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Um método composto de determinação de preços

ARTIGOS

Um método composto de determinação de preços

Raimar Richers

Professor-Adjunto, Departamento de Mercadologia, e Co-Chefe do Centro de Pesquisas e Publicações da Escola de Administração de Emprêsas de São Paulo

Na pratica, apreçar um produto requer bem mais do que a comparação de custos e procura; requer objetivos claros, diretrizes imaginativas e uma sólida base de estrategia; acima de tudo, requer compreensão daquilo que se presta para modificar as condições prevalecentes da procura em benefício próprio "

ALFRED R. OXENFELDT

Determinar o preço de um produto é tarefa ingrata para o administrador. Há uma infinidade de variáveis no problema, tôdas interdependentes, nenhuma passível de destilação que a transforme em ponto de referência para umcalculo racional. O conhecimento do custo, por exemplo, é essencial à determinação, mas depende do volume de produção - e êste do volume de vendas - e êste da da procura. Esta, por sua vez, escapa a qualquer quantificação, pois depende de uma infinidade de fatôres não controláveis. Como se isto não fôsse suficiente, a instabilidade monetária do nosso país dificulta qualquer planejamento em que o preço possa figurar como constante.

Não é de estranhar, pois, que o nosso empresário tenda a adotar, dentre os métodos de determinação, aquêle que menos se presta para um planejamento de longo alcance: é o que conjuga a experiência sôbre aumentos de custos no passado e a "intuição" sôbre o que se pode esperar do comprador no futuro. Disto geralmente resulta um "preço de autodefesa" que, por ser alto, impõe limitações desnecessárias ao volume de vendas e, por conseguinte, à expansão, tanto da própria emprêsa, quanto da economia em geral.

A fim de encontrar o preço capaz de assegurar-lhe não só o melhor aproveitamento de seus atuais recursos, como a futura expansão de sua emprêsa, deve o administrador analisar, isoladamente, os fatôres que compõem o preço de seu produto, sem, contudo, perder de vista a interdependência dêsses fatôres. Acreditamos que isto possa ser realizado por meio de um esquema que integre a estratégia do preço no planejamento mercadológico total da emprêsa, esquema que, em nosso entender, deve abranger os seguintes passos:

1. Avaliação dos fatôres estáveis da emprêsa

2. Determinação do custo unitário e total do produto

3. Determinação dos objetivos da determinação do preço

4. Cálculo da remuneração do capital da emprêsa

5. Avaliação qualitativa da concorrência da emprêsa

6. Avaliação do mercado em potencial

7. Avaliação do composto mercadológico

8. Avaliação dos efeitos das diretrizes mercadológicas

9. Definição de uma estratégia de preços

Na descrição que a seguir faremos dêsses passos, ilustraremos a aplicação prática do esquema sugerido para uma emprêsa tipicamente brasileira que produz um bem de consumo de ampla distribuição no país.

De início, vale ressaltar que o método não se aplica de forma irrestrita a qualquer produto, sob quaisquer condições. Adaptações mais ou menos substanciais terão que ser feitas pelas emprêsas que não se enquadram na situação aqui ilustrada, particularmente quando estas enfrentem o problema de apreçar um produto nôvo, um bem industrial, ou quando disponham de uma linha de produtos. Cabe anotar, também, que o método só se refere ao chamado "preço-base", ou seja, não leva em conta possíveis ajustes de ordem administrativa, como descontos ou prazos de pagamento.

Impossível seria a integração de todos êsses fatôres em um só artigo. Acreditamos, porém, que tanto a disposição do método, quanto o exemplo prático que o ilustra, venham facilitar a tarefa eventual de adaptação.

