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Migrants, urban, poverty and instability in depeloping nations

RESENHA BIBLIOGRÁFICA

Migrants, urban, poverty and instability in depeloping nations

Por Joan M. Nelson. Harvard University, Center for International Affairs, 1969. 81 p.

Um dos pontos mais controvertidos do problema das migrações internas diz respeito ao papel político que o migrante desempenha quando sai de uma zona rural e vai para uma cidade. De um lado há aqueles que argumentam que os migrantes de baixo status social, quando se localizam numa cidade, provocam instabilidade social. De outro, há os que defendem a tese de que os migrantes de baixo status que se localizam nas áreas urbanas são politicamente passivos, havendo poucas evidências de que eles se sentem mais frustrados do que no seu ambiente anterior. O livro de Joan Nelson procura reunir uma série de investigações realizadas na América Latina, na Africa e na Asia, no sentido de colocar em evidência os prós e os contras às duas posições apontadas.

Dentre os que defendem que os migrantes são anônimos e politicamente insatisfeitos e constituem fator de instabilidade, Joan Nelson destaca Philipp Hauser e Gláucio Soares ( p. 7). Estes sociólogos argumentam que o migrante rural que vai para a cidade cai em uma situação de insegurança devido ao subemprego em que vive a maior parte do tempo.

Procurando evidências para essa posição, Nelson argumenta que os dados deveriam indicar uma porção relativamente mais alta de migrantes, apoiando partidos radicais, do que não-migrantes nas áreas urbanas. Os estudos disponíveis, entretanto, tendem a refutar essa hipótese. Por exemplo, vários estudos encontraram uma relação negativa entre a proporção de migrantes em cidades e a proporção de votos que apoiavam Salvador Allende nas eleições de 1952 no Chile. Trabalhos realizados na mesma linha são citados por Nelson, mostrando que a relação entre radicalismo político e migração não é clara.

Nelson aventa a questão de que talvez radicalismo não seja o melhor indicador de instabilidade social e por isso realiza um levantamento dos estudos que focalizam o "protesto político" como indicador de instabilidade. Aqui, também, estudos realizados nos Estados Unidos e na França indicam que os migrantes são relativamente pouco participantes dos movimentos de protesto nas zonas urbanas.

Outro ponto geralmente mencionado é o de que os migrantes vivem uma situação de relativo desemprego nas zonas urbanas. Citando estudos realizados no Chile, na Argentina e no Brasil, o autor conclui que a maioria dos migrantes que chegam às grandes cidades encontra emprego muito rapidamente (p. 15). Trabalhos realizados em Bogotá, Santiago, Calcutá, Nova Deli, Bombaim e outras cidades indicam ainda que a taxa de desemprego entre os migrantes é relativamente mais baixa do que os nativos da cidade mantendo-se constante o nível de educação. Por outro lado a cidade oferece ao migrante uma série de satisfações com o entretenimento formal e informal, melhores meios para educar seus filhos, melhores condições sanitárias, enfim, participação na cultura urbana.

Os trabalhos examinados no iivro indicam que a maioria dos migrantes que vem diretamente da zona rural para as cidades tem pouco interesse nos assuntos políticos e continua com uma atitude fatalista e com seus hábitos de respeito às autoridades.

Joan Nelson comenta ainda a teoria da radicalização elaborada por Gláucio Soares segundo a qual a urbanização sem industrialização aumenta o hiato entre as aspirações e as realizações. Este ato gera frustrações que são expressas em forma de agressão política e, especificamente, radicalismo. A condição central para a radicalização, segundo esta teoria, é a existência de um certo nível de marginalidade econômica e social entre os migrantes; em outras palavras, o radicalismo é uma função da marginalidade.

A despeito da grande importância desta teoria de radicalização, ela permanece ainda não testada devido a inúmeros problemas de ordem prática. Um deles diz respeito à dificuldade de se definir marginalidade. Podemos considerar marginais os indivíduos que vivem nas favelas? Os não qualificados e analfabetos? Ou os que, a despeito de uma especialização ou educação, nio possuem um trabalho estável? Ou devemos simplesmente considerar marginais os indivíduos de salários muito baixos?

Os estudos indicam que muitos indivíduos que vivem em favelas e cortiços possuem empregos estáveis e algum nível de educação (p. 35-36). Além do mais, muitos trabalhadores nio qualificados possuem empregos estáveis; em contrapartida, certos trabalhadores especializados possuem salários mais baixos. Isso significa que a ocupação e a educação são critérios muito ambíguos de marginalidade. Gláucio Soares, por exemplo, tomou os trabalhadores não qualificados como critério de definição de marginalidade e com base nisso construiu a sua teoria de radicalização, deixando de lado o problema de definição mais completa de marginalidade, assim como o problema de diferentes níveis de experiência urbana que ocorre entre um recém-chegado ou um migrante que vive na cidade há vários anos.

Comentando os resultados estatísticos apresentados por Gláucio Soares e outros autores que também operam com esta teoria do radicalismo, Joan Nelson mostra existir muito pouca evidência empírica em favor dessa postura teórica. Quando se considera o tempo de residência de um migrante na cidade, as relações entre nível ocupacional e radicalismo político tornam-se bastante obscuras. Por exemplo, os levantamentos realizados por Inkeles na Argentina, Chile, índia e Paquistão indicam que a satisfação com o trabalho entre migrantes diminui com o decorrer da sua experiência urbana. Isso indica que muitos fatores interferem na formação da satisfação do indivíduo no trabalho, tais como as comparações que faz com os grupos locais, as aspirações educacionais, as novas necessidades urbanas etc.

O trabalho de Joan M. Nelson constitui um esforço bastante interessante de reunir evidências empíricas para as duas posições acima enunciadas. As pesquisas relatadas no livro indicam a grande fragilidade em que ainda se encontra a teoria sociológica a respeito do fenômeno migração e marginalidade nos países em desenvolvimento.

JOSÉ PASTORE

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Maio 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1971
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