de uma certa confusão entre os termos função, posto, cargo ou ocupação, cujos significados variam de organização para organização.

Aguirre & Noriega (1971), por exemplo, optam pelo nome análise de operações, dizendo que o processo consiste basicamente em determinar o conteúdo do trabalho, por meio de uma relação de atividades de um posto que é identificado com o departamento ou seção, a especialidade e a categoria dos empregados que desempenha. Por sua vez, Dunnette (1974) emprega o termo análise de cargo, afirmando que o processo consiste em definir o cargo e descobrir o que ele exige do empregado em matéria de comportamento. Legere (1978) utiliza a expressão análise ocupacional, enfatizando ser um sistema de procedimentos usados para verificar a exisfência de tarefas específicas em um campo ocupacional.

Embora hoje muitos métodos e técnicas já tenham sido desenvolvidos, e se encontrem disponíveis, um dos principais problemas com que se defrontam sobretudo os programas de recrutamento e seleção, desenvolvimento, treinamento e avaliação de desempenho, é o desconhecimento ou falta de determinação específica das características exigidas pelas funções ou cargos desempenhados nos tipos de organização.

Nesse sentido, a análise funcional destaca-se como instrumento importante na solução desses problemas, visto que o resultado obtido através desse processo servirá à organização como elemento informativo e de referência para sua política de pessoal, através da execução das atividades de planejamento, administração e desenvolvimento dos recursos humanos, como administração de cargos e salários, recrutamento e seleção, avaliação de desempenho, sistema de prevenção de acidentes, orientação profissional e treinamento e aperfeiçoamento de pessoal.

O processo de análise funcional tem por objetivo reunir e fornecer informações sobre os vários fatores considerados determinantes no desempenho das atividades próprias de um cargo ou função. Desse modo, através de uma sistemática de análise funcional, descrevem-se e hierarquizam-se as tarefas e procedimentos do trabalhador, identificam-se as condições necessárias ao desempenho profissional, indicam-se equipamentos e materiais exigidos e delineia-se o perfil psicofísico adequado ao eficaz exercício da função.

Nesse sentido, o profissional psicólogo pode colaborar, desenvolvendo, dentre outras, as seguintes atividades:

• identificar e examinar os fatores psicofísicos e psicológicos necessários ao desempenho da função;

• elaborar instrumentos para coleta de dados;

• analisar as aptidões, habilidades e conhecimentos requeridos para o bom desempenho do trabalho;

• estabelecer perfil profissiográfico;

• detectar níveis e dimensões da função, descrevendo seus componentes e elementos.

3. RECRUTAMENTO E SELEÇÃO

O dinamismo do ambiente onde estão as organizações se torna, sem dúvida, mais complexo a cada dia.

O sucesso e a sobrevivência das organizações requerem que elas promovam, obtenham e transformem novas idéias em soluções, para encontrar saída para a multiplicidade de problemas sociais com que se defrontam.

Certamente, esse fenômeno decorre das freqüentes e rápidas mudanças que diretamente afetam a vida das empresas (mudanças de tecnologia, de hábitos e valores sociais, de mercado e clientela, de métodos de trabalho, de diretrizes políticas, etc), tornando cada vez mais difícil sua sobrevivência e impedindo a que elas se desenvolvam e se tomem cada vez mais eficazes no oferecimento de seus bens, produtos e serviços.

Esse "desenvolvimento" de que necessitam as organizações está, efetiva e diretamente, dependente da qualidade e adequação dos recursos humanos de que dispõem ou venham a dispor. Em outras palavras, para que cresça e inove, uma organização deve contar com um qualificado e integrado quadro de pessoal, visto que a especialização e a competência de mão-de-obra adequada têm sido uma exigência do moderno mundo do trabalho.

Por conseguinte, organização alguma, hoje, pode se dar ao luxo de admitir ou incorporar mão-de-obra desqualificada ou pouco adequada às suas reais necessidades. Ao contrário, as organizações modernas, conscientes de que os seus funcionários são os mais importantes recursos que possuem, ressaltam em sua política de pessoal a importância da formação de quadros de pessoal qualificado e devidamente integrado aos seus objetivos e finalidades.

Assim, as práticas tradicionais de aquisição de mãode-obra estão dando lugar a sofisticados sistemas de captação de recursos humanos, sustentados por métodos e técnicas cientificamente estabelecidos, altamente específicos e continuamente atualizados.