1.º PASSO: AVALIAÇÃO DOS FATORES ESTÁVEIS

Tôda emprêsa opera com um considerável número de fatôres imutáveis a curto prazo que lhe impõem uma limitação nas decisões, inclusive quanto à determinação de seus preços. Além das condições externas (como, por exemplo, a conjuntura econômica ou o número e tipo de concorrentes), em que a emprêsa se localiza, há uma série de dados internos, cuja modificação exigiria um esfôrço ou dispêndio considerável de tempo ou dinheiro, tais como:

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- na área de produção: o tipo de produto, a localização das instalações, o tipo e número de funcionários e empregados, a matéria-prima necessária e os tipos de fornecedores;

- na área de finanças: o capital fixo e de giro disponíveis e os recursos financeiros e seus custos;

- na área de vendas: o processo de mercadização em vigor, as vias de distribuição disponíveis, e os contratos e relações com vendedores e revendedores.

A fim de conjugar êsses fatôres de modo a permitir o seu máximo aproveitamento, convém que a emprêsa inicie o apreçamento de produtos com uma avaliação genérica dos dados mais ou menos constantes, devendo, para tal, realizar, no mínimo, o seguinte:

a) determinar o melhor aproveitamento de sua capacidade instalada de produção em têrmos de unidades a serem produzidas, sem aumento considerável de recursos; e

b) colhêr dados sôbre o movimento de vendas (por regiões, unidades e cruzeiros) para os últimos (se possível dez) anos e analisar as causas dos altos e baixos do volume verificado no passado.

Êste tipo de análise responderá a questões como: quantas unidades podem ser produzidas em diversos níveis de produção; quantas unidades foram produzidas no passado; como se comparam os resultados de vendas (em unidades) com a capacidade instalada; qual era a rotação dos estoques; etc. No caso da "Indústria Manufatureira ABC" - emprêsa que servirá para ilustrar nosso método - as seguintes informações resultaram dêste tipo de avaliação-: a "ABC" produz um único bem de consumo semidurável em fábrica localizada nos arredores de São Paulo; tem capacidade instalada de cêrca de 100.000 unidades anuais, que poderá ser aumentada para 150.000 unidades sem investimento adicional, caso resolvesse operar com duas equipes de operários; nos últimos dez anos a emprêsa produziu em média 77.580 unidades; nos últimos três uma média de 90.870 unidades.

Seu capital total foi avaliado em 100 milhões de cruzeiros, dos quais 40 representam o capital fixo (ao valor de mercado, não patrimonial!) e 60 o capital de giro (ou circulante). A rotação média do capital sôbre as vendas realizadas foi de 1, 96 nos últimos três anos, sendo que cêrca de 75 % das expansões foram financiadas pela reinversão de lucros e 25 % por credores externos.

Utilizando um corpo de vendedores e distribuindo diretamente a varejistas, a emprêsa ABC abastece os principais Estados sulinos do País, mais as capitais e cidades importantes de outros Estados da União. Um cálculo do movimento de vendas (deflacionado com base nu m índice composto do custo de vida, no valor de negócios da "Conjuntura Econômica" e na evolução dos custos e preços da própria firma) revelou que, nos últimos três anos, a ABC realizou vendas médias anuais de 196 milhões de cruzeiros, obtendo um lucro líquido médio (ajustado) de 46 milhões ou 23, 5% sôbre o volume de vendas, o que corresponde a um preço médio de 2.157, 00 cruzeiros por unidade de produto.

Cêrca de quinze produtores operam no mercado nacional, distribuindo artigos que substituem diretamente o produto da ABC. Dentre êles, contudo, apenas três são considerados importantes, um maior (denominado "Fábrica X"), e outro (denominado "Fábrica Y") algo menor do que a ABC. Em conjunto, estas três fábricas vendem cêrca de 55% do mercado total.

Os preços dos produtos têm variado, ultimamente, de Cr$ 1.900, 00 a Cr$ 2.200, 00. Alguns dos produtores menores tem a tendência de estabelecer preços um pouco inferiores aos da Fábrica X, reajustando-os em função dos aumentos que esta faz. Há, contudo, outros concorrentes que estabelecem preços superiores aos da Fábrica X, seja porque operam com margem de lucro mais baixa, seja porque procuram dar maior ênfase à qualidade de seus artigos.

2.º PASSO: DETERMINAÇÃO DO CUSTO

Do primeiro passo poderão, eventualmente, resultar algumas modificações de maior ou menor porte na estrutura da empresa que afetarão, inclusive, o segundo passo: a determinação do custo (independentemente do preço).

É natural que esta fase do processo seja tão mais precisa quanto mais desenvolvida fôr a contabilidade de custos da empresa. As companhias que não dispõem de um sistema de contabilidade industrial devem satisfazer-se com estimativas.

Para que os dados contábeis destinados à determinação do preço possam ser utilizados como instrumento de decisão administrativa, recomenda-se que as seguintes normas de apresentação sejam observadas:

A. Transformação de dados históricos em estimativas

A contabilidade é, por natureza, um instrumento que registra acontecimentos passados, ao passo que o preço visa o futuro. Por conseguinte, é indispensável que a alta administração determine época e período para os quais deseja que sejam feitas as estimativas de custos pelo setor responsável por esta função. Recomenda-se, contudo, que a estimativa seja feita para uma época próxima e que o período não ultrapasse um ano, devido ao grau crescente de incerteza com que a inflação afeta qualquer previsão destinada a datas remotas.

B. Estimativa para diversos níveis de produção

Em geral, os custos totais variam consideràvelmente para diversos níveis de aproveitamento da capacidade instalada e do pessoal ocupado em todos os setores da emprêsa. Por conseguinte, quanto mais alternativas de aproveitamento da capacidade instalada forem levadas em conta na estimativa de custos, tanto mais fácil será a tarefa posterior de comparação entre custos e procura.

C. Utilização de formulários e gráficos

Os formulários devem conter apenas resumos dos elementos essenciais à decisão e ser preparados de uma maneira que facilite a comparação entre períodos. Os gráficos visam a melhor compreensão dos elementos que compoem o custo total e da relação entre custos e volumes.

Evidentemente, a apresentação dos dados dependerá, em parte, do sistema contábil em vigor na companhia. No caso da Indústria Manuíatureira ABC, os dados foram apresentados como demonstra o Quadro 1. Ao levantar esses elementos, a emprêsa utilizou custos históricos de produção do passado recente, acrescentando uma "taxa de ajuste" para a inflação (como percentagem dos principais elementos de custo). Para os custos de vendas e de administração foram utilizadas taxas variáveis de acréscimo, diretamente incorporadas ao custo total correspondente.


3.º PASSO: DETERMINAÇÃO DOS OBJETIVOS

Em essência, os primeiros dois passos procuram levantar uma espécie de "inventário situacional" da emprêsa, útil a qualquer decisão de natureza administrativa. Somente do terceiro passo em diante focaliza-se o problema específico da determinação do preço. Para tal, convém que se estabeleça, inicialmente, o objetivo ou objetivos que servirão como guia de conduta para todos os passos subseqüentes.

Dos possíveis objetivos de determinação, o que geralmente nos ocorre em primeiro lugar é o princípio do lucro máximo. Todavia, só raras vêzes a chamada "maximização dos lucros" constitui uma base satisfatória para apreçar um produto. Acima de tudo, o próprio têrmo é excessivamente vago para servir como base de decisão prática. Além do mais, conduz êle fácilmente a preços exorbitantes, que correspondem antes a um desejo de realização de lucros do que a uma apreciação objetiva das condições que possam ou não determinar essa realização. A emprêsa tende a restringir o seu próprio volume de vendas, seja porque torna o seu produto inacessível a uma parcela do seu m ercado em potencial, seja porque fará com que novos concorrentes surjam no mercado, ou ambos.