Agora mais acentuadamente as empresas se apercebem de que a incorporação de recursos pouco especializados e inadequados é enormemente prejudicial ao seu sucesso, não apenas do ponto de vista financeiro, mas sobretudo como elemento fortemente propulsor do enegrecimento de sua imagem junto à comunidade a que pertence.

Despontam, pois, os processos de recrutamento e seleção como instrumentos relevantes e centrais na eficácia organizacional, garantindo não somente a sobrevivência da instituição, mas principalmente permitindo que ela atinja continuamente seus objetivos e desempenhe com êxito seu papel na sociedade moderna.

De modo geral, o processo seletivo compreende quatro grandes etapas que são interdependentes, conforme é ilustrado na figura 1.


Dentro desse enfoque os psicólogos podem colaborar para o aumento da eficácia das organizações desenvolvendo atividades basicamente nas etapas de recrutamento e de seleção, a saber:

a) Na etapa de recrutamento:

• realizar pesquisa de mercado (disponibilidade de mãode-obra, fontes de recrutamento, sondagens, etc);

• elaborar avisos, editais, manuais de inscrição e outros formulários necessários, como ficha de inscrição, ficha de cadastro de pessoal inscrito, etc;

• examinar fontes de recrutamento;

• elaborar regulamento e normas de procedimentos;

• identificar tipo de veículo a ser usado no recrutamento;

• determinar técnicas, instrumentos e procedimentos a serem utilizados no recrutamento;

• auxiliar nas pesquisas salariais.

b) Na etapa de seleção:

• determinar exigências mínimas para preenchimento de cargos;

• determinar o planejamento do processo seletivo;

• construir testes de aptidões, de personalidade e de nível mental, questionários, inventários de interesse, escalas de classificação e outros instrumentos;

• aplicar, interpretar e analisar testes e outros instrumentos;

• conduzir entrevistas para coleta de dados, avaliação individual, etc;

• elaborar laudos psicológicos;

• estabelecer a precisão e validade dos instrumentos a serem utilizados;

• analisar currículos;

• constituir banco de questões.

4. AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO

Um importante aspecto do relacionamento entre a organização e o empregado é a sua avaliação de desempenho. A avaliação de desempenho sempre existiu e ela é inevitável, pois os chefes sempre estão julgando o desempenho dos subordinados. Entretanto, tais julgamentos, como sabemos, são, na maioria das vezes, afetados por tendenciosidades cognitivas e emocionais da pessoa que avalia. Assim, no intuito de reduzir os erros que freqüentemente ocorrem nas avaliações, os psicólogos são solicitados a construir sistemas de avaliação que possam garantir a obtenção de dados mais acurados sobre o desempenho dos indivíduos no trabalho.

O resultado da avaliação de desempenho é normalmente utilizado para múltiplas finalidades, porquanto quando o sistema é bem sucedido, oferece base sólida para decisões relativas principalmente a promoções, transferências, identificação de necessidades de treinamento, revalidação de procedimentos de recrutamento e seleção, entre outras. A despeito dos vários usos da avaliação de desempenho, enfatizamos que sua finalidade primordial deve ser educativa, pois deve visar essencialmente o aperfeiçoamento profissional do avaliando, embora saibamos que, infelizmente, essa prática é pouco adotada no Brasil.

Basicamente, há três abordagens formais que podem ser seguidas para se avaliar o desempenho dos indivíduos no trabalho. Quase todas produzem um conceito numérico que expressa a qualidade do desempenho do avaliando.

A primeira abordagem, que podemos denominar comparação, envolve três métodos: classificação, sistema de comparação binária e escolha forçada. O método de classificação envolve procedimentos através dos quais o avaliador escolhe um dos seus subordinados, que ele considera como o melhor, depois aquele que vem imediatamente a seguir, e assim por diante. O segundo método, denominado sistema de comparação binária, comumente envolve a avaliação dos empregados numa única característica geral. Finalmente, o terceiro método onde o avaliador deve distribuir os avaliandos dentro de um certo número de categorias conforme uma distribuição percentual previamente definida.