Por conseguinte, uma definição mais realista de objetivos torna-se desejável, sem que esta entre em conflito com o princípio de lucro máximo a longo prazo. Entre estes objetivos, quatro merecem especial atenção, a saber:

a) atingir remuneração predeterminada do capital empatado (ou a empatar, quando se trata de expansão ou de produtos novos);

b) atingir parcela predeterminada do mercado em potencial;

c) atingir e/ou conservar uma margem predeterminada de lucro;

d) enfrentar e/ou evitar a entrada de concorrentes.

Uma comparação dêstes objetivos demonstra que êles não se excluem necessàriamente entre si. Daí convém que a emprêsa estabeleça prioridades nos objetivos, de preferência de acordo com as diretrizes básicas de sua operação. Assim, por exemplo, se uma firma tem como uma de suas diretrizes fundamentais assegurar uma dada percentagem do potencial de mercado, os seus objetivos de determinação de preços devem estar de acordo com essa diretriz.

Quanto à Indústria ABC, o seguinte fôra decidido pela direção da emprêsa: o principal objetivo era a conservação de uma taxa mais ou menos constante de remuneração do capital. Tudo o que excedia o teto combinado desta remuneração era aplicado em um esforço dirigido à ampliação do mercado e a uma modesta remuneração dos acionistas. Ao mesmo tempo, procurava-se conservar a taxa de lucro líquido entre 20 e 30%.

A entrada de concorrentes entrava em jôgo apenas nas considerações de expansão.

4.º PASSO: CÁLCULO DE REMUNERAÇÃO DO CAPITAL

Por uma série de motivos, compensa que a remuneração do capital seja levada em conta para a grande maioria dos produtos cujo preço está para ser fixado ou revisto. Além de permitir uma avaliação e comparação objetiva dos resultados obtidos no passado, o conceito se presta para o cálculo financeiro de alternativas de investimentos, daí decorrendo uma variedade de aplicações práticas, entre elas a determinação do preço. Vale acrescentar que, como instrumento de decisão, o conceito é particularmente valioso quando há escassez rígida do capital (e, por conseguinte, seu preço é elevado). É êste, sem dúvida, o caso da atual conjuntura brasileira.

Para se conhecer a remuneração do capital, basta que se divida o lucro obtido durante um determinado período pelo capital total investido na emprêsa. É importante, porém, que não se perca de vista a dupla facêta do conceito, qual seja: (a) a relação entre lucros e volume de vendas, que reflete a lucratividade e o poder competitivo da emprêsa; e (b) a relação entre volume de vendas e capital, que reflete a rapidez com que o capital produz vendas. O primeiro aspecto revela a margem de lucro (em %), o segundo o índice de rotação do capital.

Aplicadas ao caso concreto da Indústria ABC, as duas fórmulas demonstraram os seguintes resultados para a média dos três anos anteriores:

Para ser utilizado na metodologia de apreçar produtos, convém que o conceito leve em conta a dependência entre o volume de vendas e o volume de capital aplicado, particularmente do capital de giro, cuja grandeza é, em grande parte, uma função do volume de vendas. A seguinte fórmula engloba esta relação:

Para poder beneficiar-se desta fórmula, a Indústria ABC tinha que determinar duas variáveis: a percentagem da remuneração desejada e a percentagem do capital de giro do resultado esperado de vendas. A remuneração foi fixada em 50 % (ou algo superior à do passado), enquanto que cêrca de 30% das vendas eram consideradas satisfatórias para se poder operar sem o levantamento de créditos de fontes externas.

Nestas condições, qual seria o preço para um volume de vendas de 100.000 unidades? Ao substituir os valores da fórmula acima, temos:

A mesma remuneração poderia ser atingida se a companhia vendesse apenas 75.000 unidades ao preço de Cr$ 2. 469, 00 ou se as vendas alcançassem 125. 000 unidades ao preço de Cr$ 1.896, 00.