A segunda abordagem envolve o uso de escalas de avaliação onde o desempenho do indivíduo é avaliado em suas múltiplas dimensões. No uso destas escalas o avaliador é solicitado a indicar o grau no- qual o avaliando se situa em cada dimensão. O conteúdo das dimensões a serem avaliadas pode variar desde traços de personalidade do avaliando (escala de avaliação de traços) até comportamentos observáveis (escalas de avaliação de comportamentos). Além disso, os vários pontos da escala poderão ou não estar apoiados em descrições que representem aquele ponto.

Finalmente, há uma terceira abordagem, denominada de listas de verificação, que são baseadas sobretudo na técnica de Incidentes Críticos de Flanagan (1954). Esta abordagem consiste basicamente de listas de descrições de comportamentos relacionados ao desempenho efetivo e inefetivo ocorridos e observados em situações de trabalho.

O avaliador indica aqueles comportamentos incidentes que o avaliando apresenta ou esperaria que ele apresentasse.

A avaliação de desempenho é sempre um estudo de natureza, psicométrica, cujas técnicas são de domínio do psicólogo, devendo este profissional, pois, participar das seguintes atividades que normalmente envolvem o processo de avaliação:

• pesquisar as dimensões relacionadas com o desempenho no trabalho;

• contribuir para a definição de nível e critérios;

• elaborar formatos de avaliação de desempenho;

• treinar os avaliadores, prevendo-lhes os possíveis erros de avaliação;

• promover estudos e pesquisas visando o aperfeiçoamento de sistemas e formatos de avaliação;

• verificar a precisão e validade dos instrumentos utilizados na avaliação de desempenho no trabalho;

• acompanhar o processo de feedback da avaliação, orientando os avaliadores na condução de entrevistas com os avaliandos, a fim de garantir o alcance do objetivo principal da avaliação que é o aperfeiçoamento profissional do avaliando.

5. TREINAMENTO

Para nosso propósito, treinamento pode ser definido como o sistema utilizado para desenvolver ou modificar as habilidades, conhecimentos e atitudes dos empregados, para que se tornem mais efetivos e produtivos em seu trabalho.

Fala-se, hoje, de várias modalidades de treinamento, com metodologias e objetivos diferentes. Assim, muitas organizações públicas ou privadas brasileiras fazem constar de seus programas anuais de treinamento desde o mais simples até o mais sofisticado curso. Treinamento técnico, administrativo, desenvolvimento gerencial, formação de consultores, especialização, aperfeiçoamento, por exemplo, são alguns dos títulos que observamos em suas programações.

Com o estabelecimento da Lei n.º 6.297 - que dispõe sobre a dedução do lucro tributável, para fins de imposto sobre a renda das pessoas jurídicas, do dobro das despesas realizadas em projetos de formação profissional - cresceu sensivelmente o número de cursos e pessoas treinadas nas empresas, sobretudo nas instituições privadas, que são diretamente beneficiadas pelo citado dispositivo. Para se ter uma idéia, em fins de 1979, o Conselho Federal de Mão-de-Obra já havia credenciado aproximadamente 650 instituições de preparação de recursos humanos, incluindo-se as empresas que têm por objetivo a prestação de serviços a outras empresas.

Basicamente, o treinamento compreende quatro etapas: determinação das necessidades, planejamento ou programação, desenvolvimento do curso e avaliação. O cumprimento dessas etapas varia de empresa para empresa, em métodos, técnicas e procedimentos, de acordo com sua política de pessoal, disponibilidade financeira, quadro de pessoal, objetivos, especialidade, etc. Entretanto, o êxito do treinamento dependerá intimamente da perfeita execução de cada uma dessas etapas. Na realidade, contudo, poucas empresas que promovem treinamento ao seu pessoal observam rigorosamente os procedimentos técnicos recomendados. Por exemplo, a determinação das reais necessidades de treinamento têm sido feita por poucas empresas brasileiras, enquanto algumas organizações que a executam o fazem inadequadamente. Assim, também nas demais etapas, muitos programas deixam a desejar, como é o caso da avaliação do treinamento.