Destarte a emprêsa conseguiu determinar quais eram os diversos preços em diferentes níveis de produção e vendas necessários para obter uma dada remuneração de capital. Contudo, a fórmula nada revela sôbre a disposição do mercado em absorver as quantidades desejadas aos seus respectivos preços.

5.º PASSO: AVALIAÇÃO QUALITATIVA DA CONCORRÊNCIA

A variação considerável entre os preços em diversos níveis de produção levanta uma série de perguntas essenciais, sobretudo: qual é o preço que garante o melhor aproveitamento da capacidade instalada, o máximo aproveitamento das forças administrativas em operação, a melhor combinação entre volume de produção e de vendas e a melhor margem de lucro? Qual seria a remuneração real em função dêsse preço?

As respostas a estas perguntas dependem, de um lado, da estrutura de custos; de outro, da aceitação do produto no mercado. E isto, por sua vez, requer um amplo conhecimento dos fatores que determinam a procura do produto. Inevitável é, pois, uma análise que visa uma definição das forças que agem no mercado. Estas são, em essência, duas: o comprador em potencial e os concorrentes.

Raríssimos são os produtos que não enfrentam alguns ou muitos concorrentes no mercado que lhes impõem limites máximos ao preço. Êsses produtos concorrentes podem ser tanto diretos quanto indiretos. Assim, por exemplo, um produtor de capas, ao apreçar o seu artigo, poderá ser influenciado não somente pelos preços de outras capas, como também pelos preços dos guarda-chuvas, que representam um substituto indireto do seu produto.

Para poder determinar até que ponto o seu preço poderá diferir dos preços de seus concorrentes, o empresário deve responder às seguintes perguntas: (a) quais são as vantagens e desvantagens concretas do meu produto, em relação aos produtos de meus principais concorrentes? E (b) qual é a provável imagem, na mente do comprador, criada por meu produto e pelos produtos de competidores?

A sutileza destas questões demanda, a rigor, uma pesquisa motivacional, que apenas um número restrito de emprêsas pode realizar. O empresário experimentado, contudo, dispõe de um meio capaz de lhe proporcionar respostas bastante satisfatórias a estas questões: o julgamento criterioso próprio e de seus auxiliares, baseado em conhecimento de causa e raciocínio objetivo. Para tal efeito, convém que seja utilizado um instrumento que convencionamos chamar de "perfil de afinidade". Êste procura comparar as principais características de produtos concorrentes, as quais, em seu conjunto, determinam a imagem que o respectivo produto cria entre os seus compradores em potencial.

Ao construir o perfil de afinidade, o empresário deve, inicialmente, selecionar aquêles fatores que maior influência possam exercer sôbre a decisão de compra e agrupá-los de maneira coordenada. Depois, o seu produto e os produtos de seus principais concorrentes devem ser avaliados em função dos critérios escolhidos e devem ser classificados em uma escala de valores com a maior insenção de ânimo possível. Após registrar os resultados desta avaliação em um diagrama previamente preparado e traçadas linhas entre os "pontos" da escala de valores, verificam-se os pontos fracos e fortes dos produtos analisados.

Dentre outros resultados úteis à avaliação do processo de mercadização, o diagrama oferece um indício sôbre o grau de desvio do preço permissível para o produto da emprêsa, sem prejuízo para as receitas de vendas.

O Diagrama n.º 1 é um resumo do perfil de afinidade utilizado pelas Indústrias ABC na avaliação de seu produto em comparação com os produtos de seus principais concorrentes (produtos X e Y). Da análise dêste quadro, o diretor comercial das Indústrias AB C tirou as seguintes conclusões principais, referentes ao preço:

a) apesar de certas vantagens sôbre ambos os produtos concorrentes, um preço superior ao do produto X (que girava em tôrno de Cr$ 2. 100, 00) provàvelmente dificultaria qualquer plano de ampliação da emprêsa;

b) um preço ligeiramente inferior ao do produto X traria vantagens, se acompanhado de outras medidas de natureza administrativa, particularmente como não era de se esperar que a emprêsa X acompanhasse uma eventual redução de preços da Indústria ABC.

6.º PASSO: AVALIAÇÃO DO MERCADO

Se a análise descrita no passo anterior é capaz de definir a posição que o produto ocupa no mercado em relação aos seus concorrentes, pouco ou nada revela sôbre o potencial de vendas do produto a vários preços hipotéticos. Apenas uma avaliação criteriosa do mercado poderá determinar êste potencial.

Geralmente, está costuma ser a variável de mais difícil determinação para o analista de preços. Contudo, a dificuldade não é insuperável, nem requer, necessariamente, um dispêndio fora de proporções.

A pergunta que se apresenta na prática pode ser assim formulada: de que maneira um aumento (ou uma diminuição) do preço irá afetar as quantidades procuradas?

Várias são as alternativas para encontrarem-se respostas satisfatórias a esta pergunta; entre elas, figura, em primeiro lugar, a pesquisa de mercado. Tem ela apenas um defeito: por ser cara, não está ao alcance de muitas emprêsas. Substancialmente menos dispendiosa é a utilização de um método experimental conduzido em "mercados-teste" isolados entre si, mas com características semelhantes.

Os principais passos dêste método podem ser assim resumidos: (a) divisão do território de vendas em mercados estanques; (b) estudo preliminar das características dos mercados; (c) escolha dos mercados-teste; (d) seleção das vias e estabelecimentos utilizados para o teste; (e) venda dos produtos nos mercados-teste a preços distintos e, eventualmente, alteração nos preços dentro de cada mercado-teste após decorrência de um período suficientemente amplo para permitir repetição de compras pelos consumidores; (f) avaliação dos resultados de venda.

Acreditamos ter êste método experimental um excelente campo de aplicação no Brasil. A prática de igualar preços nas diversas regiões, de modo a permitir variações substanciais na determinação regional de preços, ainda não é comum entre nós. A seleção de mercados-teste é relativamente fácil, pois há, no Brasil, centenas de municípios bastante isolados e com características comparáveis. Além do mais, os testes podem trazer benefícios secundários de inestimável valor para a conquista de mercados ainda pouco explorados. De outro lado, cabe reconhecer os obstáculos que se impõem à aplicação do método para o efeito de avaliação da procura. Um é o elevado grau de variação no poder aquisitivo das diferentes regiões geo-econômicas do Brasil; o outro é a inflação, que introduz um fator de instabilidade no teste.

A emprêsà que não possa ou não queira fazer uso de nenhum método empírico ou de pesquisa de campo, deve satisfazer-se com um meio menos preciso de avaliação da procura, o qual, contudo, pode assegurar-lhe bons resultados, particularmente se conduzido com objetividade por pessoas de considerável conhecimento de causa. Referimo-nos ao julgamento.

Como método de avaliação, o julgamento não segue, por definição, um esquema rígido. A sua aplicação depende, em parte, da emprêsa e, em parte, do pessoal que o adota. Todavia, há um aspecto comum a todo tipo de análise por julgamento cujo objetivo seja a determinação da procura a preços variáveis. Trata-se de pergunta: de que depende a quantidade procurada do produto - além do preço?

Invariàvelmente, esta pergunta conduz a duas áreas de investigação: a primeira diz respeito aos aspectos quantitativos do mercado (como número de compradores em potencial, renda per capita dos compradores, localização dos principais mercados etc.), a segunda se refere aos aspectos qualitativos (como motivos e hábitos do comprador, consciência do fator preço em relação a outras variáveis como apresentação, propaganda, ou promoção etc.).

A fim de reduzir a margem de êrro sempre contida em uma avaliação essencialmente subjetiva, a emprêsa déve recorrer à interpretação de fatos e de dados secundários para complementar o julgamento, seja com base em estatísticas oficiais e semi-oficiais, seja em função dos resultados de vendas. Por conseguinte, quanto melhor organizado fôr o registro de vendas da emprêsa, tanto mais preciso poderá ser o resultado do julgamento.