Como profissional do comportamento humano, o psicólogo deve compor a equipe técnica do departamento de treinamento, podendo participar ativamente em quaisquer das seguintes atividades:

• orientar a elaboração de planos globais de treinamento, adequando-os às reais necessidades da organização;

• proceder à determinação das necessidades de treinamento, adotando método, técnicas e procedimentos apropriados e elaborando instrumentos de coleta de dados;

• identificar os fatores ou aspectos a serem desenvolvidos ou aperfeiçoados (conhecimentos, habilidades e atitudes);

• avaliar os métodos, técnicas e processos utilizados no treinamento, determinando a sua validade;

• ministrar aulas ou conduzir cursos, visando o desenvolvimento da competência interpessoal dos treinandos, como análise transacional, dinâmica de grupo, sensitivity training, relações humanas, etc;

• promover assistência psicopedagógica aos treinandos e/ou supervisores de cursos;

• proceder à avaliação da eficácia do treinamento;

• elaborar testes para verificação da aprendizagem;

• colaborar no estabelecimento de métodos e técnicas a serem utilizados no treinamento, bem como orientar a utilização dos recursos didáticos e pedagógicos (multimeios, audiovisuais);

• desenvolver nos treinandos habilidades no processo de aprendizagem, utilizando técnicas de memorização, de estudos, relaxamento, etc.

6. ERGONOMIA E ACIDENTE DE TRABALHO

Classificamos Acidentes do Trabalho e Ergonomia dentro de um único campo em virtude da estreita relação entre ambas as áreas de aplicação, embora sabendo que conceitualmente sejam distintos.

A Sociedade de Pesquisa Ergonômica de Oxford define a ergonomia como o "estudo entre o homem e sua ocupação, equipamento e meio-ambiente e, principalmente, a aplicação do conhecimento anatômico, fisiológico e psicológico para os problemas que surgem daí" (Chackel, 1975). Esta definição supõe explicitamente que a tecnologia ergonômica exige atuação de uma equipe multidisciplinar da qual devem participar pelo menos médico, psicólogo e engenheiro industrial. Destaca-se também que o foco direto da pesquisa ergonômica dirige-se para o homem trabalhador nas suas dimensões anatômicas, fisiológicas e psicológicas para, a partir daí, planejar o seu ambiente de trabalho de modo compatível com as propriedades humanas.

Na prática, a ergonomia volta-se basicamente para os seguintes objetivos:

a) assegurar a utilização adequada das capacidades humanas;

b) contribuir para a identificação do estabelecimento de condições aceitáveis de trabalho, tanto no aspecto psicológico quanto físico;

c) contribuir para a criação de condições de segurança no trabalho.

Por conseguinte, no campo da ergonomia o psicólogo pode prestar uma contribuição decisiva para uma intervenção bem sucedida. Aspectos psicológicos, como comunicação humana, aprendizagem, percepção, memória, tomada de decisão, motivação e atitudes no trabalho, são alguns dos fatores que devem ser considerados no planejamento de qualquer ambiente de trabalho, incluindo máquinas, ferramentas, utensílios, artefatos, etc.

Por sua vez, a tecnologia do acidente do trabalho, denominada infortunística por alguns autores, envolve uma conceituação um tanto diferente, como referência ao tempo, ao espaço e às mais diversas circunstâncias inerentes no trabalho humano. O Regulamento do Seguro de Acidente do Trabalho (Lei n.º 6.367) conceitua-o como o "acidente que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho".

No Brasil, os dados estatísticos sobre acidente de trabalho são alarmantes, preocupando Governo, empresas, dirigentes e técnicos. Para se ter uma idéia, em 1977,* * N. do A. Dados obtidos junto à Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho - MTb. perdemos mais de 250 milhões de horas de trabalho, como conseqüência do número de acidentes registrados - 1.614.750 - numa média de 5.294 acidentes por dia útil de trabalho. Cerca de 4.500 trabalhadores perderam suas vidas em acidentes de trabalho, estabelecendo-se uma média assustadora de 12 mortes por dia.

Além das perdas da economia brasileira, que se elevaram a quase 32 bilhões de cruzeiros em custos diretos e indiretos naquele ano, deve-se pensar nas trágicas conseqüências decorrentes do acidente, seja no plano social, seja a nível familiar.