Ao proceder à avaliação do mercado, a Indústria ABC utilizou-se do julgamento baseado em um inquérito. Durante dois meses, três analistas visitaram todos os territórios em que a emprêsa tinha uma representação, a fim de consultar os seus vendedores, inspetores e varejistas sôbre os eventuais efeitos de um a alteração nos preços. As informações regionais foram, posteriormente, conjugadas e interpretadas pelo diretor comercial e os três analistas Os resultados nacionais dessa interpretação constam do Quadro 2. De acordo com êsse quadro, o preço que prometia a relação mais lucrativa entre receitas e custos era o mais próximo a Cr$ 2.100, 00.


7º PASSO: AVALIAÇÃO DO COMPOSTO MERCADOLÓGICO

Em seu conjunto, os primeiros seis passos do presente método têm muito em comum com o diagnóstico que revela os pontos fortes e fracos de um organismo vivo e que o analista interpreta para aplicar um a terapêutica condizente com o estado físico do analisado.

No nosso caso, o objeto da análise é a organização de vendas em seu sentido mais amplo (incluindo os custos e as vias de distribuição), cujas determinantes individuais devem ser avaliadas e combinadas de maneira a proporcionar o melhor resultado (medido pela margem de lucro, percentagem de remuneração do capital ou outro fator) para a emprêsa em períodos futuros predeterminados.

Um plano, portanto, é essencial para a organização. O resultado da coordenação das diferentes dimensões desse plano é, às vêzes, chamado de "composto mercadológico".

Entre as dimensões, o preço figura apenas como um dos fatores; os outros fatores costumam ser o produto, as vias, as vendas pessoais, a propaganda e a localização (tanto das lojas, agências ou da própria fábrica).

A avaliação do composto mercadológico pela Indústria ABC conduziu ã determinação de cinco diretrizes novas da emprêsa, que visavam eliminar os pontos mais fracos da atual organização de vendas e fortalecer a posição da emprêsa no mercado. Eram estas as diretrizes:

1. reavaliar os inspetores e Q corpo de vendedores;

2. reestruturar a rêde de distribuição;

3. criar uma nova embalagem simplificada e mais funcional;

4. lançar duas campanhas de promoção direta por meio de mostruários e folhetos;

5. restringir temporàriamente os gastos com a propaganda sem, contudo, mudar de veículos.

Esperava-se que as despesas decorrentes destas diretrizes superassem a sua economia durante cêrca de seis meses. Posteriormente, os efeitos da implantação do plano reduziriam os custos unitários, sobretudo devido a um aumento da procura e a uma maior eficiência na distribuição.

8º PASSO: AVALIAÇÃO DOS EFEITOS DAS DIRETRIZES

É natural que a introdução de novas diretrizes mercadológicas terá que exercer os seus efeitos na organização e nos resultados de venda. Cabe, pois, ao analista de preços avaliar êstes efeitos, particularmente com relação:

a) aos custos de distribuição e custos totais;

b) aos preços a diversos níveis de produção; e

c) à repercussão nas quantidades procuradas.

Na opinião do diretor comercial da Indústria ABC, a implementação das novas diretrizes, acompanhada de outras medidas de organização interna, afetaria a emprêsa da se

guihté maneira:

a) os custos de distribuição iam aumentar para os níveis mais baixos de produção e vendas. mas se distribuídos sôbre um maior volume, os custos totais iam crescer proporcialmente menos do que antes;

b) em conseqüência do esforço, adicional programado, a procura poderia sofrer um aumento mínimo de 10%, em relação à estimativa anterior (vide Quadro 2), para cada nível de produção e preço. Assim, por exemplo, ao preço de Cr$ 2.000, 00, as quantidades procuradas poderiam aumentar fàcilmente de 101.500 a 111.700 unidades. (Vide Quadro 3).


Para que a direção executiva da emprêsa pudesse visualizar melhor os efeitoss esperados da reorganização, fora preparado um gráfico comparativo das duas estimativas de antes e depois da adoção das novas diretrizes (Vide Gráfico 1)


Entre os efeitos positivos de reorganização, valia destacar os seguintes aspectos:

1.º) - uma redução do preço de Cr$ 2.100, 00 para Cr$ 1.900, 00 resultaria em um maior volume de produção e de vendas e em um aumento substancial da margem de lucro, devido ao melhor aproveitamento da capacidade instalada.

2.º) com a reorganização, qualquer um dos preços finalmente adotados pela emprêsa asseguraria uma margem de lucro superior ao seu preço correspondente de antes da reorganização, permitindo uma maior flexibilidade na determinação dos preços.

9º PASSO: DEFINIÇÃO DE UMA ESTRATÉGIA DE PREÇOS

Todos os elementos encontram-se agora à disposição da emprêsa para que se formule uma estratégia de preços em que as principais dimensões de um planejamento mercadológico total sejam ponderadas face aos objetivos básicos antes estabelecidos.

Para a Indústria ABC, o problema da estratégia a ser adotada resumia-se nas seguintes alternativas; ou a emprêsa adotaria uma diretriz antes conservadora de produção e vendas, a um preço próximo aos seus principais concorrentes; ou ela tentaria expandir suas atividades por meio de um plano de reorganização, o que demandaria um preço inferior aos de seus rivais mais diretos. Em algarismos (arredondados), o quadro se apresentava da seguinte forma:

A alternativa da expansão apresentava ligeiras vantagens sôbre a da conservação, particularmente devido ã melhor remuneração do capital, ao melhor aproveitamento da capacidade, à margem de lucro algo mais favorável e à maior independência nas decisões de expansão e de determinação do preço. Em contrapartida, o risco era considerado maior, dada a relativa escassez de capital da emprêsa e a incerteza sôbre como os consumidores, varejistas e concorrentes iam reagir a uma "política de preço baixo".

Acreditava-se, porém, que os benefícios decorrentes desta política seriam consideráveis a longo prazo, abrindo caminho a uma maior penetração no mercado, a uma aceitação mais ampla da marca e, possivelmente, a uma diversificação e conseqüente fortalecimento da emprêsa em um futuro mais remoto.

CONCLUSÕES

O método aqui proposto tem, inegàvelmente, uma desvantagem, que talvez assuste o administrador: a sua complexidade. Adotá-lo, pois, com a finalidade exclusiva de encontrar o preço mais compensador para a emprêsa seria antieconômico. Infelizmente, contudo, a simples aplicação de fórmulas ou regras "pré-fabricadas" nunca resulta em um preço capaz de ser utilizado como instrumento administrativo consciente na conquista da expansão ou, ao menos, na consolidação da emprêsa. Para tal fim, o preço deve, sempre, ser encarado como um elemento flexível e manejável pela direção da emprêsa. Isto requer a sua integração em um plano composto de uma multiplicidade de armas mercadológicas, tais como a qualidade do produto, a sua apresentação ou a maneira de sua distribuição.

Além de levar em conta esta necessidade de coordenação mercadológica, o presente método parte de um conceito de preço que diverge algo da obtenção do lucro máximo a curto prazo. Freqüentemente, um preço fixado abaixo do máximo que o mercado está disposto a pagar resulta em um benefício maior a longo prazo, devido à ampliação do volume de vendas e à conseqüente redução dó custo unitário. Por êsté motivo e, por oferecer uma melhor proteção aos interêsses dos proprietários, o objetivo-chave do nosso método consiste na remuneração mínima do capital.

Em essência, pois, todos os passos que compõem o esquema de determinação de preços aqui descrito convergem para a integração mercadológica e a conservação (ou expansão) do patrimônio da emprêsa.

BIBLIOGRAFIA

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1962
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