Se consideramos que apenas dois por cento dos acidentes têm sua origem em causas imprevisíveis (Mello et alii, 1969), parece razoável concluir que o trabalho do psicólogo deva ser também inserido nesse contexto de prevenção. Nessas condições, elencamos algumas atividades que este profissional pode oferecer, seja na área do planejamento ergonômico, seja na de prevenção de acidentes:

• participar de campanhas de prevenção de acidentes;

• compor equipe técnica responsável pela elaboração de projetos de equipamentos e material e do trabalho;

• participar como membro da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa), instituída por lei;

• examinar os aspectos e fatores psicológicos relacionados com as causas de acidentes;

• estudar as condições físicas do trabalho (iluminação, ruídos, espaço físico, temperatura, umidade, etc), determinando seu efeito no desempenho humano no trabalho;

• estudar a natureza do erro humano, determinando com a sua incidência;

• proceder ao estudo de outras variáveis, como hora de trabalho, intervalos de descanso, fadiga física e mental.

7. ORIENTAÇÃO NO TRABALHO

O desenvolvimento tecnológico e social tem alterado o modo de vida do homem moderno, criando nele novas necessidades a serem atendidas, e é através do exercício profissional e nas relações de trabalho que efetivamente dispõe o homem de maiores oportunidades para atender às suas necessidades, principalmente quanto aos seus motivos de reconhecimento e prestígio social. Desta maneira, a satisfação ou insatisfação nas atividades produtivas do homem envolverão e condicionarão seu próprio ajustamento ao trabalho, à vida familiar e à vida social.

Os especialistas em comportamento organizacional têm alertado para a necessidade de uma fusão dos objetivos organizacionais com os objetivos individuais dos empregados. Na prática, contudo, muito pouco se tem feito: a colocação de pessoal nos serviços é feita, muitas vezes, sem a observância das diferenças individuais e das exigências do trabalho; a subutilização das capacidades humanas; o desconhecimento do potencial dos funcionários; o uso de critérios inadequados para a promoção do pessoal; a ausência ou mesmo impossibilidade de planejamento de carreira; enfim, são muitos os exemplos encontrados em organizações brasileiras que denunciam a ausência de orientação no trabalho. Tais situações dificultam a realização pessoal do funcionário, trazendo conseqüências negativas para si e para a comunidade de trabalho da qual participa.

No campo da orientação no trabalho, o psicólogo pode oferecer ao administrador alternativas para melhor gerenciar seu pessoal, incluindo as seguintes atividades:

• avaliar características pessoais de funcionários recémadmitidos, com vistas a fornecer subsídios para sua adequada localização no serviço;

• promover a orientação profissional dos funcionários (planejamento de carreira, remanejamento interno, etc);

• prestar atendimento psicossocial, visando o ajustamento profissional;

• realizar levantamento de potencialidades do pessoal da organização;

• identificar o grau de motivação e satisfação do empregado, em relação ao trabalho que executa;

• realizar entrevistas de desligamento, com vistas a colher subsídios que auxiliem a organização em decisões relativas ao pessoal;

• estudar e estabelecer critérios de avaliação periódica dos índices de absenteísmo e tumover, identificando suas causas e prevendo soluções.

8. DIAGNÓSTICO ORGANIZACIONAL

O diagnóstico organizacional é um dos produtos da evolução do pensamento sobre a natureza do homem e do trabalho, na medida em que destas novas posições surgiu a evidência de compatibilizar as necessidades das pessoas com os objetivos organizacionais.

Os teóricos e especialistas em organizações apresentam diferentes conceitos e definições para o diagnóstico, influenciados por seus estilos, valores e habilidades e, por outro lado, limitados pelos conhecimentos e experiências com abordagens e metodologias específicas.

O diagnóstico organizacional é o resultado do levantamento e análise das variáveis relacionadas ao desempenho organizacional, oferecendo informações e dados que possibilitem o entendimento do atual estado da organização. No entender de Castro & Luchessa (1974), o diagnóstico é "uma avaliação sistemática e integral dos problemas da empresa, suas causas e possíveis soluções". Ressalte-se, contudo, que o diagnóstico não deve estar somente voltado para identificar deficiências ou "doenças" da organização, mas sobretudo visa ele possibilitar a que se conheça o estado atual da organização, sendo a identificação de problemas ou dificuldades apenas uma das possíveis conseqüências dele. Uma outra definição, apresentada por um grupo de consultores organizacionais (ODA, 1978), permite-nos chegar a uma compreensão mais clara sobre o diagnóstico organizacional. Para eles, diagnóstico "é um processo analítico que visa identificar e medir as variáveis relevantes e válidas da eficácia e eficiência organizacionais".

Como se observa, o diagnóstico deve procurar fornecer informações que tornem possível conhecer e compreender a organização e, para tanto, deve-se contar com profissionais de várias áreas, incluindo o psicólogo, que poderá colaborar na execução das seguintes atividades:

• proceder ao estudo de variáveis organizacionais, como clima organizacional, poder, satisfação no trabalho, motivação, influência, autoridade, responsabilidade, liderança, etc;

• identificar o processo de integração grupai, avaliando fenômenos psicossociais, como interação, competição, conflito, etc;

• avaliar atitudes e opiniões de empregados acerca do trabalho que desempenham na organização;

• identificar possíveis conflitos intra e intergrupais;

• analisar os fatores relacionados com processos de mudanças (resistência/ajustamento);

• estudar o processo de comunicação empresarial, verificando seus efeitos sobre o sistema organizacional;

• estudar os métodos de processo decisório na empresa.

9. CONCLUSÃO

Atualmente, no processo de evolução das organizações, um dos aspectos mais acentuados que se observa é a crescente conscientização dos dirigentes quanto á importância da administração de recursos humanos, aceitando a premissa de que é a qualidade do pessoal o fator que mais diferencia sua organização da outra. Principalmente se considerarmos o órgão de recursos humanos não como um simples componente administrativo, mas como um elemento do sistema recursos humanos, podemos perceber que seus limites extrapolam simples ações isoladas. Antes disso, o sistema recursos humanos compreende uma gama de atividades e procedimentos que, conduzidas de forma constante e sistemática, têm por objetivo suprir (procurar, selecionar, ajustar) e manter (integrar, avaliar, motivar e desenvolver) a organização com pessoas em quantidade e qualidade necessárias à consecução dos objetivos organizacionais.

Ao discutir a forma como o sistema recursos humanos pode contribuir eficazmente para o sucesso organizacional, passando-se de uma posição reativa para próreativa, Gomes (1978) admite que é necessária a adoção de alguns pressupostos básicos como:

a) acreditar na importância dos recursos humanos como instrumento de desenvolvimento organizacional;

b) fundamentar-se na crença de aplicabilidade das ciências do comportamento na empresa (psicologia, sociologia, pedagogia, etc);

c) integrar o órgão de recursos humanos como intermediário entre as necessidades da empresa e as dos empregados.

De fato, considerando-se a multiplicidade e a complexidade das variáveis que influenciam a vida das organizações, envolvendo e exigindo competências e habilidades diversas, o papel do subsistema recursos humanos será realmente mais efetivo, caso se constitua equipe multiprofissional.

  • Aguirre, E. G. & Noriega, F. R. Aplicación de los análisis de las operaciones para determinar necesidades reales de capacitación EN PEMEX. Pedagogía para el adiestramiento, 1(5):3545, 1971.
  • Castro, J. Podesta & Luchessa, Héctor. Diagnóstico: evaluación sistemática de los problemas de la empresa. Buenos Aires, Ediciones Macchi, 1974.
  • Chackel, Bryan. A ergonomia na Inglaterra e na Universidade de Loughborough. Arquivos Brasileiros de Psicologia Aplicada, Rio de Janeiro, FGV, 27(1):22-69, 1975.
  • Dunnette, M. D. Seleção e colocação de pessoal. São Paulo, Atlas, 1974.
  • Flanagan, J. C. The critical incident techinique. Psychological Bulletin, 51:327-58, 1954.
  • Gomes, Jorge F. Administração de recursos humanos e desenvolvimento organizacional. Revista de Administração de Empresas, Rio de Janeiro, FGV, 4(18), out./ dez. 1978.
  • Legere, C. L. John. Occupational analysis for training. Educacional Technology, 18(3):27-34,1978.
  • Melo, Armilon R. et alii. Curso de orientação à prevenção de acidentes. São Paulo, Sesi, 1969.
  • ODA - Organization Development Associations. Habilidades de diagnóstico organizacional. Programa de Formação de Consultores de Organização. Brasília, Ministério da Agricultura/Suplan, 1978.
  • *
    N. do A. Dados obtidos junto à Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho - MTb.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 1982
    Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: rae@fgv.br